Ministro do Superior Tribunal de Justiça
O CONTRATO NO CÓDIGO CIVIL E A SUA FUNÇÃO SOCIAL
JOSÉ AUGUSTO DELGADO1*
Ministro do Superior Tribunal de Justiça
1 - INTRODUÇÃO
O Código Civil de 2002, em seu artigo 421 .determina que "a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato".
Dispositivo de igual natureza não existia no Código Civil de
1916.
A regra destacada impõe uma visualização contemporânea a respeito do contrato privado, por exigir que se explicite a sua vinculação aos aspectos axiológicos nela contidos.
Cumpre, em face dessa necessidade, identificar-se o alcance da filosofia adotada pelo legislador que, aceitando a proposta formulada pela Comissão designada para elaborar o projeto do Código Civil de 2002, subordinou todo o estatuto aos princípios da eticidade, socialidade, operosidade e praticidade.
O contrato, em razão dessa nova realidade legal, apresenta-se conseqüentemente, na atualidade, com um desenho composto pelas complexidades que envolvem as relações jurídicas no alvorecer deste Século XXI.
1 Professor de Direito Público (Administrativo, Tributário e Processual Civil). Professor-Convidado do Curso de Especialização em Processo CMl-CEUB, Brasília. Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. Professor da UFRN (aposentado). Ex-Professor da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. Ex-Professor da Universidade Católica de Pernambuco. Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário. Sócio Benemérito do Instituto Nacional de Direito Público. Conselheiro Consultivo do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Integrante do Grupo Brasileiro da Sociedade Internacional do Direito Penal Militar e Direito Humanitário Conselheiro do Instituto de Procedimento e Processo Tributário do Brasil - IPTT Brasil.
*Ministro do Superior Tribunal de Justiça, a partir de 15/12/1995.
Esse panorama tem por objetivo central fazer com que o contrato, expressão de negócio jurídico bilateral, seja visto de forma afastada da postura patrimonialista até então adotada, por ter migrado para conviver em um ambiente onde predomina uma concepção pós- moderna dos pactos entre as pessoas, concepção que privilegia os ditames da Constituição Federal de 1988 concentrados na valorização da dignidade humana e da cidadania (art. 1º, II e III), bem como na imperatividade do princípio de que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observando-se a função social da propriedade (art. 170, III).
O Código Civil de 2002 reflete, na mensagem do art. 421, um padrão moderno referente à função do contrato, imprimindo-lhe um efeito que rompe com a predominância da livre manifestação da vontade como pressuposto para a sua validade e eficácia.
Embora a vontade emitida de modo livre continue sendo necessária para a consumação sem vício do negócio jurídico contratual, não se deve, contudo, a ela emprestar-se, como outrora, grande relevância, em face da imperatividade do fator social sobre essa entidade de direito.
Identifica-se, na visão contemporânea do contrato, segundo a moldura do art. 421 do Código Civil de 2002, uma fuga à sua concepção clássica que tinha na autonomia privada o seu princípio sustentador.
É de ficar registrado, desde logo, que as limitações impostas, atualmente, pelo legislador à autonomia da vontade na formação e execução dos contratos não têm significação de que eles não geram obrigação de cumprimento.
Saliente-se que os acontecimentos apontados determinaram, apenas, uma diminuição da força que tinha a autonomia da vontade, sem, porém, afastá-la por inteiro. Até então ela era considerada como tendo carga de natureza absoluta; hoje, ela é concebida como possuindo natureza relativa.
Essa nova concepção da presença da autonomia da vontade nos contratos, ao ser analisada por XXXXXXX XXXXX XXXXXX, na obra de sua autoria Função Social, Xxxxx e Onerosidade Excessiva nos Contratos, publicada pela Editora Método, em 2002, mereceu, pp. 50/51, as seguintes observações: “Porém, nada justifica a distorção de institutos jurídicos, a má-fé, a ausência de vontade de cumprir pactos, para simplesmente ignorar os contratos. Apesar de estarmos diante daquela concepção originária e férrea da autonomia da vontade, ela não desapareceu de todo. Nem a limitação que a ela se impõe deve servir como pretexto para o raso e firme descumprimento de contratos. Somente por exceção e em casos-limites é que o consentimento deve ser afastado para dar azo ao que o Estado-juiz decidiu em sentença firme, acobertada pela coisa julgada”.
“Em razão da liberdade de contratação, é faculdade natural de cada pessoa aceitar ou rechaçar uma proposta de contrato. A negativa é um ato lícito e não implica responsabilidade”.
O mesmo poder da vontade que engendrou um contrato serve para deixá-lo sem efeito, por meio do mútuo dissenso, o que para os romanos é distrato.
2 O autor registra, em nota de rodapé, a obra de XXXXX XXXXXXXX, de onde foi extraída a citação feita: "Principales efectos de Ia contratación civil", publicada pela Depalma, em Buenos Aires, no ano de 1978, p. 133.
Os vícios da vontade impedem ou anulam os efeitos do
contrato.
A força do contrato e sua imutabilidade levam por corolário o de seu cumprimento com fidelidade. A lei os assegura mediante seu poder coativo para que se cumpra o prometido e sanciona o descumprimento com a previsão de indenização por perdas e danos.
A autonomia da vontade com natureza absoluta nas relações contratuais decorreu dos postulados do Código Civil francês, de 1804. Para este, o contrato era lei privada entre as partes, gerando para as partes o dever de rigorosa obediência às cláusulas nele firmadas.
O direito contratual, por guardar vinculação a essa força da autonomia da vontade, era aplicado com base em três princípios:
1) o da autonomia da vontade;
2) o da obrigatoriedade do cumprimento das cláusulas contratuais (pacta sunt senvanda);
3) o da eficácia relativa às partes contratantes.
XXXXX XXXX XXXXX XXXX, em trabalho intitulado Princípios Contratuais, publicado na obra coletiva A Teoria do Contrato e o Novo Código Civil, pp. 11 e 12, após xxxxxxx os princípios acima invocados, observa, a respeito dos mesmos, o seguinte:
“O direito contratual que se toma como paradigma, tanto para a formação como para a prática dos operadores do direito, é o que se desenhou durante a hegemonia do Estado liberal, corporificando nas codificações a concepção iluminista da autonomia da vontade.
De modo geral podem ser assim agrupados os princípios que determinam a função individual do contrato:
I - Princípio da autonomia privada (ou da autonomia da vontade, ou da liberdade contratual);
II - Princípio da obrigatoriedade (pacta sunt servanda ou da intangibilidade);
III - Princípio da relatividade subjetiva (ou da eficácia relativa às partes contratantes).
No Estado liberal, o contrato converteu-se em instrumento por excelência da autonomia da vontade, confundida com a própria liberdade, ambas impensáveis sem o direito de propriedade privada. Liberdade de contratar e liberdade de propriedade seriam interdependentes, como irmãs siamesas.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa, em 1789, proclamou a sacralidade da propriedade privada ('Art. 17. Sendo a propriedade um direito sagrado e inviolável...'), tida como exteriorização da pessoa.
Emancipada da rigidez estamental da Idade Média, a propriedade privada dos bens econômicos ingressou em circulação contínua, mediante a instrumentalização do contrato.
Autonomia da vontade, liberdade individual e propriedade privada transmigraram dos fundamentos teóricos e ideológicos do Estado liberal para os princípios de direito, com pretensão de universalidade e intemporalidade.
