A C Ó R D Ã O
A C Ó R D Ã O
4ª Turma
MF/MCG/ncp
INVENTO OU APERFEIÇOAMENTO – ARTIGO 42 DO CÓDIGO DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL DE 1971 – SILÊNCIO DO CONTRATO DE TRABALHO ACERCA DE
ATIVIDADES INVENTIVAS DO RECLAMANTE - INDENIZAÇÃO DE METADE DO PROVEITO ECONÔMICO AUFERIDO PELA RECLAMADA COM O APERFEIÇOAMENTO PRODUZIDO PELO
RECLAMANTE – INDENIZAÇÃO DEVIDA. Adotadas as premissas de que o
aperfeiçoamento realizado pelo reclamante na peça denominada “braçadeira de engate de vagões” permitiu a substituição das peças importadas por
outras, de fabricação nacional e mais baratas, e ainda que tal
aperfeiçoamento, que não era o objeto do contrato de trabalho, decorreu da contribuição pessoal do reclamante, com a utilização de recursos da
empresa, inviável cogitar-se de violação direta e literal do artigo 42 da Lei nº 5.772/71, decorrente da condenação da reclamada à indenização
correspondente à metade do proveito econômico que passou a usufruir em razão do invento do reclamante. O v. acórdão do Regional, longe de
vulnerar esse dispositivo, aplicou-o corretamente. Agravo de instrumento não provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-AIRR-433/1986-001-17-00.8, em que é agravante COMPANHIA VALE DO RIO DOCE e agravado XXXXXXXXX XXXXXX XXXXXXX DOS
SANTOS.
Contra o r. despacho de fls. 459/461, que negou seguimento ao seu recurso de revista, sob o fundamento de inexistência de negativa de prestação
jurisdicional, incolumidade do artigo 114 da Constituição Federal de 1988 e ainda de incidência dos Enunciados nºs 126, 221 e 296 do TST, a
reclamada interpõe agravo de instrumento (fls. 472/478).
Insiste na argüição de incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar o feito, nos termos do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, pois a matéria versada nos autos, a saber, indenização por participação em
inventos, não tem natureza trabalhista, segundo afirma. Argúi, ainda, a nulidade do v. acórdão do Regional por negativa de prestação
jurisdicional e a conseqüente violação dos artigos 832 e 897-A da CLT,
458 e 535 do CPC, 5º, XXXV e LV, e 93, IX, da Constituição Federal de 1988, caracterizada pela suposta recusa do i. Juízo a quo de sanar as omissões apontadas nos embargos de declaração. No mérito, sustenta que sua revista merece ser admitida, porque o v. acórdão do Regional, ao
admitir a participação do reclamante na criação de inventos, não obstante tal criação fosse exatamente o objeto do contrato de trabalho, violou os artigos 40 e 42 da Lei nº 5.772/71 e 89 da Lei nº 9.279/96. Alega que o
trabalho de criação de inventos do reclamante ocorria com a participação de outros empregados e com uso de materiais fornecidos pelo empregador.
Diz que não é necessário o reexame de fatos e provas para se concluir pela violação direta e literal dos dispositivos apontadas na revista. Finalmente, aduz que colacionou divergência jurisprudencial específica nas razões de revista, nos termos do Enunciado nº 296 do TST.
Contraminuta a fls. 490/495.
Os autos não foram remetidos à d. Procuradoria-Geral do Trabalho.
Relatados .
V O T O
O agravo de instrumento é tempestivo (fls. 462 e 472), está subscrito por advogado devidamente habilitado nos autos (fls. 479/481) e foi processado nos autos principais.
CONHEÇO.
Contra o r. despacho de fls. 459/461, que negou seguimento ao seu recurso de revista, sob o fundamento de inexistência de negativa de prestação
jurisdicional, incolumidade do artigo 114 da Constituição Federal de 1988 e ainda de incidência dos Enunciados nºs 126, 221 e 296 do TST, a
reclamada interpõe agravo de instrumento (fls. 472/478).
