ÂNGELA MAROJA SERÁFICO LINHARES SAUMA
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L.L.M em Direito dos Contratos
XXXXXX XXXXXX SERÁFICO LINHARES SAUMA
O CONTRATO DE TRABALHO COMO CONTRATO EXISTENCIAL: O ALCANCE DA AUTONOMIA PRIVADA NOS CONTRATOS DE TRABALHO DOS EMPREGADOS “HIPERSUFICIENTES”
São Paulo 2022
XXXXXX XXXXXX SERÁFICO LINHARES SAUMA
O CONTRATO DE TRABALHO COMO CONTRATO EXISTENCIAL: O ALCANCE DA AUTONOMIA PRIVADA NOS CONTRATOS DE TRABALHO DOS EMPREGADOS “HIPERSUFICIENTES”
Monografia apresentada ao programa de LLM em Direito dos Contratos como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Direito dos Contratos.
Orientadora: Prof. Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx
São Paulo 2022
Dedico esta monografia ao meu filho, Xxxxxx, e ao meu marido, Xxxxxx.
AGRADECIMENTOS
Meus agradecimentos vão ao meu filho, Xxxxxx, que, mesmo que não intencionalmente e sem mesmo saber, fornece-me diariamente a força e impulso para todas as ações da vida. E ao meu marido, Xxxxxx, que me apoiou e incentivou desde que este curso era apenas uma ideia, e sem cujo estímulo constante eu não teria galgado mais esta conquista.
RESUMO
Este trabalho acadêmico traz uma breve análise da autonomia privada no contexto do contrato de trabalho dos empregados “hipersuficientes”, à luz dos conceitos gerais clássicos de direito contratual, tendo em vista a recente modificação introduzida nas leis trabalhistas, que conferiu liberdade individual a estes empregados para negociar suas próprias cláusulas contratuais diretamente com a outra parte contratante, qual seja, os seus empregadores. A metodologia utilizada foi a dedutiva. Objetiva-se demonstrar que, embora tenha sido conferida autonomia privada individual inédita na tradição jurídica trabalhista a uma categoria de empregados, tal autonomia ainda assim encontra limites inerentes não apenas ao próprio conceito contemporâneo de contrato e de autonomia privada – dada a alteração paradigmática ocorrida no modelo do núcleo contratual a partir do final do século XIX – como também inerentes à própria natureza do contrato de trabalho, podendo ser caracterizado mais recentemente, conforme novos paradigmas da doutrina civilista, como contrato existencial, uma vez que visa estritamente à subsistência de uma pessoa natural.
Palavras-chave: Autonomia privada. Empregado “hipersuficiente”. Contrato existencial. Paradigmas contratuais.
ABSTRACT
This academic work brings a brief analysis of private autonomy in the context of the employment contract of "hypersufficient" employees, in light of classic, general concepts of contractual law, in view of the recent modification introduced in labor laws, which granted individual liberty to such employee to negotiate their own contractual terms directly with the other contracting party, namely their employers. The methodology used was deductive. The objective is to demonstrate that, although an unprecedented in the labor legal tradition individual private autonomy has been granted to a category of employees, such autonomy still finds inherent limits not only in the contemporary concept of contract and private autonomy - given the paradigmatic change that occurred in the contractual core model from the end of the 19th century - as well as inherent to the very nature of the employment contract, which can be characterized more recently, according to new paradigms of civil doctrine, as an existential contract, since it strictly aims at the subsistence of a natural person.
Keywords: Private autonomy. “Hypersufficient” employee. Existential contract. Contractual paradigms.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÂO 7
2. CONCEITOS PRELIMINARES 11
2.1. Alteração Histórica dos Paradigmas Contratuais 11
2.2. Contrato Patrimonial (ou de Lucro) e Contrato Existencial 15
2.3. Autonomia Privada 20
2.4. Empregado “Hipersuficiente” 23
3. CONTROVÉRSIA ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DA FIGURA JURÍDICA DO EMPREGADO “HIPERSUFICIENTE” 28
4. A AUTONOMIA PRIVADA DO EMPREGADO “HIPERSUFICIENTE” NO CONTEXTO DO CONTRATO TRABALHO 34
5. CONCLUSÃO 42
1. INTRODUÇÃO
Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx propôs a caracterização dicotômica (“a dicotomia do século XXI”, nas suas palavras) dos contratos em contratos de lucro e contratos existenciais, segundo a qual contratos de lucro seriam “aqueles celebrados entre empresas ou entre profissionais” e, contratos existenciais, aqueles em que “pelo menos uma das partes é uma pessoa natural que visa a sua subsistência”. 1
Nesse sentido, temos que, pelos seus requisitos caracterizadores, o contrato de trabalho é um contrato existencial por excelência, uma vez que, por definição legal do art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, o contrato de trabalho (ou “de emprego”, mais especificamente) envolve de um lado, necessariamente, uma pessoa física que presta serviços de natureza não eventual sob dependência do empregador, mediante salário2, tendo-se ainda em conta que, na organização socioeconômica inaugurada pela Revolução Industrial, o trabalho assalariado é o principal e mais socialmente utilizado meio de subsistência do indivíduo.
Em tal contexto é que aparece a necessidade de se abordar o tema do enquadramento (e tratamento) jurídico adequado, especificamente, do contrato de trabalho firmado pelo chamado empregado “hipersuficiente” (ou “autossuficiente”), essa novel figura introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, sob a óptica do princípio da autonomia privada.
A autonomia privada representa uma das diversas faces da liberdade individual, qual seja, a liberdade de negociar, ou liberdade negocial, consistindo tal instituto, nos dizeres de Xxx Xxxxx, no “poder de criar normas negociais”3.
É relativamente assente na teoria e na jurisprudência pátrias que o princípio da autonomia privada se coaduna com o Direito do Trabalho brasileiro,
0XXXXX XXXXXX, Xxxxx. Contratos existenciais e sua aplicabilidade. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 19, p. 113-134, abr. – jun. 2019. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/. Acesso em: 24 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
2 Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
3 REQUIÃO, Xxxxxxxx. Autonomia e suas Limitações. Revista de Direito Privado, v. 60, p. 85- 96, out. – dez. 2014. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em: 24 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
pois o texto da Consolidação das Leis do Trabalho estabelece expressa e literalmente que as partes interessadas podem “estipular livremente” sobre as relações contratuais de trabalho.
Por sua vez, o parágrafo único do art. 444 consolidado estende tal prerrogativa de livre estipulação, de forma ainda mais pronunciada, ao empregado chamado “hipersuficiente” (ou autossuficiente), pois o destaca dentre todas as demais espécies de empregado existentes, permitindo que se entenda que a autonomia privada (liberdade negocial, poder de criar normas negociais) dessa categoria empregatícia é também diferenciada em relação aos demais – como ele próprio o é.
Ocorre que, em se tratando de contrato existencial por excelência, o contrato de trabalho – tratando-se de qual categoria de empregado se tratar – sempre será marcado pelo traço da irrenunciabilidade de direitos, pelo requisito primordial da garantia do mínimo existencial estabelecido na Constituição Federal, dentre outros princípios e predicados, todos relacionados ao fato de se tratar de instrumento por meio do qual se rege o meio de subsistência do indivíduo signatário.
O estudo da autonomia privada e dos contratos existenciais como um todo constituem parte integrante primordial e essencial do estudo jurídico dos contratos, configurando tópicos preponderantemente presentes na abordagem da Teoria Geral dos Contratos.
Por outro lado, o enfoque interdisciplinar representado pela abordagem de um contrato tipicamente trabalhista engrandece o debate em ambos os âmbitos, tanto na seara estritamente contratual-civilista, quanto na seara contratual-laboral.
Não raros são os momentos em que os operadores e estudiosos do Direito contratual somos convidados a refletir e discutir sobre as mudanças socioeconômicas, culturais, políticas e jurídicas que determinaram a própria alteração da nomenclatura de “autonomia da vontade” para “autonomia privada”, ou, então, sobre a própria existência de contratos que, para além do conteúdo puramente patrimonial, também carregavam em si o conteúdo existencial.
Assim, para esse trabalho, pesquisou-se, estudou-se e abordou-se o nível
– e a própria existência de níveis – de autonomia privada que o empregado “hipersuficiente” possui para efetivamente fazer a diferença a seu favor e fazer
valer seus direitos e – por que não? – suas vontades na mesa de negociação com o empregador.
A metodologia utilizada é a metodologia dedutiva.
Procura-se partir do estudo de conceitos já estabelecidos e consolidados, tais como – dentre outros – autonomia privada, contrato existencial, contrato patrimonial (ou de lucro) e contrato de trabalho para, então, construir uma teoria geral ainda não estabelecida – em desenvolvimento – sustentada pelas premissas e conceitos tomados como ponto de partida.
Com efeito, embora o conceito de empregado “hipersuficiente” em si seja relativamente novo e escasso de tratamento prático – dada a sua inserção no ordenamento jurídico apenas ao final do ano de 2017 –, também será tomado como ponto de partida para a construção do artigo, uma vez que se apresenta como a figura central no escopo de análise – o sujeito de direitos cujo grau de autonomia privada se procura averiguar.
Nessa toada, as respostas para o questionamento central que se pretende deslindar com o desenvolvimento do artigo, e que é o foco da pesquisa realizada, são perseguidas tendo em vista premissas e conceitos jurídicos sedimentados, razão pela qual o método dedutivo foi utilizado.
Não obstante, como não poderia deixar de ser, o desenvolvimento do trabalho não pretende excluir a utilização, ainda que tangencial, de outras metodologias paralelas, tais como o método dialético, ainda que de forma reduzida, para abordagens acidentais ao longo da condução.
O trabalho está estruturado para que, no primeiro capítulo, sejam introduzidos e abordados os conceitos sustentadores do tema central e como se relacionam entre si para gerar a problemática central. Dessa feita, serão pincelados conceitos tais como os de contrato patrimonial (ou de lucro), contrato existencial, empregado “hipersuficiente” (ou autossuficiente) e autonomia privada.