Considere-se o mais brilhante dos pensadores da época, XXXX, especialmente na Fundamentação da Metafísica dos Costumes, onde distingue o que entende por autonomia de heteronomia. A autonomia é o campo da liberdade, porque os seres humanos podem exercer suas escolhas e estabelecerem regras para si mesmos, coletivamente ou interindividualmente. A heteronomia, por seu turno, é o campo da natureza cujas regras o homem não pode modificar e está sujeito a elas.
Assim, o mundo ético, em que se encartaria o direito, seria o reino da liberdade dos indivíduos, enquanto tais, porque a eles se dirige o princípio estruturante do imperativo categórico kantiano. Na fundamentação filosófica kantiana, a autonomia envolve a criação e aplicação de todo o direito. Posteriormente, os juristas deram feição dogmática estrita ao princípio da autonomia, significando o espaço de auto-
regulação dos interesses privados, de onde emerge o contrato.”
O que o mundo jurídico revela à humanidade é a impossibilidade de a sociedade, em razão da necessidade de cada vez mais o homem ser valorizado na preservação de sua dignidade e de sua cidadania, continuar sendo dirigida por normas de cunho individualista e com objetivos de proteger, apenas, o patrimônio.
O tecido social sofreu severas mudanças no relacionamento do que o integra. Elas exigem um novo panorama jurídico para os negócios a serem celebrados pelo ser humano, com predominância da atuação com probidade, boa-fé, respeito à igualdade e ao fenômeno da socialização.
O Código Civil de 2002, xxxxxxxx esse momento vivenciado pelo Século XXI, adota postura, no campo contratual, no sentido de, ao lado do princípios individuais que, de uma forma ou de outra, continuam regendo os contratos, exigir que todos os negócios jurídicos bilaterais obedeçam, também, aos denominados princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e da equivalência material, conforme bem acentuado por XXXXX XXXX XXXXX XXXX, no trabalho que compõe a obra coletiva já citada, p. 14.
Firmo conclusão sobre essa parte introdutória, na linha do observado por XXXXX XXXX XXXXX XXXX, de que, atualmente, o contrato, em nosso ordenamento jurídico sujeita-se a duas classes de princípios: os individuais (o da autonomia privada, o da obrigatoriedade ou pacta sunt servanda e o da eficácia relativa às partes contratantes); e os sociais (o da função social, o da boa-fé objetiva e o da equivalência material do pacto). Estes não eliminam, como observa XXXXX XXXX XXXXX XXXX, aqueles; porém, limitam, profundamente, o seu alcance.
2 - A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO COMO PRINCIPIO
A doutrina tem dado ênfase ao conteúdo principiológico revelado pelo art. 421 do Código Civil de 2002 como a mais importante inovação introduzida em nosso sistema jurídico, no tópico das obrigações.
O artigo 421 ao reconhecer que a liberdade de contratar não é absoluta, haja vista que só terá validade se for exercida em razão e nos limites da função social do contrato, fixa uma determinação de natureza principiológica, portanto, com carga mais intensa do que a de uma regra positiva jurídica.
Sendo princípio, com essa característica deve ser analisada a função social do contrato. Importa, portanto, em se considerar essa função social com toda a extensão que ela representa e torná-la integralmente eficaz.
O princípio, quando presente no ordenamento jurídico, assume fundamental importância, pelo posicionamento hierárquico que ele assume. Ele atua como pressuposto normativo a ser observado pelas demais normas jurídicas. Ele é comando, portanto, gerador de obediência por todos que se envolvem com a aplicação da norma jurídica.
Observa HELENILSON CUNHA PONTES3 que “conforme ensinou XXXX XXXXXXXXX, OS princípios são um indispensável elemento de fecundação da ordem jurídica positiva. Eles contêm, em estado de virtual (à l'étai de virtualité), um grande número de soluções exigidas pela realidade. Uma vez afirmados e aplicados pela Jurisprudência, os princípios constituem o material graças ao qual a doutrina pode edificar com confiança as construções jurídicas”.
O princípio da função social do contrato, presente de modo explícito no artigo 421, caracteriza uma operação que determina o exame
3 XXXXXX, Xxxxxxxxxx Xxxxx. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. Dialética, p. 27-28.
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do negócio celebrado dentro de um prisma que nenhuma lesão de direito tenha sido causado a qualquer componente da sociedade.
A doutrina tem buscado construir um conceito sobre a função social do contrato, partindo do exame do que se entende por função social em sentido lato.
XXXXXX XXXXXXX XXXXXX XXXXXXXX, autor do artigo
“Contrato: da função social”, publicado via internet no site:
<xxxx://xxx.xxxxxxxxxx.xxxxxxxx.xx>, afirma que a função social do contrato pode ser entendida como sendo "a finalidade pela qual visa o ordenamentos jurídico a conferir aos contratantes medidas ou mecanismos jurídicos capazes de coibir qualquer desigualdade dentro da relação contratual". A seguir, explica: "Não significa limitar a liberdade contratual; garante-se a liberdade de contratar, preservando, legalmente, valores fundamentais ligados à dignidade humana. Assim como a propriedade é vista como um direito-função, no sentido de ser garantida a propriedade natural, condicionado o seu exercício ao fim coletivo, também o contrato deve perquirir este sentido: o bem-estar social".
MIGUEL REALE4, coordenador da comissão encarregada de elaborar o projeto do novo Código Civil, comentando a introdução desse princípio das disposições gerais aplicadas ao contrato, afirma que o fato do contrato ser produto da autonomia da vontade,
“não quer dizer que essa vontade deva ser incontrolada: a medida de seu querer nasce de uma ambivalência, de uma correlação essencial entre o valor do indivíduo e o valor da coletividade. O contrato é um elo que põe o valor do indivíduo como aquele que o cria; mas, de outro lado, estabelece a sociedade como lugar onde o contrato vai ser executado e onde vai receber uma razão de equilíbrio e de medida”.
Aprofundada análise da conceituação da função social do contrato foi feita por XXXXXXX XXXXXX XXXXXXXX, em artigo intitulado A
4 XXXXX, Xxxxxx. O Projeto de Código Civil – Situação atual e seus problemas fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 10.
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Função Social do Contrato no Novo Código Civil, publicado via internet, no site: xxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx. O mencionado autor, Professor do Curso de Direito da FMU, assinala que, atualmente, o direito se volta para tornar eficaz a função social sem sentido lato. Concebe a função social como significando "a prevalência do interesse público sobre o privado, bem como'a magnitude' do proveito coletivo em detrimento do meramente individual", sendo, conseqüentemente, um "fenômeno massivo que, modernamente, inspira todo o nosso ordenamento jurídico, rompendo com o seu padrão retributivo contido no brocardo suum cuique tribuere - 'dar a cada um o seu', e tentando fundaras bases de uma justiça de natureza mais distributiva, nos termos concebidos por XXXXX, promovendo a inclusão social dos excluídos e, nesse mister, diligenciando para cumprimento de um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, que é erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais".
Após analisar a presença do fenômeno da função social da propriedade e da família, classificando-o como fato integrante da terceira geração de direitos, volta-se para o contrato, escrevendo:
“Desta feita, é de verificar-se que a função social incide sobre toda a fenomenologia jurídica, encontrando morada, também, nas relações contratuais. O novo Código Civil, atento a esta miríade trazida pelos direitos de terceira geração, previu, em seu art. 421, que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, afastando, dessa forma, o individualismo jurídico arquitetado por CLÓVIS BEVILÁQUA que, nesse sentido, fora inspirado' peio Código Civil francês e, naturalmente, pelos ideais revolucionários que influenciaram sobejamente a gênese dessa lei.”
