A PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL: ANÁLISE DO RE 605.709/SP
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Centro de Ciências Jurídicas e Políticas
Escola de Ciências Jurídicas
XXXXXX XXXXXXXXX XXXXXXX
A PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL: ANÁLISE DO RE 605.709/SP
Rio de Janeiro 2020
A PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL: ANÁLISE DO RE 605.709/SP
Trabalho de conclusão de Curso apresentado à Escola de Ciência Jurídicas e Políticas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientadora: Drª. Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx
Rio de Janeiro 2020
P436
Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxxxx.
A penhorabilidade do bem de família do fiador em contrato de locação comercial: análise do RE 605.709/SP / Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx. -- Rio de Janeiro, 2020.
47 p.
Orientadora: Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) -
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Graduação em Direito, 2020.
1. Princípios Constitucionais. 2. Direito à moradia. 3. Garantia Fiduciária. 4. Interpretação Extensiva. I. Xxxxx, Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, orient. II. Título.
A PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL: ANÁLISE DO RE 605.709/SP
Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para à obtenção do título de bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).
Aprovado em: 22/01/2021 Banca Examinadora
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
Doutor Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
Xxxxxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Junior Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Xxxxx e Xxxx, minha força motriz.
À minha irmã, Xxxxxx, pelo amor e a certeza que sempre teremos uma a outra.
À minha tia, Fátima, pelo acolhimento durante toda a graduação. Ao meu noivo, Xxxxxx, por todo o apoio e incentivo.
Aos amigos e demais familiares, por sua imprescindibilidade neste período.
À Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e a todos os professores do curso de Direito pela elevada qualidade do ensino oferecido, em especial, a profª drª orientadora Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx, por todo o suporte ao longo desse processo.
O presente trabalho tem como objetivo analisar o bem de família do fiador no que tange à sua penhorabilidade nos contratos de locação, à luz da doutrina, legislação vigente e entendimento dos Tribunais, sobretudo, a partir da análise da decisão do RE 605.709/SP, sobre o qual o Supremo Tribunal Federal (STF) poderá protagonizar, ao menos em parte substancial, uma revisão do seu posicionamento sobre a matéria até então consolidada no RE 407.688/SP. Neste contexto, o presente trabalho explora o posicionamento do STF nos autos do RE 605.709/SP, abordando a respeito dos argumentos desenvolvidos na decisão, especialmente em relação os princípios constitucionais aparentemente em rota de colisão. Ao final, concluiu- se que apesar da fiança no contrato de locação ainda ser uma garantia usual para o locador, principalmente, nas locações residenciais, o direito não deve servir para agravar, ainda mais, as desigualdades do Brasil, sequer violar princípios basilares da Constituição. Em meio a isso, a despeito do RE 605.709/SP ter significativa relevância por primar pela aplicação de preceito constitucional, sendo um marco inicial para uma possível mudança de entendimento da Suprema Corte, o estudo destaca também a questionável interpretação extensiva da lei por meio da utilização do distinguishing por parte dos Ministros da 1ª Turma do STF.
Palavras-chave: Princípios Constitucionais. Direito à moradia. Garantia fiduciária. Interpretação extensiva
ABSTRACT
The current work aims to analyze the guarantor's family property, mainly with regard to the attachment to the lease agreement, using doctrine, current laws and understanding of the Courts, especially from the analysis of the decision on RE 605.709/SP, on which the Brazilian Supreme Federal Court will assume a more prominent role, at least in a substantial part, a review of its position on the common consolidated on RE 407.688/SP. In this context, the current work explores the position of the Brazilian Supreme Federal Court in the case records of RE 605.709/SP, addressing the arguments formulated in the decision, especially in relation to the constitutional principles apparently on a collision course. In the end, it is concluded that, despite, the guarantee on the lease agreement is still being a usual guarantee for the lessor, mainly in residential leases; the right should not serve to aggravate the inequalities in Brazil, not even to violate basic principles of the Constitution. In this sense, although RE 605.709/SP has relevance for give priority to the application of constitutional principles, being an important milestone for a possible change in Supreme Court’s understanding, the study also highlights the extensive interpretation of the law through the use for distinguishing by the Ministers of the 1st Panel of the Brazilian Supreme Federal Court.
Keywords: Constitutional Principles. Right to Housing. Fiduciary Guarantee. Extensive Interpretation.
2.2.1 Bem de família voluntário 12
2.3.1 Inalienabilidade e impenhorabilidade 16
3. O BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR E O ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES 18
3.2 O bem de família do fiador 22
3.3 Entendimento dos Tribunais Superiores 25
4.1 Votos proferidos no RE 605.709/SP 32
4.1.1 Voto do Ministro relator Xxxx Xxxxxxx 32
4.1.2 Voto do Ministro Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx 32
4.1.3 Voto da Ministra Xxxx Xxxxx 33
4.3 Os reflexos do RE 605.709/SP no cenário jurídico-econômico 36
Apesar da significativa contribuição da fonte histórica romana para o nosso direito, cabe esclarecer que o antecedente histórico significativo para a tutela jurídica do bem de família encontra-se no direito norte-americano, mais especificamente, em uma lei texana.
Segundo Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx (1999, p. 254) o termo “bem de família” surgiu no estado do Texas, EUA, no começo do século XIX; e, lá era conhecido como Homestead Exemption Act1, cujo objetivo era proteger as famílias da grave crise econômica que assolou a região, permitindo que ficassem isenta de penhora a pequena propriedade, sob a condição de sua destinação à residência do devedor.
No Brasil, este instituto foi introduzido pelo Código Civil de 1916 (CC/16), apresentando uma grande evolução ao decorrer dos anos, seja por meio da Lei 8.009/1990 e o Código Civil de 2002 (CC/02), como também na jurisprudência nacional, sendo papel de destaque no RE 407.688/SP2 e no recente julgado, objeto deste estudo, o RE 605.709/SP3.
Dito isto, o presente trabalho consiste em analisar o instituto do bem de família do fiador nos contratos de locação e a decisão do RE 605.709/SP, cujos efeitos afetarão tanto o ordenamento jurídico brasileiro, quanto o mercado imobiliário; tendo em vista que o RE 407.688/SP, até então orientação pacificada, que sem ressalva de alguma exceção, vinha entendo ser constitucional a penhora do único imóvel e bem de família do fiador em contrato de locação, tal como previsto no artigo 3ª, inciso VII, da Lei 8.009/1990.
Ademais, há de se responder alguns questionamentos, principalmente acerca da constitucionalidade do art. 3º, inc. VII, da Lei 8.009/90, afinal, essa previsão abraçada pelo legislador não ofende a Constituição Brasileira, que tem por princípio fundamental inerente ao Estado Democrático de Direito a dignidade da pessoa humana?
Com o fito de ponderar questionamentos desta natureza, o primeiro capítulo aborda o instituto bem de família, desenvolvendo a ideia de seu conceito, as suas espécies e seus efeitos
1 PEREIRA, 2010, p. 601: “(...) Na Constituição Texana de 1845 o homestead era definido como uma porção de terra pertencente aos chefes de família protegida contra a alienação judicial forçada, por quaisquer débitos contraídos por seu proprietário posteriormente à aquisição da propriedade”.
2 STF, RE 407.688/SP, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxx, julgado 13.mar.2013, DJe 6.out.2006
3 STF, RE 605.709/SP. rel. Ministro Xxxx Xxxxxxx, julgado 12. Jun. 2018, DJe 18. fev. 2019
no ordenamento jurídico brasileiro. Para tanto, faz-se uma breve abordagem histórica acerca de sua aplicação na legislação, bem como estuda os artigos relacionados na Lei 8.009/1990 e na Lei 10.406/2002. Trata-se de uma contextualização do tema, que visa demonstrar a importância do instituto em questão.
O segundo capítulo discorre a respeito do posicionamento dos tribunais superiores em relação ao bem de família do fiador nos contratos, estudando especificamente o conceito de fiança e seus efeitos, como também o entendimento alcançado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF) quanto à temática nos contratos de locação. Para isso, analisa-se a legislação brasileira, bem como a jurisprudência nacional.
O terceiro e último capítulo analisa o RE 605.709/SP, onde fora levantado novamente o debate acerca da constitucionalidade do dispositivo da Lei 8.009/90, cuja decisão, por maioria dos votos, afastou a possibilidade de penhora do bem de família do fiador quando se tratar de locação comercial. A abordagem será acerca dos argumentos levantados, especialmente em relação aos princípios constitucionais conflitantes.
Os recursos utilizados como referenciais bibliográficos para elaboração do presente se resumem às leis, súmulas, jurisprudências e obras de estudiosos doutrinadores como Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, Xxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx xx Xxxxx Xxxxxx, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxx, dentre outros.
A metodologia utilizada será por delineamento bibliográfico e coleta de dados de fontes secundárias por base teórica e doutrinária, a respeito da penhorabilidade do bem de família do fiador, com destaque nos contratos de locação. Ademais, a presente pesquisa se classifica em descritiva e para elaboração deste trabalho se seguirá uma abordagem qualitativa.
Portanto, sem pretensão de esgotar o tema, pode-se afirmar que este trabalho apresenta aos leitores um panorama geral acerca da problemática existente em torno do imóvel bem de família do fiador, trazendo à tona também a análise acerca da mudança jurisprudência proposta no RE 605.709/SP. A partir disso, o leitor poderá reunir elementos para que possa refletir e se filiar a corrente que entender mais equânime e, acima de tudo, não violadora de garantias minimamente asseguradas, como o direito à moradia e proteção à dignidade da pessoa humana.
2. BEM DE FAMÍLIA
No Brasil, o instituto do bem de família foi introduzido com o Código Civil de 1916, que dele cuidava em quatro artigos (70 a 73), no Livro II, intitulado “Dos Bens”. Adiante, houve a publicação do Decreto-Lei 3.200, de 19 de abril de 1941, que também tratou da matéria nos arts. 8º, § 5º, e 19 a 23, estabelecendo os valores máximos dos imóveis a ser aplicada a proteção, bem como disciplinou o modo de instituição e de extinção do bem de família e seus procedimentos necessários.