Depois de estabelecidos os conceitos basilares, o segundo capítulo traz um aprofundamento da problematização acerca do empregado “hipersuficiente”. Faz-se isso por meio da exposição do debate acerca da sua constitucionalidade, projetando tanto as vozes que sustentam que a sua própria existência enquanto instituto jurídico representa uma inconstitucionalidade à luz dos princípios de proteção do trabalhador, que rechaçam justamente a
possibilidade de se conceder autonomia negocial plena a qualquer espécie de trabalhador, quanto também expondo o argumento daqueles que defendem a sua constitucionalidade, chegando-se, por fim, à formulação de uma opinião própria.
No terceiro e último capítulo deste trabalho, pretende-se trazer a lume, por meio do confronto dos subtemas versados nos dois capítulos anteriores, o deslinde do questionamento: “o empregado ‘hipersuficiente’ (ou autossuficiente) exerce efetivamente uma autonomia privada plena, considerando que o contrato de trabalho é contrato existencial por excelência?”, onde traremos nossa conclusão pessoal.
Importa ressaltar que não se aborda neste trabalho o questionamento do porquê de se ter escolhido os dois critérios objetivos de educação acadêmica e patamar salarial para definição do conceito de empregado “hipersuficiente”, pois entendemos que tal questão é secundária na análise global que se deve fazer do instituto do empregado “hipersuficiente”.
Também não faz parte do recorte dado ao trabalho o estudo dos casos de simulação de relações empregatícias sob a aparência de relações de natureza civil, de forma que partimos sempre do pressuposto de que contratos empregatícios contêm, necessariamente, uma pessoa natural em um dos polos contraentes e, ao longo de todo o desenvolvimento deste trabalho, tal premissa será tomada como incontroversa.
Igualmente, não se insere no escopo do tema o debate profundo ou mesmo o questionamento acerca das motivações concretas, de natureza socioeconômica, jurídica ou política que levaram à edição e promulgação da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) ou mesmo da inclusão da figura do empregado “hipersuficiente” no seu texto e, consequentemente, da CLT – de forma que o presente trabalho não se presta a discutir se tais motivações foram acertadas ou não, limitando-se em se fazer um relato descritivo da realidade tal como se apresenta.
Com efeito, limitamo-nos a abordar tais temas de forma superficial, realizando unicamente uma avaliação (pessoal) da adequação do instituto à principiologia trabalhista contida na Constituição Federal.
2. CONCEITOS PRELIMINARES
Cumpre, antes de se adentrar o tema central, fazer um curto e sucinto apanhado geral de alguns conceitos basilares, nomeadamente aqueles de contrato patrimonial, contrato existencial, empregado “hipersuficiente” e autonomia privada, mencionando rapidamente como tais conceitos se relacionam entre si para a formação da problemática que ora se pretende abordar.
2.1 . Alteração Histórica dos Paradigmas Contratuais
Decerto ocorreram inúmeras alterações e deslocamentos – tanto laterais quanto verticais, dentro da estrutura legal –, ao longo da História, no posicionamento acadêmico, econômico e social da figura contratual – ainda que sem a denominação formal de “contrato”, mas enquanto instituto concretizador de atos e acordos de vontades na vida cotidiana –, bem como na finalidade a que vem servindo dentro das diversas experiências e dos diversos contextos socioeconômicos em que o instituto já esteve inserido, desde a sua mais primitiva noção.
À toda evidência, o que hoje conhecemos como a figura jurídica do contrato não é fruto de uma evolução retilínea e cronologicamente linear remontando ao festejado direito romano clássico.
Como bem ensinam Xxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx e Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx:
Se o direito somente existe como direito aplicado e interpretado, tamanho intervalo temporal torna arriscado afirmar que, ainda que sob o mesmo nomen iuris “contrato”, se esteja a tratar do mesmo instituto, a desempenhar a mesma função em sociedades tão diversas4.
Pode-se dizer com relativa segurança que o contrato, tal como o conhecemos atualmente e não obstante suas evoluções subsequentes, tomou
4 XXXXXXXX, Xxxxxxx. XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. BANDEIRA, Xxxxx Xxxxx. Fundamentos do Direito Civil: contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 3.
forma já na era moderna, surgindo “de uma ruptura, na modernidade, com o modo de pensar medieval”5.
Um dos aspectos mais marcantes da ruptura com o modelo de pensamento medieval foi a ascensão do antropocentrismo como pilar do raciocínio filosófico, trazido a lume pela escola do Iluminismo, que inspirou as Revoluções Burguesas, na Europa, e que se opunha ao teocentrismo tão presente e tão dominante na Idade Média – e até mesmo depois do Renascimento, na posterior Idade do Absolutismo6.
O aspecto antropocêntrico do pensamento que permeou desde então o imaginário intelectual recebeu projeção social, econômica – traduzida pelo liberalismo econômico, que cunhou o célebre mote do laissez faire, laissez passer, le monde va de lui même7 – sendo projetado, também, como não poderia deixar de ser, ao pensamento e às construções jurídicas, sempre conferindo protagonismo ao homem, ao ser humano enquanto indivíduo dotado de autonomia, de livre arbítrio e, especialmente, de soberania sobre seu próprio destino.
Não por outra razão, o modelo de contrato forjado como consequência desse imaginário era focado na exaltação do indivíduo considerado em si mesmo, trazendo, portanto, o individualismo como característica marcante desse modelo contratual.
Essa era toda a legitimidade de que precisava o homem, tido como senhor de si mesmo e dotado de liberdade plena e plena capacidade de autodeterminação, para entrar em acordos com outros homens – tidos, então, como seus iguais – e fazer desses acordos leis praticamente irrevogáveis entre eles.
Na lição de Xxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx e Xxxxx Xxxxx Bandeira8:
5 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito Contratual Brasileiro: Críticas e Alternativas ao Solidarismo Jurídico. São Paulo: Atlas, 2015, p. 33.
6 Conforme MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, na era dos reis absolutistas, o principal fator legitimador da Monarquia enquanto forma de governo, e do próprio poder absoluto e hereditário que os reis aglutinavam nas suas figuras era, justamente, a ideia de que o poder do rei emanava de Deus – portanto, era um poder divino – e que reis não deviam satisfações a homem nenhum, tendo unicamente o temor a Deus como seu superior.
7 Em tradução livre, “deixai fazer, deixai passar, o mundo anda por si mesmo”.
8 XXXXXXXX, Xxxxxxx. XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxx. op. cit.,p. 15.
(...) a vontade assumiu importância formidável na construção do significado e fundamento do contrato. A escolha das partes por contratar desponta, nesse contexto, não apenas como origem do contrato, mas também como seu fundamento de legitimidade, como razão pela qual suas regras são obrigatórias. Compreendido como “acordo de vontades”, o contrato emerge no esplendor do voluntarismo jurídico, onde o postulado fundante de toda a teoria contratual era a autonomia da vontade (...)
Já nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxx, ainda sobre o papel da manifestação de vontades no paradigma liberal de contrato:
Nessa conformidade, a concepção liberal de contrato era a de um acordo livremente manifestado de vontades das partes (consenso) – tomadas igualmente pelo sistema jurídico – independentemente de qualquer formalidade para sua perfectibilização (em regra). Após o encontro das vontades, isto é, o consenso (proposta e aceitação), as partes estarão obrigadas a dar, fazer ou não fazer alguma coisa, não sendo lícito a nenhuma delas, isoladamente, desistir do negócio (pacta sunt servanda); também não será lícito ao juiz interferir no que fora livremente pactuado entre as partes.
A concepção elementar do modelo é a de que o legislador deixa uma esfera normativa dos comportamentos sociais para os próprios indivíduos negociarem, barganharem, cada qual sendo responsável pelo que é melhor para si.9.
A figura da vontade de contratar, então, emerge como uma verdadeira entidade jurídica com fim em si mesma. Ela surge não apenas como elemento legitimador do acordo, mas também como elemento limitador da atuação do juiz e, ademais, como elemento balizador da atuação apriorística do legislador, já que este não poderia deixar de ter em mente que as leis deveriam deixar espaço suficiente para a atuação individual dos particulares nas suas contratações.
Aqui se encontra o ápice da construção filosófica da Revolução Francesa da “liberdade, igualdade e fraternidade” – embora todas tomadas em sua representação formal, como se verá abaixo.
Todavia, principalmente depois do advento da Revolução Industrial e o surgimento de mazelas (especialmente sociais) antes desconhecidas, revelou- se de forma mais veemente que o modelo individualista da modernidade não era suficiente para realizar efetivamente os festejados lemas de igualdade, liberdade e fraternidade tão propagados pelas revoluções liberais de inspiração iluminista.
9 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p. 33.
Com efeito, ficou escancarada a real dimensão arrasadora das desigualdades (inclusive contratuais) existentes na incipiente realidade urbana, que preconizava, de um lado, uma crescente acumulação de riquezas nas mãos de alguns e, de outro, a exploração da força de trabalho da esmagadora maioria. Tal dinâmica criou, dentre outros desdobramentos, um acachapante descompasso no poder de barganha nas negociações – especialmente nas
relações entre capital e força de trabalho.
O modelo individualista de contrato, que presumia os contratantes como iguais entre si e igualmente livres – igualdade e liberdade meramente formais – não levava em consideração esses reais e efetivos desequilíbrios, empiricamente verificados no campo dos fatos, o que propiciava a ocorrência de numerosos abusos de direito e de posições jurídicas contratuais.
Diante dessa nova realidade, o pensamento liberal individualista começou a dar espaço a um modelo de pensamento mais solidarista e humanitário (Comte, Xxxxxxxx), voltado à busca do benefício do coletivo, em detrimento do individual.
Os desdobramentos jurídicos desse novo pensamento, após Xxxxxx, Xxxxxxxx, Xxxxxxxxxx, Josserand e Demogue, dentre outros fundadores da escola jurídica chamada Direito Social10, trouxeram a lume conceitos como dirigismo contratual, eficácia horizontal dos direitos fundamentais, constitucionalização do direito civil e função social do contrato, dentre tantos outros.
