EMPRÉSTIMO E DEPÓSITO
EMPRÉSTIMO E DEPÓSITO
FÁTIMA NANCY ANDRIGHI
Ministra do Superior Tribunal de Justiça
Empréstimo - arts. 1248 a 1264, CC de 1916 e 579 a 592, novo CC
O Código Civil trata, no capítulo sob o título “Do empréstimo”,
Comodato, Brasil de dois contratos: o comodato e o mútuo.
Ambos têm por objeto a entrega de uma coisa, para ser usada e depois restituída.
O primeiro é empréstimo para uso apenas, e o segundo, para
consumo.
Comodato - arts. 1248 a 1255, CC de 1916 e 579 a 585, novo CC
Código Civil de 1916 | |
CAPÍTULO VI Do Empréstimo Seção I Do Comodato | |
Art. 579. O comodato e o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfez-se com a tradição do objeto. | Art. 1.248. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto. |
Art. 580. Os tutores, curadores e em geral todos os administradores de xxxx xxxxxxx não poderão dar em comodato, sem autorização especial, os bens confiados à sua guarda. | Art. 1.249. Os tutores, curadores, e em geral todos os administradores de xxxx xxxxxxx não poderão dar em comodato, sem autorização especial, os bens confiados à sua guarda. |
Art. 581. Se o comodato não tiver prazo convencional, presumir-se- lhe-á o necessário para o uso concedido; não podendo o comodante, salvo necessidade imprevista e urgente, reconhecida | Art. 1.250. Se o comodato não tiver prazo convencional, presumir- se-lhe-á o necessário para o uso concedido não podendo o comodante, salvo necessidade imprevista e urgente, reconhecida pelo juiz, suspender o uso e gozo |
pelo juiz, suspender o uso e gozo da coisa emprestada, antes de findo o prazo convencional, ou o que se determine pelo uso outorgado. | da coisa emprestada, antes de findo o prazo convencional, ou o que se determine pelo uso outorgado. |
Art. 582. O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos. O comodatário constituído em mora, além de por ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for arbitrado pelo comodante | Art. 1.251. O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato, ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos. |
Art. 1.252. O comodatário constituído em mora, além de por ela responder, pagará o aluguer da coisa durante o tempo do atraso em restituí-la. | |
Art. 583. Se, correndo risco o objeto do comodato juntamente com outros do comodatário, antepuser este a salvação de seus abandonando o do comodante, responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir a caso xxxxxxxx, ou força maior | Art. 1.253. Se, correndo risco o objeto do comodato juntamente com outros do comodatário, antepuser este a salvação dos seus, abandonando o do comodante, responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir a caso xxxxxxxx, ou força maior. |
Art. 584. O comodatário não poderá jamais recobrar do comodante as despesas feitas com o uso e gozo da coisa emprestada. | Art. 1.254. O comodatário não poderá jamais recobrar do comodante as despesas feitas com o uso e gozo da coisa emprestada. |
Art. 585. Se duas ou mais pessoas forem simultaneamente comodatárias de uma coisa, ficarão solidariamente responsáveis para com o comodante. | Art. 1.255. Se duas ou mais pessoas forem simultaneamente comodatárias de uma coisa, ficarão solidariamente responsáveis para com o comodante. |
Conceito
“O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto”. (art. 1248, CC de 1916 e 579, novo CC).
Características
O comodato tem como características essenciais a gratuidade do contrato, a infungibilidade do objeto e o aperfeiçoamento com a tradição deste.
A gratuidade decorre da própria natureza do contrato de comodato, pois confundir-se-ia com a locação, se fosse oneroso. A propósito, já se decidiu que não desvirtua o contrato de comodato o fato de o comodatário de um apartamento responsabilizar-se pelo pagamento das despesas condominiais e dos impostos.
A infugibilidade do objeto implica na restituição da mesma coisa recebida em empréstimo. Caso seja o objeto fungível ou consumível, tratar-se-á de mútuo. Todavia, pode ser coisa móvel ou imóvel.
O comodato de bens fungíveis ou consumíveis só é admitido quando destinado a ornamentação, como o de uma cesta de frutas, por exemplo (comodatum ad pompam vel ostentationem).
A necessidade da tradição para o seu aperfeiçoamento torna o comodato um contrato real. Desdobra-se, assim, a posse em direta e indireta, permanecendo esta com o comodante.
O comodato é, também, contrato unilateral, temporário e
não solene.
É unilateral porque, aperfeiçoando-se com a tradição, gera obrigações apenas para o comodatário. Só por exceção o comodante pode assumir obrigações, contudo, a posteriori.
O empréstimo é para uso temporário. O ajuste pode ser por prazo determinado ou indeterminado. Neste caso, presume-se ser o necessário para o comodatário servir-se da coisa para o fim a que se destina.
Como a lei não exige forma especial para a sua validade, podendo ser utilizada até a verbal, o comodato é contrato não solene.
Importante salientar que os tutores, curadores, e em geral todos os administradores de xxxx xxxxxxx não poderão dar em comodato os bens confiados à sua guarda, sem autorização especial do juiz (art. 1249, CC de 1916 e art. 580, novo CC).