Em ato contínuo, por meio da Lei 6.742/1979, a limitação imposta pelo decreto supramencionado foi afastada, possibilitando, assim, a isenção de penhora de imóveis de qualquer valor. Entretanto, no Código Civil de 2002, por meio do art. 1.711, houve o retorno da limitação do valor do imóvel, na hipótese de existir outros bens residenciais.
Ademais, outros diplomas legais também cuidaram do bem de família, como a Lei 6.015/73 (arts. 260 a 265), o Código de Processo Civil de 1973 (art. 1.218, inc. VI) e a Carta Magna de 1988 (art. 5, inc. XXVI). Atualmente, o instituto encontra-se amparado no Código Civil de 2002 (arts. 1.711 a 1.722), que trata do bem de família voluntário e na Lei 8.009/90, sob a forma de bem de família legal.
Diante do exposto, resta claro a importância do estudo desse instrumento de defesa social, sendo necessário, de agora em diante, uma melhor explanação acerca de seu conceito, espécie e efeitos.
2.1 Conceito
O termo bem de família, de forma geral, constitui-se em uma porção de bens que a lei resguarda com as características de inalienabilidade e impenhorabilidade, cujo objetivo é proteger e resguardar a manutenção de um lar para a família, consubstanciado na defesa do direito constitucional à moradia4, bem como no da dignidade da pessoa humana5 e na solidariedade social6 (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 470).
4 Art. 6º da CRFB/88.
5 Art. 1º, III da CRFB/88.
6 Art. 3.º, I, da CRFB/88.
Na busca de estabelecimento de outro conceito para melhor ilustrá-lo, podemos utilizar também a definição de Xxxxxxx Xxxxxxxxx Credie (2004, p. 07) ao propor que o bem de família:
(...) é o direito de imunidade relativa à apreensão judicial, que se estabelece, havendo cônjuges ou entidade familiar, primeiro por força de lei e em alguns casos ainda por manifestação de vontade, sobre imóvel urbano ou rural, de domínio e/ou posse de integrantes, residência efetiva desse grupo, que alcança ainda os bens móveis quitados que a guarneçam, ou somente esses em prédio que não seja próprio, além das pertenças e alfaias, eventuais valores mobiliários afetados e suas rendas.
Pode-se, a partir de então, entender o “bem de família” como o imóvel utilizado pela família ou entidade familiar como residência, seja urbano ou rural, juntamente com outros bens, considerados acessórios; que, em razão da lei ou por ato do instituidor, goza de proteção contra eventuais atos de constrição, sendo sua finalidade a defesa do direito à moradia, como sustentáculo da dignidade da pessoa humana (XXXXX; XXXXXXX, 2017, p. 247).
Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em diversas decisões, aparenta compartilhar desse mesmo entendimento, ao considerar que a proteção do bem de família não visa apenas proteger a família em si, mas amparar a pessoa humana e a sua premente necessidade do direito à moradia (TARTUCE, 2017, p. 369).
Acerca da natureza jurídica, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx (2010, p. 602) elucida que o instituto é uma forma de “afetação de bens a um destino especial que é ser a residência da família, e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua constituição, salvo provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio”. Sendo assim, é nítido que o bem de família não fica isento de todas as formas de execução, haja vista a exceção prevista no art. 1.715 do Código Civil de 2002 que são as dívidas provenientes de tributos relativos ao prédio ou despesas de condomínio.
Ainda a respeito do art. 1.715 do CC/02, vale evidenciar que o bem de família não pode ser instituído em prejuízo aos credores, ou melhor, em fraude contra credores, afinal, o objetivo do instituto não é defender o devedor, mas garantir o mínimo de sobrevivência com dignidade (VENOSA, 2017, p. 417-418).
Além do mais, essa proteção legal tenderá a se perpetuar no tempo, enquanto viver um dos cônjuges ou componentes da entidade familiar – famílias decorrentes da união estável, união homoafetiva, monoparental ou outra manifestação familiar, protegido por previsão legal específica - ou até que os filhos completem sua maioridade (art. 1.716 do CC/02).
Inclusive acerca da entidade familiar, a Súmula 364 do STJ7, cuja publicação se deu em 03 de novembro de 2008, fez interpretação extensiva da proteção da moradia para atingir o imóvel onde reside pessoa solteira, separada ou viúva.
Por fim, como pode-se perceber o instituto do bem de família tem o escopo de proteção, garantindo uma espécie de asilo à família e as pessoas, haja vista todos serem detentores de direitos fundamentais, tais como, o direito à moraria e a uma vida digna, não merecendo ter a proteção da integridade física e moral do ser humano violados.
2.2 Espécies
No sistema brasileiro, o bem de família se classifica em duas modalidades, a saber, o bem de família voluntário, estabelecido pelo Código Civil de 2002, e o bem de família legal, previsto na Lei 8.009/90. Cabe destacar, de antemão, que a principal diferença entre as duas modalidades é a forma de instituição, tendo em vista que o bem de família obrigatório é instituído pela própria lei, que oferece proteção às famílias, independentemente de assim o requererem, enquanto que o bem de família convencional dependerá de declaração ou requerimento, feito por escritura pública ou testamento, a fim de garantir a impenhorabilidade do imóvel.
2.2.1 Bem de família voluntário
O bem de família convencional ou voluntário é o originalmente previsto desde a codificação anterior, por meio do art. 70 do Código Civil de 1916 que tratava ser “permitido aos chefes de família destinar um prédio para domicilio desta, com a cláusula de ficar isento de execução por dividas, salvo as que provierem de impostos relativos ao mesmo prédio”.
Atualmente, essa espécie está prevista nos arts. 1.711 a 1.722 no livro que trata do Direito de Família do CC/02, devido este instituto manter relação direta com o direito familiar, “sendo tendência da proteção dos direitos da personalidade, a partir de uma concepção social e axiológica.” (TARTUCE, 2017, p. 370).
Dispõe o art. 1.711 do CC/02 que o bem de família convencional ou voluntário pode ser constituído pelos cônjuges, pela entidade familiar ou por terceiros – neste caso, devem os
7 O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
cônjuges aceitar expressamente a instituição -, mediante escritura pública ou testamento, não podendo ultrapassar 1/3 (um terço) do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição. Como se vê essa limitação estabelecida por lei prevê a proteção de eventuais credores.
Já o art. 1.712 do CC/02 estabelece que os imóveis urbano ou rural, juntamente com suas pertenças, instituídos como bem de família, deverão ser obrigatoriamente destinados a servirem ao domicílio familiar, sendo facultada a inclusão de valores mobiliários que não podem exceder o valor do prédio instituído em bem de família, à época de sua instituição (art. 1.713 do CC/02).
A esse respeito, Xxxx Xxxxxxxx (2018, p. 1.420) informa que:
Os valores mobiliários se compõem de depósitos em conta corrente, aplicações financeiras, ações, títulos de crédito, entre outras, e precisam ser individualizados na escritura pública de constituição8; se forem títulos nominativos devem constar dos registros competentes9 e estes valores podem ser confiados à administração de uma instituição financeira que ficará como fiel depositária (CC, art. 1.713, § 3º), e o instituidor poderá disciplinar a forma de pagamento da respectiva renda aos beneficiários.
O art. 1.714 exprime que bem de família voluntário deve ser efetuada por escrito e registrada no Cartório de Registro de Imóveis do local em que o mesmo se encontra para a devida produção de efeitos. Todavia, segundo o art. 1.715, esse instituto de proteção não prevalecerá nos casos de dívidas com as seguintes origens: (i) dívidas anteriores à sua constituição, de qualquer natureza; (ii) dívidas posteriores, relacionadas com tributos relativos ao prédio; e (iii) despesas de condomínio, mesmo que posteriores à instituição.
Na hipótese de execução pelas dívidas mencionadas no artigo 1.715 do CC/02, vale ressaltar a sintonia do parágrafo único com a proteção da pessoa (art. 1º, inc. III, da CRFB/88), tendo em vista a previsão de que, caso haja saldo existente, este será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, a não ser que motivos relevantes aconselhem outra solução, a critério do juiz.
Acerca da isenção do artigo supramencionado, está perdurará enquanto viver um dos cônjuges – acrescenta-se companheiro -, ou na falta destes, até que os filhos completem 18 anos (art. 1.716 do CC/02).
Em ato contínuo, cita-se que o bem de família é também inalienável, pois a sua destinação é a residencial e de sustento familiar, só podendo, em caráter excepcional, judicialmente comprovada a necessidade, ser alienado com o consentimento dos interessados
8 Art. 1.713, § 1º do CC/02.
9 Art. 1.713, § 2º do CC/02.
e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público, a teor do art. 1.717 do CC/02. Caso seja impossível a sua manutenção, “poderá o juiz, a requerimento dos interessados, extingui- lo ou autorizar a sub-rogação dos bens que o constituem em outros, ouvidos o instituidor e o Ministério Público” (art. 1.719 do CC/02).
O art. 1.720 do CC/02 prevê que a administração do bem de família competirá a ambos os cônjuges – incluem-se companheiros e aquele que exerce o poder parental na família monoparental -, entretanto, na falta de quaisquer destes, a administração tocará ao filho mais velho, se for maior, e se não for, ao tutor, nesta ordem (parágrafo único do art. 1.720 do CC/02).
Por fim, os artigos 1.721 e 1.722 do CC/02 tratam acerca da extinção do bem de família, o primeiro informa que dissolução da sociedade conjugal – inclui-se união estável - não o extingue, salvo a hipótese de morte de um dos cônjuges ou companheiros, eis que, nesse caso, poderá o sobrevivente requerer a dita extinção, se for o único bem do casal. Já o segundo, art. 1.722, relata que dar-se a extinção do bem de família com a morte de ambos os cônjuges – ou companheiros - e a maioridade dos filhos, não sujeitos a curatela.