Segundo preleciona ainda Xxxxxxx Xxxxxxx Timm11:
Efetivamente, a grande culpada daquela “questão social” pela qual passava a sociedade de então foi considerada, pelo modelo solidarista, a ideologia individualista e voluntarista, ou, dito simplificadamente, a “metafísica” (o grande substrato teórico do modelo liberal de contrato), ao conceber que o indivíduo é o melhor defensor de seus interesses (e por isso devia ser-lhe garantida a liberdade de contratar). Essa ideologia seria a grande responsável pela desestruturação da sociedade industrial, pela falta de solidariedade social, pelo processo de “anomia” pelo qual passavam as relações interindividuais.
E, ainda:
10 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p. 88.
11 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p. 93.
Aos olhos dos solidaristas, esse modelo liberal considerava, equivocadamente, que haveria uma vontade individual superior a outras vontades, dotada de um caráter “supraterrestre”, de um imperium antissocial12.
Em contraposição à percepção isolacionista do homem como um ser abstrato e anterior à sociedade, dependente apenas de si mesmo, passou-se a pregar que o homem em verdade está indissoluvelmente inserido em uma trama social, independentemente da sua vontade, e que essa trama social – essa sociedade – seria “um todo orgânico, harmônico e cooperativo, tendo um caráter normativo para pessoas, impondo determinadas condutas e proibindo outras, coerentes com a solidariedade social”13.
Nesse novo paradigma, a ordem “correta” e “justa” de coisas determina que a vontade individual seja limitada pela incidência inarredável de normas impostas pela própria sociedade (normas heterônomas), de caráter cogente, impossíveis de serem afastadas pela vontade das partes nas negociações contratuais.
Em última análise, a finalidade de tais normas sempre se voltaria para a distribuição da justiça social e coibição de abusos, especialmente de origem econômica.
2.2 . Contrato Patrimonial (ou de Lucro) e Contrato Existencial
Nesse contexto de mudança do eixo paradigmático contratual de um viés individualista para um viés coletivo, solidarista, voltado à distribuição da justiça social, surge, mais contemporaneamente, uma nova dicotomia.
Partindo da apreciação dos elementos subjetivos dos diversos contratos e realizando a valoração dos interesses dos particulares que compõem os polos contraentes em cada caso concreto, tal nova dicotomia separa os contratos em, de um lado, contratos patrimoniais (ou de lucro) e, de outro, contratos existenciais – conforme regulem de forma mais contundente situações jurídicas subjetivas patrimoniais ou situações jurídicas subjetivas existenciais.
12 Idem, ibidem.
13 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p. 94.
Na tradição jurídica brasileira, é uníssono o entendimento de que o Código Civil de 1916 possuía tônica eminentemente liberal, uma vez que fora concebido ainda sob a influência moderna, e pouco tratava “da tutela da pessoa quando não estão envolvidos interesses patrimoniais”14.
Contudo, é inegável a oxigenação que a produção legislativa começou a receber do pensamento solidarista com o passar do tempo, ainda que timidamente, principalmente quando se toma em consideração, por exemplo, a edição da lei de acidentes ferroviários, passando a ficar mais presente posteriormente com a edição da Consolidação das Leis do Trabalho e de leis esparsas tratando de matéria previdenciária15.
Nesse diapasão, a percepção, cada vez mais presente, de que a consecução do bem coletivo deve se sobrepor àquela do bem particular – mesmo em um contexto contratual efetivamente concretizado entre particulares
–, levou o Poder Constituinte originário brasileiro, em 1988 a optar, de maneira consciente, por definitivamente criar um programa constitucional inteiramente voltado à promoção da dignidade da pessoa humana e dos direitos sociais16, adotando como tônica o solidarismo social e a materialização do bem coletivo17, mesmo no contexto de regramento da ordem econômica18. Nos dizeres de Xxxxx Xxxxx Xxxxxx00, “a Constituição Federal de 1988 trouxe diversas disposições que priorizam valores existenciais”.
14 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx. Autonomia Privada e Dignidade Humana. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 2.
15 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p. 89.
16 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (...). Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxxxxxxx/XxxxxxxxxxxxXxxxxxxxx.xxx. Acesso em 29 ago. 2022.
17 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxxxxxxx/XxxxxxxxxxxxXxxxxxxxx.xxx. Acesso em 29 ago. 2022.
18 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III - função social da propriedade; (...) V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego;
00 XXXXX XXXXXX, Xxxxx. Contratos existenciais e sua aplicabilidade. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 19, p. 113-134, abr. – jun. 2019. Disponível em:
Com isso, considerando a prevalência da Constituição no topo da pirâmide kelseniana da hierarquia das normas legais, a Carta Maior Brasileira de 1988 veio a sedimentar a ordem clara e contundente de que o legislador infraconstitucional, bem como toda a cadeia da hermenêutica jurídica subsequente, a partir de então, deveria acrescentar ao foco da tutela jurídica do “ter” (isto é, do patrimônio material) a tutela jurídica do “ser” (ou seja, a pessoa humana)20.
Tal qual leciona Xxxx Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx00:
Passa-se, assim, do indivíduo à pessoa humana. Do individualismo ao personalismo. Do sujeito abstrato, ao sujeito concreto. Isto significa que a ordem jurídica como um todo se volta à tutela da pessoa humana que toma o lugar do indivíduo neutro, tal como aparece na codificação. Importa, assim, a proteção da pessoa humana dentro das relações que participa, sem que seja reduzida a mero elemento, titular de direitos e deveres, mas, também, como ponto referencial de tutela.
No âmbito contratual, a promoção da dignidade humana e o desenvolvimento da pessoa humana passam a ser vistos como objetivos – ainda que mediatos – da trama contratual, trazendo para o plano da validade no caso concreto a avaliação acerca da consecução de tais objetivos.
Dessa forma, tornou-se inevitável a observação de que certas relações contratuais envolvem situações jurídicas subjetivas (situações jurídicas subjetivas que se situam na categoria do ser22) que impactam de forma mais direta e imediata na esfera da dignidade humana de uma das partes contraentes, ou que dizem respeito diretamente a algum aspecto, até, da própria existência do indivíduo inserido naquela relação contratual.
A tais contratos dá-se o nome de contratos existenciais.
xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/. Acesso em: 08 set. 2022 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
20 Importa destacar que, por não instituir um estado socialista, a Constituição Federal de 1988, embora com tônica claramente solidarista (e não por outro motivo ganhou a alcunha “Constituição Cidadã”), não deixou de fora a tutela de institutos liberais básicos como a propriedade privada e a livre concorrência (art. 170, II, IV, CFRB/88), tratando expressamente da ordem econômica, porém conferindo a esta contornos mais solidários ao, por exemplo, conferir-lhe como fundamento a valorização do trabalho humano e como finalidade a existência digna.
21 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 13.
22 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 16
Tal qual formulado por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx00, “os contratos existenciais tem (sic) basicamente como uma das partes, ou ambas, as pessoas naturais; essas pessoas estão visando a sua subsistência”.
Por outro lado, outras relações contratuais, ainda que por força da programação constitucional devam, ao fim e ao cabo, promover e não ferir a dignidade humana, bem como atender aos ditames do bem coletivo, caracterizam-se por seu viés eminentemente patrimonial, regendo situações jurídicas subjetivas (situações jurídicas subjetivas que se situam na categoria do ter24) que apenas de forma indireta e mediata resvalam no espectro da dignidade humana, mas cuja finalidade primordial é a consecução de objetivos econômicos e, portanto, patrimoniais.
A esses contratos convencionou-se chamar contratos patrimoniais (ou contratos de lucro).
Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx00 resume que “os contratos de lucro são aqueles entre empresas ou entre profissionais e, inversamente, se essas entidades ou pessoas são incompetentes, devem ser expulsas, ‘descartadas’, do mercado ou da vida profissional”.
O Direito Privado tem promovido cada vez mais a tutela de situações jurídicas subjetivas existenciais, mormente após a adoção, pelo Código Civil de 2002, do paradigma solidarista de contrato, que trouxe para o bojo do códice substantivo brasileiro cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados, tais como a boa-fé objetiva na interpretação e na execução dos contratos26 e a função social do contrato27.
23 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx. Diálogos com a doutrina: entrevista com Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx. Revista Trimestral de Direito Civil, vol. 9, n. 34 in AZEVEDO, Xxxxxxx Xxxxxxxxx de. Novos Estudos e Pareceres de Direito Privado. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 611.
24 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 16
25 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxxx de. op. cit., p 611.
26 Código Civil, Art. 113. Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa- fé e os usos do lugar de sua celebração. § 1º A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) (...) III - corresponder à boa-fé; Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
27 Código Civil, Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.
Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxxx00, “o Direito Civil deslocou o seu pensamento exclusivamente patrimonial e passou a incorporar valores existenciais, assegurando a dignidade da pessoa humana”.
Esses expedientes normativos são capazes de absorver e projetar para a seara das interações interparticulares os objetivos programáticos constitucionais.
Ademais, o novo códice civil dedica um capítulo próprio ao tratamento dos chamados direitos da personalidade, estes considerados em si mesmos, independentemente de sua relação com questões patrimoniais.
Mesmo as situações jurídicas subjetivas patrimoniais, após o advento da Constituição Federal de 1988, passaram a ser submetidas “a um juízo de merecimento de tutela, somente alcançado se o seu escopo for o de promover a dignidade humana”29.
Nesse diapasão, também na lição de Xxxx Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx00:
As situações jurídicas subjetivas patrimoniais, portanto, são redesenhadas pelo texto constitucional, o que importa em serem dignas de tutela na medida em que respeitem o comando constitucional de promoção da pessoa humana.
Atenta à necessidade de se dar destaque à essencialidade do bem objeto da prestação contratual no que tange à realização da dignidade humana e do projeto de vida do indivíduo enquanto pessoa, Xxxxxx Xxxxxxxxx00 já propugnava, em 2006, que a caracterização do bem contratado como essencial, útil ou supérfluo (a exemplo do que se faz com as benfeitorias) deve ser considerada como fator determinante da disciplina contratual – é o chamado “paradigma da essencialidade”32.