Objeto
O comodato tem por objeto a entrega de uma coisa, para ser usada e depois restituída. Trata-se de empréstimo apenas para uso da coisa dada em comodato.
Obrigações do comodatário
1. O comodatário deve conservar a coisa como se sua própria fosse, evitando desgastá-la (art. 1251, CC de 1916 e art 582, novo CC). Não pode alugá-la, nem emprestá-la.
Responde o comodatário pelas despesas de conservação, não podendo recobrar do comodante as comuns, como a alimentação do animal emprestado, por exemplo (art. 1254, CC de 1916 e 584, novo CC).
As despesas extraordinárias devem ser comunicadas ao comodante, para que as faça ou autorize o comodatário a fazê-las.
Como possuidor de boa-fé, o comodatário tem direito à indenização das benfeitorias e à retenção da coisa, salvo convenção em contrário (art. 516, CC de 1916 e 1219, novo CC).
Em caso de perigo, preferindo o comodatário salvar os seus bens, abandonando o do comodante, responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir o evento a caso fortuito, ou força maior (art. 1253, CC de 1916 e 583, novo CC).
2. O comodatário deve usar a coisa de forma adequada, isto é, não pode usá-la senão de acordo com o contrato, ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos (art. 1251, CC de 1916 e 582, novo CC). O uso inadequado constitui, também, causa de resolução do contrato.
3. Deve também o comodatário restituir a coisa no prazo convencionado, ou, não sendo este determinado, findo o necessário ao uso concedido. Assim, se alguém empresta um trator para ser utilizado na colheita, presume-se que o prazo do comodato se estende até o final desta.
O comodatário que se negar a restituir a coisa praticará esbulho e estará sujeito à ação de reintegração de posse, além de incidir em dupla sanção: responderá pelos riscos da mora e terá de pagar aluguel durante o tempo do atraso (art. 1252, CC de 1916 e 582, in fine, novo CC).
Como se vê, o art. 582 do novo CC abrigou também o antes disposto no art. 1252 do CC de 1916, com algumas modificações de redação, dispondo que o “comodatário constituído em mora, além de por ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for arbitrado pelo comodante”. O CC de 1916 apenas referia-se ao fato de o comodatário ter que pagar aluguel da coisa “durante o tempo do atraso em restituí-la”, sem referir-se ao arbitramento do aluguel pelo comodante, o que agora se faz constar no novo texto legal.
Em regra, o comodatário não responde pelos riscos da coisa. Mas, se estiver em mora, responde por sua perda ou deterioração, ainda que decorrentes de caso fortuito (art. 957, CC de 1916 e 399, novo CC).
É importante ressaltar que a expressão aluguel vem sendo interpretada como perdas e danos, arbitradas pelo juiz, não transformando o contrato em locação.
Somente por exceção pode o comodante exigir a restituição da coisa antes de findo o prazo convencionado ou o necessário à sua utilização: em caso de “necessidade imprevista e urgente, reconhecida pelo juiz” (art. 1250, CC de 1916 e 581, novo CC).
Extinção do comodato
O comodato extingue-se:
1. pelo advento do termo convencionado ou, não havendo estipulação nesse sentido, pela utilização da coisa de acordo com a finalidade para que foi emprestada;
2. pela resolução, por iniciativa do comodante, em caso de descumprimento, pelo comodatário, de suas obrigações, especialmente por usar a coisa de forma diversa da convencionada ou determinada por sua natureza;
3. por sentença, a pedido do comodante, provada a necessidade imprevista e urgente;
4. pela morte do comodatário, se o contrato foi celebrado intuitu personae, porque nesse caso as vantagens dele decorrentes não se transmitem aos herdeiros (p. ex., quando morre o paralítico a quem foi emprestada a cadeira de rodas). Contudo, se o empréstimo do trator do vizinho, por exemplo, foi feito para uso na colheita, a sua morte prematura não obriga os herdeiros a efetuar a devolução antes do término da aludida tarefa.