Conforme já mencionado, a Lei 8.009/90 cuida do bem de família involuntário ou legal, ou seja, aquele que independe de manifestação de vontade ou de ato comissivo da entidade familiar para a sua instituição; uma vez que, neste caso, é a própria Lei que determina a edificação do bem de família. Nas palavras de Xxxx Xxxxxxxx (2018, p. 1.415- 1.416):
A Lei 8.009/1990 emerge na esteira da nova ordem jurídica da Constituição Federal de 1988, para conferir proteção à moradia da entidade familiar, esta constituída pelo casamento, pela união estável ou proveniente da família monoparental, (...).
Esta modalidade ampliou o objeto de proteção, pois além do imóvel em si, “a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados” também não responderão “por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam”, ressalvados os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos (arts. 1º, caput, parágrafo único e 2º da Lei 8.009/90).
Aliás, vale ressaltar que as famílias ou entidades familiares que não possuem imóvel residencial próprio também estão resguardadas por essa lei, haja vista o locatário que tem a garantia de impenhorabilidade dos seus bens móveis que guarnecem a residência, desde que quitados (art. 2º, parágrafo único da Lei 8.009/90).
Ainda nessa toada, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (2017, p. 476), informam que interpretando extensivamente a norma, pode-se chegar à conclusão que a proteção legal se estende também ao comodatário, ao usufrutuário e ao promitente-comprador que estejam em situação semelhante à do inquilino.
Em complemento sobre o tema, ressalta-se que os tribunais entendem que os móveis que devem ser resguardados são aqueles que, em todos os casos, são indispensáveis à habitabilidade de uma residência e os usualmente mantidos em um lar comum, excetuando-se aqueles que encontrados em duplicidade, por não se tratar de utensílios necessários à manutenção básica da unidade familiar10.
Em ato contínuo, o art. 3º da Lei 8.009/90 aborda as exceções à impenhorabilidade do bem de família que são aplicadas, caso sejam movidas:
a) “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato” (inciso ii);
b) “pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida” (inciso iii);
c) “para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar” (inciso iv);
d) “para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar” (inciso v);
e) “por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens” (inciso vi); e
f) “por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.” (inciso vii).
10 STJ, AgRg no REsp 606.301/RJ, 4.ª Turma, rel. Ministro Xxxx Xxxxxx, julgado 27.ago.2013, DJe 19.09.2013.
Outra exceção é a preceituada no art. 4º da Lei 8.009/90, que exclui os benefícios da referida lei àquele que, “sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga”. Em casos tais, “poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese” (art. 4.º, § 1.º da Lei 8.009/90).
Não obstante, o § 2º informa que se a residência familiar for constituída em imóvel rural, a impenhorabilidade será restrita à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da CRFB/88, à área limitada como pequena propriedade rural. A partir disso, pode-se verificar que a norma visa punir aquele que age de má-fé, preservando a proteção da pequena propriedade rural (TARTUCE, 2017, p. 380).
Por fim, ainda no que concerne ao bem de família legal, é necessário que o casal ou entidade familiar estejam estabelecidos no imóvel, com o intuito de ali residir com animus permanendi, conforme exposto no artigo 5º da Lei 8.009/90. Entretanto, caso o casal ou entidade familiar for possuidor de vários imóveis, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido indicado pelo proprietário (art. 5º, parágrafo único, da Lei 8.009/1990).
2.3 Efeitos
É cediço que o bem de família nada mais é do que o imóvel utilizado pela família ou entidade familiar como residência, sendo protegido por previsões legais específicas, em lei especial e no Código Civil. Os efeitos que são declinados a este imóvel afetarão diretamente os proprietários, bem como os credores, tendo em vista que o patrimônio gravado como bem de família é inalienável e impenhorável.
2.3.1 Inalienabilidade e impenhorabilidade
A inalienabilidade é um efeito exclusivo do bem de família voluntário e é relativa, pois o art. 1.717 do CC/02 estabelece a possibilidade de alienação, desde que haja aquiescência dos interessados e seus representantes legais, quando incapazes, como também o posicionamento do Ministério Público (SIMÕES, 2018, p. 47). No que tange ao bem de
família involuntário (Lei 8.009/90), não há o efeito da inalienabilidade, podendo o proprietário alienar o imóvel como bem entender.
Já a impenhorabilidade é a característica fundamental deste instituto, cuja previsão consta no art. 1.715 do CC/02, e diz respeito a dívidas posteriores a instituição do bem de família, salvo as provenientes de tributos ao prédio ou de despesas de condomínio. Na Lei 8.009/90, a impenhorabilidade, prevista no parágrafo único do art. 1º, abarca não só o imóvel residencial, seja urbano ou rural, mas a construção, as plantações e as benfeitorias de qualquer natureza, como também todos os equipamentos, inclusive os destinados ao uso profissional. Sendo certo que os móveis que guarnecem a casa, desde que quitados, também restam impenhoráveis.
Aliás, no tocante à pequena propriedade rural, ressalta-se, conforme consta no inciso XXVI do art. 5º da CRFB/88, que também é impenhorável - quando trabalhada pela família - não respondendo por débitos oriundos de sua atividade produtiva (AZEVEDO, 2019, p. 524). Ademais, vale destacar que o Superior Tribunal de Justiça sumulou a respeito da impenhorabilidade incidente em imóveis locados, desde que a destinação da renda seja para moradia ou subsistência da família do xxxxxxx00.
Diante do exposto, conclui-se que a impenhorabilidade do bem de família não é absoluta, tal qual como a alienabilidade, por ceder às execuções das chamadas obrigações propter rem, além dos casos de fraude contra credores ou em detrimento de débito anterior.
11 Súmula 486 do STJ: É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.
3 O BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR E O ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
A impenhorabilidade do bem de família é uma norma de ordem pública, cujas exceções são encontradas no artigo 3º da Lei 8.009/90. Uma dessas ressalvas é o inc. VII, acrescentado pelo art. 82 da Lei 8.245/91, que estabeleceu mais uma exceção à impenhorabilidade legal do bem de família: a obrigação decorrente de fiança em contrato de locação.
É por meio deste inciso que se pode ver a “execução do patrimônio do fiador, sem possibilidade de exercer o benefício de ordem; a execução do acessório sem a possibilidade de executar-se o principal” (XXXXXXX, 2019, p. 536). Em outras palavras, este inciso prevê que “se o fiador for demandado pelo locador, visando à cobrança dos aluguéis atrasados, poderá o seu único imóvel residencial ser executado, para a satisfação do débito do inquilino” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2019, p. 478).
Neste capítulo, o estudo será direcionado a analisar o posicionamento dos tribunais superiores em relação ao bem de família do fiador nos contratos, inclinando-se especificamente ao conceito de fiança e seus efeitos, como também o entendimento alcançado pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal quanto à temática restrita aos contratos de locação.
3.1 Fiança
Diante dos riscos de todo contrato, houve a necessidade de criar e aperfeiçoar diversos institutos jurídicos, visando assegurar aos contratantes meios eficazes de se obter a prestação firmada ou, no mínimo, uma indenização satisfatória (COELHO, 2012, p. 512).
A fiança é um dos exemplos desses instrumentos jurídicos supramencionados, sendo “um negócio, sem sombra de dúvida, economicamente perigoso para o fiador, por permitir ao credor manifestar toda a sua ferocidade creditória em face de alguém que não é, em verdade, o titular da dívida” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2019, p. 891).
Feita esta breve introdução, pode-se afirmar, antes mesmo de aprofundarmos a análise acerca do instituto, que a fiança é um meio em que o fiador assume dívida que originalmente não lhe pertence, colocando em risco os seus próprios bens.
O contrato de fiança é “definido como aquele em que uma das partes (fiador) assume a obrigação perante a outra (credor ou beneficiário) de entregar a prestação devida por terceiro (devedor ou afiançado), caso este não o faça” (XXXXXX, 2012, p. 508).
Na definição de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx (2016, p. 298):
A fiança é o contrato pelo qual alguém se obriga a pagar ao credor o que a este deve determinada pessoa. Um terceiro, denominado fiador, obriga-se perante o credor, garantindo com o seu patrimônio a satisfação do crédito deste, caso não o solva o devedor.
Nesse sentido, pode-se concluir que o contrato de fiança é um contrato de garantia pessoal12 cuja finalidade é atenuar o risco do inadimplemento de outro contrato – o principal -
, sobre o qual o fiador – terceiro estranho à relação obrigacional originária – se responsabiliza com o seu patrimônio pela obrigação, eventualmente não cumprida, pelo devedor.
A fiança outorgada em favor do locatário, por exemplo, está ligada ao contrato principal que é o de locação, pois a fiança é um contrato que não se constitui por si mesmo, sendo sempre acessório de outro vínculo contratual (XXXXXX, 2012, p. 508-509).
Acerca das principais características desse instituto jurídico, pode-se citar:
a) a unilateralidade, por somente obriga uma das partes, no caso, o fiador;
b) acessoriedade, por ser um contrato acessório e, sempre depender e acompanhar um contrato principal para que possa existir;
c) solenidade – a efetivação da fiança depende de forma escrita ad solemnitatem, imposta pela lei (art. 819 do CC/02);
d) gratuidade – o fiador não recebe nada em troca; e
e) intuitu personae ou personalíssimo, por se estabelecer em função da confiança
12 PEREIRA, 2017, p. 358: “No gênero caução ou garantia compreende-se todo negócio jurídico com o objetivo de oferecer ao credor uma segurança de pagamento, além daquela genérica situada no patrimônio do devedor (v. nº 67, supra, vol. II).”
