DESPACHO Nº 393/2021 - GAB
ESTADO DE GOIÁS PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO
GABINETE
PROCESSO: 000000000000000
INTERESSADO: ELCI XXXXXXXXX XXXXXX ASSUNTO: CONSULTA.
DESPACHO Nº 393/2021 - GAB
EMENTA: CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL URBANO ADQUIRIDO DO ESTADO DE GOIÁS SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 17.545/2012. SUPERVENIÊNCIA DA LEI ESTADUAL Nº 20.954/2020. ADOÇÃO DO ÍNDICE NACIONAL DE PREÇOS AO CONSUMIDOR AMPLO (IPCA) PARA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO SALDO DEVEDOR DO CONTRATO E, CONSEQUENTEMENTE, DAS PARCELAS. APLICAÇÃO IMEDIATA DO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA PREVISTO NA LEI NOVA, A PARTIR DA SUA ENTRADA EM VIGOR, ÀS PARCELAS VINCENDAS.
1. Trata-se de requerimento de revisão do índice de correção monetária do saldo devedor do contrato de promessa de compra e venda firmado em 19/11/2018 com o Estado de Goiás, relativamente ao imóvel compreendido pelo lote 08, da quadra 193, com área de 588,01 metros quadrados, situado na Avenida Rio Verde, Setor Xxxxx Xxxxxxxx, nesta Capital, adquirido pelo ocupante Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx xx Xxxx, quando vigente a Lei estadual nº 17.545/2012, que dispunha sobre a regularização fundiária de ocupação de imóveis urbanos de domínio do Estado.
2. O interessado alega que o IGP-DI (índice adotado no contrato) dos últimos 12 meses foi de 23,07% e que a correção aplicada é incompatível e desproporcional à atualização de sua renda, bem como da população em geral, e que o país vive um momento de crise, requerendo que seja realizado o recálculo do reajuste do saldo devedor do contrato firmado, aplicando-se o IPCA, que é o índice adotado pela Lei estadual 20.954/2020, que revogou a Lei estadual nº 17.545/2012.
3. A matéria foi analisada pelo Parecer PPMA nº 24/2021 (000018061558), o qual orientou a matéria em questão, concluindo que:
“5. A Lei Estadual nº 20.954/20 que dispõe sobre a regularização fundiária de ocupação de imóveis urbanos de domínio do Estado de Goiás, trouxe a seguinte previsão quanto à atualização das parcelas dos contratos de compra e venda, in verbis:
Art. 10. Em ocupações para fins residenciais ou mistas a venda poderá ser realizada mediante pagamento à vista ou parcelado, obedecendo aos seguintes critérios:
(...)
§ 1º O parcelamento previsto nos incisos I e II deste artigo será atualizado monetariamente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo — IPCA, ou por índice que venha a substituí-lo.
6. Tendo em vista que a lei revogada não previa o indicador econômico que deveria ser usado para a atualização das parcelas, bem como que a lei revogadora trouxe expressamente referida previsão, deverá ser aplicada a nova lei ao presente contrato de compra e venda a partir do início da data de sua vigência, passando a prever que as parcelas serão atualizadas monetariamente pelo IPCA, uma vez que os efeitos da lei revogadora devem ser aplicados aos contratos já vigentes à época da sua entrada em vigor. Portanto, até a data de 31/12/2020 deverá ser aplicada a Lei Estadual nº 17.545/12.
7. Ante o exposto, nos manifestamos favoráveis à aplicação da Lei Estadual nº 20.954/20, passando o presente contrato a prever que a atualização monetária das parcelas se dará pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, a partir da data da entrada em vigor da referida Lei.”