Mútuo - arts. 1256 a 1264, CC de 1916 e 586 a 592, novo CC
Código Civil de 1916 | |
Seção II Do Mútuo | |
Art. 586. O mútuo é o empréstimo | Art. 1.256. O mútuo é o |
de coisas fungíveis. O mutuário é | empréstimo de coisas fungíveis. O |
obrigado a restituir ao mutuante o | mutuário é obrigado a restituir ao |
que dele recebeu em coisa do | mutuante o que dele recebeu em |
mesmo gênero, qualidade e | coisas do mesmo gênero, |
quantidade. | qualidade e quantidade. |
Art. 587. Este empréstimo | Art. 1.257. Este empréstimo |
transfere o domínio da coisa | transfere o domínio da coisa |
emprestada ao mutuário, por cuja | emprestada ao mutuário, por cuja |
conta correm todos os riscos dela | conta correm todos os riscos dela |
desde a tradição. | desde a tradição. |
Art. 1.258. No mútuo em moedas de ouro e prata pode convencionar-se que o pagamento se efetue nas mesmas espécies e quantidades, qualquer que seja ulteriormente a oscilação dos seus valores. | |
Art. 588. O mútuo feito à pessoa | Art. 1.259. O mútuo feito à |
menor, sem prévia autorização | pessoa menor, sem prévia |
daquele cuja guarda estiver, não | autorização daquele sob cuja |
pode ser reavido nem do mutuário, | guardar estiver, não pode ser |
nem de seus fiadores. | reavido nem do mutuário, nem de |
seus fiadores, ou abonadores ( art. | |
1.502) | |
Art. 589. Cessa a disposição do artigo antecedente: | Art. 1.260. Cessa a disposição do artigo antecedente: |
I- se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente; | I- se a pessoa de cuja autorização necessitava o mutuário, para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente; |
II- se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais; | II- se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais; |
III- se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal | III- se o menor tiver bens da classe indicada no art. 391, II. |
caso, a execução do credor não lhes poderá ultrapassar as forças; IV- se o empréstimo reverteu em benefício do menor; V- se o menor obteve o empréstimo maliciosamente. | Mas em tal caso, a execução do credor não lhes poderá ultrapassar as forças. |
Art. 590. O mutuante pode exigir garantia da restituição, se antes do vencimento o mutuário sofrer notória mudança em sua situação econômica. | Art. 1.261. O mutuante pode exigir garantia da restituição, se antes do vencimento o mutuário sofrer notória mudança na fortuna. |
Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual. | Art. 1.262. É permitido, mas só por cláusula expressa , fixar juros ao empréstimo de dinheiro ou de outras coisas fungíveis. Esses juros podem fixar-se abaixo ou acima da taxa legal (artigo 1062), com ou sem capitalização. |
Art. 1.263. O mutuário que pagar juros não estipulados, não os poderá rever nem imputar no capital. | |
Art. 592. Não se tendo convencionado expressamente, o prazo do mútuo será: I- até a próxima colheita, se o mútuo for de produto agrícolas, assim para o consumo, como para semeadura; II- de trinta dias, pelo menos, se for de dinheiro; III- do espaço de tempo que declarar o mutuante, se dor de qualquer outra coisa fungível. | Art. 1.264. Não se tendo convencionado expressamente, o prazo do mútuo será: I- até à próxima colheita, se o mútuo for de produtos agrícolas, assim para o consumo, como para a semeadura; II- de 30 (trinta) dias, pelo menos, até prova em contrário, se for dinheiro; III- do espaço de tempo que declarar o mutuante, se for de qualquer outra coisa fungível. |
Conceito
O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis, pelo qual o mutuário obriga-se a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (art. 1256, CC de 1916 e 586,
novo CC). Por ele, o mutuante transfere o domínio da coisa emprestada ao mutuário, que se torna proprietário, e por conta do qual correm todos os riscos da coisa desde a tradição (art. 1257, CC de 1916 e 587, novo CC).
É empréstimo para consumo, pois o mutuário não é obrigado a devolver o mesmo bem, do qual se torna dono (pode consumi-lo, aliená- lo, abandoná-lo, p. ex.), mas sim coisa da mesma espécie. Se o mutuário restituir coisa de natureza diversa, ou soma em dinheiro, haverá respectivamente troca ou compra e venda, e não mútuo, salvo, no último caso, se o empréstimo for de dinheiro, que é bem fungível.
Diferenças entre comodato e mútuo
1. Enquanto o comodato é empréstimo de uso, o mútuo é empréstimo de consumo.
2. O comodato tem por objeto coisas infungíveis, o mútuo
fungíveis.
3. O comodatário só se exonera restituindo a própria coisa emprestada, enquanto que o mutuário desobriga-se restituindo coisa da mesma espécie, qualidade e quantidade.
4. No comodato não há a transferência do domínio, ao passo que o mútuo acarreta tal transferência.
5. Ao comodatário é proibido transferir a coisa a terceiro, enquanto que o mútuo permite a alienação da coisa emprestada.
Características
1. É contrato real, porque aperfeiçoa-se com a entrega da coisa emprestada, não bastando o acordo de vontades ou promessa de emprestar.
2. É gratuito, conforme dispõe o CC, embora o empréstimo de dinheiro seja, em regra, oneroso, com estipulação de juros, sendo por isso denominado mútuo feneratício. Dispunha o CC de 1916 que a onerosidade dependia de convenção expressa (art. 1262); inexistindo, subsistiria a presunção de gratuidade. Contudo, se embora não estipulados, os juros fossem pagos espontaneamente (obrigação natural), não poderiam ser recobrados nem imputados no capital (art. 1263, CC), porque o pagamento voluntário afastaria a presunção de gratuidade. No entanto, o novo CC modificou tal posicionamento, ao dispor, em seu art. 591 que “destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual”. Assim, somente no caso de destinar-se o mútuo a fins econômicos, poderão ser cobrados juros, os quais, ao contrário do estatuído no diploma anterior, não poderão exceder a “taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional” (art. 406, novo CC), permitida a capitalização anual.
3. O mútuo é contrato unilateral, porque com a entrega da coisa emprestada (instante em que se aperfeiçoa) nada mais cabe ao mutuante, recaindo as obrigações somente sobre o mutuário.