Nesse contexto é que entra a classificação ora tratada dos contratos, entre contratos patrimoniais (ou de lucro) e contratos existenciais, na qual os contratos
28 XXXXX XXXXXX, Xxxxx. Contratos existenciais e sua aplicabilidade. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 19, p. 113-134, abr. – jun. 2019. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/. Acesso em: 08 set. 2022 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
29 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 9.
30 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 8
31 XXXXXXXXX, Xxxxxx. Teoria do Contrato: Novos Paradigmas. 2 ed. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 388.
32 Idem, ibidem.
existenciais seriam tratados como “essenciais” e os patrimoniais (ou de lucro), como “úteis” ou, dependendo do caso, até mesmo “supérfluos”.
2.3 Autonomia Privada
Sob o modelo individualista de contrato, o indivíduo configura o foco preponderante da tutela jurídica, elevando-se a sua liberdade e soberania a uma posição quase sagrada, intocável.
Neste paradigma, a tutela da liberdade individual e da capacidade de autodeterminação do ser humano, agora dono de si mesmo e senhor único de seu destino, é projetada na esfera contratual por meio do reconhecimento da soberania do acordo de vontades das partes contratantes, que se presumem igualmente livres em seus desideratos e igualmente capazes de determinar o que é melhor para si.
Nesse diapasão, o acordo de vontades figura tão importante, que consiste na própria razão de ser do contrato e aspecto legitimador da sua existência. A esta liberdade suprema do indivíduo humano, traduzida no encontro de vontades com aptidão de gerar efeitos jurídicos e vincular duas partes a tais efeitos chamou-se, no primeiro momento, de autonomia da vontade.
A autonomia da vontade, portanto, surge na disciplina contratual como aspecto da liberdade defendida na era moderna após a ruptura com o modo de pensar medieval.
Segundo preleciona Xxx Xxxxx00, “o negócio jurídico é a afirmação da liberdade da pessoa, o negócio é o efeito jurídico da vontade livre”.
Na lição de Xxxxxxx Xxxxx00, a “autonomia da vontade particulariza-se no Direito Contratual na liberdade de contratar” e, desenvolvendo a ideia de liberdade de contratar, preleciona que35:
O conceito de liberdade de contratar abrange os poderes de autorregência de interesses, de livre discussão das condições contratuais e, por fim, de escolha do tipo de contrato conveniente à atuação da vontade. Manifesta-se, por conseguinte, sob tríplice
33 PRATA, Ana. A Tutela Constitucional da Autonomia Privada. Coimbra: Xxxxxxxx, 0000, p 11.
34 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 54.
35 Idem, ibidem.
aspecto: a) liberdade de contratar propriamente dita; b) liberdade de estipular o contrato; c) liberdade de determinar o conteúdo do contrato.
Todavia, conforme os paradigmas contratuais vão se modificando, como já explanado mais acima, e conforme o eixo axiológico da disciplina contratual vai se alterando e tomando contornos mais solidaristas e de tônica mais coletiva do que individualista, também tal liberdade ganha novos contornos e passa a ser vista e interpretada dentro de um contexto de prevalência do bem comum.
Percebeu-se a importância cada vez mais premente de adotar medidas legislativas para coibir abusos que a anterior perspectiva de igualdade formal entre as partes propiciava, abusos inclusive de posições contratuais, promovidos pela desigualdade substancial – especialmente econômica e jurídica – subjacente às relações contratuais, afinal, como bem ensina Álvaro Xxxxxxx Xxxxxxx00, “no âmbito da liberdade contratual, na discussão das cláusulas e condições contratuais, há, na prática, o prevalecimento da vontade do economicamente forte”.
Ainda na lição de Xxxxxxx Xxxxx00:
Quando se apreciam as consequências práticas do uso da liberdade de contratar num regime de desigualdade econômica como o que resultou do desenvolvimento do capitalismo, a impressão mais viva é a da abstenção do Estado no momento da formação dos contratos. O princípio da igualdade de todos perante a lei conduziu logicamente à indiferença da ordem jurídica pela situação das partes de qualquer contrato. No pressuposto dessa igualdade meramente teórica presumia-se que os interessados em contratar precediam o contrato, qualquer que fosse, de livre discussão, na qual seus interesses divergentes encontravam, afinal, denominador comum. (...) Partes iguais e livres não precisavam da interferência legislativa para impedir a estipulação de obrigações onerosas ou vexatórias.
Nesse sentido, o substrato legitimador da vinculação das partes aos efeitos contratuais deixou de ser a vontade das partes – cuja importância, ainda que ressignificada, ainda estava presente –, passando a sê-lo a lei, que agora trazia em seu bojo requisitos mínimos e cogentes (imperativos legais), sem os quais o contrato sequer se reputava válido.
Importante explanação faz Xxxxxxx Xxxxx00:
36 XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Curso de direito civil: teoria geral dos contratos. 4. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
37 XXXXX, Xxxxxxx. op. cit., p. 56.
38 XXXXX, Xxxxxxx. op. cit., p. 62.
O processo de conversão de leis supletivas em imperativas ensejou a elaboração de novo princípio do Direito Contratual, o da regulamentação legal do conteúdo dos contratos, hoje admitido, sem maior relutância, em relação a certas espécies contratuais. Consiste em regular o conteúdo do contrato por disposições legais imperativas, de modo que as partes, obrigadas a aceitar o que está predisposto na lei, não possam suscitar efeitos jurídicos diversos. Em consequência, a vontade deixa de ser autônoma e a liberdade de contratar retrai-se. Não mais regras supletivas, que as partes observam se coincidem com seus interesses, mas normas imperativas, a cuja obediência não podem furtar-se. Contratos padronizados. Fala-se, então, em dirigismo contratual.
A essa nova leitura da autonomia da vontade deu-se o nome autonomia privada, conforme a qual a liberdade individual dos sujeitos contratantes não é mais absoluta, mas sim, deve se submeter aos ditames do interesse geral, coletivo, consubstanciado nas normas positivadas por meio do processo legislativo que retira sua legitimidade da representatividade popular.
A nova ideia, segundo Xxxxxxxx Xxxxxxx, como citado por Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx00, é de que:
O interesse geral, o bem comum, constitui limite à realização dos interesses individuais, subjetivos, do credor. Quem se arroga a condição de credor tem necessariamente um qualquer interesse em que o devedor realize a prestação, mas, evidentemente, o direito não poderá tutelar interesses que porventura sejam fúteis, ou por outra forma estranhos ao bem comum. Para além dos interesses do credor, e transcendendo mesmo os interesses conjuntos do credor e do devedor, estão valores maiores da sociedade, que não podem ser afetados.
Quanto ao conteúdo central da autonomia privada, preleciona Xxxxxxxx Xxxxxxx00:
Não há consenso quanto ao conteúdo da autonomia privada. Embora, indiscutivelmente, trate do valor da vontade humana e do poder de autodeterminação do sujeito, é por alguns identificada com a liberdade humana ou um aspecto desta, enquanto outros a enxergam como verdadeiro poder de criar normas jurídicas.
Ainda segundo Xxx Xxxxx:
39 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Direito das Obrigações. v. 1. 2 ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 26- 27 apud REBOUÇAS, Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Autonomia Privada e a Análise Econômica do Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000, p. 97.
40 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Autonomia e suas Limitações. Revista de Direito Privado, v. 60, p. 85- 96, out. – dez. 2014. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em: 07 abr. 2022.
A autonomia privada ou liberdade negocial traduz-se pois no poder reconhecido pela ordem jurídica ao homem, prévia e necessariamente qualificado como sujeito jurídico, de juridicizar a sua actividade (designadamente, a sua actividade económica), realizando livremente negócios jurídicos e determinando os respectivos efeitos41.
Já na lição de Xxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx e Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx00, citando Xxxxxx Xxxxxxxxxxx, a autonomia privada é:
entendida em geral, como “o poder, reconhecido ou concedido pelo ordenamento estatal a um indivíduo ou a um grupo, de determinar ‘vicissitudes jurídicas’ como consequência de comportamentos – em qualquer medida – livremente adotados.
Não se demora a compreender, portanto, que tal “liberdade negocial” está no cerne da capacidade de usar, gozar/fruir, dispor de um bem em um contexto negocial, atributos esses comumente relacionados ao direito de propriedade e cujos contornos não oferecem muita dificuldade de apreensão em se tratando de contratos patrimoniais.
No entanto tais contornos não restam tão claros quando se apreciam os chamados contratos existenciais.
2.4 Empregado “Hipersuficiente”
A característica mais marcante do contrato de trabalho, no que diz respeito à relação de situações jurídicas subjetivas que ele concretiza, é notadamente o desnível em que se encontram as partes, uma relativamente à outra, principalmente no aspecto econômico, mas também no aspecto técnico, jurídico, organizacional, disciplinar, informacional e estrutural.
Ocorre que um contrato de trabalho não se aperfeiçoa a menos que uma das partes contratantes seja, necessariamente, uma pessoa natural que presta serviços remunerados em caráter de pessoalidade e habitualidade, sob regime de subordinação a outra, que dirige essa prestação.
Não se trata, aqui, de opinião ou subjetivismo.
41 PRATA, Ana. op. cit., p. 13
42 XXXXXXXXXXX, Xxxxxx. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 335 apud XXXXXXXX, Xxxxxxx. XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxx. op. cit., p. 16.
Assim o é por expressa determinação legal contida no art. 3º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho, Decreto-Lei nº 5.452/1943), que, de forma peremptória, declina os elementos fundamentais caracterizadores do contrato de trabalho, preconizando que “considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.
Não resta dúvidas, portanto, de que o contrato de trabalho sempre e necessariamente irá envolver, em um dos polos contraentes, um ser humano, já que, em razão da expressa determinação legal acima transcrita, se uma das partes não for uma pessoa física, não há, a priori, contrato de trabalho43.
