Parecer Jurídico SMLC/DJ nº 639/2023
Parecer Jurídico SMLC/DJ nº 639/2023
Ementa: Prorrogação de Contrato nº 288/2018 firmado com Mecanicapina Limpeza Urbana Ltda. Secretaria Municipal de Serviços Urbanos. Artigo 57, inciso II e §4º da Lei nº 8.666/1993. Parecer favorável.
I. RELATÓRIO.
1. Trata-se na espécie de processo administrativo, protocolado no sistema SEI sob o nº 23.0.000035772-3, que visa a prorrogação do Contrato nº 288/2018, pelo período de 12 (doze meses), em que figura como contratada Mecanicapina Limpeza Urbana Ltda. (CPNJ: 02.207.800/0001-03), e possui como objeto a prestação de serviços de coleta manual e transporte dos resíduos sólidos domiciliares no Município de Canoas e transporte de resíduos sólidos domésticos até a Unidade de Transbordo no Aterro Guajuviras.S
2. Verifica-se que o processo foi instruído com os seguintes documentos: (i) cópia do contrato e respectivos aditivos, bem como da ordem de início dos serviços (doc. 0290928); (ii) certidões negativas e demais documentos de habilitação (docs. 0326730 e 0266601); (iii) justificativa e o pedido e autorização – P.A. (doc. 0306124); (iv) manifestação de interesse da credenciada (doc. 0266601); (v) ata de autorização da XXX (doc. 0321621); (vi) termo de reserva orçamentária (doc. 0323750); (vii) parecer do fiscal do contrato (0348776).
3. Os autos foram aportados a esta assessoria jurídica em um primeiro momento (despacho nº 0340556), sendo solicitadas algumas providências e esclarecimentos à secretaria requisitante, notadamente em se tratando de pretendida prorrogação excepcional do contrato (com fulcro no art. 57, inc. II e §4º, da Lei 8.666/93), considerando o entendimento dos órgãos de controle a respeito da matéria
4. Após prestadas as devidas informações, retornaram os autos a este órgão jurídico-consultivo para reanálise
5. Eis o relatório. Passa-se à análise jurídica.
II. DA ABRANGÊNCIA DA ANÁLISE JURÍDICA.
6. Consigne-se que a presente análise considerará tão somente os aspectos estritamente jurídicos da questão trazida ao exame desta Diretoria Jurídica, partindo-se da premissa básica de que, ao propor a solução administrativa ora analisada, o administrador público se certificou quanto às possibilidades orçamentárias, financeiras, organizacionais e administrativas, levando em consideração as análises econômicas e sociais de sua competência.
7. Isso porque, nos termos da Lei nº 6.627/2023, que dispõe sobre a estrutura, organização e funcionamento do Poder Executivo Municipal de Canoas, compete à Secretaria Municipal de Licitações e Contratos, entre outras atribuições, proceder com o assessoramento jurídico em questões de licitações e contratações em geral:
Art. 11. As competências das Secretarias de Natureza Instrumental compreendem: (…) (...)
c) compete à Secretaria Municipal de Licitações e Contratos (SMLC): (...)
2. planejar, dirigir, executar, controlar e assessorar, material, técnica e juridicamente, todas as fases e procedimentos de formação e execução do processo licitatório e dos procedimentos de seleção e formação de parcerias da administração direta; (grifei)
8. Desta feita, verifica-se que a atividade dos procuradores e assessores jurídicos atuantes junto à Secretaria Municipal de Licitações e Contratos – assim como ocorre com a atividade advocatícia de maneira geral – se limita à análise da compatibilidade jurídica da matéria trazida a exame, sem prejuízo de, eventualmente, sugerir soluções vislumbradas por esta unidade de assessoramento jurídico, que devem ser objeto de consideração por parte do gestor, que detém, no entanto, a palavra final sobre a implementação de políticas públicas no âmbito municipal, nos limites do seu juízo de mérito.
III. DA ANÁLISE JURÍDICA.
A) DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO EM CARÁTER CONTÍNUO.
9. Como dito, analisa-se na espécie a possibilidade de, nos termos do art. 57, inc. II, da Lei nº 8.666/93, realizar a prorrogação do Contrato nº 288/2018, firmado com a empresa Mecanicapina Limpeza Urbana Ltda.