4. Constitui contrato não solene, por não ser exigida nenhuma formalidade especial para a sua celebração.
5. É contrato temporário, porque será doação se não houver prazo determinado ou determinável, caso em que se tornaria perpétuo. A propósito, prescrevem o art. 1264 do CC de 1916 e em igual teor o art. 592 do novo CC que, não se tendo convencionado expressamente, o prazo do mútuo será: a) até a próxima colheita, se for de produtos agrícolas; b) de trinta dias, pelo menos, (“até prova em contrário” – suprimida tal expressão no novo CC), se for de dinheiro; e c) do espaço de tempo que declarar o mutuante, se for de qualquer outra coisa fungível.
Como o mútuo transfere o domínio, o mutuante deve ser proprietário daquilo que empresta e ter capacidade para dispor da coisa. O mutuário também há de ser habilitado a obrigar-se.
O mútuo feito à pessoa menor de idade, sem prévia autorização daquele em cuja guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores, (“ou abonadores” – expressão igualmente suprimida no texto do novo CC), consoante dispõe o art. 1259 do CC de 1916 e 588 do novo CC, cuja origem encontra-se nas leis romanas (senatusconsulto macedoniano), salvo (art. 1260 do CC de 1916 e 589, do novo CC) : a) se o representante do menor ratificar o empréstimo; b) se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contraí-lo para os seus alimentos habituais; c) se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho (alterou o novo texto tal disposição ampliando o espectro antes restrito aos bens “da classe indicada no art. 391, II”), caso em que a execução do credor não lhe poderá ultrapassar as forças;
d) se o empréstimo reverteu em benefício do menor; e e) se o menor obteve o empréstimo maliciosamente. Obs.: As alíneas “d” e “e” foram acrescentadas pelo novo texto legal.
Objeto
Assim como o comodato, o mútuo tem por objeto a entrega de uma coisa para ser usada e depois restituída.
Empréstimo em dinheiro
O Código Civil adotou o princípio do nominalismo (art. 947, CC de 1916 e 315, novo CC), por meio do qual se considera como valor da moeda o nominal, atribuído pelo Estado.
O devedor de uma quantia em dinheiro libera-se entregando a quantidade de moeda mencionada no contrato ou título da dívida, e em curso no lugar do pagamento, ainda que desvalorizada pela inflação, ou
seja, mesmo que tal quantidade não seja suficiente para a compra dos mesmos bens que podiam ser adquiridos quando contraída a obrigação.
Desse modo, para contornar os efeitos perversos da desvalorização monetária, permitiu-se o pagamento em moeda estrangeira (art. 947, § 1º, CC, parágrafo este posteriormente revogado pela MP nº 1.540-29/97 – em setembro de 1998 com o nº 1.675-42), e em ouro e prata, o que não o permite o novo CC (art. 318, novo CC).
Dispõe, com efeito, o art. 1258 do CC de 1916 que, “no mútuo em moedas de ouro e prata pode convencionar-se que o pagamento se efetue nas mesmas espécies e quantidades, qualquer que seja ulteriormente a oscilação dos seus valores”.
Tal situação perdurou somente até o ano de 1933, quando o mútuo passou a ser vedado pelo Decreto nº 23.501, substituído pelo Decreto-Lei nº 857, de 11 de setembro de 1969.
Com o passar do tempo, buscaram os credores outros meios para fugir aos efeitos ruinosos da inflação, dentre eles a adoção da cláusula de escala móvel, pela qual o valor da prestação deve variar segundo os índices de custo de vida.
Surgiram, assim, os diversos índices de correção monetária, que podiam ser aplicados sem limite temporal, até a edição da Medida Provisória nº 1.106, de 29 de agosto de 1995, que, pretendendo desindexar a economia, declarou “nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano” (art. 2º, § 1º).
A Lei nº 9.069, de junho de 1995, que dispõe sobre o Plano Real, recepcionou o aludido Decreto-Lei nº 857/69, que veda o pagamento em moeda estrangeira, mas estabelece algumas exceções, tais como a permissão de tal estipulação nos contratos referentes à
importação e exportação de mercadorias e naqueles em que o credor ou devedor seja pessoa domiciliada no exterior. Mesmo antes da referida lei a jurisprudência permitia estipulações contratuais em moeda estrangeira, efetuando-se porém a conversão de seu valor para a moeda nacional, por ocasião do pagamento ou de sua cobrança.
