ACÓRDÃO Nº 06/2011 – 22/03/2011 – 1ª SECÇÃO/PL RECURSO ORDINÁRIO Nº 01/2011-EMOL
ACÓRDÃO Nº 06/2011 – 22/03/2011 – 1ª SECÇÃO/PL RECURSO ORDINÁRIO Nº 01/2011-EMOL
PROCESSO Nº 1729/2010 DESCRITORES:
▪ Natureza e caracterização do contrato, com referência ao respectivo modo de execução;
▪ Emolumentos e correspondente cálculo;
Sumário:
1.
Na ausência de uma definição relativa ao conceito jurídico-civil de “contratos de execução periódica”, o respectivo esclarecimento conceptual passará pela sua delimitação de institutos próximos [contratos de execução permanente e continuada e, bem assim, contratos com prestações periódicas reiteradas];
2.
Mod. TC 1999.001
O contrato de prestação de serviços, vigente por determinada fase temporal, mas renovável, automática e sucessivamente, por períodos de tempo constantes e com limite global máximo, comunga da natureza dos contratos de execução periódica ou continuada;
3.
O cálculo dos emolumentos decorrentes dos contratos de execução periódica efectua-se de acordo com o disposto no art.º 5.º, n.º 2, do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas [Decreto-Lei n.º 66/96, de 31.05.].;
O Conselheiro Relator: Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx
Mod. TC 1999.001
– 2 –
ACÓRDÃO Nº 6 /2011 - 22 /03/2011 – 1ª SECÇÃO/PL RECURSO ORDINÁRIO Nº 01/2011-EMOL
PROCESSO Nº 1729/2010
I. Relatório
1.
“Residências Montepio Servidores de Saúde, SA”, inconformada com a decisão que fixou emolumentos, no montante de € 5 715,35, interpôs o atinente recurso, concluindo a final, pela forma seguinte:
“(…)
1.ª
O contrato intitulado “Acordo para a Unidade de Convalescença”, datado de 9.06.2010 e respectivo aditamento, datado de 2.11.2010, nos termos do qual a recorrente se obrigou perante a Administração Regional de Saúde do Centro, IP, a acolher e prestar cuidados de saúde às pessoas que esta lhe indicar, é um contrato de execução periódica ou continuada, porque dele emergem sucessivas obrigações, cujo cumprimento se não esgota num único acto, tal como sucede nos contratos de avença ou de locação.
2.ª
Mod. TC 1999.001
O referido contrato entrou em vigor a 30.06.2010”…e termina a 31 de Dezembro de 2010, renovando-se automática e sucessivamente por períodos de um ano, se entretanto não ocorrer a sua cessação nos termos previstos na cláusula anterior” (cit. Cláusula XV), mas a sua vigência não poderá ultrapassar o limite de cinco anos.
Assim,
3.ª
Nos termos do artigo 5º, nº.1, al. b) e nº. 2 do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas, os emolumentos devidos pelo visto do referido contrato devem ser calculados sobre o valor máximo anual do pagamento devido à recorrente, isto é, sobre 1.143.070,50 € e, em consequência,
4.ª
Os emolumentos devem ser liquidados, no máximo, em 1 143,07 € e não no valor constante do Documento de Cobrança nº. 14746/10-V, 5 715,35 €, em cuja elaboração foi violado o disposto nas normas citadas na conclusão anterior.”
Termina, peticionando a reconsideração da deliberação que fixou o montante emolumentar, devendo este ser fixado em função do valor anual do contrato de prestação de serviços.
2.
O Xx.xx Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência do recurso interposto, devendo, em conformidade, anular-se o “documento de cobrança”, substituindo-o por outro que repercuta a qualificação jurídica do contrato sustentada nas alegações de recurso.
3.
Foram colhidos os vistos legais.
II. Fundamentação
Mod. TC 1999.001
Para além da factualidade referenciada em 1. [intróito], consideram-se fixados, com relevância para a decisão em curso, os seguintes factos:
1.
Em Sessão diária de visto ocorrida em 23.12.2010, e no âmbito do processo n.º 1729/2010, foi proferida decisão [n.º 1084/2010] que visou o “Acordo para a Unidade de Convalescença “ celebrado, em 09.06.2010, entre a Administração Regional de Saúde do Centro e “Residências Montepio Servidores de Saúde, SA”;
2.
Tal Acordo, verdadeiro contrato de prestação de serviços, foi objecto de aditamento em 02.11.2010, o qual fixa a vigência daquele entre 30.06.2010 e 31.12.2010, renovando-se, automática e sucessivamente, por períodos de um ano, mas até ao limite máximo de cinco anos;
3.
O valor do pagamento à instituição “Residências Montepio Servidores de Saúde, SA”, no ano de 2010, é de € 626 340,00 e de € 1 143 070,50 no domínio das renovações anuais;
O valor global do montante, incluindo as eventuais renovações, é, pois, de
€ 5 715 353,50;
4.
Subsequentemente à decisão mencionada em 1., foram calculados os emolumentos e elaborado o correspondente documento de cobrança [n.º 14746/10-U], no montante de € 5 715,35;
5.
Mod. TC 1999.001
Nos termos do contrato em apreço, a recorrente obrigou-se a disponibilizar as suas instalações e serviços no sentido de acolher pessoas com perda transitória de autonomia, potencialmente recuperável, que necessitem de cuidados clínicos, de reabilitação e de apoio psicossocial, em regime de internamento e de convalescença, por situação clínica decorrente da recuperação de um processo
agudo ou descompensação de processo crónico, em conformidade com o preceituado no art.º 13.º, do Decreto-Lei n.º 101/2006, de 06.06.;
6.