A respeito de duas características, vale frisar que a fiança pode ser, excepcionalmente, onerosa, caso o fiador seja remunerado pelo devedor afiançado. Essa hipótese ocorre na chamada fiança bancária, como bem ilustra Xxxxxx Xxxxxxxxx (2004, p. 359):
Nada impede, entretanto, que o fiador reclame, em troca da garantia que oferece, determinada remuneração. O procedimento de há muito se instalou no comércio bancário, em que os bancos assinam termos de responsabilidade em favor de seus clientes, em troca de uma percentagem sobre o montante garantido. É a chamada fiança bancária. Modernamente, encontram-se firmas especializadas em prestar fiança, mediante percentagem. Nessas hipóteses, o negócio é oneroso, pois está presente o propósito especulativo
A segunda característica que merece destaque é a atrelada ao art. 836 do CC/02, pois apesar da fiança ser um contrato personalíssimo, ela se transmite causa mortis, até os limites das forças da herança, como pontua Xxxxxxx Xxxxx (2001, p. 439):
Embora a fiança seja contrato intuitu personae em relação ao fiador, suas obrigações transmitemse mortis causa, desde que nascida antes da abertura da sucessão. Por outras palavras, os efeitos da fiança produzidos até a morte do fiador vinculam os herdeiros intra vires hereditates
Por fim, vale ressaltar que outra peculiaridade quanto à fiança é a não admissão de interpretação extensiva, conforme previsão no arts. 819, in fine, e 114 do CC/02, pois como todo contrato benéfico, interpreta-se restritivamente, não comportando ampliações, quer no tocante à sua extensão, quer no concernente à sua duração.
Considerando que a fiança é um contrato acessório em relação ao contrato principal e, em geral, gratuita, seus efeitos estão restritos à forma contratada, não podendo ir além da dívida nem lhe ser mais onerosa. Esses efeitos incidirão tanto nas relações entre fiador-credor quanto nas relações entre fiador-devedor.
A respeito da relação fiador-credor, o primeiro efeito é o chamado benefício de ordem que, segundo Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx (2016, p. 304), refere-se a possibilidade do fiador:
(...) quando demandado, indicar bens do devedor, livres e desembaraçados, e somente até a fase da contestação, que sejam suficientes para saldar o débito, a fim de evitar a excussão de seus próprios bens (CC, art. 827), visto que a sua obrigação é acessória e subsidiária.
A fim de exercer o benefício de ordem, Xxxxx Xxxxx Xxxxxx (2012, p. 535-536) esclarece também que:
(...) o fiador deve, na contestação ou embargos, nomear bens do devedor situados no mesmo Município, os quais estejam livres e desembaraçados e sejam suficientes para o pagamento da obrigação garantida. Não tem direito à subsidiariedade, assim, o fiador que não invoca seu benefício na contestação (da ação de conhecimento) ou nos embargos (à execução), isto é, na oportunidade processualmente adequada para contrapor-se à pretensão do credor. Além disso, não basta provar a solvência do devedor para beneficiar-se o fiador da excussão. A lei impõe-lhe o ônus de indicar bens do afiançado solvente situados no mesmo Município em que a fiança deve ser executada e por onde corre a demanda (CC, art. 827, parágrafo único). Se o devedor está solvente, mas os bens que se encontram no mesmo Município da execução da fiança são insuficientes à satisfação do credor, o benefício não é titulado pelo fiador
Ainda sobre esse efeito, há o art. 828 do CC/02 informando que tal benefício não pode ser invocado, se: (i) o fiador o renunciou expressamente; (ii) se obrigou como principal pagador ou devedor solidário; e (iii) o devedor for insolvente, ou falido.
Nesse diapasão, cabe destacar o Enunciado 364, aprovado na IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal que diz: “no contrato de fiança é nula a cláusula de renúncia antecipada ao benefício de ordem quando inserida em contrato de adesão” (XXXXXXXXX, 2016, p. 305)
Outro benefício instituído para o fiador demandado é o da divisão, previsto no art. 829 e § único do CC/02, cujo princípio presume que os cofiadores são solidários, admitindo-se, porém, que se ilida a presunção pela estipulação contrária, e neste caso cada um responderá cada qual a sua cota.
Portanto, nas relações entre cofiadores a regra é a divisão, pois esse benefício afasta a solidariedade, tornando a obrigação divisível, “cabendo ao fidejussor solvente da dívida inteira demandar dos demais cofiadores pro parte. E se algum deles for insolvente, partilha-se entre os demais a sua cota” (PEREIRA, 2017, p. 362).
Já nas relações fiador-afiançado, existe o efeito da sub-rogação que esclarece que o fiador ao pagar integralmente a dívida “fica sub-rogado de pleno direito nos direitos do credor”, com todos os direitos, ações, privilégios e garantias de que este desfrutava (arts. 346, III, e 349 do CC/02). Entretanto, somente “poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota” (art. 831, segunda parte, do CC/02) e, caso exista parte insolvente, a sua quota será distribuída pelos demais (art. 831, parágrafo único, do CC/02).
Além do mais, destaca-se que o fiador que sub-rogou os direitos do credor, poderá exigir do devedor – afiançado - o que pagou acrescido dos “juros do desembolso pela taxa
estipulada na obrigação principal” ou, à sua falta, pela taxa legal, além das “perdas e danos” que pagar e “pelos que sofrer em razão da fiança” (arts. 832 e 833 do CC/02).
Por fim, o Código Civil de 2002, em seu art. 834 prevê que, em caso de desídiado credor no processo de execução contra o devedor, pode o fiador promover o andamento da execução e, ainda, no caso de vencer-se a obrigação, ou haver decorrido o prazo dentro no qual o devedor obrigou-se a desonerá-lo, faculta-se-lhe exigir que o devedor satisfaça a obrigação, ou o exonere da fiança (art. 835, do CC/02).
3.2 O bem de família do fiador
Em meados de 1990, quando a economia brasileira estava passando por considerável crise, adveio uma nova modalidade de bem de família, imposto pelo próprio Estado por norma de ordem pública (Lei 8.009, de 29 de março de 1990) reforçando a defesa da entidade familiar. Todavia, ante a nova previsão, o mercado imobiliário retraiu, haja vista a insegurança jurídica dos contratos locatícios, afinal os garantidores destes, agora tinham uma importante ferramenta de proteção a fim de resguardarem seus bens.
Diante disso, no ano de 1991, foi instituída a Lei do Inquilinato (Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991), impulsionada pela pressão do ramo imobiliário, na tentativa de recuperar a confiança do mercado. O referido diploma, em seu artigo 82, alterou o artigo 3º da Lei 8.009/90, incluindo como exceção a impenhorabilidade do bem de família do fiador em obrigação locatícia.
Ao excluir o fiador do contrato de locação da benesse prevista na Lei 8.009/90, isto é, a impenhorabilidade do bem de família, intencionava o legislador infraconstitucional ampliar as chances de se conceder a fiança no contrato de locação e, assim, fomentar a negociação imobiliária. Nesse diapasão, Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx (2019, p. 471) informa que:
A nova exceção, acrescida ao artigo 3º da Lei nº 8.009, se impunha, no interesse do mercado, pois estava se tornando quase impossível o oferecimento da garantia da fiança, já que raramente o candidato à locação conseguia um fiador que tivesse, em seu patrimônio, mais de um imóvel residencial.
Por outro lado, era justa e compreensível a recusa do locador, já que de nada lhe valia a fiança, quando o fiador só dispunha de um único imóvel residencial, que não poderia ser alcançado pela execução.
Sendo assim, a previsão da fiança nos contratos de locação foi medida benéfica tanto para o locador, devido a eficácia imediata das sentenças proferidas nas ações locatícias (art.
58, inc. V, da Lei 8.245/91), bem como para o locatário, considerando que sua utilização não lhe proporciona despesas adicionais – como ocorre no seguro, caução ou garantia bancária. Então, como se vê, a exceção legal acabou por criar condições jurídico-econômicas favoráveis ao locador e locatário, ampliando o mercado da locação imobiliária.
Como pode-se imaginar, a alteração foi polêmica e muito discutida, sendo, enfim, aceita, prevalecendo nos tribunais superiores o afastamento da impenhorabilidade dos bens de família. A partir daí, tornou-se possível o fiador, caso fosse acionado para pagar dívida em razão de inadimplemento do locatário, perder seu único imóvel residencial.
Até hoje, há doutrinadores a favor e contra o dispositivo de lei em referência, tendo em vista o advento da Emenda Constitucional nº 26, de 14 de fevereiro de 2000, a qual incluiu entre os direitos sociais previstos no art. 6° da CRFB/88 o direito à moradia.
A corrente doutrinária favorável ao inc. VII trazido pelo art. 82 da Lei 8.245/91 ao art. 3° da Lei 8.009/90, informa ser constitucional a penhorabilidade do bem de família do fiador, conforme entendimento de Xxxxx Xxxxxx Xxxxx (2009, p. 361-362), a saber:
Se assim é, parece-nos, ante o caráter de norma especial do art. 82 da Lei 8.245/91 e do art. 3º, VII, da Lei 8.009/90, inconstitucionalidade não há, tendo em vista que a moradia é direito social tutelado pelo Estado e não pelo particular, e que o fiador, ao garantir dívida locatícia, assumiu tal risco e que as obrigações do locatário e do fiador são diferentes apesar de terem a mesma causa: o contrato de locação.
Em consonância, para Xxxxxxx Xxxxxxxxx Credie (2010, p. 21):
[...] não há discrepância alguma entre o texto da Lei 8.009/90, no que se interpreta finalística ou teleologicamente, e as demais normas constitucionais, sobretudo aquelas que apontam para a dignidade da pessoa humana (art. 1°, III), para a solidariedade social (art. 3°, I), para a isonomia (art. 5°, caput), e para a formação de uma sociedade livre, sadia e desenvolvida (art. 3°, I a IV), como objetivos do Estado.
Sendo assim, pode-se perceber que Xxxxx Xxxxxx Xxxxx defende a constitucionalidade da penhora do imóvel familiar pertencente a fiador de contrato de locação comercial tomando como base o direito à livre iniciativa (art. 1º, caput, da CRFB/88), onde ninguém é obrigado a ser fiador; contudo, assumindo esse encargo, mediante a boa-fé objetiva, arcará com os riscos da obrigação. Em sintonia, Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx afirma que não há inconstitucionalidade alguma, descartando qualquer discrepância.
Para Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (2006, p. 9) a regra da penhorabilidade do bem de família do fiador favorece o direito à moradia das pessoas interessadas em locar bem imóvel urbano, auxiliando, inclusive o papel do Estado de promover o direito à moradia (art.