Indo-se além, tem-se que esse ser humano que comporá um dos polos do contrato de trabalho (chamado empregado, ofertante da sua força de trabalho) também sempre e necessariamente estará submetido a um regime de subordinação ao outro polo, o qual pode ser tanto uma pessoa jurídica quanto também uma pessoa física (chamado empregador, dono dos meios de produção).
Conforme já mencionado anteriormente no presente trabalho, a Consolidação das Leis do Trabalho encerra a introdução dos institutos formulados pela escola do Direito Social no ordenamento jurídico brasileiro, ainda que de maneira incipiente, antes da sedimentação jurídica desses institutos, com a Constituição Federal de 1988.
Assim, trata-se de compêndio legal fortemente marcado pelo solidarismo e pela promoção da distribuição da justiça social, tendência seguida pela construção doutrinária formulada em torno da disciplina jurídica laboral.
Ilustrando tal tendência doutrinária, cita-se a lição de Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx00, para quem:
A função tutelar do direito do trabalho visa, enfim, sobretudo sob a perspectiva dos direitos humanos e do direito constitucional, corrigir as desigualdades sociais, econômicas, ambientais e políticas entre os
43 Ressalva-se, por precaução acadêmica, as situações de simulação em que contratos de trabalho típicos são dissimulados sob a fachada de outros tipos contratuais em que a prestação de serviços pode se ser feita por pessoa jurídica, tais como empreitada, a prestação civil de serviços, representação comercial, dentre outros. Essas situações se tratam, no entanto, de patologias, violações jurídicas a serem retificadas no âmbito do Poder Judiciário, tema que não faz parte do recorte deste trabalho.
44 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 23.
atores representantes do capital e do trabalho, por meio de um sistema normativo de proteção jurídica ao cidadão trabalhador.
Nesse diapasão, tem-se no eixo axiológico da dogmática laboral a presunção absoluta de vulnerabilidade da figura do empregado – fornecedor da força de trabalho – frente o empregador – dono do capital e demais meios de produção –, justamente em função do já mencionado desequilíbrio a níveis econômico, técnico, jurídico, organizacional, disciplinar, informacional e estrutural, alçando o empregado, invariavelmente, à posição de hipossuficiente45.
Com a instauração do programa constitucional de tutela suprema da dignidade humana e a institucionalização da proteção às categorias contratuais vulneráveis, a exemplo do consumidor e do empregado, aliadas à constitucionalização de normas de natureza laboral no art. 7º da Carta Maior, criou-se uma cultura e uma tendência, que se enraizaram na doutrina e jurisprudência juslaborais, a rechaçar como inconstitucional qualquer movimentação legislativa que se entenda poder, sob qualquer aspecto que seja, representar um afrouxamento das proteções conferidas à categoria dos empregados, proteções de cujo exemplo é a presunção absoluta de sua vulnerabilidade.
Não obstante isso – e com apoio de parte da doutrina – recentemente a CLT sofreu significativa alteração, consubstanciada na chamada “Reforma Trabalhista”, Lei nº 13.467/2017, que trouxe para o ordenamento positivo juslaboral uma figura até então não abordada formalmente, embora já existente na prática cotidiana, qual seja, o empregado “hipersuficiente” (também chamado “autossuificente” por alguns).
Com efeito, o caput do art. 444 da CLT expressamente incorpora o princípio da autonomia privada ao Direito do Trabalho para todas as categorias de empregado, estabelecendo, de forma literal, que (in verbis):
As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, os contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes (grifos nossos).
45 Idem, ibidem.
Como se vê, a inspiração legal é claramente solidarista ao limitar a livre estipulação das partes, que esbarra nos chamados mínimos existenciais de proteção ao trabalho e nos contratos coletivos (expressão tomada em sentido amplo, aí incluídos os acordos e convenções coletivas de trabalho, fruto da autonomia privada coletiva dos sindicatos) aplicáveis.
De acordo com o parágrafo único do mesmo art. 444, da CLT (incluído pela referida legislação reformista), o empregado “hipersuficiente” (ou autossuficiente”) é aquele que: i) possui diploma em curso de nível superior de educação e; ii) percebe salário mensal básico igual ou superior ao dobro do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social46.
Senão vejamos a redação, especificamente, do parágrafo único do art.
444 consolidado:
A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
Dessa feita, para além de meramente introduzir o conceito do empregado “hipersuficiente” no ordenamento positivo pátrio, o novel parágrafo único do art. 444, da CLT confere às cláusulas contratuais inseridas no contrato individual de trabalho celebrado com esta espécie de empregado preponderância sobre instrumentos coletivos e, até mesmo, sobre a lei, na parte em que tal contrato dispuser sobre as matérias elencadas – de forma taxativa – no art. 611-A da mesma consolidação trabalhista, o que por si só já denota o grau mais elevado do patamar em que se encontra a figura contratual em apreço.
Como se vê, os critérios objetivos adotados pelo legislador ordinário para caracterizar esta categoria diferenciada de empregado são de ordem educacional e salarial.
46 No ano de 2022, conforme a Portaria Interministerial MTP/ME n. 12, de 17 de janeiro de 2022, tal limite máximo é de R$ 7.087,22 (sete mil e oitenta e sete reais e vinte e dois centavos). Logo, o dobro deste valor equivale a R$ 14.174,44 (quatorze mil cento e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos) e este é o valor mínimo de corte para a satisfação do critério salarial da configuração do empregado “hipersuficiente”.
Sem nos aprofundarmos, aqui, nas especificidades das motivações por trás da adoção desses dois critérios47, é de se observar, já superficialmente, que a ilação legislativa refletida em tal disposição legal é a de que, em decorrência do seu estudo formal avançado (diploma em curso de nível superior) e de seu patamar salarial mais elevado (dobro do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, ou mais), essa categoria de empregado estaria em melhor posição para negociar as cláusulas de seu contrato individual de trabalho com o empregador e, assim, estabelecer regras personalizadas, adequadas às suas particularidades.
Nos dizeres de Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxxx00:
Não obstante o poder econômico, organizacional, disciplinar e autoridade de contratar e dispensar pertencente ao empregador, nos dias atuais não podemos negar que o empregado dentro da empresa também conta com certo poder quanto ao acesso ao estabelecimento, aos equipamentos, aos clientes, às informações de negócios, além da influência sobre outros empregados. O acesso a todo esse conteúdo aumenta o poder dos empregados (...). No caso de empregados com qualificações específicas, o poder é maior já que o empregador depende da expertise destes para prosseguir com o negócio.
Em outras palavras, o empregado “hipersuficiente” (ou “autossuficiente”) gozaria de autonomia privada plena dentro dos assuntos delineados no art. 611- A da CLT.
47 Também não faz parte do recorte do presente trabalho a análise sobre se os critérios objetivos adotados para a caracterização do empregado como “hipersuficiente” (ou “autossuficiente”) são ou não adequados ou os mais indicados. A um, porque entende-se que, de fato, a categoria deveria ser definida por algum critério objetivo e, dentro da realidade brasileira, a escolha legislativa foi fazer o recorte com base em educação acadêmica e patamar salarial, o que, efetivamente, são fatores que ainda dividem a sociedade brasileira para outros efeitos. A dois, porque entendemos, tal qual Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxxx, que “a análise da autonomia negocial do empregado deveria ser considerada no caso concreto, levando em conta a atividade, a capacidade de trabalho, a independência, as vantagens e conveniência para a sua vida pessoal e as características do trabalho que desenvolve” (DUBUGRAS, Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxxxx. Acordo individual firmado com empregado autossuficiente – art. 444, parágrafo único, da CLT. Revista do Advogado AASP, nº 137, mar. 2018, p 157). E, a três, porque a referida legislação não revogou nem é incompatível com o Código Civil de 2002, que ainda prevê os requisitos de validade dos negócios jurídicos, possibilitando a anulação do negócio caso reste provado que houve vício de consentimento.
48 XXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxxxx. Acordo individual firmado com empregado autossuficiente – art. 444, parágrafo único, da CLT. Revista do Advogado AASP, nº 137, mar. 2018, p 156.
3. CONTROVÉRSIA ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DA FIGURA JURÍDICA DO EMPREGADO “HIPERSUFICIENTE”
Conforme delineado acima, a Constituição Federal de 1988 abraçou para o ordenamento jurídico brasileiro, de forma incontestável, o paradigma solidarista instituído pela escola do Direito Social na Europa, sendo pioneira na tradição constitucional brasileira na regulamentação de direitos sociais, inclusive os direitos do trabalhador.
Segundo Xxxxxxx Xxxxx00, “é uma das Constituições mais avançadas no aspecto social, pois consagra os direitos trabalhistas como autênticos direitos fundamentais”.
Para ademais disso, a Constituição instituiu um programa evidentemente solidarista e coletivista – em contraponto ao individualismo característico do liberalismo, como já visto –, voltado à realização de finalidades sociais, tais como a erradicação da pobreza e da marginalização bem como a redução das desigualdades sociais (art. 3º, III), a construção de uma sociedade solidária (art. 3º, I) e a promoção do bem de todos (art. 3º, IV).
Dessa feita, traz em seu bojo normas programáticas, que são conceituadas por Xxxxxxxxx Xxxx xx Xxxxxx00 como normas “cujo objeto imediato é o estabelecimento de fins públicos a serem alcançados pelo Estado e sociedade, sem a especificação dos meios para a obtenção das finalidades colimadas” (grifos nossos).
Tendo em vista que, conforme destacado acima, normas programáticas não se propõem a definir um caminho específico a ser seguido, mas tão somente a indicar o objetivo a ser alcançado, a Constituição Federal de 1988, de forma intencional, faz uso de técnicas legislativas comumente manejadas quando se tem a intenção de permitir a oxigenação valorativa do ordenamento jurídico, dentre as quais cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados.
Acerca das cláusulas gerais, Xxxxxx Xxxxxxx-Xxxxx, citada por Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx00, traça-lhes um conceito genérico da seguinte maneira:
49 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p 18.
50 XXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx de. Curso de Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2022, p 82.