Depósito - arts. 1265 a 1287, CC de 1916 e 627 a 652, novo CC
Código Civil de 1916 | |
CAPÍTULO IX Do Depósito Seção I Do Depósito Voluntário | |
Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame. | Art. 1.265. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame. |
Art. 628. O contrato de depósito é gratuíto, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão. | Parágrafo único. Este contrato é gratuito, mas as partes podem estipular que o depositário seja gratificado. |
Parágrafo único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do lugar, e, na falta desses por arbitramento. | |
Art. 629. O depositário é obrigado a | Art. 1.266. O depositário é |
ter na guarda e conservação da coisa | obrigado a ter na guarda e |
depositada o cuidado e diligência que | conservação da coisa depositada |
costume com o que lhe pertence, | o cuidado e diligência que |
bem como restituí-la, com todos os | costuma com o que lhe pertence, |
frutos e acrescidos, quando o exija o | bem como a restituí-la, com |
depositário. | todos os frutos e acrescidos, |
quando lho exija o depositante. | |
Art. 630. Se o depósito se entregou | Art. 1.267. Se o depósito se |
fechado, colado, selado, ou lacrado, | entregou fechado, colado, selado, |
nesse mesmo estado se manterá. | ou lacrado, nesse mesmo estado |
se manterá; e, se for devassado, | |
incorrerá o depositário na |
presunção de culpa. | |
Art. 631. Salvo disposição em contrário a restituição deve dar-se no lugar em que tiver de ser guardada. As despesas de restituição correm por conta do depositante. | |
Art. 632. Se a coisa houver sido depositada no interesse de terceiro, e o depositário tiver sido cientificado, deste fato pelo depositante, não poderá ele exonerar-se restituindo a coisa a este, sem o consentimento daquele. | |
Art. 633. Ainda que o contrato fixe | Art. 1.268. Ainda que o contrato |
prazo à restituição o depositário | fixe prazo à restituição, o |
entregará o depósito logo que se lhe | depositário entregará o depósito, |
exija, salvo se tiver o direito de | logo que se lhe exija, salvo se o |
retenção, a que se refere o artigo | objeto for judicialmente |
644, se o objeto for judicialmente | embargado, se sobre ele pender |
embargado, se sobre ele pender | execução, notificada ao |
execução, notificada ao depositário | depositário, ou se ele tiver |
ou se houver motivo razoável de | motivo razoável de suspeitar que |
suspeitar que a coisa foi | a coisa foi furtada ou roubada |
dolosamente obtida. | (artigo 1.273). |
Art. 634. No caso do artigo | Art. 1.269. No caso do artigo |
antecedente, última parte, o | antecedente, última parte, o |
depositário, expondo o fundamento | depositário, expondo fundamento |
da suspeita, requererá que se | da suspeita, requererá que se |
recolha o objeto ao depósito público. | recolha o objeto ao depósito |
público. | |
Art. 635. Ao depositário será | Art. 1.270. Ao depositário será |
facultado, outrossim, requerer | facultado, outrossim, requerer |
depósito judicial da coisa, quando, | depósito judicial da coisa, |
por motivo plausível não a possa | quando, por motivo plausível, a |
guardar e o depositante não queira | não possa guardar, e o |
recebê-la. | depositante não lha queira |
receber. | |
Art. 636. O depositário que por | Art. 1.271. O depositário que |
força maior houver perdido a coisa | por força maior houver perdido a |
depositada e recebido outra em seu | coisa depositada e recebido outra |
lugar, é obrigado a entregar a | em seu lugar é obrigado a |
segunda ao depositante, se dele as | entregar a segunda ao |
ações que no caso tiver contra terceiro responsável pela restituição da primeira. | depositante, e ceder-lhe as ações que no caso tiver contra o terceiro responsável pela restituição da primeira. |
Art. 637. O herdeiro do depositário que de boa fé vendeu a coisa depositada é obrigada a assistir o depositante na reivindicação e a restituir ao comprador o preço recebido. | Art. 1.272. O herdeiro do depositário, que de boa-fé vendeu a coisa depositada, é obrigado a assistir o depositante na reivindicação, e a restituir ao comprador o preço recebido. |
Art. 638. Salvo os casos previstos nos artigos 633 e 634, não poderá o depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar. | Art. 1.273. Salvo os casos previstos nos arts. 1268 e 1.269, não poderá o depositário furtar- se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar (art. 1.287). |
Art. 639. Sendo dois ou mais depositantes, e divisível a coisa, a cada um só entregará o depositário a respectiva parte, salvo se houver entre eles solidariedade. | Art. 1.274. Sendo dois ou mais os depositantes, e divisível a coisa, a cada um só entregará o depositário a respectiva parte, salvo se houver entre eles solidariedade. |
Art. 640. Sob pena de responder por perdas e danos não poderá o depositário, sem licença expressa do depositante servir-se da coisa depositada, nem a dar em depósito a outrem. Parágrafo único. Se o depositário devidamente autorizado, confiar a coisa em depósito à terceiro, será responsável se agiu com culpa na escolha deste. | Art. 1.275. Sob pena de responder por perdas e danos, não poderá o depositário, sem licença expressa do depositante servir-se da coisa depositada. |
Art. 641. Se o depositário se tornar incapaz, a pessoa, que lhe assumir a administração dos bens diligenciará imediatamente restituir a coisa depositada, e, não querendo ou não podendo o depositante recebê-la, recolhê-la ao depósito público ou | Art. 1.276. Se o depositário se tornar incapaz, a pessoa, que lhe assumir a administração dos bens, diligenciará imediatamente restituir a coisa depositada, e, não querendo ou não podendo o depositante recebê-la, recolhê-la- |