23, inciso IX da CRFB/88). A esse respeito Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxx (2004, p. 272-274) acrescenta dizendo que:
[...] na realidade, a lei visou a proteger e estimular o mercado imobiliário e facilitar a realização dos contatos locatícios. [...] Com a referida norma, facilita-se o direito à moradia não só do locatário, mas da coletividade, pois se propicia com ela o aumento de moradas para a população, sem a necessidade de aquisição de um imóvel. Assim, poder-se-ia falar em recepcionalidade da norma legal se fosse estabelecida a penhorabilidade do imóvel residencial do fiador – ainda que seu único imóvel – para contratos de locação de caráter exclusivamente residencial.
Por outro lado, Xxxxxx Xxxxxxx (2017, p. 379) pontua que:
Em primeiro lugar, verifica-se que a Emenda Constitucional 26, de 14 de fevereiro de 2000, incluiu a moradia entre os direitos sociais previstos no art. 6.º da CF/1988, o qual constitui norma ordem pública. Ora, ao proceder de tal maneira, o constituinte nada mais fez do que reconhecer o óbvio: a moradia como direito fundamental da pessoa humana para uma vida digna em sociedade. Com espeque na alteração realizada pela Emenda Constitucional 26 e no próprio escopo da Lei 8.009/1990, resta claro que as exceções previstas no art. 3.º dessa lei não podem ser tidas como irrefutáveis, sob pena de dar cabo, em alguns casos, à função social que exerce o bem de família, o que não pode ser admitido.
De acordo está Xxx Xxxxx xx Xxxxx (2009, p. 100-101) ao informar que:
[...] numa relação contratual, subsumida num tipo de contrato, deve-se primar pela justiça, consubstanciada na máxima de agir conforme os ditames da lealdade, da eticidade, da probidade, da solidariedade e da igualdade substancial. Desta forma, a relação jurídico-contratual não só estará cumprindo a sua função social, como também colocando o homem de carne e osso no centro desta relação: trata-se da consagração da dignidade humana.
Na esteira desse entendimento, reconhece-se que, na hipótese de conflito entre o direito humano fundamental à moradia do fiador e o direito de crédito do locador – por exemplo, é indiscutível que deve preponderar aquele, visto garantir não apenas o teto do fiador e de sua família – que já seria motivo suficiente para prevalecer em face do direito de crédito -, mas preserva outros valores, como a dignidade humana.
Xxxxxx Xxxxxxx entende que o direito social à moradia (art. 6º da CRFB/88) deve ser interpretado de forma teleológica, enfatizando que a intenção do constituinte foi clara ao assegurar esse direito como fundamental, a fim de que fosse garantido o patrimônio mínimo capaz de permitir a existência digna das pessoas. Nesse diapasão, Xxx Xxxxx de Xxxxx evidencia a importância da moradia, do qual a pessoa não pode ser desapossada, mesmo em detrimento dos direitos dos credores.
Ainda, Xxxxx xx Xxxxx Xxxxx (2001, p. 148) aponta que o sentido social da Lei 8.009/90 é buscar a garantia de um teto para cada pessoa, eis que a referida Lei criou o espírito protetor da família humana, não sendo plausível que seja constitucional um
dispositivo – presente nesta mesma Lei - que retire a necessidade primária de todo ser humano
– um abrigo.
Assim, como pode-se constatar, há diversos doutrinadores que ainda discutem a suposta (in)constitucionalidade do art. 3º da Lei 8.009/90, demonstrando que ainda há uma grande divergência doutrinária acerca dos princípios e direitos fundamentais que cercam essa matéria, sendo necessário, a partir disso, averiguar o posicionamento dos tribunais superiores na atualidade.
3.3 Entendimento dos Tribunais Superiores
Em 2005, o STF declarou a inconstitucionalidade da penhora no bem de família do fiador nos contratos de locação, através de decisão monocrática no RE 352.940/SP13 e RE 449.657/SP14. Entretanto, no ano de 2006, o STF mudou o entendimento referente a matéria, tendo como fundamento que o artigo 3°, inciso VII da Lei 8.009/90 não afronta o direito à moradia, disposto no art. 6° da Constituição Federal, conforme julgamento do RE 407.688/SP.
Para corroborar com a referida decisão, houve a consolidação do entendimento, em sede de repercussão geral, no RE 612.360/SP15, obtendo, posteriormente, a tese firmada no Recurso Repetitivo - Tema 70816 e na Súmula 54917, ambos do STJ, bem como o tema 29518, do STF.
Como pode-se ver, o RE 407.688/SP é um importante julgado, cuja relevância advém do fato que houve uma ampla discussão entre os Ministros, podendo-se chegar, após vários anos de divergências jurisprudenciais, a uma uniformização jurisprudencial na Suprema Corte.
É cediço que tal decisão foi influenciada pelo mercado imobiliário, cujo fundamento foi pautado no princípio da autonomia da vontade e de que o direito à moradia não se exerce apenas em imóvel próprio, mas também sobre imóvel alugado, sendo assim o mercado
13 STF, RE 352.940-4/SP, rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxxx, julgado 25.abr.2005, Dj 09.mai.2005
14 STF, RE 449657/SP, rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxxx, julgado 28.abr.2005, Dj 09.mai.2005
15 STF, RE 612.360-RG/SP, rel. Ministra Xxxxx Xxxxxx, julgado 13.out.2010,Dje 03.set.2010
16 É legítima a penhora de apontado bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, ante o que dispõe o art. 3º, inciso VII, da Lei 8.009/1990
17 É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.
18 É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3°, VII, da Lei 8.009/1990 com o direito à moradia consagrado no art. 6° da Constituição Federal, com redação da EC 26/2000.
imobiliário teria suas garantias prejudicadas, caso prevalecesse a tese contrária. Mediante esse entendimento, a ementa foi assim redigida:
FIADOR. Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Responsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel residencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009/90, com a redação da Lei nº 8.245/91. Recurso extraordinário desprovido. Votos vencidos. A penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, objeto do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República (STF, RE: 407688 SP, Relator: Xxxxx Xxxxxx, julgado 08.02.2006, Tribunal Pleno, DJ 06.10.2006) (BRASIL, 2006, p. 880)
Em relação aos argumentos apresentados, temos o posicionamento dos Ministros Xxxx Xxxx, Xxxxx Xxxxxx e Xxxxx xx Xxxxx que mencionam a inconstitucionalidade do art. 3º, inc. VII da Lei 8.009 /90 considerando, de modo geral:
a) afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, haja vista que a penhorabilidade retira do fiador o mínimo existencial;
b) afronta ao princípio da isonomia, vez que o fiador não goza deste benefício – impenhorabilidade do bem de família - e o locatário sim, inclusive em ação de regresso movida pelo fiador;
c) afronta pactos internacionais dos quais o Brasil é signatário, como, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 25) e Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (art.11)
d) que a família tem proteção especial do Estado, conforme previsão no art. 226 da CRFB/88, portanto, a exceção prevista pelo legislador, sem dúvidas, viola o disposto constitucional;
e) que não se deve fazer leitura da Constituição para atender à lógica do mercado imobiliário das locações, e muito menos comprometer direitos e garantias à fluência desse mercado;
Além do mais, os Ministros reafirmaram a importância e relevância do art. 6º da CRFB/88, como também a sua eficácia de norma vinculante, ou seja, o legislador infraconstitucional deve sempre respeitá-lo incondicionalmente.
Por outro lado, há os Ministros Xxxxx Xxxxxx (relator), Xxxxxx Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxx que alegaram a constitucionalidade do dispositivo, relatando, basicamente, o entendimento de que:
a) o direito social é um direito subjetivo, sendo necessário, portanto, de previsão legal para objetivá-lo;
b) o direito social tem caráter prestacional por parte do Estado, logo existem muitas outras maneiras de o Estado alcançar a sua efetividade;
c) a penhorabilidade do bem de família do fiador é um meio para a promoção do direito a moradia, considerando que ele é um facilitador da celebração de contratos locatícios;
d) deve ser respeitado o princípio da livre iniciativa, tendo em vista que o fiador se obrigou voluntariamente;
e) numa ponderação de princípios, considerando que nenhum direito fundamental é absoluto, o direito social e fundamental à moradia deve, nesse caso concreto, ceder espaço em prol da afirmação do princípio da autonomia privada; e
f) não há afronta no princípio da igualdade, haja vista que o locatário e o fiador ocupam papéis distintos na relação.
Conforme se observa, a decisão sobre o tema foi objeto de uma ampla discussão. Mas, por sete votos a três, a Suprema Corte reconheceu a constitucionalidade da exceção constante no inc. VII do art. 3º da Lei 8.009/90.