51 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. A Boa-Fé No Direito Privado E Tópica No Processo Obrigacional. São Paulo: Ed. XX, 0000, p. 274 apud ALMADA, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx.
o meio legislativamente hábil para permitir o ingresso, no ordenamento jurídico, de princípios valorativos, expressos ou ainda inexpressos legislativamente, de standards, máximas de conduta, arquétipos exemplares de comportamento, das normativas constitucionais e de diretivas econômicas, sociais e políticas, viabilizando a sua sistematização no ordenamento positivo.
Na seara dos direitos do trabalhador, especificamente, a Constituição Federal trouxe, em seu art. 7º, um conteúdo mínimo de direitos que não podem ser retirados, renunciados, negados, em suma, direitos indisponíveis, conjunto que se convencionou chamar mínimo existencial52.
Contudo, além de elencar, em seus incisos, direitos específicos, o caput do art. 7º da CF/88 também trouxe uma norma programática, inserindo no espectro dos direitos subjetivos do trabalhador, juntamente com queles enumerados nos incisos, todos aqueles direitos que “visem à melhoria de sua condição social”.
Em nosso sentir, trata-se de evidente cláusula geral constitucional, pois institui um standard a ser alcançado, sem, contudo, definir o que, efetiva e concretamente, promoveria a melhoria da condição social do trabalhador.
Com isso, abre-se caminho para inúmeras e sucessivas polarizações doutrinárias, jurisprudenciais e principalmente políticas acerca de como alcançar esse parâmetro constitucional.
Tais polarizações acabam fazendo com que se suscite a inconstitucionalidade – dentre outros argumentos, por violação à cláusula geral do caput do art. 7º – de qualquer medida legislativa que se entenda obstar, ou não promover, a melhoria da condição social do trabalhador, uma vez que se lhe estaria negando o mínimo existencial irrenunciável.
Não por outro motivo a alteração legislativa trazida pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), que inseriu o parágrafo único no art. 444 da CLT, tem sua constitucionalidade questionada por algumas vozes acadêmicas – ainda que minoritárias.
Instrumento de Criação e Evolução do Direito para o Acesso À Justiça. Revista de Direito Privado, vol. 38/2009, p. 264-286, Abr - Jun / 2009, DTR\2009\266. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 02 set. 2022 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
52 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p 242.
Entende-se como inconstitucional o tratamento jurídico superlativo conferido à autonomia privada na espécie contratual do empregado hipersuficiente, o que, para muitos, conflitaria com o próprio âmago principiológico constitucional do Direito do Trabalho.
Xxxxxxx, exemplificativamente, a opinião de Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxxx00 a respeito do novo parágrafo único do art. 444, da CLT:
Como visto, a reforma trabalhista (Lei 13.467/2017 (LGL\2017\5978)) inaugurou uma nova classe de trabalhadores, cuja condição de hipossuficiência é juridicamente relativizada para autorizar a “livre pactuação” entre empregado e empregador. Isso significa que esses trabalhadores passam a deter autonomia para negociar diretamente com seus empregadores temas que, como regra geral, seriam reservados à negociação sindical.
(...)
Trata-se de dispositivo legal bastante questionável, tendo em vista que encontra resistência em princípios basilares do Direito do Trabalho, tais como os princípios da proteção, da irrenunciabilidade de direitos e da inafastabilidade das normas trabalhistas.
No mesmo sentido, Xxxxxx Rechden Gomide54 analisa que:
Ao que nos parece, ao contrário do que a Constituição prevê, o discrímen criado parece servir apenas aos interesses empresariais de “negociar livremente” com aqueles empregados que possuem remuneração considerável, possibilitando, inclusive que o conflito se encerre perante a alguma câmara arbitral, sem possibilidade de reapreciação pelo Poder Judiciário
Com efeito, a própria Reforma Trabalhista por si só, tomada em sua globalidade, gerou calorosos debates sociais, econômicos e políticos no âmbito da sociedade brasileira já desde o seu nascedouro, sendo concebida em um momento turbulento da política e economia nacionais, em seguida a um período conturbado que culminou com um impeachment presidencial, dividindo sobremaneira opiniões em uma sociedade que previamente a isso já se encontrava igualmente dividida.
53 XXXXXXXX, Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Os empregados “hipersuficientes” e a flexibilização do princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas. Revista de Direito do Trabalho, vol. 201, p. 63-81, maio 2019. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 25 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
54 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. A reforma trabalhista, a figura do trabalhador hipersuficiente e a possível violação do princípio da igualdade. Revista de Direito do Trabalho, v. 190, p. 47- 62, jun. 2018. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 25 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
Houve vozes abundantes tanto elogiando quanto condenando as provisões novas trazidas no seu conteúdo55, 56.
As primeiras argumentam que já era passado o tempo de haver uma modernização, uma adaptação das normas reguladoras das relações de trabalho à realidade contemporânea, pois, ainda que algumas mudanças tivessem acontecido, disposições essenciais não haviam sofrido alterações significativas desde a promulgação da consolidação, há quase três quartos de século57.
Também afirmam que as flexibilizações inauguradas pela reforma teriam o condão de desinchar as folhas de pagamento das empresas, simplificar as contratações, contribuindo assim para a elevação dos níveis de empregabilidade formal.
De outra banda, os críticos da reforma propagavam que a reforma “representa grave retrocesso social em relação aos direitos conquistados ao longo dos anos pelos trabalhadores” e que “há supressão de direitos trabalhistas sobre incontáveis parcelas”, destacando, “negativamente, as normas que, de forma ampla e nociva, praticamente desregulamentaram todo o sistema protetivo à jornada, relativizando o conceito de tempo à disposição do empregador”, tal qual pode ser visto na manifestação dos Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região acerca do Projeto da Reforma58 .
Some-se a tudo isso o fato, destacado por muitos e objetivamente verificável, de que o processamento legislativo da reforma se deu a “toque de caixa”, sem o debate social que muitos consideravam recomendável e sem mesmo o debate parlamentar necessário para o amadurecimento da lei tendo vista as mais de 1.700 propostas de emendas apresentadas ao texto original do Projeto de Lei (PL) 6.787 que fora apresentado em dezembro de 2016 pelo então Presidente da República, Xxxxxx Xxxxx.
55 Consulta pública a manifestações populares apresentadas ao projeto de lei disponível em xxxxx://xxx00.xxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxxx/xxxxxxxx/-/xxxxxxx/000000.
56 Xxxxxxx XXXXXXX, Xxxx e XXXXXXX, Xxxxxxx, em Ações sobre a reforma trabalhista, 3 anos, repousam no Supremo. Consultor Jurídico. Disponível em xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/0000- nov-28/acoes-reforma-trabalhista-anos-caducam-supremo. Acesso em: 02 set. 2022, “desde 2017, foram ajuizadas perante o STF 34 ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que questionam pontos trazidos pela reforma. No mesmo período, chegaram quatro ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) também relacionadas à lei”.
57 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. op. cit., p 186.
58 XXXXX, Xxxxxxx. Ofício endereçado ao Senador Xxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxx, Presidente do Senado Federal. Porto Alegre, RS, 30 ago. 2017. Disponível em xxxxx://xxx00.xxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxxx/xxxxxxxx/-/xxxxxxx/000000. Acesso em 08 set. 2022.
Em razão do recesso parlamentar de dezembro, os debates do PL na Câmara dos Deputados apenas tiveram início em 9 de fevereiro de 2017, sendo o PL aprovado nesta Casa e passado ao Senado Federal em 26 de abril de 2017, e sendo novamente aprovado e encaminhado à sanção presidencial em 12 de julho de 201759.
Não é surpresa, portanto, que vários de seus aspectos – senão todos – sejam altamente controversos e propensos a gerar debates calorosos, dentre eles o tema ora em apreço, cuja atualidade e relevância são ululantes.
Contudo, especificamente em relação à figura do empregado “hipersuficiente”, o debate acerca da constitucionalidade ou inconstitucionalidade deste novel instituto não é tão simplista e muito menos pode ser tomado de forma abstrata. Ao revés, a avaliação deve ser realizada caso a caso.
Com efeito, embora seja evidente que, na relação de emprego, o empregador sempre será o lado mais forte, pois detém o capital e os meios de produção, bem como o poder disciplinar e regulador, possuindo ainda o direito potestativo de admitir e demitir sem justa causa, também é verdade, especialmente em cidades de dimensões e hábitos cosmopolitas, com realidades vastamente heterônomas, que o tecido das relações de trabalho já é drasticamente diverso daquele que se apresentava quando da edição da CLT, no início da década de 1940.
Como mencionado no parecer60 elaborado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados encarregada de apreciar o PL da Reforma Trabalhista, apresentado pelo poder Executivo Federal:
O Brasil de 1943 não é o Brasil de 2017. Há 74 anos éramos um país rural, com mais de 60% da população no campo. Iniciando um
59 XXXXXXXX, Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Os empregados “hipersuficientes” e a flexibilização do princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas. Revista de Direito do Trabalho,
v. 201, p. 63-81, maio 2019. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 25 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
60 BRASIL. Parecer ao Projeto de Lei nº 6.787, de 2016, do Poder Executivo, que "Altera o Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 - Consolidação das Leis do Trabalho, e a Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências”. Comissão Especial da Câmara dos Deputados. Brasília, DF, 12 abr. 2017. Disponível em xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxXxx/xxxx_xxxxxxxxx_xxxxxxxxxxxxx_xxxxx;xxxxxxxxxxxxxx e0xynps2i9vkprneb5oxaj3wsh8287170.node0?idProposicao=2122076. Acesso em 31 ago. 2022.
processo de industrialização, vivíamos na ditadura do Estado Novo, apesar disso, o governo outorgou uma legislação trabalhista que preparava o país para o futuro. Uma legislação que regulamentava as necessidades do seu tempo, de forma a garantir os patamares mínimos de dignidade e respeito ao trabalhador.
Hoje, estamos no século XXI, na época das tecnologias da informação, na época em que nossos telefones celulares carregam mais capacidade de processamento do que toda a NASA quando enviou o homem à lua. As dinâmicas sociais foram alteradas, as formas de se relacionar, de produzir, de trabalhar mudaram diametralmente.