promoverá nomeação de outro depositário. | á ao depósito público, ou promoverá a nomeação de outro depositário. |
Art. 642. O depositário não responde pelos casos de força maior; mas para que lhe valha a escusa, terá de prová-los. | Art. 1.277. O depositário não responde pelos casos fortuitos, nem de força maior; mas, para que lhe valha a escusa, terá de prová-los. |
Art. 643. O depositante é obrigado a pagar ao depositário as despesas feitas com a coisa, e os prejuízos que do depósito provierem. | Art. 1.278. O depositante é obrigado a pagar ao depositário as despesas feitas com a coisa, e os prejuízos que do depósito provierem. |
Art. 644. O depositário poderá reter o depósito até que se lhe pague a retribuição devida, o líquido valor das despesas, ou dos prejuízos a que se refere o artigo anterior, provando, imediatamente esses prejuízos ou essas despesas. Parágrafo único. Se essas dívidas, despesas ou prejuízos, não forem provados suficientemente, ou forem ilíquidos o depositário poderá exigir caução idônea do depositante, ou na falta desta, a remoção da coisa para o depósito público, até que se liquidem. | Art. 1.279. O depositário poderá reter o depósito até que se lhe pague o líqüido valor das despesas, ou dos prejuízos, a que se refere o artigo anterior, provando imediatamente esses prejuízos ou essas despesas. Parágrafo único - Se essas despesas ou prejuízos não forem provados suficientemente, ou forem ilíqüidos, o depositário poderá exigir caução idônea do depositante ou, na falta desta, a remoção da coisa para o depósito público, até que se liquidem. |
Art. 645. O depósito de coisas fungíveis em que o depositário se obrigue a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo disposto acerca do mútuo. | Art. 1.280. O depósito de coisas fungíveis, em que o depositário se obrigue a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo disposto acerca do mútuo (arts. 1.256 a 1.264). |
Art. 646. O depósito voluntário provar-se-á por escrito. | Art. 1.281. O depósito voluntário provar-se-á por escrito. |
Seção II Do Depósito Necessário | |
Art. 647. É depósito necessário: | Art. 1.282. É depósito necessário: |
I - o que se faz em desempenho de obrigação legal; II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou o saque. | I - o que se faz em desempenho de obrigação legal (art. 1.283); II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio, ou o saque. |
Art. 648. O depósito a que se refere o inciso I do artigo antecedente, reger-se-á pela disposição da respectiva lei, e, no silêncio ou deficiência dela, pelas concernentes ao depósito voluntário. Parágrafo único. As disposições desse artigo aplicam-se aos depósitos previstos no inciso II do artigo antecedente, podendo estes certificarem-se por qualquer meio de prova. | Art. 1.283. O depósito de que se trata no artigo antecedente, nº I, reger-se-á pela disposição da respectiva lei, e, no silêncio, ou deficiência dela, pelas concernentes ao depósito voluntário (arts. 1.265 a 1.281). Parágrafo único. Essas disposições aplicam-se, outrossim, aos depósitos previstos no art. 1.282, II; podendo estes certificar-se por qualquer meio de prova. |
Art. 649. Aos depósitos previstos no artigo antecedente é equiparado o das bagagens dos viajantes ou hóspedes nas hospedarias onde estiverem. Parágrafo único. Os hospedeiros responderão como depositários assim como pelos furtos e roubos que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas nos seus estabelecimentos. | Art. 1.284. A esses depósitos é equiparado o das bagagens dos viajantes, hóspedes ou fregueses, nas hospedarias, estalagens ou casas de pensão, onde eles estiverem. Parágrafo único. Os hospedeiros ou estalajadeiros por elas responderão como depositários, bem como pelos furtos e roubos que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas nas suas casas. |
Art. 650. Cessa, nos casos do artigo antecedente, a responsabilidade dos hospedeiros, se provarem que os fatos prejudiciais aos viajantes ou hóspedes não podiam ter sido evitados. | Art. 1.285. Cessa, nos casos do artigo antecedente a responsabilidade dos hospedeiros ou estalajadeiros: I - se provarem que os fatos prejudiciais aos hóspedes, viajantes ou fregueses não podiam ter sido evitados; II - se ocorrer força maior como nas hipóteses de escalada, invasão da casa, roubo à mão armada ou violências |
semelhantes. | |
Art. 651. O depósito necessário não se presume gratuíto. Na hipótese do art. 649, a remuneração pelo depósito está incluída no preço da hospedagem. | Art. 1.286. O depósito necessário não se presume gratuito. Na hipótese do art. 1.284, a remuneração pelo depósito está incluída no preço da hospedagem. |
Art. 652. Seja o depósito voluntário ou necessário, o depositário que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano e ressarcir os prejuízos. | Art. 1.287. Seja voluntário ou necessário o depósito, o depositário, que o não restituir, quando exigido, será compelido a fazê-lo, mediante prisão não excedente a 1 (um) ano, e a ressarcir os prejuízos (art. 1.273). |
Conceito
“Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame” (art. 1265, CC de 1916 e art. 627, novo CC).
Finalidade
Sua principal finalidade é a guarda de coisa alheia.
Aperfeiçoamento
Aperfeiçoa-se com a entrega da coisa ao depositário.
Características
1. É contrato real, porque para existir, exige-se a tradição, não bastando o acordo de vontades. Todavia, a tradição se presume caso o objeto já esteja em poder do depositário.