Inclusive, vale citar o voto do Ministro Xxxxxxx Xxxxxxx a respeito do suposto confronto entre o direito à moradia e o direito à liberdade, pois ele é capaz de transparecer a linha de raciocínio que a maioria dos Ministros se inclinou à época:
[...] aparentemente, a questão posta nos presentes autos centra-se no embate entre dois direitos fundamentais: de um lado, o direito à moradia (art. 6º da Constituição Federal), que é direito social constitucionalmente assegurado e, em princípio, exige uma prestação do Estado; de outro, o direito à liberdade, em sua mais pura expressão, ou seja, a da autonomia da vontade, exteriorizada, no caso concreto, na faculdade que tem cada um de obrigar-se contratualmente e, por consequência, de
suportar os ônus dessa livre manifestação de vontade. Ambos os direitos merecem igual tutela em nossa Constituição, de modo que é tarefa complexa estabelecer os parâmetros e limites de sua aplicação, em especial neste tema da penhorabilidade do bem de família do fiador nos contratos de locação. [...]. A norma é muito clara: o fiador que oferece o único imóvel de sua propriedade para garantir contrato de locação de terceiro pode ter o bem penhorado em caso de descumprimento da obrigação principal pelo locatário. Sustenta-se que essa penhora seria contrária ao disposto na Constituição federal, sobretudo após a Emenda Constitucional 26, que incluiu o direito à moradia no rol dos direitos sociais descritos no art. 6º da Constituição. Entendo, porém, que esse não deve ser o desenlace da questão. Como todos sabemos, os direitos fundamentais não têm caráter absoluto. Em determinadas situações, nada impede que um direito fundamental ceda o passo em prol da afirmação de outro, também em jogo numa relação jurídica concreta. É precisamente o que está em jogo no presente caso. A decisão de prestar fiança, como já disse, é expressão da liberdade, do direito à livre contratação. Ao fazer uso dessa franquia constitucional, o cidadão, por livre e espontânea vontade, põe em risco a incolumidade de um direito fundamental social que lhe é assegurado na Constituição. E o faz, repito, por vontade própria. Por via de consequência, entendo que não há incompatibilidade entre o art. 3º, VII, da Lei 8.009/1990, inserido pela Lei 8.245/1991, que prevê a possibilidade de penhora do bem de família em caso de fiança em contrato de locação, e a Constituição federal. (BRASIL, 2006, p. 897-900)
O entendimento supramencionado manteve-se pacífico tanto nos Tribunais Superiores, bem como nos Tribunais Estaduais, como pode-se observar nos seguintes julgados do STF, por exemplo: RE 493.738-Agr/SP, rel. Ministra Xxxxxx Xxxxx, 1ª Turma, julgado 28.out.2008, DJe 05.fev.2009; AI 693.554/RS, rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxx, julgado 13.dez.2007, DJe 11.fev.2008; RE 477.953-AgR/SP, rel. Ministro Xxxx Xxxxx, 2ª Turma, julgado 28.nov.2006, DJ 02.fev.2007; AI 584.436-AgR/RJ, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxx, 2ª Turma, julgado 02.fev.2009, DJe 12.mar.2009; RE 591.568/SP, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxx, julgado 29.ago.2008, DJe 18.set.2008; AI 642.307/SP, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxxx, julgado 18.jun.2009, DJe 26.jun.2009; RE 598.036/SP, rel. Ministro Xxxxx xx Xxxxx, julgado 27.mar.2009, DJe 06.abr.2009; AI 718.860/RS, rel. Ministro Xxxx Xxxxxxx, julgado 25.mar.2010, DJe 19.4.2010; e RE 419.161/SP, rel. Ministro Xxxxxxx Xxxxxxx, julgado 21.out.2009, DJe 09.nov.2009.
Após anos de jurisprudência pacificada, em recente julgado, a 1ª Turma do STF no RE 605.709/SP, levantou novamente o debate acerca da constitucionalidade do inc. VII, do art. 3º da Lei 8.009/90, cuja decisão, por maioria dos votos, afastou a possibilidade de penhora do
bem de família do fiador quando se tratar de locação comercial. Passaremos a análise deste julgamento.
4 ANÁLISE DO RE 605.709/SP
O Recurso Extraordinário 605.709/SP, com acórdão proferido em 12 de junho de 2018 pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, possui imensa relevância para o direito voltado ao mercado imobiliário focado em locação, pois foi nesse julgado, após vários anos de jurisprudência consolidada, que houve uma mudança de entendimento, pelo menos, em parte acerca da penhorabilidade do bem de família do fiador em contratos de locação.
A 1ª turma do STF no RE 605.709/SP, cuja relatoria foi do Ministro Xxxx Xxxxxxx, aplicando o método do distinguishing19, entendeu que a penhora do bem de família do fiador deve permanecer nos casos de locação residencial, excluindo esta prerrogativa aos contratos de locação comercial. No entanto, antes de evoluir sobre o tema, é necessário entender a origem da demanda, para então compreender o contexto e a notoriedade desse julgamento.
A demanda que deu origem ao recurso extraordinário em comento é oriunda da 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que proferiu acórdão proferido, assim ementado (BRASIL, 2018, p. 348):
Locação de imóveis. Embargos à arrematação. Penhora e arrematação de imóvel dos fiadores. Bem de família. Impenhorabilidade. Inexistência em se tratando de fiança. Inteligência do art. 82 da Lei nº 8.245/1991. Situação que não foi alterada pela norma programática expressa no art. 6º da Constituição Federal, prevendo o direito social de moradia. Alegação de nulidade contratual ante a pretensa previsão de dupla garantia locatícia. Questão que não foi aventada pelos executados, ora embargantes, durante a tramitação da ação executiva, sendo objeto de alegação apenas em sede recursal. Contrato, ademais, que não se encontra maculado da nulidade legada, estabelecendo a obrigação do locatário de realizar seguro contra incêndio, que não se confunde com seguro fiança. Recurso improvido.
Assim, Xxxxxxxx Xxxxxxx e outros interpuseram recurso extraordinário perante o Supremo Tribunal Federal, com fundamento na alínea a do inciso I do art. 102 da CRFB/88, alegando, em síntese, violação ao art. 6º, caput, da CRFB/88.
Após ser autuado sob o nº 605.709/SP e contra-arrazoado, inicia-se o julgamento em 2012 tendo o Ministro relator Xxxx Xxxxxxx negado monocraticamente o seguimento do recurso, pelas seguintes razões (BRASIL, 2018, p. 349-350):
(...)
Decido.
19 XXXXXXX, 2009, p. 17-18: “o distinguishing é uma técnica, típica do common law, consistente em não se aplicar o precedente quando o caso a ser decidido apresenta uma peculiaridade, que autoriza o afastamento da rule e que a decisão seja tomada independentemente daquela”
Anote-se, inicialmente, que o acórdão recorrido foi publicado em 31.10.2005, conforme expresso na certidão de fl. 190, não sendo exigível a demonstração da existência de repercussão geral das questões constitucionais trazidas no recurso extraordinário, conforme decidido na Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 664.567/RS, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 06.09.2007.
Não merece prosperar a irresignação, uma vez o Plenário desta Corte concluiu, em sessão realizada por meio eletrônico, no exame do RE 612.360/SP, Relatora a Ministra Xxxxx Xxxxxx, pela existência da repercussão geral da matéria constitucional versada nestes autos e, no mérito, reafirmou a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal nesses termos, in verbis:
“A questão versada no presente apelo extremo possui relevância do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, nos termos do § 1º do art. 543-A do Código de Processo Civil. É que o assunto afeta, certamente, grande número de famílias, as quais têm interesse na solução do impasse sobre a penhorabilidade do imóvel residencial do fiador em contrato de locação.
Ressalte-se que, com o reconhecimento da existência da repercussão geral da matéria, deve ser aplicado o regime legal previsto no art. 543-B do Código de Processo Civil, conforme procedimento já apreciado por esta Corte no julgamento das Questões de Ordem no RE 579.431, no RE 580.108 e no RE 582.650, todos de minha relatoria.
Ademais, verifico que a matéria já se encontra pacificada no âmbito desta Corte, no sentido da constitucionalidade da penhora sobre o bem de família do fiador, mesmo após a EC 26/2000.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 407.688, Rel. Min. Xxxxx Xxxxxx, DJ 06.10.2006, afirmou ser legítima a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990 com o direito à moradia consagrado no art. 6º da Constituição Federal, com a redação da EC 26/2000.”
No mesmo sentido, cito, ainda: RE 477.953-AgRg, 2ª T., Rel. Min. Xxxx Xxxx, DJ 02.02.2007; RE 493.738-AgRg, 1ª T., Xxxx Xxx. Xxxxxx Xxxxx, DJe 05.02.2009; AI
584.436-AgRg, 2ª T., Rel. Min. Xxxxx Xxxxxx, DJe 12.03.2009; AI 693.554, Rel.
Min. Xxxxxx Xxxxxx, DJe 11.02.2008; RE 591.568, Rel. Min. Xxxxx Xxxxxx, DJe 18.09.2008; RE 598.036, Rel. Min. Xxxxx xx Xxxxx, DJe 06.04.2009; AI 642.307,
Rel. Min. Xxxxx Xxxxxxx, DJe 26.06.2009; RE 419.161, Rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxxx, DJe 09.11.2009; AI 718.860, Rel. Min. Xxxx Xxxxxxx, DJe 19.04.2010; e RE 607.505,
Rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, DJe 05.03.2010 (...)
À vista disso, os recorrentes interpuseram agravo regimental, argumentando que a matéria que ensejou a prolação do precedente consubstanciado pelo RE 407.688/SP diverge da matéria presente dos autos, pois, neste caso, a penhora decorre de fiança prestada em um contrato de locação de imóvel comercial, além de que a composição da Corte teria variado substancialmente, podendo ensejar a modificação do entendimento então adotado.
Pois então, houve nova apreciação, tendo, por maioria dos votos, a 1ª Turma dado provimento ao recurso, com o único propósito de fazer com que este fosse submetido a julgamento. Logo após, o Ministério Público, na pessoa do Subprocurador-Geral da República, ofertou parecer pelo provimento do recurso extraordinário, sob a alegação de que a moradia é “substrato material básico da vida familiar” (BRASIL, 2018, p. 351).
4.1 Votos proferidos no RE 605.709/SP
Como é sabido, o RE 605.709/SP foi provido por maioria dos votos, sendo assim, é necessário, a fim de que se tenha melhor compreensão, observar e analisar atentamente cada voto proferido neste recurso.
4.1.1 Voto do Ministro relator Xxxx Xxxxxxx
O Ministro Xxxx Xxxxxxx não se convenceu que existiam, no caso concreto e nas teses levantadas no recurso, motivos para afastar a incidência da jurisprudência consolidada no RE 407.688/SP e reafirmada no julgamento do RE 612.360/SP, de relatoria da Ministra Xxxxx Xxxxxx.
Nesse ínterim, destacou que não havia afronta ao direito à moradia prescrito no art. 6º da CRFB/88, com a redação dada pela EC 26/2000, por tratar-se de norma que não “contém densidade normativa suficiente para gerar os efeitos pretendidos” (BRASIL, 2018, p. 355). Sendo necessário, portanto, de conteúdo determinado pelo legislador infraconstitucional a fim de dar cabo a seus efeitos.