10. Assim, ante o pedido de renovação com fulcro no art. 57, II, da Lei 8.666/93, cumpre destacar que não há na Lei nº 8.666/1993 uma definição acerca do que se entende por serviço contínuo. A Instrução Normativa SEGES nº 05/2017, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão que dispõe sobre as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, apresenta o seguinte conceito:
“Subseção II
Dos Serviços Prestados de Forma Contínua e Não Contínua
Art. 15. Os serviços prestados de forma contínua são aqueles que, pela sua essencialidade, visam atender à necessidade pública de forma permanente e contínua, por mais de um exercício financeiro, assegurando a integridade do patrimônio público ou o funcionamento das atividades finalísticas do órgão ou entidade, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional.
Parágrafo único. A contratação de serviços prestados de forma contínua deverá observar os prazos previstos no art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993.” (grifei)
11. Destaque-se, outrossim, que, não obstante o ajuste em tela ser regido pela Lei nº 8.666/1993, a Lei nº 14.133/2021, novo marco legal sobre licitações e contratos, traz um rol de definições que podem auxiliar o administrador a compreender melhor os termos já utilizados, conforme se verifica a seguir:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
(…)
XV - serviços e fornecimentos contínuos: serviços contratados e compras realizadas pela Administração Pública para a manutenção da atividade administrativa, decorrentes de necessidades permanentes ou prolongadas;
12. No mesmo sentido é a orientação do Tribunal de Contas da União – TCU:
“Contrato Administrativo. Prorrogação de contrato. Serviços contínuos. Caracterização. O caráter contínuo de um serviço (art. 57, inciso II, da Lei 8.666/1993) é determinado por sua essencialidade para assegurar a integridade do patrimônio público de forma rotineira e permanente ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do ente administrativo, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional”. Acórdão 10138/2017 Segunda Câmara (Representação, Relator Ministra Xxx Xxxxxx)
13. Como se observa, o que é serviço contínuo para um órgão ou entidade pode não ser para outro, pelo que cabe a cada um definir, em processo próprio, quais serviços lhe são essenciais e que, se interrompidos, podem comprometer o desempenho de suas atividades finalísticas.
14. Dessa forma, será a necessidade permanente de determinado serviço tido como essencial que ensejará sua caracterização como contínuo, cabendo à Administração avaliar as características e condições específicas do serviço contratado, a fim de aferir se o mesmo pode ou não ser assim considerado.
15. Sobre o tema, mais uma vez, colaciona-se a jurisprudência do TCU:
“Serviços de natureza contínua são serviços auxiliares e necessários à Administração no desempenho das respectivas atribuições. São aqueles que, se interrompidos, podem comprometer a continuidade de atividades essenciais e cuja contratação deva estender-se por mais de um exercício financeiro. O que é contínuo para determinado órgão ou entidade pode não ser para outros. São exemplos de serviços de natureza contínua: vigilância, limpeza e conservação, manutenção elétrica, manutenção de elevadores, manutenção de veículos etc. Em processo próprio, deve a Administração definir e justificar quais outros serviços contínuos necessita para desenvolver as atividades que lhe são peculiares”1
1 Brasil. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília : TCU, Secretaria-Geral da Presidência : Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010. p. 772
“[SUMÁRIO] A natureza do serviço, sob o aspecto da execução de forma continuada ou não, questão abordada no inciso II, do art. 57, da Lei nº 8.666/1993, não pode ser definida de forma genérica, e sim vinculada às características e necessidades do órgão ou entidade contratante.” Acórdão 4614/2008 - Segunda Câmara.
16. Cabe salientar que, conforme demostrado no doc. 0306124, fica evidente que o objeto se trata de serviço continuado, conforme trechos que seguem da justificativa:
17. Com efeito, é pela necessidade permanente do órgão e pelos prejuízos diante de eventual interrupção, que a Lei 8.666/1993, no art. 57, inciso II, contempla a possibilidade de prorrogação/renovação da vigência desses ajustes, até o limite de 60 (sessenta) meses, com a finalidade de garantir a manutenção da viabilidade econômica da contratação, conforme se verifica:
Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
(...)