2. O objeto deve ser de natureza móvel, entregue para guarda, e não para uso.
3. A obrigação de restituir é, também, da essência do contrato de depósito.
4. O contrato é temporário, porque o depositário recebe o objeto móvel, para guardar, “até que o depositante o reclame”.
5. É gratuito, mas podem as partes estipular remuneração, conforme dispõe o art. 1265, parágrafo único, do CC de 1916. O art. 628 do novo CC, todavia, enumera os casos em que o depósito será oneroso, quais sejam: a) se houver convenção nesse sentido; b) se o contrato for resultante de atividade negocial; e c) se o depositário praticar o depósito por profissão. Dispõe ainda o art. 628, do novo CC, verbis: “Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do lugar, e, na falta destes, por arbitramento”.
6. Quando oneroso, o depósito é contrato bilateral; sendo gratuito, é unilateral, porque aperfeiçoa-se com a entrega da coisa, após a qual restarão obrigações para o depositante, como a de pagar ao depositário as despesas feitas com a coisa.
Importante salientar que, se o depositário realizar algum serviço na coisa depositada (a lavagem do veículo, p. ex.), o depósito não fica desvirtuado. Da mesma forma se vier a usá-la, desde que tal uso não se constitua no fim precípuo do contrato. Se tal ocorrer, transformar-se-á em comodato ou em locação, conforme seja gratuito ou oneroso.
No comodato, o comodatário recebe a coisa para seu uso, enquanto no depósito a recebe para guardá-la. Portanto, para usá-la, necessita de expressa permissão do depositante.
Se a coisa é entregue não para ser guardada, mas para ser administrada, haverá contrato de mandato. Todavia, o depositário pode ser, simultaneamente, mandatário. É o que acontece com os bancos que
se encarregam da custódia de ações, com a obrigação de receberem também as bonificações e dividendos.
Tratando-se de coisa entregue para vender em exposição pública e confiada à pessoa que a recebe, o contrato é de depósito. Mas, se emprestada aos expositores, para exibição, será comodato.
Obrigações do depositário
1. Guardar e conservar a coisa depositada, com o cuidado e diligência que costuma ter com o que lhe pertence (art. 1266, CC de 1916 e 629, novo CC).
O depositário deve conservar a coisa como se fosse sua, podendo confiá-la, para maior segurança, a um banco ou a terceiro.
Responde, o depositário, por culpa ou dolo, se a coisa perecer ou deteriorar-se, seja o depósito gratuito ou remunerado. Só se exonera provando o caso fortuito ou a força maior (art. 1277, CC de 1916). O novo CC não previu a ocorrência de caso fortuito no dispositivo de lei correspondente, qual seja, o art. 642, de modo que somente não responderá pelos casos de força maior, desde que provados.
Se o depósito se entregou fechado, nesse mesmo estado se manterá; e, se for devassado, incorrerá o depositário na presunção de culpa. Assim dispunha o art. 1267 do CC de 1916. O art. 630, porém, do novo CC, excluiu a parte final, silenciando a respeito da presunção de culpa.
2. Deve o depositário também restituir a coisa, com os seus frutos e acrescidos, quando lhe exija o depositante (art. 1266, do CC de 1916 e 629 do novo CC).
Importante salientar a inclusão de dois novos dispositivos no novo CC, no tocante à restituição da coisa, verbis:
Art. 631 – “Salvo disposição em contrário a restituição deve dar-se no lugar em que tiver de ser guardada. As despesas de restituição correm por conta do depositante”.
Art. 632 – “Se a coisa houver sido depositada no interesse de terceiro, e o depositário tiver sido cientificado deste fato pelo depositante, não poderá ele exonerar-se restituindo a coisa a este, sem consentimento daquele”.
Ainda que o contrato fixe prazo à restituição, o depositário entregará o depósito logo que se lhe exija.
Não estará, portanto, obrigado a fazê-lo: a) “se tiver o direito de retenção a que se refere o artigo 644” (hipótese inclusa pelo novo CC);
b) se o objeto for judicialmente embargado; c) se sobre ele pender execução, notificada ao depositário; d) se tiver motivo de suspeitar que a coisa foi “dolosamente obtida” (redação diversa dada pelo novo CC à expressão outrora “furtada ou roubada”), caso em que a recolherá ao depósito público (arts. 1268 e 1269, CC de 1916 e 633 e 634, novo CC).
Salvo essas hipóteses, não pode furtar-se à restituição alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar (art. 1273, CC de 1916 e 638, novo CC).
Se o depositário descobrir que a coisa lhe pertence, mesmo assim deve devolvê-la e depois reivindicá-la judicialmente, sob pena de estar fazendo justiça pelas próprias mãos.
Assegura-se-lhe o direito de retenção apenas pelo valor “da retribuição que lhe é devida” (inclusão do novo CC), das despesas necessárias à conservação da coisa e dos prejuízos com o depósito (art. 1279, CC de 1916 e 644, novo CC), que o depositante é obrigado a lhe pagar (art. 1278, CC de 1916 e 643, novo CC).
Havendo dois ou mais depositantes, e divisível a coisa, a cada um só entregará o depositário à respectiva parte, salvo se houver entre eles solidariedade (art. 1274, CC de 1916 e art. 639, novo CC).