A seguir, posiciona-se com a afirmação de que
"a função social do contrato exprime a necessária harmonização dos interesses privativos dos contraentes com os interesses de toda a coletividade, em outras palavras, a compatibilização do princípio da liberdade com o da igualdade, vez que para o liberal o fim principal é a
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expansão da personalidade individual e, para o igualitário, o fim principal é o desenvolvimento da comunidade em seu conjunto, mesmo que ao custo de diminuir a esfera de liberdade dos singulares".
Entende que
"a instituição da função social dos contratos, portanto, findou a celeuma, muito mais terminológica do que propriamente doutrinária, acerca das dessemelhanças entre liberdade contratual e liberdade de contratar, vez que a liberdade contratual, que equivale à função social do contrato, é limitada objetivamente pela ordem pública e pela maior valia dos direitos e interesses coletivos sobre os eminentemente individuais e a liberdade de contratar é a prerrogativa subjetiva, que cada contratante possui, de arbitrar sobre a viabilidade ou não de formalizar determinada contratação".
XXXXX XXXX XXXXX LOBO5 ao examinar o princípio da função social do contrato, emite o seguinte pensamento:
“O princípio da função social determina que os interesses individuais das partes do contrato sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais, sempre que estes se apresentem. Não pode haver conflito entre eles, pois os interesses sociais são prevalecentes. Qualquer contrato repercute no ambiente social, ao promover peculiar e determinado ordenamento de conduta e ao ampliar o tráfico jurídico.”
Explica, mais adiante, o sentido do art. 421 do Código Civil de
2002:
“No Código Civil de 2002, a função social surge relacionada à liberdade de contratar, como seu limite fundamental. A liberdade de contratar, ou autonomia privada, consistiu na expressão mais aguda do individualismo jurídico, entendida por muitos como o toque de especificidade do direito privado. São dois princípios antagônicos que exigem aplicação harmônica. No Código, a função social não é simples limite externo ou negativo, mas limite positivo, além de determinação de conteúdo da liberdade de contratar.
5 XXXX, Xxxxx Xxxx Xxxxx. Princípios Contratuais. In: A Teoria do Contrato e o Novo Código Civil. Nossa Livraria, p. 15-16.
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Esse é o sentido que decorre dos termos 'exercida em razão e nos limites da função social do contrato* (art. 421).”
3 - OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL NA ÉPOCA CONTEMPORÂNEA
A doutrina anterior ao Código Civil de 2002 estabelecia os princípios fundamentais que deviam ser atendidos por todos os que se envolvessem em uma relação contratual.
É de ser relembrado alguns posicionamentos.
ORLANDO GOMES6 defendia a existência de quatro princípios fundamentais do regime contratual:
a) o da autonomia da vontade;
b) o do consensualismo;
c) o da força obrigatória;
d) o da boa-fé.
aplicados:
SÍLVIO RODRIGUES7 entendia que apenas três princípios eram
a) o da autonomia da vontade;
b) o da relatividade das convenções;
c) o da força vinculante dos contratos.
MARIA HELENA DINIZ8 defendia cinco princípios fundamentais:
a) a autonomia da vontade;
b) o do consensualismo;
6 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 21 .ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 22.
7 XXXXXXXXX, Xxxxxx. Direito Civil. 23.ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 3, p. 15.
8 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 1989, v.3, p. 27-32.
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c) o da obrigatoriedade da convenção;
d) o da relatividade dos efeitos do negócio contratual;
e) o da boa-fé.
WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO9 entendia que apenas três princípios imperavam sobre a relação contratual:
a) o da autonomia da vontade;
b) o da supremacia da ordem pública;
c) o da obrigatoriedade da convenção.
princípios:
CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA10 destacou, também, três
a) o da autonomia da vontade;
b) o da obrigatoriedade;
c) o do consensualismo.
Esses doutrinadores só no final do Século XX é que começaram a admitir a possibilidade da imperatividade do princípio da função social do contrato.
Atualmente, ao lado dos princípios acima enumerados, atua o previsto pelo Código Civil de 2002 no corpo do art. 421. Esta norma, embora não afaste o princípio da autonomia da vontade, porém, o vincula à “exigência teleológica de que o contrato deve cumprir função social, além de servir como instrumento de regulação privada do comportamento dos contratantes”, conforme, de modo feliz, acentua XXXXXXXX XXXXXXXXXX, sm artigo intitulado Efeitos do Contrato, publicado na obra
9 MONTEIRO, Xxxxxxxxxx xx Xxxxxx. Curso de Direito Civil. 1O.ed. São Paulo: Saraiva, 1975, v.2, p. 9.
10 XXXXXXX, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx. Instituições de Direito Civil. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1975, v.III, p. 14.
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coletiva A Teoria do Contrato e o Novo Código Civil, Editora Nossa livraria, p. 170.
O referido autor, de modo correto, afirma que o princípio da função social do contrato “tem seu fundamento de validade no direito positivo brasileiro, no princípio constitucional da função social da propriedade (CF, art. 170, III), segundo o qual o exercício dos direitos de propriedade deverá respeitar e se harmonizar com os princípios constitucionais supra-ordenadores, como, por exemplo, com os direitos individuais (CF, art. 5º) e sociais (CF, art. 7º), assim como frente ao princípio da justiça social (CF, art. 170, caput)”.
Essa sintonia entre o princípio da função social do contrato com o princípio da função social da propriedade foi vista por MESSINEO, em sua obra Doctrina General del Contrato, traduzida por R. O. FONTANARROSA, XXXXXXXX SENTIS MELENDO e M. VOLTERRA, publicada
No curso das investigações doutrinárias sobre a função social do contrato, entendo que possuem cunho de alta significação o pregado por XXXXXXX XXXXX XXXXXX, em sua obra Função Social, Lesão e
11 Registro que XXXXXXX XXXXX XXXXXX, na obra Função Social - Lesão e Onerosidade Excessiva nos Contratos cita, também, o trecho acima identificado como sendo de MESSINEO.
Onerosidade Excessiva nos Contratos, Editora Método, pp. 126/127, quando adverte:
“A função social do contrato obriga a todos do mundo jurídico a harmonizar o direito com a vontade de lucrar muito e mais como é próprio do sistema capitalista. Além de enxergar o contrato como instrumento jurídico, terá de observar que ele tem forte conteúdo de justiça e de utilidade.
Junto a esta consideração jurídica, de cariz estritamente de direito privado, o caráter social do contrato deve predominar sobre o individual. O contrato deixa de ser considerado um tema particular, interessante somente para as partes contratantes. Na vida econômica e social, o contrato não afeta somente interesses dos que nele intervêm, mas se transforma numa instituição social. Dentro deste critério, XXXXX XXXXXX XXXX (Los contratos civiles. Nuevas perspectivas. Granada: Cornares, 1992, p. 15) observou com justeza que a sociedade representada pelo Estado ou outras entidades soberanas são responsáveis pelo controle de uma parte essencial do direito contratual. Esta fiscalização se manifesta principalmente nos chamados contratos de massa por meio de leis que estabelecem em todo ou em parte as condições contratuais para negócios jurídicos de importância social.”
O dogma de que as partes devem seguir, rigorosamente, as cláusulas ajustadas não tem, portanto, a predominância dos tempos passados.