Logo depois, parte para a ideia já ventilada no RE 407.688/SP que o direito à moradia não deve ser confundido com o direito de propriedade, pois o direito à moradia pode vigorar por meio de “normas jurídicas que estimula a oferta de imóveis para a finalidade de locação habitacional” (BRASIL, 2018, p. 356), como, segundo ele, é o caso do art. 3º, inc. VII, da Lei 8.009/90.
Ademais, o Ministro mencionou a impossibilidade de se criar diferenciação inexistente na lei, deixando claro que o legislador ao redigir o comando normativo do art. 3º, VII da Lei nº 8.009/90, conscientemente não fez qualquer distinção entre a fiança prestada em contrato de locação comercial e residencial. Destarte, opinou pelo não provimento do recurso extraordinário.
4.1.2 Voto do Ministro Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
O Ministro Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx inclinou-se à economia de mercado, afirmando que “em nossa Constituição, a livre iniciativa é aspecto inerente à liberdade individual” (BRASIL,
2018, p. 372), onde cada indivíduo é livre para decidir onde e de que forma aplicará seus rendimentos e seus bens, por conta disso.
Segundo ele, o fato de existir o fiador no contrato de locação do caso concreto foi o fator determinante para a celebração do negócio, possibilitando, assim, o exercício da atividade econômica pela sociedade. Desta forma, a garantia que o fiador ofereceu serviu como meio de viabilizar concretamente o exercício da livre iniciativa do locatário, promovendo o empreendedorismo e a celebração de contratos de locação empresarial em termos mais favoráveis.
Outrossim, o Ministro (BRASIL, 2018, p. 372-373) alegou que:
(...) não há desproporcionalidade na exceção à impenhorabilidade do bem de família. O dispositivo legal é razoável ao abrir a exceção à fiança prestada voluntariamente para viabilizar a livre iniciativa. Ninguém é obrigado a prestar fiança em contrato de locação de imóvel comercial; se o faz, porém, no exercício constitucionalmente protegido de sua autonomia da vontade, poderá ter seu imóvel penhorado para o pagamento das dívidas não quitadas pelo locatário.
Como se vê, o Ministro Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx votou no sentido de manter a higidez da tese firmada no julgamento do RE 612.360/SP (tema 295/STF), informando que nos contratos de locação de imóvel comercial deve-se levar em conta o direito à livre iniciativa, princípio fundamental da República (art. 1º, caput, da CRFB/88) e princípio geral da atividade econômica (art. 170, caput, da CRFB/88).
4.1.3 Voto da Ministra Xxxx Xxxxx
A Ministra Xxxx Xxxxx já inicia seu voto alertando sobre a importância do princípio da dignidade da pessoa humana e a proteção à família, deixando claro que não devem ser desprestigiados sobre o “pretexto de satisfazer o crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa” (BRASIL, 2018, p. 279). Em ato contínuo, ratifica que o art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/90 não foi recepcionada pela EC 26/2000.
Ainda esclarece que (BRASIL, 2018, p. 379-380):
(...) a restrição do direito à moradia do fiador em contrato de locação comercial tampouco se justifica à luz do princípio da isonomia. Eventual bem de família de propriedade do locatário, vale recordar, não se sujeitará à constrição e alienação forçada, para o fim de satisfazer valores devidos ao locador. Não vislumbro, assim, justificativa para que o devedor principal, afiançado, goze de situação mais benéfica do que a conferida ao fiador (garante), sobretudo porque tal disparidade de tratamento, ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito fundamental à moradia
Não obstante, a Ministra também acredita que a restrição do direito fundamental à moradia sequer se justifica sob o ângulo da proporcionalidade, considerando que já existem outros instrumentos suscetíveis de “viabilizar a garantia da satisfação do crédito do locador de imóvel comercial, notadamente caução, seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundos de investimento (art. 37 da Lei nº 8.245/1991)” (BRASIL, 2018, p. 380).
Além do mais, a Ministra informa que também não vê motivo plausível para que o direito à moradia – adjunto ao principio da dignidade da pessoa humana e da proteção à família (arts. 1º, III, e 226, caput, da CRFB/88) – seja sacrificado, não sendo justificativa suficiente a onerosidade da prestação de outras modalidades de garantia, tampouco a situação de ser difícil encontrar fiador com mais de um imóvel ou “em nome” da promoção do direito à livre iniciativa.
Inclusive, Xxxx Xxxxx (BRASIL, 2018, p. 381) complementa o seu argumento dizendo que:
(...) a imposição de limites à penhora de certos bens constitui conquista civilizatória, endereçada a assegurar o mínimo existencial. Admitir a penhora de bem de família para satisfazer débito decorrente de locação comercial, em nome da promoção da livre iniciativa, redundaria, no limite, em solapar todo o arcabouço erigido para preservar a dignidade humana em face de dívida;
Por fim, a Ministra (BRASIL, 2018, p. 386) ressalta que o RE 407.688/SP dizia respeito a fiança prestada como garantia em contrato de locação residencial, por isso, que os Ministros à época entenderam pela constitucionalidade do dispositivo em comento, vez que
(...) a exceção à impenhorabilidade do bem de família, quanto ao fiador em contrato de locação residencial, configurava medida de promoção do próprio direito à moradia, relativamente aos locatários, entendeu esta Suprema Corte por sua compatibilidade com a Constituição da República
Sendo assim, resta claro que a Ministra concorda com a tomada de decisão no RE 407.688/SP, pois, ao final, afirmou que devido às diferenças fáticas entre esses dois julgados, ela julga a incompatibilidade apenas “da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação comercial com o direito fundamental social à moradia, bem como com o princípio isonômico, veiculado no art. 5º, caput, da Magna Carta” (BRASIL, 2018, p. 389).
Nesse sentido, deu provimento ao recurso extraordinário, tendo os Ministros Xxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxx, sem mais delongas, acompanhado a Ministra Xxxx Xxxxx.
4.2 Decisão
Como foi possível analisar, a decisão sobre o tema foi objeto de uma ampla discussão. Os Ministros Xxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx votaram no sentido de não dar provimento ao RE 605.709, porém, mesmo com argumentos plausíveis, não conseguiram eleger sua tese como a vencedora.
De outro lado, os Ministros Xxxx Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxx por meio de argumentos fundamentados, conseguiram lograr êxito em sua tese.
Portanto, a decisão foi assim ementada (BRASIL, 2018, p. 346-347):
RECURSO EXTRAORDINÁRIO MANEJADO CONTRA ACÓRDÃO PUBLICADO EM 31.8.2005. INSUBMISSÃO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. PREMISSAS DISTINTAS DAS VERIFICADAS EM PRECEDENTES DESTA SUPREMA CORTE, QUE ABORDARAM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA EM LOCAÇÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO QUE ENVOLVE DÍVIDA DECORRENTE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL COMERCIAL. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. INCOMPATIBILIDADE COM O DIREITO À MORADIA E COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA.
1. A dignidade da pessoa humana e a proteção à família exigem que se ponham ao abrigo da constrição e da alienação forçada determinados bens. É o que ocorre com o bem de família do fiador, destinado à sua moradia, cujo sacrifício não pode ser exigido a pretexto de satisfazer o crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa. Interpretação do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990 não recepcionada pela EC nº 26/2000.
2. A restrição do direito à moradia do fiador em contrato de locação comercial tampouco se justifica à luz do princípio da isonomia. Eventual bem de família de propriedade do locatário não se sujeitará à constrição e alienação forçada, para o fim de satisfazer valores devidos ao locador. Não se vislumbra justificativa para que o devedor principal, afiançado, goze de situação mais benéfica do que a conferida ao fiador, sobretudo porque tal disparidade de tratamento, ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito à moradia.
3. Premissas fáticas distintivas impedem a submissão do caso concreto, que envolve contrato de locação comercial, às mesmas balizas que orientaram a decisão proferida, por esta Suprema Corte, ao exame do tema nº 295 da repercussão geral, restrita aquela à análise da constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial .
4. Recurso extraordinário conhecido e provido.
Assim, denota-se que, em contrato de locação de imóvel comercial, o fiador não terá o seu bem de família colocado em risco, caso o locatário não honre com os aluguéis e/ou encargos, justamente porque em seu favor milita o direito à moradia, bem como o da dignidade da pessoa humana.
Nesse ínterim, observa-se, de antemão, a inconsistência do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria. Em um momento decidem que é penhorável o bem de família do fiador em contratos de locação urbana, defendendo que o princípio da livre iniciativa pode superar o
direito à moradia (RE 407.688/SP). Anos mais tarde, decidem que é impenhorável o bem de família do fiador em locações comerciais, ainda que a lei em nenhum momento faça qualquer distinção da locação residencial, ao exato argumento reverso, de que a livre iniciativa não pode sobrepujar o direito à moradia.
4.3 Os reflexos do RE 605.709/SP no cenário jurídico-econômico
Após a publicação do acórdão do RE 605.709/SP em fevereiro de 2019, os recorridos opuseram embargos de divergência, restando admitidos e redistribuídos, por efeito de determinação regimental (art. 76 da RISTF). Apesar disso, restou inadmitido pelo Ministro Xxxxx xx Xxxxx em 01 de outubro de 2020, sob o argumento de que “os julgamentos de caráter monocrático emanados do Relator da causa não se revelam hábeis à demonstração do dissídio jurisprudencial”20. Inconformados, foram opostos Embargos de Declaração que serão em breve analisados.
Apesar de não constar repercussão geral ou findada a discussão acerca da matéria, a decisão do RE 605.709/SP vem ganhando força a cada dia perante a Suprema Corte, sendo possível observar, através de decisões monocráticas21, o gradual afastamento da penhorabilidade do único imóvel residencial dos fiadores apenas em contrato de locação de imóvel comercial, acarretando, consequentemente, a frustração dos créditos dos locadores.
Nesse sentido, cabe destacar a falta de cuidado que a 1ª Turma do STF teve em relação à segurança jurídica, considerando os milhares de casos judiciais idênticos que ainda tramitam nos tribunais. A incongruência da Corte em deixar de submeter o caso para apreciação de sua eventual repercussão geral22, gerou decisões destoantes que podem ser vistas tanto nos tribunais superiores, quanto em tribunais estaduais, posto que, ora se aplica, nas fianças decorrentes de locação de imóvel comercial, o tema 295/STF, ora não se aplica.