Dispõe igualmente o CC que ao depositário é facultado requerer depósito judicial da coisa, quando não a possa guardar e o depositante não a queira receber, desde que para tanto demonstre motivo plausível (art. 1270, CC de 1916 e 635 do novo CC).
Caso o depositário houver perdido a coisa, por motivo de força maior, e recebido outra em seu lugar, será obrigado a entregar a segunda ao depositante, e ceder-lhe as ações que no caso tiver contra terceiro responsável pela restituição da primeira (art. 1271, CC de 1916 e 636, do novo CC).
Dispõe ademais, o art. 1272 do CC de 1916 e o art. 637 do novo CC, que caso o herdeiro do depositário houver vendido a coisa depositada, desde que de boa fé, será obrigado a assistir o depositante na reivindicação, bem como a restituir ao comprador o preço recebido.
Espécies de depósito
Depósito Voluntário – arts. 1265 a 1281, CC de 1916 e 627 a 646, novo CC
O depósito voluntário resulta de acordo de vontades e as disposições a ele relativas aplicam-se subsidiariamente ao depósito necessário.
O depósito voluntário deverá ser provado por escrito (art.
1281, CC de 1916 e 646, novo CC).
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx – arts. 1282 a 1287, CC de 1916 e 647 a 652, novo CC
O depósito necessário (obrigatório) é o que independe da vontade das partes.
Subdivide-se em legal e miserável.
É legal quando se faz em desempenho de obrigação de lei (art. 1282, I, CC de 1916 e art. 647, I, novo CC), como o das bagagens dos hóspedes nos hotéis (art. 1284, CC de 1916 e 649, novo CC). Há várias hipóteses de depósito legal (arts. 603, parágrafo único, do CC de 1916 e 1233, do novo CC; 793 e 984, do CC de 1916).
É miserável o depósito que se efetua por ocasião de alguma calamidade pública (art. 1282, II, CC de 1916 e 647, II, novo CC).
Ao depósito necessário é equiparado o da bagagem dos viajantes, hóspedes ou fregueses, nas hospedarias, estalagens ou casas de pensão (necessário por assimilação), onde eles estiverem (art. 1284, do CC de 1916). O art. 649, do novo CC, suprimiu os termos “fregueses” e “estalagens” e a expressão “casas de pensão”, do respectivo dispositivo. Contudo, tal dispositivo aplica-se ao contrato de hospedagem, estendendo-se aos internatos, colégios, hospitais, e outros locais que forneçam leito e não apenas comida e bebida.
Os hospedeiros respondem pelas bagagens como depositários. A responsabilidade decorre tanto de atos de terceiros, como de empregados ou pessoas admitidas nas hospedarias. Cessa, porém, provado que: a) os fatos prejudiciais aos hóspedes não podiam ser evitados, como na hipótese de culpa destes, por deixarem aberta a porta do quarto (art. 1285, CC de 1916 e 650, novo CC); b) se ocorrer força maior, como nas hipóteses de escalada, invasão da casa, roubo à mão armada, ou violências semelhantes (tal disposição está contida apenas no art. 1285, do CC de 1916, tendo sido suprimida na nova lei).
A obrigação de ressarcir o prejuízo não pode ser excluída nem mediante cláusula de não indenizar pactuada com o hóspede, pois o hoteleiro é um prestador de serviços e o CDC considera nula cláusula dessa espécie (art. 51, I e IV, CDC).
A responsabilidade restringe-se às roupas e coisas de uso pessoal, que habitualmente são levadas em viagens, não abrangendo jóias e bens de grande valor, que deverão ser objeto de depósito voluntário.
Dispõe o art. 1286, do CC de 1916 e o art. 651, do novo CC, que o depósito necessário não se presume gratuito, porque a remuneração pelo depósito, no caso de hospedarias, está incluída no preço da hospedagem.
Há ainda a classificação em depósito regular e irregular.
O depósito regular ou ordinário é aquele que recai sobre coisa
infungível.
O depósito irregular envolve bens fungíveis, como o dinheiro, obrigando-se o depositário a restituir coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. Cite-se, como exemplo, o depósito bancário, que se rege pelo disposto acerca do mútuo, acarretando a transferência do domínio (art. 1280, CC de 1916 e art. 645, novo CC).
O depósito pode ser também civil e comercial. Será da última espécie somente o que for feito por causa proveniente de comércio, em poder de comerciante, ou por conta de comerciante (art. 280, Com). Os demais são civis.
Prisão do depositário infiel
A Constituição Federal proíbe a prisão por dívida civil, mas ressalva a do devedor de pensão alimentícia e a do depositário infiel (art. 5º, LXVII).
Por sua vez, o disposto nos arts. 1287, do CC de 1916 e 652, do novo CC sujeita o depositário infiel à prisão não excedente a um ano, e a ressarcir os prejuízos.
A sanção atua como meio de coerção e não propriamente como pena, pois a lei não estabeleceu um prazo mínimo para sua duração, estando ele na própria vontade do depositário, que pode dela liberar-se desde o momento em que cumpra a obrigação de restituir.
Caso a obrigação de restituir resulte de contrato, a prisão só pode ser decretada em ação de depósito (art. 901, CPC).
Todavia, a prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo (Súmula 619/STF).