O contrato, tanto em sua formação, como na sua fase de execução, deverá harmonizar a autonomia da vontade com a função social que exerce na contextura social. O ordenamento jurídico abandonou a fase individualista e patrimonial para adentrar, com absoluta segurança, em ambiente que assegure uma humanização dos negócios jurídicos contratuais. Há uma transformação imposta ao direito privado que, embora não o desconfigure, passa a ser regido por princípios que visam a diminuir os efeitos de forças dominantes que, ainda, pregam o liberalismo econômico.
É de ser registrado que o Conselho da Justiça Federal, por ocasião da I Jornada de Estudos sobre o Novo Código Civil, estabeleceu enunciados sobre a função social do contrato, na forma a seguir registrada:
a) Enunciado 21 - Art. 421: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, a impor a revisão do principio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito.
b) Enunciado 22 - Art. 421: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas.
c) Enunciado 23 - Art. 421: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana.
Há, em vista de tudo quanto foi exposto, uma nova ordem jurídica contratual onde novos princípios ganham relevo, tudo com a finalidade de resguardar nas relações ajustadas a boa-fé negocial, a eqüidade, a justiça, a transparência, a confiança, a satisfação dos interesses dos contratantes, a autonomia da vontade, porém, respeitando-se a função social que deverá ter o pacto firmado.
4 - 0 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO NO DIREITO COMPARADO
O Código Civil da França, não obstante conter um capítulo determinando as disposições preliminares aplicadas ao contratos e às obrigações contratuais em geral, não registra qualquer regra sobre a função social do contrato.
O mencionado capítulo é formado pelos artigos 1.101 a 1.107.
Estes dispõem:
“Título III - De los contratos o de las obligaciones contractuales en general
Capítulo I: Disposiciones preliminares
Artículo 1101 - El contrato es un convenio por el cual una o varias personas se obligan, frente a una u otras varias, a dar, hacer o no hacer algo.
Artículo 1102 - El contrato es sinalagmático o bilateral cuando las partes se obligan reciprocamente una con respecto a la otra.
Artículo 1103 - Es unilateral cuando una o varias personas se obligan frente a una o varias otras, sin que haya compromiso por parte de estas últimas.
Artículo 1104 - Es conmutativo cuando cada una de las partes se obliga a dar o hacer una cosa que se contempla como equivalente a aquello que le es dado o a aquello que se hace para ella. El contrato es aleatorio cuando la equivalencia consiste en la posibilidad de ganancia o perdida para cada una de las partes que depende de un acontecimiento incierto.
Artículo 1105 - El contrato de beneficencia es aquel por el cual una de las partes procura a la otra un beneficio puramente gratuito.
Artículo 1106 - El contrato a título oneroso es aquel que obliga a cada una de las partes a dar o hacer algo.
Artículo 1107 - Los contratos, tengan o no una denominación propia, estarán sometidos a las regias generales que son objeto del presente título. Las regias particulares para ciertos contratos se establecen bajo los títulos relativos a cada uno de ellos; y las regias particulares para las transacciones comerciales se establecen por las leyes relativas al comercio.
Capítulo II: De los requisitos esenciales para la validez de los contratos
Artículo 1108 - Cuatro requisitos son esenciales para la validez de un contrato:
El consentimiento de la parte que se obliga; Su capacidad de contratar;
Un objeto cierto que forme la materia del compromiso; Una causa lícita en la obligación.”
O Código Civil da República da Nicarágua não tem qualquer determinação legal no sentido de homenagear a função social do contrato.
As disposições gerais sobre o contrato são as seguintes:
“TÍTULO VII – DE LOS CONTRATOS
Capítulo I Disposiciones generales
Arto. 2435. Contrato es un acuerdo de dos o más personas para constituir, regular o aclarar entre las mismas un vinculo jurídico.
Arto. 2436. Además de las condiciones indispensables para la validez de las obligaciones en general, se requiere, para las que nacen de contrato el consentimiento, y que se cumplan las solemnidades que la ley exija.
Arto. 2437. Los contratantes pueden establecer los paetos, cláusulas y condiciones que tengan por conveniente, siempre que no sean contrarios a las leyes, a la moral, ni al orden público.
Arto. 2438. La validez y el cumplimiento de los contratos no pueden dejarse al arbitrio de uno de los contratantes.
Arto. 2439. Los contratos sólo producen efectos entre las partes que los celebran y sus herderos; salvo, en cuanto a estos, el caso en que los derechos y obligaciones que proceden del contrato no sean transmisibles, ya por su naturaleza, ora por pacto o por disposicion de la ley.
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Si el contrato contuviere alguna estipulación en favor de un tercero, éste podrá exigir su cumplimiento, siempre que hubiere hecho saber su aceptación al obligado antes de que aquella haya sido revocada.
Arto. 2440. Xxxxxxx puede contratar a nombre de otro sin estar por éste autorizado, o sin que tenga por la ley su representación legal.
El contrato celebrado a nombre de otro por quien no tenga su autorización o representación legal, será nulo, a no ser que lo ratifique la persona a cuyo nombre se otorgue antes de ser revocado por la otra parte contratante.
Arto. 2441. Cada parte puede ser una o muchas personas.
Arto. 2442. El contrato puede ser unilateral o bilateral, oneroso o gratuito.
Arto. 2443. Es contrato unilateral aquel en que solamente una de las partes se obliga; bilateral, aquel en que resulta obligación para todos los contratantes.
Arto. 2444. Es contrato oneroso aquel en que se estipulan provechos y gravámenes recíprocos, y gratuito aquel en que el provecho es solamente de una de las partes.
Arto. 2445. Es contrato de suerte o aleatorio, si para ambos contrayentes o para uno de ellos, el beneficio depende de un suceso incierto.
Tales son el contrato de seguro, el préstamo a la gruesa, el juego, la apuesta y la renta vitalicia.
Arto. 2446. El contrato es conmutativo, cuando cada una de las partes se obliga a dar o hacer una cosa que se ruira como equivalente a lo que la otra parte debe dar o hacer a su vez.
Capítulo II - De los requisitos esenciales para la validez de tos contratos
Arto. 2447. No hay contrato sino cuando concurran los requisitos siguientes:
1º. Consentimiento de los contratantes.
2º. Objeto cierto que sea material del contrato.
Consentimiento
Arto. 2448. El consentimiento de las partes debe ser libre y claramente manifestado.
La manifestación puede ser hecha de palabras, por telégrafo, telefono, por escrito o por hechos de que necesariamente se deduzca.
Arto. 2449. Desde que la estipulación se acepta, queda perfecto el contrato, salvo que la ley exija alguna otra formalidad; pero en todo caso se tendra como una promesa exigible.
Arto. 2450. El que hace una proposición puede retirarla mientras no haya sido aceptada por la otra parte; pero el contrato propuesto será válido, si la persona o quien se hizo la proposición, la acepta puramente antes de tener noticia de que había sido retirada.
Cuando la aceptación envolviere modificación de la propuesta o fuere condicional, se considerará como nueva propuesta.
Arto. 2451. Si las partes estuvieren presentes, la aceptación debe hacerse en el mismo acto de la propuesta, salvo que ellas acordaren otra cosa.
Arto. 2452. Si las partes no estuvieren reunidas, la aceptación debe hacerse dentro del plazo fijado por el proponente para este objeto. Si no se ha fijado plazo, se tendrá por no aceptada la propuesta, si la otra parte no respondiere dentro de tres días cuando se halle en el mismo distrito; dentro de diez, cuando no se hallare en el mismo distrito, pero si en la República; y dentro de sesenta días, cuando se hallare fuera de la República.