II - à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses;
18. Sobre o tema, assim leciona Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx:
“A segunda exceção se refere aos contratos de prestação de serviços executados de forma contínua, necessários a satisfazer uma necessidade pública permanente e não extinguível. Abrangem não apenas os serviços essenciais. O serviço de limpeza pode ser qualificado como não essencial, mas é contínuo para os fins da fixação de prazo de vigência. A possibilidade de contratar serviço contínuo por período mais longo deriva de dois motivos. Há a inconveniência (senão impossibilidade) de sua suspensão. Mas há também a presunção de existência de recursos orçamentários nas leis futuras. O texto do art. 57, II, induz a possibilidade de contratação por período de até sessenta meses, prorrogáveis por mais doze em situações excepcionais. Mas a solução que vem sendo adotada é a contratação pelo período de vigência de cada crédito orçamentário, produzindo-se a renovação da contratação periodicamente até atingir o limite temporal máximo autorizado na lei.”2
19. Assim, considerando-se a natureza do objeto contratual, desde que atendidos os requisitos do art. 57, II, da Lei nº 8.666/1993, é possível a prorrogação de ajustes como o presente.
2 XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Curso de Direito Administrativo. 4 ed. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.)
20. Na espécie, porém, verifica-se que já atingido o limite de sessenta meses previsto no dispositivo legal supra, tratando-se, pois, de pretendida prorrogação excepcional, com fulcro no §4º do art. 57 da Lei de Licitações:
Art. 57. [...] § 4º Em caráter excepcional, devidamente justificado e mediante autorização da autoridade superior, o prazo de que trata o inciso II do caput deste artigo poderá ser prorrogado por até doze meses.(Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)
21. Dito isto, no tópico seguinte, seguem algumas considerações importantes acerca da matéria.
B) DA PRORROGAÇÃO EXCEPCIONAL DO ART. 57, §4º, DA LEI 8.666/1993.
22. O Contrato em voga, firmado em 2018, pelo período de 60 (sessenta) meses, conforme Cláusula 4.1, a contar de 10.12.2018, data de recebimento da OIS, atingirá o prazo máximo de 60 (sessenta) meses, do art. 57, inc. II, da Lei nº 8.666/1993, em 10.12.2023. Desse modo, como já dito, nova prorrogação do ajuste só poderia vir consubstanciada no §4º do mesmo dispositivo legal supra, cujo teor é expresso no sentido de que se trata de prorrogação em caráter excepcional.
23. Conforme a lição de Xxxxx Xxxxx Furtado3, a excepcionalidade deve ser interpretada no sentido de o poder público não poder permanecer sem a prestação do serviço e de não ter podido realizar licitação em razão de fatores estranhos à sua vontade.
24. Nessa mesma direção é o entendimento do Tribunal de Contas da União – sobre o qual já se discorreu brevemente nos despachos de etapas 12 e 15. Segundo a Corte de Contas, com grifos nossos, deve ser “evitada a prorrogação dos contratos de execução continuada além dos 60 meses previstos na Lei de Licitações, uma vez que a prorrogação contida no § 4º do art. 57 da norma é excepcional” (Xxxxxxx nº 1938/2007 - Plenário), e que essa prorrogação excepcional “somente é pertinente em situações excepcionais ou imprevistas, diante de fato estranho à vontade das partes” (Acórdão nº 1159/2008-Plenário e Xxxxxxx nº 429/2010 - 2ª Câmara).
25. Ainda, no bojo do Acórdão nº 2702/2006 – 2ª Câmara, ficou consignado que deve a administração realizar o “planejamento necessário para a realização tempestiva dos certames licitatórios relativos a serviços de natureza continuada, evitando a prorrogação com fundamento no art. 57, § 4º, da Lei n. 8.666/93, em decorrência de falta de planejamento e de ação da Unidade”.
26. Quer dizer, portanto, que a excepcionalidade dita no dispositivo legal supra, não se relaciona à necessidade do objeto. Até mesmo porque a necessidade do objeto é pressuposto para justificar a própria contratação em si. Como visto, o que justificaria a prorrogação excepcional, na verdade, seria um evento anormal e imprevisto, não causado pelas partes, e que impediria a tempestiva realização e conclusão de processo licitatório/chamamento público.