Outro ponto que merece atenção, a despeito da inquestionável importância da decisão ao tornar possível a revisão da jurisprudência, foi a aplicação do método do distinguishing que
20 RE 605.709 EDv/SP, rel. Ministro Xxxxx xx Xxxxx, julgado 01;out.2020, DJe 09.out.2020
21 RE 1.223.149/DF, rel. Ministra Carmem Xxxxx, julgado 16. ago. 2019, DJe 21.08.2019; RE 1.256.594/RS, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxx, julgado 09. mar. 2020, DJe 11.03.2020; RE 1.268.112/RS, rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxx, julgado 29. mai. 2020, DJe 03.06.2020; RE 1.271.234/RS, rel. Ministo Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, 2ª turma, julgado
19. jun. 2020, DJe 23.06.2020; RE 1.278.282/SP, rel. Ministro Xxxxx Xxxxxxx, julgado 05. ago. 2020, DJe 11.08.2020; e RE 1.278.427/SP, rel. Ministra Carmem Xxxxx, 2ª turma, julgado 03. ago. 2020, DJe 21.09.2020. 22 (...)
O Senhor Ministro Xxxxx Xxxxxxx (Presidente) – Julga na Turma sem a repercussão geral? A Senhora Ministra Xxxx Xxxxx - Sim.
criou uma segregação entre os locadores de imóveis urbanos, nunca antes vistas, já que em nenhum momento o legislador infraconstitucional motivou existir duas categorias no ordenamento jurídico: o locador de imóvel urbano residencial e locador de imóvel urbano comercial.
Nessa mesma lógica, cabe ressaltar também o fato de que no momento em que a 1ª Turma criou uma distinção inexistente na legislação, os Ministros acabaram por dar à norma interpretação extensiva, contrariando o entendimento pacífico quanto à necessidade de interpretação restritiva das regras de exceção, o que corresponde ao disposto no art. 3º, inc. VII da Lei nº 8.009/90.
Por outro lado, há de se destacar o correto prestígio ao direito social fundamental à moradia e ao princípio da dignidade da pessoa humana em face da livre iniciativa, vez que todo ser humano tem necessidade de um lugar para habitar com tranquilidade, de um lugar de sossego e paz para o seu repouso e de seus familiares.
Essa premissa está em consonância com alguns doutrinadores que até o consagram como direito da personalidade, sendo assim, inerente à condição humana, de forma que, assim como os direitos da personalidade, o direito a moradia não pode ser penhorado, e tampouco renunciado, por ser um direito individual, indisponível e inalienável (ORTMEIER; LOCATELI, 2011, p. 69). Inclusive, Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx (2005, p. 204) informa que:
(...) o direito à moradia não só deve ser encarado como uma responsabilidade do Estado – Poder Público – em criar mecanismos ou facilitar para que os indivíduos venham a adquirir um teto, mas também deve assegurar, ao máximo, a manutenção da moradia àquele que já a possuem. Caso contrário, o direito à moradia seria um direito claudicante e incompleto, inapto a promover integralmente a sua finalidade social.
Diante disso, pode-se até mesmo observar que no momento em que o RE 407.688/SP reconheceu a constitucionalidade da exceção do art. 3º, da Lei 8.009/90 ao considerar que a possibilidade de se penhorar o bem de família do fiador do contrato de locação, em última análise, garantia também moradia ao locatário, posto que se estimularia o equilíbrio do mercado imobiliário focada nas locações, há uma paradoxo, haja vista que na tentativa de promover o direito a moradia do locatário, acabou-se por desproteger o direito à moradia do fiador.
Ainda nesse ponto, vale frisar que apesar da obviedade de tal assertiva formulada pelos Ministros do STF na época e reproduzida no voto dos Ministros Xxxx Xxxxxxx, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxxxx no RE 605.709/SP, ela não é mais do que mera especulação
não pautada em dados concretos. Ainda que fosse, resta-se claro que o papel do STF deve permear à questão constitucional, evitando-se uma preocupação sobremodo consequencialista, “sendo a tarefa de tornar o negócio imobiliário menos oneroso ao locador e, por projeção, facilitar-se o acesso à moradia, incumbência do Poder Executivo.”23
Por fim, como pode-se ver, agora o direito à moradia do fiador deve prevalecer em detrimento do direito de crédito do locador comercial, levando em conta que não se pode considerar uma vida digna, sem a garantia de um asilo à família (ORTMEIER; LOCATELI, 2011, p. 71). Entretanto, deve-se ressaltar também que a superveniência de decisões contrárias à orientação firmada pelo pleno do STF no RE 407.688/SP e no Tema 295, nas hipóteses de locação comercial, poderá representar um grande fator de retração do mercado imobiliário em meio à crise econômica gerada pela pandemia por Covid-19, tendo em vista que a fiança ainda se constitui em motivo determinante para a celebração de muitos contratos de locação.
23 XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx. MARQUES, Xxxxxxxx Xxxxxxxx. A inconstitucionalidade da penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação. Boletim Jurídico, 2020. Disponível em <xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxxxx-xxxxx/00000/x- inconstitucionalidade-penhorabilidade-bem-familia-fiador-contrato-locacao> Acesso em: 22.dez.2020
5 CONCLUSÃO
Por todo exposto, é sabido que devido o grande êxito do homestead no Texas, EUA, o instituto do bem de família passou a ser adotado por outros Estados da nação norte-americana, inclusive ultrapassando suas fronteiras. No Brasil, o instituto bem de família foi introduzido pelo Código Civil de 1916, que dele cuidava em quatro artigos (70 a 73), no Livro II, intitulado “Dos Bens”.
O instituto do bem de família no Brasil passou por transformações acompanhando as mudanças sociais. No início, limitava-se apenas a existir por vontade das famílias legalmente constituídas e era regulado pelas disposições do Código Civil de 1916. Entretanto, anos mais tarde, a proteção a este instituto jurídico foi ampliada por meio da Lei 8.009/1990, Código Civil de 2002 e a Constituição Federal.
Atualmente, o instituto caracteriza-se como o imóvel utilizado como residência da família, isento de execução por dívidas de índole civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de qualquer natureza, salvo as exceções previstas em relação aos débitos descritos no seu artigo 3º. Além do mais, o bem de família engloba também a entidade familiar, leia-se não apenas os cônjuges, mas as famílias decorrentes da união estável, da união homoafetiva e entre outras, em respeito à previsão contida no art. 226 da CRFB/88.
Porém, conforme explicado ao longo deste trabalho, a impenhorabilidade do bem de família não é absoluta, vez que há a hipótese prevista no art. 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90, cujos princípios justificadores para a manutenção desta exceção foram o princípio da livre iniciativa (art. 1º, inc. IV, da CRFB/88) e o princípio geral da atividade econômica (art. 170, caput, da CRFB), por meio do RE 407.688/SP. Todavia, anos após a predominância deste pensamento, em recente julgado, a 1ª Turma do STF no RE 605.709/SP privilegiou outros princípios, como o direito à moradia (art. 6º da CRFB/88) e o respeito à dignidade da pessoa humana, (art. 1º, III, da CRFB/88).
Apesar do RE 605.709/SP ter significativa relevância por primar pela aplicação de preceitos constitucionais, a questionável interpretação extensiva da lei por meio da utilização do distinguishing por parte dos Ministros da 1ª Turma do STF é foco de descontentamento, afinal, acabou por criar duas categorias no ordenamento jurídico, nunca antes vistas: o locador de imóvel urbano residencial e locador de imóvel urbano comercial.
Em despeito disso, há de se destacar que o direito à moradia está relacionado com um complexo de direitos que o ser humano necessita para se viver com o mínimo de dignidade,
abrindo portas para se ter acesso a outros direitos fundamentais como a alimentação, a saúde, a educação, o lazer, o descanso e etc. Diante disso, este direito deve ser tutelado de maneira mais rigorosa pelo Estado, fazendo-se prevalecer o interesse social e a dignidade humana nas relações.
Entretanto, é claro que o credor deve ter direito a ter seu crédito satisfeito também, mas não a um preço tão desproporcional. Como bem explicita Xxxx Xxxxx em ser voto no RE 605.709/SP, atualmente há outros meios de garantir a satisfação do crédito do locador comercial, como, por exemplo, a caução, seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundos de investimento (art. 37 da Lei 8.245/1991), podendo incluir também a possibilidade de penhorabilidade de outros bens, que não os imóveis de família.
Além do mais, vale frisar a responsabilidade do Estado no desenvolvimento de políticas públicas, a fim de garantir o acesso ao direito social fundamental à moradia de outras formas, pois o que não cabe é a perpetuação do argumento de que a exceção prevista no art. 3º, da Lei 8.009/90 atenta-se justamente para a efetivação desse direito à aqueles que necessitam locar um imóvel, já que nessa linha de raciocínio justifica-se sacrificar o direito a moradia de uma pessoa em prol do direito de moradia de outra. Ou seja, acata como totalmente plausível proteger um lado para desproteger outro.
Sendo assim, à luz do ordenamento jurídico brasileiro, conclui-se ser inconstitucional a previsão inserta no artigo 3°, VII da Lei 8.009/1990, porque viola o direito à moradia; o princípio da dignidade da pessoa humana; o princípio da isonomia; e a função social do contrato, em razão do prevalecimento do direito de crédito do locador em detrimento do direito fundamental de moradia do fiador, concebido como interesse social.
Por fim, vale ressaltar que apesar do RE 605.709/SP possuir pontos negativos, deixa- se claro a sua importância no ponto de servir como baliza para racionalizar o processo de execução, pugnando pela aplicação dos direitos constitucionais. Ademais, espera-se que com esta decisão, tal entendimento se estenda aos demais tipos de locação, não apenas a comercial, uma vez que os princípios defendidos pela Constituição devem se sobrepor à lei infraconstitucional.
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