Arto. 2453. El proponente está obligado a mantener su propuesta, mientras no reciba respuesta de la otra parte en los términos fijados en el artículo anterior.
Arto. 2454. Si al tiempo de la aceptación hubiere fallecido el proponente o se hubiere vuelto incapaz, sin que el aceptante fuere sabedor de su muerte o incapacidad, quedarán los
herederos o representantes de aquel obligados a sostener el contrato.
Arto. 2455. Es anulable el contrato en que se consiente por error, cuando este recae:
1º Sobre la espécie dei acto o contrato que se celebra.
2º. Sobre la identidad de la cosa especificada de que se trata, o sobre su sustancia o calidad esencial.
Arto. 2456. El simple error de escritura o de cálculo aritmético, sólo da derecho a que se rectifique.
Arto. 2457. También es anulable el contrato en que se consienta por fuerza o miedo grave.
Arto. 2458. Para calificar la fuerza o intimidación debe atenderse a la edad, sexo y condición de quien las sufra.
Arto. 2459. Para que la fuerza o intimidación vicien el consentimiento, no es necesario que la ejerza aquel que es beneficiado: basta que se haya empleado por cualquiera otra persona, con el objeto de obtener el consentimiento.
Arto. 2460, El dolo no vicia el consentimiento, sino cuando es obra de una de las partes y cuando adernas aparece claramente que sin él no hubiera habido contrato. En los demás casos, el dolo da lugar solamente a la acción de danos y perjuicios contra la persona o personas que lo han fraguado o se han aprovechado de el: contra los primeros, por el valor total de los perjuicios; y contra los segundos, hasta el monto del provecho que han reportado.
Arto. 2461. Es ineficaz la previa renuncia de la nulidad proveniente de la fuerza, miedo o dolo.
Arto. 2462. El error de hecho no produce la nulidad del contrato, sino cuando recae sobre la sustancia de la cosa que constituye su objeto.
Arto. 2463. El error de derecho produce la nulidad del contrato, solo cuando él mismo es la causa única o principal.
Arto. 2464. La violencia es causa también de nulidad del contrato, cuando el mal se dirija a la persona o bienes del cónyuge, ascendiente o descendiente del contratante.
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Tratándose de otras personas, corresponde al Juez faltar sobre la nulidad según las circunstancias.
Arto. 2465. El temor solamente respetuoso, sin que haya intervenido la violência, no es bastante para anular el contrato.
Arto. 2466. El dolo es causa de nulidad cuando los manejos usados por uno de los contratantes sean tales, que el otro no hubiera contratado sin los mismos.
Arto. 2467. El error sobre la persona solo invalidará el contrato cuando la consideración a ella hubiere sido la causa principal del mismo.
Arto. 2468. Hay violencia cuando para arrancar el consentimiento se emplea una fuerza irresistible. Hay intimidación cuando se inspira a uno de los contratantes el temor racional y fundado de sufrir un mal inminente y grave en su persona o bienes o en la persona y bienes de los individuos designados en el artículo 2464.
Arto. 2469. Hay dolo, cuando con palabras o maquinaciones insidiosas de parte de uno de los contratantes, es inducido el otro a celebrar un contrato que, sin ellas, hubiera hecho.
Hay mala fe, cuando uno de los contratantes disimula su error, una vez conocido.
Arto. 2470. Para que el dolo produzca nulidad de los contratos, deberá ser grave y no haber sido empleado por las dos partes contratantes.
El dolo incidental sólo obliga al que lo empleó, a indemnizar daños y perjuicios.
Arto. 2471. Para que el consentimiento sea válido se necesita que el que lo manifiesta sea legalmente capaz.
Arto. 2472. Toda persona es legalmente capaz. Son incapaces en conformidad a los artículos 7 y 8 de este Código, absolutamente, los de por escrito o de otro modo claro o indubitable.
Artos. 299 inc. 3°, 330, 345, 346, 347, 359, 944, 1833,
2204, 2252, 2367 C.
Sus actos no producen ni aún obligaciones naturales y no admiten caución.
Artos. 1840, 1844, 2070, 2201, 2212, 3673 C; B. J. pág.
7432 Cons. III.
Son relativamente incapaces los menores adultos que no han obtenido la declaración de mayores, y los que se hallan bajo interdicción de administrar lo suyo, por sentencia ejecutoriada. Sus actos pueden tener valor en ciertas circunstancias y bajo ciertos respectos determinados por las leyes.
Arto. 2473. Pueden ser objeto de contrato todas las cosas que no están fuera del comercio de los hombres, aún las futuras.
Sobre la herencia futura no se podrá sin embargo celebrar otros contratos que aquellos cuyo objeto sea practicar entre vivos la división de un caudal conforme el artículo 1358.
Pueden ser igualmente objeto de contrato todos los servidos que no sean contrarios a las leyes o las buenas costumbres.
Arto. 2474. No podrán ser objeto de contrato las cosas o servidos imposibles.
Arto. 2475. El objeto de todo contrato debe ser una cosa determinada en cuanto a su especie. La indeterminación en la cantidad no será obstáculo para la existencia del contrato, siempre que sea posible determinaria sin necesidad de nuevo convenio entre los contratantes.
Arto. 2476. Es nulo el contrato cuyo objeto no sea física y legalmente posible.
Artos. 2201 nº 1 C.
Arto. 2477. En los contratos sólo se considera como fisicamente imposible lo que lo sea con relación absoluta al objeto del contrato, pero no a la persona que se obliga.
Arto. 2478. Tampoco pueden ser objeto de contrato las cosas o actos que no se puedan reducir a un valor exigible, ni los actos contrarios a la moral pública o a las obligaciones impuestas por la ley.”
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Postura mais moderna foi adotada pelo Código Civil da Bolívia, conforme a redação das disposições gerais aplicadas aos contratos em geral, especialmente o artigo 454, II, quando impõe limites à liberdade de contratar, quando conflitante, nos termos da lei, a direitos dignos de proteção. A cláusula tem natureza genérica; pelo que, dependendo das circunstâncias que envolvam o contrato, pode a ele se aplicar o princípio da função social. As disposições gerais referidas são:
“TÍTULO I - DE LOS CONTRATOS EN GENERAL CAPÍTULO I
Disposidones generales
Art 450. (NOCION). Hay contrato cuando dos o más personas se ponen de acuerdo para constituir, modificar o extinguir entre si una relación jurídica. (Arts. 110, 294, 352, del Código Civil)
Art. 451. (NORMAS GENERALES DE LOS CONTRATOS. APUCACION A OTROS ACTOS).
I. La normas contenidas en este título son aplicables a todos los contratos, tengan o no denominación especial, sin perjuicio de Ias que se establezcan para algunos de ellos en particular y existan en otros códigos o leyes propias.
II. Son aplicables también, en cuanto sean compatibles y siempre que no existan disposidones legales contrarias, a los actos unilaterales de contenido patrimonial que se celebran entre vivos así como a los actos jurídicos en general. (Arts. 584, 749, 955 del Código Civil)"
CAPÍTULO II
De los requisitos del contrato
Art. 452. (ENUNCIACION DE REQUISITOS). Son requisitos
para la formación del contrato:
1) El consentimiento de las partes.
2) El objeto.
3) La causa.
4) a forma, siempre que sea legalmente exigible.