Novas profissões surgiram e outras desapareceram, e as leis trabalhistas permanecem as mesmas. Inspiradas no fascismo de Xxxxxxxxx, as regras da CLT foram pensadas para um Estado hipertrofiado, intromissivo, que tinha como diretriz a tutela exacerbada das pessoas e a invasão dos seus íntimos.
Ao final, manifesta-se o parecer pela constitucionalidade, pela juridicidade e pela boa técnica do Projeto de Lei.
Compactuamos com o entendimento da Desembargadora do TRT2, Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxxx, sobre a Reforma Trabalhista, quando explica que:
A Lei nº 13.467 traz uma mudança básica na capacidade do empregado de firmar acordos, contudo preservou patamares mínimos e direitos básicos, dentre eles os previstos na Constituição Federal (CF), declarando expressamente a ilicitude na supressão ou redução destes direitos, como está expresso no art. 611-B, tais quais: salário mínimo, valores de depósitos de FGTS, 13º salário, remuneração do trabalho noturno superior ao diurno, DSR, adicional de 50% sobre as horas extras, férias e licença-maternidade e paternidade.
Dessa feita, entendemos que, no que pertine à inclusão do parágrafo único no art. 444 da CLT e à consequente criação da figura jurídica do empregado “hipersuficiente” (ou “autossuficiente”), não há inconstitucionalidade, mas adequação e atualização da legislação trabalhista às particularidades do atual cenário heterogêneo das relações de trabalho entabuladas no intricado tecido socioeconômico brasileiro.
4. A AUTONOMIA PRIVADA DO EMPREGADO “HIPERSUFICIENTE” NO CONTEXTO DO CONTRATO TRABALHO
Dando sequência ao estudo das alterações paradigmáticas pelas quais o núcleo contratual vem passando ao longo da História na trilha das mudanças históricas socioeconômicas e sofrendo as influências filosóficas delas decorrentes, tem-se a proposta contemporânea da dicotomia entre contratos existenciais e contratos patrimoniais (ou contratos de lucro).
Nessa toada, o contrato de trabalho surge, indubitavelmente, como um contrato de natureza existencial, uma vez que seu núcleo consiste, de um lado, do fornecimento de mão-de-obra por uma pessoa física em benefício de uma atividade dirigida por outrém e, de outro, no pagamento de uma contraprestação (salário) pelo “aluguel” dessa força de trabalho.
Conforme já exposto nas páginas anteriores, o salário consiste, dentro do contexto socioeconômico capitalista inaugurado pela Revolução Industrial no século XIX, no mais difundido e utilizado meio de subsistência da massa populacional, em qualquer parte do mundo.
Também segundo já delineado em páginas antecedentes deste trabalho, o contrato que possui como finalidade a subsistência de uma das partes se classifica, por definição natural, como contrato existencial.
Vê-se sem maiores dificuldades, portanto, que, para uma esmagadora maioria da população, o contrato de trabalho é o próprio veículo da existência digna.
Na lição de Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx00:
O direito ao trabalho, além de direito humano, é também direito fundamental, mormente em nosso sistema jurídico, porquanto regras de cunho trabalhista foram positivadas na Constituição Federal, sendo, portanto, tuteladas pelo direito constitucional, ora como princípio (e valor) fundamental do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, II, III e IV); ora como direito social (CF, arts. 6º e 7º); ora como valor fundante da ordem econômica, que tem por finalidade assegurar, a todos, existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado, dentre outros, o princípio da busca do pleno emprego (CF, art. 170, VIII).
É preciso esclarecer, desde logo, que não é qualquer trabalho que deve ser considerado um direito humano e fundamental, mas apenas
61 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 19.
o trabalho que realmente dignifique a pessoa humana. Fala-se, assim, em direito ao trabalho digno4 ou ao trabalho decente5 como valor fundante de um ordenamento jurídico, político, econômico e social.
Daí se entender que, por configurar vetor de dignificação do ser humano, os direitos do trabalhador constituem um mínimo existencial irrenunciável62, e, por tal razão, não se prestam a ser objeto de autonomia privada individual, diante do inerente desnível existente entre empregado e empregador no que se refere não apenas ao poder econômico, mas também à capacidade jurídica, organizacional, estrutural, disciplinar etc. – também como já mencionado anteriormente.
Nos dizeres de Xxxxxx Rechden Gomide63:
ao longo da história do Direito do Trabalho pátrio a doutrina trabalhista harmonizou-se com as normas celetistas de regência para consolidar a compreensão de que o contrato de trabalho possui natureza jurídica de contrato de adesão, por se formar, em regra, sem discussão prévia entre os pactuantes, e que a subordinação jurídica a ele inerente limita e restringe a autonomia de vontade do empregado aderente, que se manifesta mais no momento da adesão ao contrato do que na definição de seu conteúdo e cláusulas
Nessa toada, e em vista justamente, conforme já abordado acima, das alterações paradigmáticas promovidas pelo abandono do modelo econômico estritamente liberal em benefício de um modelo solidarista, houve a criação, no final do século XIX64, dos sindicatos, entidades coletivas representativas dos interesses dos trabalhadores, dotadas de autonomia privada coletiva65 para negociar em pé de igualdade com os patrões (ou sindicatos de patrões).
A tradição do mercado de trabalho brasileiro seguiu, assim, a cultura da ausência – com efeito, da proibição – de negociação individual entre patrão e empregado, defendendo rigidamente a substituição deste pelo sindicato, que
62 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 61.
63 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. A reforma trabalhista, a figura do trabalhador hipersuficiente e a possível violação do princípio da igualdade. Revista de Direito do Trabalho, v. 190, p. 47- 62, jun. 2018. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 25 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
64 XXXXX XXXXXX, Xxxxx. Contratos existenciais e sua aplicabilidade. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 19, p. 113-134, abr. – jun. 2019. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 24 nov. 2021 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa).
65 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 186.
negocia as regras aplicáveis – além daquelas mínimas ditadas pela Constituição e pelas leis –, seja a toda a categoria de empregados de um determinado segmento econômico em uma determinada região – por meio das convenções coletivas negociadas entre sindicato de trabalhadores e sindicato de atividades econômicas –, seja a todos os empregados contratados no âmbito de um determinado e específico empregador – por meio dos acordos coletivos negociados entre sindicato de trabalhadores e empresa.
O ordenamento jurídico trabalhista – leia-se: regras, normas, princípios, preceitos, decisões judiciais, enunciados de jurisprudência, pareceres e opiniões jurídicas, doutrinas etc. – jamais estimulou a negociação individual entre patrão e empregado. Ao contrário, tal prática sempre foi desencorajada e não raras são as ocasiões em que contratos individuais se trabalho são descartados como meio de prova em processos judiciais, em benefício dos princípios basilares do direito do trabalho, o princípio da proteção e o princípio da primazia da realidade66.
Logo, desde os primórdios do Direito do Trabalho no Brasil, com a consolidação, em 1943, das diversas leis esparsas que existiam sobre o assunto em um compêndio único – a CLT –, apenas e tão somente o sindicato de trabalhadores teria legitimidade para negociar cláusulas e condições de trabalho
– e, portanto, renunciar a direitos trabalhistas, desde que não positivados na Constituição.
Percebe-se que a CLT conferiu poderes contundentes aos sindicatos na organização e na sistemática das relações de trabalho, o que se explica pela forte influência que o Direito Sindical brasileiro recebeu do modelo fascista- corporativista italiano consubstanciado na Carta del Lavoro67 de 192768.
Na análise de Xxxxxxxx Xxxxxxx00
O sindicalismo brasileiro tem suas raízes fincadas em um modelo de Estado intervencionista denominado Estado Novo, no qual a sociedade era entendida como um corpo social, cujo cérebro era representado
66 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 59-61.
67 Em tradução livre, “Carta do Trabalho”.
68 LEITE, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 16.
69 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Direitos sociais trabalhistas: responsabilidade, flexibilização, sindicabilidade judicial e as relações negociadas. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 108- 109.
pelo governo centralizado e as massas representavam um organismo social regido por esse sistema nervoso central institucional.
Assim, a autonomia privada individual sempre foi um assunto afastado da realidade das relações de trabalho no Brasil – até o advento da Reforma Trabalhista, com a criação do empregado “hipersuficiente”.
Por tal razão, propõe-se, no presente trabalho, a averiguação do quantum de autonomia individual o empregado “hipersuficiente”, de fato, detém para fazer valer seus direitos e vontades na negociação de suas cláusulas individuais de trabalho.
À toda evidência, o próprio termo “hipersuficiente” detona a contraposição que essa espécie de empregado faz ao padrão que é o empregado hipossuficiente70 na relação contratual de emprego.
Com efeito, conquanto a realidade ainda mostre que a esmagadora maioria dos trabalhadores assalariados brasileiros seja, de fato, plenamente classificáveis como hipossuficientes em todas as acepções do termo, há uma – ainda que diminuta – parcela de empregados celetistas que fogem – e muito – a esse padrão.
De fato, não é raro ver profissionais altamente qualificados e experientes em áreas muito específicas de conhecimento tais como tecnologia da informação, finanças ou até mesmo executivos de “C-Level”71 serem disputados por grandes companhias, o que certamente aumenta o poder de barganha desses profissionais frente aos prospectos empregadores.
A situação se altera totalmente também quando, do outro lado da mesa, encontra-se alguma espécie das chamadas “empresas” de pequeno porte (pequenas e médias “empresas”), ou, então, sociedades limitadas menos profissionalizadas, tais como as famosas “empresas familiares”.
Contudo, não se deve perder de vista que o contrato de trabalho visa prioritariamente à subsistência de uma das partes contratantes e que tal circunstância lhe confere a característica de contrato existencial.
70 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p 325.
71 Chief Finance Officer, Chief Human Resources Officer, Chief Executive Officer, Chief Operations Officer, Chief Medical Officer etc.
No entanto, entendemos que a situação jurídica subjetiva de cunho existencial que o contrato de trabalho enfoca possui uma expressão econômica e, não por outro motivo, há uma contraprestação pecuniária envolvida, o salário. Isso confere à situação jurídica subjetiva e, consequentemente, ao contrato que a tem por objeto uma feição dúplice, tendo seu conteúdo um
aspecto patrimonial e um extrapatrimonial72.