4. O Procurador-Chefe da PPMA (Despacho PPMA nº 427/2021 - 000018330564) submeteu o caso à apreciação deste Gabinete, trazendo à lume as seguintes observações complementares: i) o índice fixado no contrato representa, atualmente, acréscimo muito superior à inflação, superando, por isso, a mera correção do valor da moeda; ii) nas obrigações por quantia devidas pelo Estado aos particulares, o IPCA é o índice normalmente utilizado pela jurisprudência (citando o REsp 1495146/MG, julgado em 22/02/2018); iii) a Lei estadual nº 20.954/2020 (art. 10, § 1º, e art. 11, caput) utiliza o IPCA como índice preferencial para correção das parcelas nos contratos de compra e venda a prazo; iv) muito embora o contrato anteriormente firmado tenha utilizado índice válido e constitua ato jurídico perfeito, a afastar a aplicação retroativa do índice ora pleiteado pelo requerente, entende acertada a conclusão da parecerista de propor a revisão do contrato, com efeitos ex nunc, a partir da vigência da nova lei, conforme a minuta (000018061985), tanto para afastar injustificado tratamento desigual entre os adquirentes que firmaram contrato com base na lei anterior e aqueles que celebrarem ajuste com base na lei atual, quanto para preservar a base objetiva do negócio celebrado, evitando-se a ocorrência de onerosidade excessiva por reajuste desproporcional do índice de correção; v) a Lei Federal nº 8.666/93, ao estabelecer o regramento geral para contratação da administração pública, em seu art. 65, II, "d", prevê a revisão do contrato para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado; vi) uma vez que o índice de correção monetária aplicado (IGP-DI) não estava previsto na lei estadual nº 17.545/2012, também não se vislumbra ilegalidade na revisão do contrato para utilização de outro índice, em comum acordo dos contratantes e para dar o mesmo tratamento atualmente conferido aos adquirentes de imóveis de acordo com a atual lei de regularização fundiária.
5. A par de todos esses fundamentos hábeis a sustentar juridicamente a possibilidade de aplicação do IPCA como índice de correção monetária às parcelas vincendas do referido contrato de promessa de compra e venda de imóvel, a partir da entrada em vigor da Lei estadual nº 20.954/2020, também deve ser mencionado que a lei que altera o padrão monetário é de aplicação imediata e aceita como constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em reiterada jurisprudência, a exemplo dos seguintes julgados:
APLICAÇÕES EM CERTIFICADOS DE DEPÓSITOS BANCÁRIOS COM VALOR DE RESGATE PRÉ-FIXADO - CDB. DL
2.335 DE 12.6.1987 (CONGELAMENTO DE PREÇOS E SALÁRIOS POR 90 DIAS). PLANO BRESSER. DEFLAÇÃO. TABLITA. APLICAÇÃO IMEDIATA. ALTERAÇÃO DE PADRÃO MONETÁRIO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ATO JURÍDICO PERFEITO. O plano Xxxxxxx representou alteração profunda nos rumos da economia e mudança do padrão monetário do país. Os contratos fixados anteriormente ao plano incorporavam as expectativas inflacionárias e, por isso, estipulavam formas de reajuste de valor nominal. O congelamento importou em quebra radical das expectativas inflacionárias e, por conseqüência, em desequilíbrio econômico-financeiro
dos contratos. A manutenção íntegra dos pactos importaria em assegurar ganhos reais não compatíveis com a vontade que deu origem aos contratos. A tablita representou a conseqüência necessária do congelamento como instrumento para se manter a neutralidade distributiva do choque na economia. O decreto-lei, ao contrário de desrespeitar, prestigiou o princípio da proteção do ato jurídico perfeito (art. 5º XXXVI, da CF) ao reequilibrar o contrato e devolver a igualdade entre as partes contratantes (RE 141190, Relator(a): XXXXX XXXXXX, Relator(a) p/ Acórdão: XXXXXX XXXXX, Tribunal Pleno, julgado em 14/09/2005, DJ 26-05-2006 PP- 00008 EMENT VOL-02234-03 PP-00403).