SECCION I
Del consentimiento
Art 453. (CONSENTIMIENTO EXPRESO O TACITO).
El consentimiento puede ser expreso o tácito. Es expreso si se manifiesta verbalmente o por escrito o por signos inequívocos; tácito, si resulta presumible de ciertos hechos o actos. (Arts. 359, 455, 805 del Código Civil)
SUBSECCION I
De la libertad contraditai y sus limitaciones
Art. 454. (LIBERTAD CONTRACTUAL: SUS LIMITACIONES).
I. Las partes pueden determinar libremente el contenido de los contratos que celebren y acordar contratos diferentes de los comprendidos en este Código.
- II. La libertad contractual está subordinada a los limites impuestos por la ley y a la realización de intereses dignos de protección jurídica. (Arts. 318, 375, 483 del Código Civil).’
O Código Civil de Portugal aplica aos contratos as seguintes disposições gerais:
"Capítulo II - Fonte das obrigações Seção I – Contratos
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais ARTIGO 405°
(Liberdade contratual):
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1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.
ARTIGO406º
(Eficácia dos contratos)
1. O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
2. Em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei.
ARTIGO 407°
(Incompatibilidade entre direitos pessoais de gozo)
Quando, por contratos sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a mesma coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si, prevalece o direito mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do registro.
ARTIGO 408°
(Contratos com eficácia real)
1. A constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as excepções previstas na lei.
2. Se a transferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando a coisa for adquirida pelo alienante ou determinada com conhecimento de ambas as partes, sem prejuízo do disposto em matéria de obrigações genéricas e do contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos naturais ou a partes componentes ou integrantes, a transferência só se verifica no momento da colheita ou separação.
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ARTIGO 409°
(Reserva da propriedade)
1. Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento.
2. Tratando-se de coisa imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a cláusula constante do registo é oponível a terceiros.”
Não há qualquer referência à função social do contrato. O legislador português limitou, apenas, a liberdade de contratar aos limites da lei. Não dispõe, contudo, sobre a identidade dessa limitação.
O Código Civil da Espanha, nas isposições gerais sobre o contrato, é, também, silente sobre a sua função social.
Os artigos 1.254 a 1.260 explicitam:
“Artículo 1.254. El contrato existe desde que una ou varias personas consienten en obligarse, respecto de otra u otras, a dar alguna cosa o prestar algún servicio.
Artículo 1.255. Los contratantes pueden establecer los pactos, cláusulas y condiciones que tengan por conveniente, siempre que no sean contrarios a las leyes, a l moral, ni al orden público.
Artículo 1.256. La validez y el cumplimiento de los contratos no pueden dejarse al arbitrio de uno de los contratantes.
Artículo 1.257. Los contratos sólo producen efecto entre las partes que los otorgan y sus herederos; salvo, en cuanto a estos, el caso en que los derechos y obligaciones que proceden del contrato no sean transmisibles, o por su naturaleza, o por pacto, o por disposición de la ley.
Artículo 1.258. Los contratos se perfeccionan por el mero consentimiento, y desde entonces obligan, no solo al cumplimiento de lo expresamente pactado, sino también a todas las consecuencias que, según su naturaleza, sean conformes a la buena fe, al uso y a la lei.
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El contrato celebrado a nombre de otro sin estar por quien no tenga su autorización o representación legal será nulo, a no ser que Io ratifique la persona a cuyo nombre se otorgue antes de ser revocado por la otra parte contratante.
Artículo 1.260. No se admitirá juramento en los contratos. Si se hiciere se tendrá por no puesto.”
A análise do Direito Comparado demonstra o avanço adotado pelo Código Civil de 2002 a respeito do tema ora enfrentado.
5 - CONCLUSÃO
A breve análise da função social do contrato acima realizada permite que, do que se colheu de vários pronunciamentos doutrinários, sejam firmadas as seguintes conclusões:
a) A função social do contrato concretiza-se quando as partes emitem comportamentos estruturados na solidariedade (CF, art. 3º, I), na justiça social (art. 170, caput da CF), na livre iniciativa, no respeito à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e não ferirem valores ambientais (Código de Defesa do Consumidor, art. 51, XIV), conforme sugere XXXXXX XXXX XXXXXX, em Contratos no Código Civil, escrito em homenagem ao Prof. XXXXXX XXXXX, publicado na obra coletiva O Novo Código Civil, LTr, p.427.
b) A função social do contrato prevista no art. 421 é uma cláusula geral12 que, conseqüentemente, exigirá do juiz o cuidado para definir os limites da sua aplicação, diante do caso concreto.
12 O Código Civil de 2002 adotou á técnica de prestigiar as chamadas cláusulas gerais. Esse fenômeno aumenta a responsabilidade do juiz porque será chamado a complementar, em face de cada caso concreto, a norma aberta. Ao analisar essas cláusulas gerais, afirmei o que passo a registrar.
2. AS CLÁUSULAS GERAIS NO CÓDIGO CIVIL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMPATIBILIDADE. O Código Civil de 2002, por inspiração da Comissão que o projetou, seguindo tendência do modelo presente no Código Civil alemão, fez opção para constituir-se como sendo um sistema composto por regras móveis, que,
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durante o transcorrer do tempo de sua aplicação, permite, pela via de sua interpretação, o seu constante aperfeiçoamento. Essa linha seguida pelo Código Civil de 2002 foi detectada, com absoluta precisão, por XXXXXX XXXX XXXXXX e XXXX XXXXX XX XXXXXXX XXXX, na obra que escreveram Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados, RT, 2002, de onde extraímos as manifestações a seguir registradas.
Afirmam que não seria possível, em pleno Século XXI, "legislar-se por normas que definissem precisamente certos pressupostos e indicassem, também de forma precisa, suas conseqüências, formando uma espécie de sistema fechado" (ob.cit., p.4).
A seguir, ditam: "A técnica legislativa moderna sé faz por meio de conceitos gerais indeterminados e cláusulas gerais, que dão mobilidade ao sistema, flexibilizando a rigidez dos institutos jurídicos e dos regramentos do direito positivo"(ob. cit., p.4).
Identificam, mais adiante, que o Código Civil de 2002, em face da impossibilidade de ser fundado, apenas, em cláusulas gerais, utilizou-se do 'método casuístico, notadamente no direito das obrigações, de modo que podemos afirmar que o CC segue técnica legislativa mista, com base nos métodos da casuística, nos conceitos legais indeterminados e das cláusulas gerais" (ob. cit, p. 4).
A definição de cláusulas gerais foi adequadamente investigada pelos autores supra-referidos, conforme consta na obra citada, p. 6.
