Visto etc.
Visto etc.
Registro que fui acionado em plantão judiciário, via contato telefônico, no dia 01/01/2020 às 15h.
Trata-se de Dissídio Coletivo de Greve com pedido de providência liminar em que são partes, como suscitantes Sindicato das Empresas de Transporte Metropolitano da Grande Vitória - GVBUS e Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Espírito Santo - SETPES e, suscitado, o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Espírito Santo - SINDIRODOVIÁRIOS.
Os suscitantes explicam que os contratos de trabalho dos cobradores dos Sistemas Transcol e Municipal de Vitória e Vila Velha/ES permaneceram suspensos até 31/12/2020, período em que estavam inseridos no programa emergencial de manutenção do emprego e renda, em razão da determinação dos Órgãos Governamentais de não utilização de dinheiro para pagamento das passagens de ônibus durante o estado de calamidade pública em razão da pandemia do coronavírus.
Afirmam que, em que pese o término do auxílio emergencial concedido pelo Governo Federal em 31/12/2020, o Estado do Espírito Santo editou Portaria em 28/12/2020, sob o n.º 045-S, suspendendo a atividade dos cobradores em razão da obrigatoriedade do pagamento eletrônico da passagem e para resguardar a saúde deles.
Narram "inexistirá qualquer prejuízo aos colaboradores que, embora não cumprirão jornada de trabalho nos coletivos, perceberão integralmente salários e benefícios previstos em Xxxxx Xxxxxxxx". Alertam que tais trabalhadores possuem garantia provisória no emprego, a teor da Lei n.º 14.020/2020, o que evidencia ausência de ato de dispensa.
Alegam que o Sindirodoviários convocou a categoria para assumirem seus postos de trabalho no dia 04/01/2021 às 4h "sendo que a Nota aos Rodoviários e à População em Geral afirma que não haverá circulação de qualquer veículo sem a presença dos cobradores".
Aduzem que a paralisação é irregular eis que não observada a Lei de Greve bem como porque existe norma coletiva em vigor e garantia provisória de emprego.
Evidenciam o fumus boni iuris na ausência de justificativa para a paralisação determinada e deliberada pelo sindicato dos trabalhadores em descompasso com a lei e disposições convencionadas.
O perigo da demora reside no risco de impedimento de circulação integral da frota de ônibus neste momento de pandemia em que se faz necessária a observância ao distanciamento social como forma de evitar a propagação do novo coronavírus.
Diante desses fatos, requer, liminarmente:
a) Que seja determinada, em antecipação dos efeitos da tutela, a manutenção da integralidade da frota atualmente em operação dos serviços de Transporte Metropolitano (TRANSCOL) e Municipal de Vitória e Vila Velha/ES, a fim de garantir a não aglomeração de pessoas dentro dos veículos;
b) Que na decisão liminar conste, ainda, a proibição de obstaculização das vias públicas ou dano aos veículos ou sedes das empresas empregadoras ora representadas; proibição para que não sejam retiradas as chaves dos veículos ou da posse dos motoristas;
Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00. É o breve relatório.
D e c i d o
A convocação dos trabalhadores que exercem a função de cobradores no transporte público de passageiros pelo Sindicato está posta nos seguintes termos, documento ID d0639bd:
NOTA AOS RODOVIÁRIOS E POPULAÇÃO EM GERAL
O SINDIRODOVIÁRIOS vem a público CONVOCAR todos os COBRADORES do transporte coletivo de passageiros da Grande Vitória - Transcol e municípios - a comparecerem, independentemente do seu turno de trabalho, na próxima segunda feira dia 04/01/2021, as 04h00min em suas respectivas garagens devidamente uniformizados e aptos a assumirem suas atividades nas roletas. Os diretores do sindicato estarão em todas as garagens para recepcionar os cobradores e garantir a observância de todos os direitos.
O SINDIRODOVIÁRIOS ressalta que possui as garantias jurídicas e políticas para a volta de tais profissionais, sendo inclusive um compromisso público do GOVERNADOR do estado com a manutenção dos postos de trabalho dos COBRADORES.