Ementa: CONSTITUCIONAL E ECONÔMICO. SISTEMA MONETÁRIO. PLANO REAL. NORMAS DE TRANSPOSIÇÃO DAS OBRIGAÇÕES MONETÁRIAS ANTERIORES. INCIDÊNCIA IMEDIATA, INCLUSIVE SOBRE CONTRATOS EM CURSO DE EXECUÇÃO. ART. 21 DA MP 542/94. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO À MANUTENÇÃO DOS
TERMOS ORIGINAIS DAS CLÁUSULAS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. A aplicação da cláusula constitucional que assegura, em face da lei nova, a preservação do direito adquirido e do ato jurídico perfeito (CF, art. 5º, XXXVI) impõe distinguir duas diferentes espécies de situações jurídicas: (a) as situações jurídicas individuais, que são formadas por ato de vontade (especialmente os contratos), cuja celebração, quando legítima, já lhes outorga a condição de ato jurídico perfeito, inibindo, desde então, a incidência de modificações legislativas supervenientes; e (b) as situações jurídicas institucionais ou estatutárias, que são formadas segundo normas gerais e abstratas, de natureza cogente, em cujo âmbito os direitos somente podem ser considerados adquiridos quando inteiramente formado o suporte fático previsto na lei como necessário à sua incidência. Nessas situações, as normas supervenientes, embora não comportem aplicação retroativa, podem ter aplicação imediata. 2. Segundo reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, as normas que tratam do regime monetário - inclusive, portanto, as de correção monetária -, têm natureza institucional e estatutária, insuscetíveis de disposição por ato de vontade, razão pela qual sua incidência é imediata, alcançando as situações jurídicas em curso de formação ou de execução. É irrelevante, para esse efeito, que a cláusula estatutária esteja reproduzida em ato negocial (contrato), eis que essa não é circunstância juridicamente apta a modificar a sua natureza. 3. As disposições do art. 21 da Lei 9.069/95, resultante da conversão da MP 542/94, formam um dos mais importantes conjuntos de preceitos normativos do Plano REAL, um dos seus pilares essenciais, justamente o que fixa os critérios para a transposição das obrigações monetárias, inclusive contratuais, do antigo para o novo sistema monetário. São, portanto, preceitos de ordem pública e seu conteúdo, por não ser suscetível de disposição por atos de vontade, têm natureza estatutária, vinculando de forma necessariamente semelhante a todos os destinatários. Dada essa natureza institucional (estatutária), não há inconstitucionalidade na sua aplicação imediata (que não se confunde com aplicação retroativa) para disciplinar as cláusulas de correção monetária de contratos em curso. 4. Recurso extraordinário a que se nega provimento (RE 212609, Relator(a): XXXXXX XXXXXXX, Relator(a) p/ Xxxxxxx: TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 29/04/2015, DJe-153 DIVULG 04-08-2015 PUBLIC 05-08-2015 EMENT VOL-03993-01 PP-00001).
6. Com esses acréscimos, acolho o Parecer PPMA nº 24/2021 (000018061558) e o Despacho PPMA nº 427/2021 (000018330564), de modo a orientar pela aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo — IPCA na atualização monetária das parcelas vincendas dos contratos de promessa de compra e venda de imóveis adquiridos do Estado de Goiás com fulcro nas leis de regularização fundiária anteriores (Lei estadual nº 17.545/2012 e antecessoras), a partir da entrada em vigor da Lei estadual nº 20.954/2020, de 30 de dezembro de 2020.
7. Matéria orientada, retornem-se os autos à Secretaria de Estado da Administração, via Procuradoria Setorial. Antes, porém, dê-se ciência da presente orientação à Chefia da PPMA, para que a replique entre os demais integrantes da Especializada, aos Procuradores Setoriais da Administração direta e indireta do Estado, bem como à Chefia do CEJUR, esta última para o fim declinado no art. 6º, § 2º, da Portaria nº 127/2018 GAB.
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx
Procuradora-Geral do Estado
GABINETE DA PROCURADORA-GERAL DO ESTADO.
Documento assinado eletronicamente por XXXXXXX XXXXXXX XXXXX PRUDENTE, Procurador
(a) Geral do Estado, em 15/03/2021, às 15:30, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.
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Referência: Processo nº 000000000000000 SEI 000019148332