Sobre o tema, anotam: '17. Cláusulas gerais. Definição. Com significação paralela aos conceitos legais indeterminados, as cláusulas gerais (Generalklauselsn) são normas orientadoras sob forma de diretrizes, dirigidas precipuamente ao juiz, Einführung, Cap. VI, p. 120/121), cujos valores devem ser preenchidos pelo juiz, autorizado para assim agir em decorrência da formulação legal da própria cláusula geral, que tem natureza de diretriz (LARENZ-WOLF. Allg.Teil, § 3º, IV, n. 94, p.82/83). Distinguem-se dos conceitos legais indeterminados pela finalidade e eficácia, pois aqueles, uma vez diagnosticados pelo juiz no caso concreto, já têm sua solução preestabelecida na lei, cabendo ao juiz aplicar referida solução. Estas, ao contrário, se diagnosticadas pelo juiz, permitem-lhe preencher os claros com os valores designados para aquele caso, para que se lhe dê a solução que ao juiz parecer mais correta, ou seja, concretizando os princípios gerais de direito e dando aos conceitos legais indeterminados uma determinalidade pela função que têm de exercer naquele caso concreto. V. XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Codificação e cláusulas gerais, RTDCiv 2/3-25; XXXXXXX XXXXX, Xxxxxx. As cláusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema jurídico, RT 680/47-58; XXXXXXX XXXXX, Xxxxxx. O direito privado como 'sistema em construção: As cláusulas gerais no projeto do Código Civil brasileiro, RT 753/24-48." Após a fixação do entendimento jurídico sobre cláusulas gerais, XXXXXX XXXX XXXXXX e XXXX XXXXX XX XXXXXXX XXXX, ob. cit, p. 6, abordam as funções das cláusulas gerais e a sua natureza jurídica. Da exposição que desenvolveram, firmamos as conclusões abaixo:
a) a adoção de cláusulas gerais pelo Código Civil de 2002 contribui para mitigar as regras mais rígidas e fechadas do sistema e permite que haja concretização dos princípios gerais de direito e dos conceitos legais indeterminados;
b) o juiz, em face da presença de cláusulas gerais no texto do Código Civil de 2002, passa a exercer, na função de interpretá-las, papel de suma importância, porque será agente responsável para a sua instrumentalização, "preenchendo com valores, o que se encontra abstratamente contido nas referidas cláusulas gerais" (XXXXXX, Xxxx. Wegweiser Zurichteriicher Rechtsschopfung, in FS Nikisch, p. 275/305, apud XXXX XXXXXX, Xxxxxx; XXXX, Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. ob. cit.,p.6);
c) "as cláusulas gerais têm função instrumentalizada, porque vivificam o que se encontra contido, abstrata e genericamente, nos princípios gerais de direito e nos conceitos legais indeterminados", pelo que elas 'são mais concretas e efetivas do que esses dois institutos" (idem, p. 6);
d) a natureza jurídica da cláusula geral não é a de principio, nem se apresenta como sendo regra de interpretação; ela é, substancialmente, "norma jurídica, isto é, fonte criadora de direito e obrigações", conforme posicionamento de XXXXXX XXXXXXX XXXXX, no artigo As cláusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema jurídico, RT, v. 680, p. 50, citado por Xxxxxx Xxxx Xxxxxx e Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx. Obra já referida, p. 6.
O Código Civil de 2002 contém cláusulas gerais presentes em vários dos seus artigos.
Identificamos, desde logo, as cláusulas gerais que possuem maior importância pela abrangência dos seus efeitos e que se apresentam compatíveis com a Constituição Federal de 1988.
Elas estão presentes nos dispositivos seguintes:
a) Artigo 421: "A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato".
A função social do contrato impõe determinado limite à autonomia privada. Essa é uma nova linha ideológica que passa a figurar no campo do nosso direito comum, alterando o espírito individualista presente no Código Civil de 1916 e impondo uma visão interpretativa socializante nas normas disciplinadoras das relações jurídicas. A autonomia privada continua a ser respeitada. Não haverá homenagem a posicionamentos individualistas. Os
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interesses particulares cederão diante dos imperativos éticos pregados pela Constituição Federal, a partir dos ditames constitucionais que exigem objetivos de valorização da dignidade humana, da cidadania e da valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.
b) Arts. 186 e 187: O artigo 186 dita que: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
O artigo 187 está assim redigido: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes".
A vinculação dos atos ou negócios jurídicos aos seus fins sociais, econômicos, aos bons costumes e à boa-fé é regra imperativa.
A prática do ato ilícito enseja a apuração da responsabilidade do autor pelo dano provocado. Essa responsabilidade pode concretizar-se tanto nas relações jurídicas contratuais, como nas extracontratuais. Xxxxxx Xxxx Xxxxxx e Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx. Obra citada, p. 92, identificam as seguintes cláusulas gerais na responsabilidade extracontratual. Afirmam:
"Pode-se dizer que há algumas cláusulas gerais extraídas do sistema do CC, para responsabilidade extracontratual. Há o direito de o prejudicado ser indenizado e o dever de o ofensor indenizar quando: a) a ofensa se der a qualquer direito (patrimonial material ou imaterial - como o moral, à imagem, da personalidade, etc); b) a ofensa ocorrer em desrespeito a norma de ordem pública imperativa (v.g. abuso de direito - CC, 187); direito protegido por norma imperativa: constitucional, penal, administrativa, etc); c) o dano causado for apenas moral; d) por expressa especificação legal, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem, independentemente de dolo ou culpa (responsabilidade objetiva - CC, 927 parágrafo único); e) a ofensa se der por desatendimento à boa-fé e aos bons costumes".
Essas cláusulas gerais atuam com o objetivo fundamental de cumprir preceitos constitucionais de valorização da dignidade humana e da cidadania, especialmente os voltados para o fato de o autor do ilícito, quer material, quer moral, indenizar o ofendido como forma de reparação do dano produzido.
c) Art. 422: 'Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé".
O princípio da boa-fé, embora seja um conceito jurídico indeterminado, está inserido em nosso ordenamento jurídico por disposição expressa contida na Constituição Federal, quando proclama uma atuação do Estado e dos particulares voltada para concretização da justiça social, da moralidade, da proporcionalidade, da razoabilidade e da segurança jurídica. A boa-fé exprime uma regra de honestidade que deve ser seguida em qualquer tipo de relação jurídica, quer de ordem privada, quer de ordem pública.
d) Art. 623: "Mesmo após iniciada a construção, pode o dono da obra suspendê-la, desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros relativos aos serviços já feitos, mais indenização razoável, calculada em função do que ele teria gasto, se concluída a obra".
A expressão “indenização razoável" é uma cláusula geral, cujos limites deverão ser encontrados pelo juiz. O Código Civil de 1916 não continha esse dispositivo. Ele está de acordo com o princípio implícito da razoabilidade que integra o sistema constitucional. A razoabilidade evita os excessos, não permitindo qualquer tipo de privilégio, quer nos vínculos públicos, quer nos privados.
e) Art. 1208: 'Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade".
Vai caber ao juiz dizer quais os elementos integrantes de "atos de mera permissão ou tolerância", bem como a ação que caracteriza violência ou clandestinidade. Há harmonia dessas cláusulas gerais com os princípios da legalidade e da igualdade. Todos estão sujeitos às determinações legais, pelo que só será considerado como constituída a posse quando for possível o exercício, em nome próprio, sobre o bem, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
f) Art. 1634, VII: 'Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: (...) VIII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição".
"Serviços próprios de sua idade e condição" constituem expressão caracterizadora de uma cláusula geral. Só o juiz é quem faz determinar quais sejam os serviços próprios da idade e condição do filho, examinando os variados aspectos que cercam a vida familiar e social do exigido. Essa cláusula geral é desdobramento do art 229 da Constituição Federal: 'Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência e enfermidade".
g) Art. 868: "O gestor responde pelo caso fortuito quando fizer operações arriscadas, ainda que o dono costumasse fazê-las, ou quando preterir interesse deste em proveito de interesses seus".
"Operações arriscadas" e “interesse deste em proveito de interesses seus" são cláusulas gerais. Elas exigirão identificação pelo juiz do alcance de seus efeitos.