Conforme lição de Xxxx Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx00, “algumas situações consideradas existenciais, porque relacionadas à pessoa do titular, possuem, entretanto, expressão econômica e, por isso, ingressam no comércio jurídico” e “nesses casos, o titular da situação jurídica subjetiva tem uma dúplice titularidade: sob o aspecto pessoal e sob o aspecto patrimonial”. Segundo referida autora, é esse caráter que as permite ser objeto de relações contratuais74, ao contrário de outras situações existenciais como, por exemplo, o contrato de “barriga de aluguel” ou a disposição do próprio corpo – salvo para fins educacionais – ou ainda o comércio de órgãos humanos.
Diante desse contraponto é que Xxxxxxxx Xxxxxxx00 propõe, também em relação ao instituto jurídico da autonomia contratual, a dicotomia entre autonomia privada e autonomia existencial.
Segundo o autor, a autonomia existencial “se identifica com a liberdade do sujeito em gerir sua vida, sua personalidade, de forma digna”.
Citando Xxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx00, Xxxxxxxx Xxxxxxx sustenta que “a dignidade, mais do que fundamento para indisponibilidade, funciona como garantia da liberdade de disposição”.
Nessa toada, parece-nos que também a flexibilização do engessamento anterior das leis trabalhistas, que apenas permitiam aos sindicatos negociar cláusulas contratuais para além dos mínimos legais, com a novel permissão de negociação de cláusulas contratuais diretamente por parte dos próprios
72 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 272. 73 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 48. 74 XXXXXXXX, Xxxx Xxxx Xxxxxxxx, op. cit., p. 51.
75 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Autonomia e suas Limitações. Revista de Direito Privado, v. 60, p. 85- 96, out. – dez. 2014. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 08 set. 2022 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
76 XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxx. Dignidade da pessoa humana: conceito fundamental do direito civil. In: XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx (org.). A reconstrução do direito privado. São Paulo: Ed. RT, 0000. p. 260 apud REQUIÃO, Xxxxxxxx. Autonomia e suas Limitações. Revista de Direito Privado, v. 60, p. 85-96, out. – dez. 2014. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. Acesso em 08 set. 2022 (Paginação da versão eletrônica difere da versão impressa)
trabalhadores – não todos, mas apenas se verificados alguns critérios objetivos
– objetiva a concretização do princípio da dignidade humana, trazendo de volta o conceito da liberdade de autodeterminação do indivíduo e, dessa vez, relacionando-a com o preceito máximo de garantia de uma existência digna.
Conforme já mencionado à guisa de introdução, não se trata aqui de avaliar se a escolha dos critérios objetivos foi ou não acertada. Apenas o tempo irá dizer se tais critérios são acertados e, se um dia precisarem ser revistos, modificados, defendemos que assim o seja.
Fato é que não se pode negar que, em um contexto de dezenas de milhões de trabalhadores assalariados, como é o Brasil, haverá uma inevitável heterogeneidade de realidades separando esses trabalhadores.
De um lado, existe uma massa esmagadora de empregados que precisam ser protegidos – até mesmo deles próprios, como faz a Consolidação das Leis do Trabalho em muitas das suas disposições.
De outro, existe uma (diminuta, sejamos realistas) proporção de empregados que, por diversos motivos – seja alta educação, seja extensa experiência de vida, seja pelas oportunidades que tiveram de viajar, conhecer novas culturas etc. – adquiriram um certo grau de autossuficiência no que diz respeito ao seu projeto de vida.
Tais trabalhadores também merecem tutela, tanto quanto os primeiros. E tal tutela merece ser adaptada às suas especificidades, sem dúvida.
No entanto, também não há como fugir do fato de que o contrato de trabalho é – presumidamente – o principal meio de subsistência desses trabalhadores, ainda que tenham alguma renda complementar, como normalmente têm, geralmente derivada de investimentos privados, mas que podem muito bem ter sido feitos, por exemplo, com o excedente do salário que auferem pelo contrato de trabalho.
De qualquer sorte, até mesmo para esses trabalhadores há que ser garantido o “mínimo existencial” delineado na Constituição Federal, sendo, de fato, direitos em reação aos quais não se pode admitir renúncia.
A maneira, portanto, de fazer a adaptação da proteção contratual à realidade dessa porção de trabalhadores é, em suma, equipará-los às entidades sindicais, estendendo-lhes, justamente, a autonomia privada coletiva de que dispõem os sindicatos.
Tanto assim é, que a condição para que até mesmo estes trabalhadores possam negociar e estipular livremente suas cláusulas contratuais, é que a matéria negociada esteja inserida no rol de matérias passíveis de negociação pelos sindicatos, as quais estão elencadas – de maneira exaustiva – no art. 611- A da CLT.
Portanto, vê-se que, embora se possa falar em autonomia privada individual do empregado “hipersuficiente”, trata-se de autonomia inerentemente limitada pelo caráter existencial do contrato de trabalho.
Não podia, aliás, ser de outra forma, até porque o próprio conceito de autonomia privada, como já se declinou mais acima, pressupõe a impressão de limites cogentes sobre a vontade individual, mesmo no direito civil propriamente dito.
Dessa forma, se nem mesmo os contratos estritamente civis podem ser objeto de negociação irrestrita, e devem manter um patamar civilizatório concretizador da dignidade humana ainda que seu conteúdo seja exclusivamente patrimonial (ou de lucro), muito menos o podem os contratos de natureza trabalhista.
De outra banda, deve-se ressaltar, também, que continuam à disposição desses trabalhadores todos os mecanismos de coibição de abusos de posições contratuais e de correção de violações já à disposição dos trabalhadores de um modo geral, inclusive a possibilidade de invalidação caso fique comprovada eventual coação moral durante a negociação.
Afinal, como leciona Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx00:
Reconhecer tais funções sociais, que são inerentes ao contrato de trabalho e admitem fácil cognição a partir da interpretação histórico- teleológica dos arts. 2°, 3° e 442, caput, da CLT (ou à mercê de interpretação sistemática que tome em consideração o art. 5° do Decreto-lei n. 4.657/42 Lei de Introdução ao Código Civil, pelo qual a lei se aplica com vistas aos seus fins sociais e às exigências do bem comum), importa em carrear, para o juiz do Trabalho, o poder de intervenção corretiva nos contratos de trabalho, ajustando suas cláusulas, expressas e/ou tácitas, às suas funções sociais proeminente
77 XXXXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx. Direito do trabalho e direito dos contratos: apontamentos relevantes sobre a parte especial do novo Código civil: (Lei n. 10.406, de 10-1- 2002). Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, n. 21, p. 83-100, 2003.
Assim, parece-nos que tais trabalhadores não ficarão desguarnecidos em seus direitos e nem sofrerão retrocesso em seu patamar civilizatório mínimo, dadas as suas peculiaridades em relação à grande massa de empregados assalariados.
No entanto, por se tratar de instituto inserido muito recentemente no ordenamento jurídico, ainda sem jurisprudência superior sedimentada a seu respeito e ainda pouco manejado – justamente por se tratar de uma categoria relativamente rara no cenário socioeconômico do mercado de trabalho brasileiro
– apenas o tempo poderá esclarecer os erros e os acertos em sua concepção e, a partir daí, os ajustes de rotas poderão ser tomados com mais assertividade e efetividade.
5. CONCLUSÃO
Após o estudo do tema, dentro do recorte dado na sua definição, não restam dúvidas de que a alteração dos paradigmas contratuais que aconteceram na virada do século XIX para o século XX foram salutares no sentido de trazer a dignidade humana e valores de solidarismo para o centro da construção jurídica. Assim, consideramos importante a contribuição da escola do Direito Social para a humanização do direito e das relações interpessoais. Se assim não fosse, certamente a predação do homem sobre o homem iria potencialmente acelerar um eventual processo de extinção do ser humano enquanto categoria
evolutiva.
De outra banda, também não restam dúvidas de que é extremamente válida a imposição de regras mínimas cogentes que concretizam esse modelo solidarista dentro das relações contratuais privadas, eivando até mesmo as relações patrimoniais de uma feição humana e dignificante, proporcionando um bem social que extrapola os limites das partes contratantes.
Também parece acertada a classificação dos contratos de acordo com a essencialidade do bem que perfaz o objeto da contratação.
Nesse contexto, o contrato de trabalho – contrato existencial por natureza, mas com aspecto dúplice – merece sim, ser cercado de proteções inderrogáveis pela vontade das partes.
No entanto, parece também evidente que a realidade é extremamente heterogênea para tratar todos como iguais, ainda que desiguais.
Percebe-se que, nesse contexto de adaptação da proteção trabalhista, foi conferida autonomia privada individual aos empregados chamados “hipersuficientes” (ou “autossuficientes”), aos moldes da autonomia privada coletiva conferida às entidades sindicais.
Porém, também se percebe que a autonomia conferida aos empregados “hipersuficientes” (ou “autossuficientes”) é inerentemente limitada não apenas pelo movimento de limitação da vontade individual que já se sedimentou na virada do século acima mencionada, mas também pela própria natureza do contrato de trabalho, isto é, contrato existencial que visa à subsistência de um ser humano.
Assim, tem-se assente que, embora o empregado “hipersuficiente” goze de maior autonomia privada do que os empregados hipossuficientes, tal autonomia sofre limitações, dentre as quais os ditames da Constituição Federal sobre direito do trabalho e o rol taxativo de matérias sobre as quais pode incidir a recém-conferida autonomia desses empregados.
Finalmente, conclui-se que a figura jurídica é recente demais para se determinar se o legislador andou certo ou errado na escolha dos critérios objetivos que elegeu para conferir tal autonomia privada individual ao trabalhador e tal como ocorre em qualquer seara do Direito, apenas a prática, com o passar do tempo e com a apreciação de casos concretos pelos tribunais, é que irá dizer onde se acertou, onde se errou e o que fazer para ajustar o percurso, se for o caso.
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