O retorno dos cobradores é fato inegociável para o SINDIRODOVIÁRIOS que não tolerará nenhum tipo de retrocesso e se coloca a disposição de todos para sanar qualquer dúvida. O SINDIRODOVIÁRIOS COMUNICA AINDA QUE NÃO IRÁ RODAR NENHUM VEÍCULO SEM A PRESENÇA DOS COBRADORES NAS ROLETAS.
A nota transcrita demonstra que o SINDIRODOVIÁRIOS fomenta e incentiva a realização de uma suspensão coletiva da prestação de serviços ao empregador, ou seja, uma verdadeira greve. Com efeito, a nota é clara nesse sentido ao expressar: que "NÃO IRÁ RODAR NENHUM VEÍCULO SEM A PRESENÇA DE COBRADORES NA ROLETA".
É certo que a Constituição da República garante e consagra o direito de greve, obviamente, desde que observados os preceitos legais contidos na chamada Lei de Greve. A lei 7783/89, estabelece requisitos para o exercício do direito de greve, entre eles:
a) A tentativa de negociação (Artigo 3º);
b) A convocação e realização de assembleia geral com definição das reivindicações da categoria e deliberação sobre a paralisação da categoria (Artigo 4º);
Importa dizer que não existe notícia nem prova de tentativa de negociação ou de convocação e realização de assembleia geral, bem COMO EXISTE CONVENÇÃO COLETIVA em vigência.
A lei é clara no sentido de aduzir que constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente Lei, bem como a manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho. Nem se pode argumentar que há superveniência de fato novo, já que a questão está posta (em relação aos cobradores), há vários meses.
A lei de greve também é cristalina ao aduzir que em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem, bem como as manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.
Ressalte-se que se trata de atividade essencial, havendo grave ameaça ao interesse público, em especial no presente momento de pandemia, com aumento no número de casos e de mortes em nosso estado, bem como a descoberta de novas cepas com maior grau de transmissibilidade. Uma paralisação, que ressalte-se, a meu ver, contraria a lei, traria uma maior aglomeração nos trabalhadores e dos usuários do sistema de transporte, trazendo uma possibilidade enorme de aumento dos casos em nosso estado, causando a lotação de nosso sistema de saúde já abalado.
A jurisprudência abaixo é clara no sentido de coibir o abuso no direito de greve:
RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE POR
CERCEAMENTO DE DEFESA. Sabe-se que a teoria das nulidades, no processo do trabalho, acolhe o princípio da transcendência, segundo o qual só existirá nulidade a ser declarada quando "resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes" (art. 794 da CLT). No caso, verifica-se que a conclusão a que chegou o egrégio Tribunal Regional acerca da existência de responsabilidade do SINTRICOM no tocante à abusividade do movimento grevista não adveio da simples análise de fração da prova produzida pela parte contrária, cujo conteúdo era desconhecido pelo Sindicato obreiro. O convencimento do Tribunal de origem pela responsabilização do ora Recorrente se firmou a partir da análise de todos os elementos probatórios em conjunto, não havendo que se falar, pois, em prejuízo manifesto do SINTRICOM que justifique o acolhimento da
preliminar suscitada. Recurso ordinário desprovido, no tema. 2. ABUSIVIDADE . DEFLAGRAÇÃO DO MOVIMENTO PAREDISTA NA VIGÊNCIA DE ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - LIMINAR DEFERIDA, DETERMINANDO O RETORNO AO TRABALHO. ACORDO ENTABULADO EM JUÍZO. DESCUMPRIMENTO. A Constituição reconhece
a greve como um direito fundamental de caráter coletivo, resultante da autonomia privada coletiva inerente às sociedades democráticas. Não se considera abusivo o movimento paredista se observados os requisitos estabelecidos pela ordem jurídica para sua validade: tentativa de negociação; aprovação pela respectiva assembleia de trabalhadores; aviso prévio à parte adversa; inexistência de acordo, convenção ou sentença normativa vigente. No caso , o movimento paredista foi deflagrado em junho de 2013, quando estava em plena vigência o Acordo Coletivo de Trabalho 2013/2014, recém-firmado entre o Suscitante e os Suscitados. Registre-se que a paralisação não teve como objetivo exigir o cumprimento de cláusula ou condição do referido acordo coletivo. Ademais, não há nos autos notícia de fato superveniente ou acontecimento imprevisto que tenha causado substancial alteração da relação de trabalho de forma a justificar o ajuizamento do presente dissídio. Esclareça-se que, mesmo com decisão liminar determinando o retorno ao trabalho e com acordo firmado em audiência, ainda assim a paralisação foi mantida. Assim, é de ser mantido o acórdão regional no tocante à abusividade do movimento paredista. Recurso ordinário desprovido, no particular. 3. MULTA FIXADA PELO DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO LIMINAR QUE DETERMINAVA O RETORNO DOS TRABALHADORES EM GREVE.