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c) O princípio da função social do contrato poderá determinar que a parte seja chamada a indenizar os prejuízos causados a outrem por a ela ter desatendido.
d) É de ordem pública a norma do art. 421, pelo que pode ser aplicada pelo juiz, de ofício, em qualquer ação judicial.
h) Art. 927, parágrafo único: “Haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”
É cláusula geral a expressão "... atividade normalmente desenvolvida pelo autor". O dano pode ser material ou moral. Esse preceito constitui um princípio decorrente do Estado democrático. Não há necessidade que a lei, expressamente, faça constar essa obrigação, pois tal garantia decorre do que dispõe o § 2º do artigo 5º da Constituição Federal: "Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela - adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte". A responsabilidade da pessoa causadora de dano a outrem é regra de conduta assegurada não só pelo ordenamento jurídico interno, bem como pelos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil tenha participado, i) Há de se reconhecer a existência de uma forte e válida "... conexão entre as normas do art. 5º, V e X, constitucional, e as cláusulas gerais dos arts. 12, 21, 187 e as regras dos arts. 927 e seu parágrafo único e 944 do Código Civil e ainda, se for o caso, as regras dos arts. 287,644 e 645 do Código de Processo Civil ou, havendo relação de consumo, do art 84, caput, do Código de Defesa do Consumidor".
As cláusulas gerais, conforme advertência de XXXXXX XXXXXXX XXXXX e XXXXXX XXXX XXXXXX XXXXXX, na obra Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro, Saraiva, p. 99, "... permitem tanto a ligação intra-sistemática (entre as normas do próprio Código) quanto a conexão intersistemática (por exemplo, entre o Código e a Constituição) e mesmo extra-sistemática (remetendo o intérprete para fora do sistema jurídico a fim de concretizar determinado valor ou diretiva)".
A interpretação das cláusulas gerais não pode deixar de "considerar o conjunto de diretrizes que norteou a elaboração do Novo Código Civil, a saber a sistemacidade, a operabilidade, a eticidade e a socialidade".
A adoção do sistema aberto pelo Código Civil de 2002 permite que os seus dispositivos sejam constantemente atualizados, pela via da atuação dos Tribunais ou pela presença do legislador, atendendo às exigências sociais do momento que esteja sendo vivenciado.
No particular, as cláusulas gerais inseridas no sistema, com os seus conceitos vagos e indeterminados, contribuem para que o juiz, ao aplicá-las, ajuste-as a cada caso concreto, escolhendo, em face da situação vivenciada, a solução mais adequada para resolver o conflito.
O Código Civil de 2002 adotou técnica de apresentação de suas regras que facilita os aspectos ligados aos fenômenos de sua operabilidade. Segue filosofia germânica ao dividir-se em uma Parte Geral e em uma Parte Especial, ambas compostas por cinco livros. Essa opção foi defendida por XXXX XXXXXX XXXXXXX XXXXX, seguidor, nesse campo, dos pandectistas alemães do Séc. XIX.
A eticidade está presente no Código Civil de 2002 em vários artigos. Ela é um valor substancial para o alcance da dignidade humana, objetivo hoje posto na Constituição Federal (art. 2º II) e que se espalha pelas mais variadas formas de relações jurídicas, consubstanciando exigência de um comportamento ético pelas partes, protegendo a confiança, a lealdade e boa-fé nos negócios jurídicos.
Os artigos 113, 187 e 422 do novo Código Civil, ao incorporarem, expressamente, o princípio da boa-fé no nosso ordenamento privado, põem em ação a força da eticidade.
Essas regras atuam mediante três funções bem definidas e que foram marcadas por XXXXXX XXXXXXX XXXXX e XXXXXX
XXXX XXXXXX XXXXXX, na obra Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro, Saraiva, p. 61/63.
As três funções referidas são: a) no art. 113 a boa-fé é "tratada como norma de interpretação dos negócios jurídicos"; b) o art. 187 é utilizado "como um limite interno do direito subjetivo, pois o direito que for exercido contrariamente à boa-fé é considerado abusivo e o ato é classificado como ilícito"; c) o art. 422 é uma "norma de conduta para os contratantes no processo obrigacional".
A socialidade está caracterizada pela preocupação do Código Civil de 2002 com a função social do contrato, da propriedade e da posse.
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e) A função social do contrato visa a prestigiar o equilíbrio entre os contratantes.
f) O juiz pode, em decorrência da aplicação do princípio da função social do contrato, emitir sentença:
f.1 - reduzindo o percentual de juros acordados em determinada relação contratual;
f.2 - proclamando a inexistência do contrato por falta de
objeto;
f.3 - declarando a sua nulidade por fraude à lei imperativa (CC, art. 166, VI);
f. 4 - convalidando o contrato anulável (CC, arts. 171 e
f.5 - reduzindo a prestação de uma das partes quando entender que, em razão de situação econômica comprovada, está exagerada ou desproporcional;
f.6 - determinando a sua resolução em caso de onerosidade excessiva (art. 478).
g) “A função social do contrato, enfim, garante a humanização dos pactos, submetendo o direito privado a novas transformações e garantindo a estabilidade das relações contratuais, sensível ao ambiente social em que ele foi celebrado e está sendo executado, e não, apenas, a submissão às regras de um mercado
13 As situações concretas elencadas que permitem a aplicação da função social citadas foram extraídas da obra Código Civil Anotado, de XXXXXX XXXX XXXXXX e XXXX XXXXX XXXX XXXXXXX, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2ª edição, 2003, na parte que comentou o art. 421
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h) A função social do contrato tem por objetivo evitar que, no negócio jurídico, nenhuma das partes seja lesada. O art. 421 do Código Civil de 2002 determina a incorporação ao direito subjetivo das partes que o contrato seja exercido de forma que busque satisfazer um resultado social.
j) "Dispositivo correlato ao art. 421, embora com efeitos para além do âmbito contratual, é o art. 187, cujo conteúdo normativo está assim disposto: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”16
I) "O princípio da função social do contrato harmoniza-se com a modificação substancial relativa à regra básica de interpretação dos negócios jurídicos introduzida pelo art. 112 do Código Civil de 2002, que abandonou a investigação da intenção subjetiva dos figurantes em favor da declaração objetiva, socialmente aferível, ainda que contrarie aquela."17
14 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Função Social, Lesão e Onerosidade Excessiva nos Contratos. São Paulo: Método, 2002, p.
15 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx. Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, p. 372, ao comentar o art 421.
16 BRAGA NETTO, Xxxxxx Xxxxxxx. A Responsabilidade Civil e a Hermenêutica Contemporânea. In: A Teoria do Contrato e o Novo Código Civil. Nossa Livraria, p. 271.
17 XXXX, Xxxxx Xxxx Xxxxx. Princípios Contratuais. In: A Teoria do Contrato e o Novo Código Civil. Nossa Livraria, p. 17.
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m) A função social, a equivalência material e a boa-fé objetiva são considerados os três princípios sociais do contrato.
n) De acordo com SYLVIO CAPANEMA DE SOUZA18 Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
“... função social do contrato é fazer com que o contrato se transforme num instrumento da construção da dignidade do homem, da eliminação da miséria, das injustiças sociais, fazer com que os contratos não estejam apenas a serviço dos contratantes, mas também da sociedade, construindo o que se convencionou chamar o Estado do Bem-Estar Essa função social dos contratos também está referida no campo dos direitos reais no que tange à posse e à propriedade”.
18 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx de. Dos Contratos no Novo Código Civil. In: Revista da EMERJ, v. 5, n. 20, p. 91, 2002.
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