Notificada para pagar os emolumentos em dívida, a recorrente não procedeu à satisfação dos mesmos, interpondo recurso.
III. O DIREITO
Sumariada a matéria sob controvérsia urge esclarecer as questões daí emergentes e que, com relevância para a apreciação em curso, são as seguintes:
▪ Natureza do contrato celebrado entre a recorrente e a Administração Regional de Saúde do Centro, IP, e respectiva caracterização;
▪ Emolumentos devidos.
1. Da caracterização do Acordo ou Contrato.
1.1.
A recorrente, em alegações deduzidas, qualifica o contrato celebrado como de execução periódica. Ou seja, e apelando à doutrina, tratar-se-á de um contrato donde emerge uma obrigação que tem por objecto uma sucessão de actos, não se esgotando a correspondente prestação num único acto1.
Mod. TC 1999.001
No encontro de uma definição para o conceito jurídico-civil de “contratos de execução periódica”, que não é directamente abordado pela doutrina e
1 Vd., a propósito, Xxx Xxxxx, in Dicionário Jurídico, Vol. I.
jurisprudência [limitam-se à abordagem de contrato de execução instantânea, de execução permanente, de execução continuada, de contratos com prestações periódicas reiteradas ou contrato sucessivo], exercitaremos a aproximação a conceitos próximos e, dentre estes, destacaremos os reportados a contratos com prestações periódicas.
No entendimento do Prof. Xxxxxxx Xxxxxx,2aqueles primeiros cumprem-se, ininterruptamente, ao longo do tempo [vd., entre outras, as prestações do locador e do comodante], ao passo que os últimos [contratos com prestações periódicas] caracterizam-se pelo facto de as prestações se renovarem em prestações singulares sucessivas e ao fim de períodos consecutivos [vd., entre outros, as referentes ao pagamento de rendas pelo locatário e ao pagamento de rendas perpétuas].
1.2.
Conforme a factualidade fixada em II., depara-se-nos um real contrato de prestação de serviços celebrado entre a recorrente e a Administração Regional de Saúde do Centro, IP, outorgado em 09.06.2010 [e aditado em 02.11.2010], a vigorar, num primeiro período, entre 30.06.2010 e 31.12.2010, renovando-se, depois, automática e sucessivamente, por períodos de um ano, mas até ao limite de cinco anos.
Trata-se, pois, de um contrato com execução prolongada no tempo, e em que, no decurso da respectiva vigência, a recorrente se obriga, mediante preço estipulado [vd. II.3.] e a pagar de modo periódico e reiterado, a disponibilizar instalações e serviços em ordem ao cumprimento da finalidade e objecto contratuais.
Mod. TC 1999.001
O instrumento contratual em causa identifica-se, assim, com o contrato de locação, ao menos na vertente da respectiva execução [também, contínua] e remuneração [prestações remuneratórias periódicas], e, mais latamente, comunga da natureza dos contratos de execução periódica ou continuada.
2 Vd. Das obrigações em geral, Vol. I.
2. Emolumentos devidos.
O art.º 5.º, n.os 1 e 2, do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas [abreviadamente, RJETC], aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/96, de 31.05., dispõe o seguinte:
“(…)
Art.º 5.º Emolumentos
1- Os emolumentos devidos em processo de fiscalização prévia são os seguintes:
a) Actos e contratos relacionados com o pessoal:
…
b) Outros actos ou contratos: 10% do seu valor certo ou estimado, com o limite mínimo de 6% do VR.
2- Nos contratos de execução periódica, nomeadamente, nos de avença e de locação, os emolumentos serão calculados sobre o valor total correspondente à sua vigência quando esta for inferior a um ano ou sobre o seu valor anual, nos restantes casos.
3- …….
A norma ora transcrita fixa o critério de cálculo e a respectiva base de incidência que, em regra, e como daí se depreende, se confunde com o valor total do contrato, quer certo, quer estimado.
Mod. TC 1999.001
Porém, o n.º 2, da mesma norma, excepciona os contratos de execução periódica, preceituando que, nesta parte, «os emolumentos serão calculados sobre o valor total correspondente à sua vigência quando esta for inferior a um ano ou sobre o seu valor anual nos restantes casos».
Como acima sustentámos, o Acordo ou contrato em causa identifica-se, no essencial, com o contrato de locação e comunga da natureza dos contratos de execução periódica.
Logo, e no cumprimento do citado art.º 5.º, n.º 2, do RJETC, o cálculo dos emolumentos deverá incidir sobre o valor anual do contrato, que se situa em
€ 1 143 070,50.
2.1.
Considerando o disposto no art.º 5.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, do RJETC, e a base de incidência – € 1 143 070,50 – para cálculo dos emolumentos a fixar, estes deverão ser quantificados em € 1 143,07.
IV. Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1.ª Secção, do Tribunal de Contas, em Plenário:
▪ Conceder provimento ao recurso, fixando o valor dos emolumentos devidos em € 1 143,07;
Não são devidos emolumentos pelo recurso [vd. art.º 17.º, n.º 1, do RJETC].
Mod. TC 1999.001
Lisboa 22 de Março de 2011.
Os Juízes Conselheiros,
(Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx – Relator)
(Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxxxx)
(Xxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx)
Fui presente,
(Procurador-Geral Adjunto)
Mod. TC 1999.001