RESPONSABILIDADE DO SINTRICOM. REDUÇÃO DO VALOR. Evidencia-se a existência de responsabilidade do Sindicato Recorrente no tocante ao pagamento das astreintes arbitradas na origem. Primeiramente, porque o SINTRICOM, de forma abusiva, fomentou e deflagrou o movimento paredista ao qual se dirigiram as decisões que determinaram o retorno imediato dos grevistas ao trabalho, não podendo, portanto, sob a alegação de que não conseguiu convencer os trabalhadores a encerrarem a greve, eximir-se de sua responsabilidade na continuação do movimento e, por conseguinte, no descumprimento de tais decisões. Em segundo lugar, porque o SINTRICOM deu suporte material à continuação do movimento, colaborando, pois, para o descumprimento do determinado judicialmente. Todavia , é de se ressaltar que, embora censurável o desrespeito à decisão judicial que determinou o retorno imediato dos trabalhadores em greve, a imposição de multa no valor de R$ 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil reais), na presente hipótese, poderia obstar o regular funcionamento da entidade sindical e prejudicar os trabalhadores que necessitam dessa representação. O princípio constitucional da proporcionalidade, afinal, incide também sobre as próprias decisões judiciais. Ante as peculiaridades do caso concreto, a douta maioria desta Seção Especializada entendeu razoável a fixação de multa no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por dia de descumprimento da decisão judicial que determinou o retorno ao trabalho. No caso, houve o descumprimento durante 11 dias, razão pela qual a multa devida é no valor de R$ 220.000,00 (duzentos e vinte mil reais). Ressalva do entendimento do Relator, que entendia razoável a fixação de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento da determinação judicial. Recurso ordinário parcialmente provido.
(TST - RO: 241240520135240000, Relator: Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Data de Julgamento: 17/08/2015, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: 28/08/2015)
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABUSIVIDADE NO EXERCÍCO DE DIREITO DE GREVE.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO SINDICATO. Extrapola o limite do exercício do direito de greve o cerceamento do direito de ir e vir dos trabalhadores que não aderiram ao movimento paredista, coordenado por dirigente sindical da categoria, configurando ato ofensivo à liberdade individual de que dispõe o inc. I do parágrafo único do art. 954 do Código Civil.
(TRT-12 - RO: 06995200703412851 SC 06995-2007-034-12-85-1, Relator: XXXXXXXX XXXXXX XX
XXXX, XXXXXXXXXX XX 0X XXXXX, Data de Publicação: 19/03/2015)
Assim, defiro o requerido nas alíneas A e B, da inicial.
Caso necessário, fica autorizada o uso da força policial, caso o oficial de justiça entenda necessário.
ESTA DECISÃO TEM FORÇA DE MANDADO.
Em caso de descumprimento da liminar, fica arbitrada a multa de R$10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento, a ser cobrada do SINDIRODOVIÁRIOS E SOLIDARIAMENTE DO PRESIDENTE E DEMAIS DIRETORES DO SINDIRODOVIÁRIOS,
ficando autorizado o bloqueio de contas através do BACEN JUD.
Com efeito, conforme julgado acima transcrito, fere a razoabilidade, o bom senso, a alegação de dirigentes sindicais que fomentaram e deflagaram a greve, no sentido de que não convencem os trabalhadores a terminar o movimento. Cite-se que foi o que ocorreu no final de 2019 com o mesmo sindicato, sendo que os jornais televisivos flagraram membros do sindicato impedindo a saída de trabalhadores para o trabalho.
Intimem-se as partes na forma que a Divisão do Pleno tem adotado neste momento de pandemia.
Publique-se.
Assinado eletronicamente por:
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Documento assinado pelo Shodo