27. No caso concreto, os elementos contidos nas justificativas de docs. 0266621 e 0306124, complementada no despacho nº 0348776, são relacionados à imprescindibilidade do objeto, além de
3 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Licitações e Contratos Administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 414.
questões interna corporis quanto à fiscalização do contrato, não sugerindo, ao menos a priori, a ocorrência de fato anormal, imprevisível e não causado pelas partes que pudesse ter impedido a realização de nova licitação/chamamento público.
28. Assinala-se que, mesmo se consideradas as motivações supra para a demora na abertura de processo administrativo destinado à contratação, verificou-se que até o momento não foi instaurado processo junto ao SEI, constando somente a informação de que o Termo de Referência e a planilha de custos estão em fase de ajustes. Tal contexto, com efeito, inviabilizaria a prorrogação com fulcro no §4º do art. 57 da Lei nº 8.666/93.
29. Entretanto, no presente caso, deve se sopesar o interesse público e o risco que a desassistência no manejo dos resíduos sólidos pode causar ao Município de Canoas. Não é possível aguardar nova licitação, não obstante a ausência de eventos anormais ou imprevistos a justificar a falta de planejamento no que toca a serviço tão essencial.
30. Dito isto, o fato é que compete ao gestor – e não a esta assessoria4, que deve se limitar a avaliar a matéria sob o ponto de vista jurídico –, ante a justificativa apresentada pela área técnica da secretaria e pelo fiscal do contrato, e tendo conhecimento das orientações ora levadas a seu conhecimento no presente parecer acerca da aplicação dos referidos dispositivos legais, inclusive conforme o entendimento dos órgãos de controle, optar pela solução que entender adequada e condizente à situação em concreto.
31. Recomenda-se que seja dada prioridade a abertura de novo processo licitatório em relação ao objeto do Contrato nº 288/2018, de modo a presente prorrogação contratual excepcional encerrar-se o quanto antes.
IV. CONCLUSÃO.
32. Ante o exposto, tendo em vista a instrução do feito, opina-se no sentido da possibilidade da prorrogação com fulcro no inciso II e §4º do art. 57 da Lei nº 8.666/1993, desde que demonstrada a excepcionalidade nos termos expostos no presente parecer jurídico, a ser avaliada pela autoridade competente.
33. Assinala-se que, por competência, se está juntando nos autos a minuta de termo aditivo de prorrogação, mas tal em nada prejudica o entendimento ora manifestado, no sentido de que a respectiva assinatura pressupõe prévia análise pelo gestor do caso concreto e definição quanto ao cabimento ou não da prorrogação excepcional, em conformidade aos termos ora expostos.
4 Não se pode exigir do assessor jurídico conhecimento técnico de todas as áreas e não apenas do Direito. No processo licitatório, não compete à assessoria jurídica averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. Sua função é zelar pela lisura sob o aspecto formal do processo, de maneira a atuar como verdadeiro fiscal de formalidades, somente.Assim, a assinatura do assessor jurídico na minuta do contrato serve de atestado do cumprimento de requisitos formais, e não materiais. STF. 2ª Turma. HC 171576/RS, Rel. Min. Xxxxxx Xxxxxx, julgado em 17/9/2019 (Info 952).
34. Ainda, mister destacar que, independentemente da solução adotada pelo gestor nos presentes autos, é impreterível que a administração, mantido o interesse público na consecução do objeto ora versado, adote imediatamente os trâmites necessários ao lançamento de processo licitatório/chamamento público regular, constando, inclusive, na minuta de aditivo cláusula de rescisão antecipada.
35. Por fim, se faz necessária a revalidação das certidões vencidas durante a tramitação do processo
É o parecer.
Canoas, 25 de outubro de 2023..
Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx
Procurador do Município Assessora Jurídica
Diretor Jurídico – SMLC Diretoria Jurídica - SMLC
OAB/RJ 221.129 OAB/RS 115.165
Matrícula 125773 Matrícula 122517