Insiste na argüição de incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar o feito, nos termos do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, pois a matéria versada nos autos, a saber, indenização por participação em
inventos, não tem natureza trabalhista, segundo afirma. Argúi, ainda, a nulidade do v. acórdão do Regional por negativa de prestação
jurisdicional e a conseqüente violação dos artigos 832 e 897-A da CLT,
458 e 535 do CPC, 5º, XXXV e LV, e 93, IX, da Constituição Federal de 1988, caracterizada pela suposta recusa do i. Juízo a quo de sanar as omissões apontadas nos embargos de declaração. No mérito, sustenta que sua revista merece ser admitida, porque o v. acórdão do Regional, ao
admitir a participação do reclamante na criação de inventos, não obstante tal criação fosse exatamente o objeto do contrato de trabalho, violou os artigos 40 e 42 da Lei nº 5.772/71 e 89 da Lei nº 9.279/96. Alega que o
trabalho de criação de inventos do reclamante ocorria com a participação de outros empregados e com uso de materiais fornecidos pelo empregador.
Diz que não é necessário o reexame de fatos e provas para se concluir pela violação direta e literal dos dispositivos apontadas na revista. Finalmente, aduz que colacionou divergência jurisprudencial específica nas razões de revista, nos termos do Enunciado nº 296 do TST.
Sem razão.
I – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
No que tange à competência da Justiça do Trabalho para conhecer do pedido deduzido, o v. acórdão do Regional negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, sob o seguinte fundamento, in verbis:
“Sustenta a Companhia Vale do Rio Doce a incompetência absoluta, eis que se trata de pedido de indenização em razão do invento, entendendo ser a Justiça do Trabalho incompetente para apreciar a questão. Equivoca-se, data vênia, a reclamada. A controvérsia decorre da existência da relação de emprego, estando intimamente ligada ao contrato de emprego, razão pela qual a competência é da Justiça do Trabalho, nos termos do disposto no artigo 114 da Constituição da República. Transcrevemos decisão proferida pelo E. TRT da 4ª Região, no mesmo sentido:
‘PRÊMIO-INVENÇÃO’. Por fim, a recorrente rebela-se contra a condenação ao pagamento de ‘prêmio invenção’ e de indenização pela ‘criação de modelo de marcador de rótulos de garrafas’, sustentando a incompetência da Justiça do Trabalho para o exame da matéria. Afirma revogado o art. 454 da CLT pela Lei nº 5.772/71 (Código de Propriedade Industrial), ao tratar do invento ocorrido na vigência do contrato de trabalho. Aduz ter a Lei nº 9.279/96 entrado em vigor somente em 14.05.97, sendo a matéria regulada, hoje, pelos arts. 88 a 93, porém, inaplicáveis ao caso sub judice . Sustenta afronta à Lei nº 5.772/71, bem como ao princípio da legalidade. Sucessivamente, argumenta que, consoante a referida lei (§ 1º do art. 40), salvo
estipulação expressa em contrário, a compensação do trabalho ou serviço será limitada à remuneração ou ao
salário ajustado. Também aqui o apelo não merece acolhida. A competência da Justiça do Trabalho para solução do litígio é evidente, pois resulta ele de atividade decorrente da relação de emprego, incidindo o disposto no art. 114 da CF/88. Inexiste, outrossim, a alegada afronta á Lei nº 5.772/71 ou ao princípio da legalidade (como aduz a recorrente), como bem aponta o MM. Juízo a quo : a competência da Justiça do
Trabalho para apreciar referida controvérsia relativa a invento ou criação concretizadas pelos trabalhadores é determinada pela Lei nº 5.772/71, e artigo 454 da CLT, este abrangido pela referida Lei. Ressalta-se que a
competência firma-se em decorrência do contrato de trabalho, sem o qual tal criação não teria ocorrido (fl. 220). Inaplicável o disposto no § 1º do art. 40 da Lei nº 5.772/71, mas sim o art. 41 do mesmo diploma legal, porque não se cuida de contrato destinado a pesquisa no Brasil (na forma do primeiro dispositivo). Não se
sustenta, portanto, o argumento da recorrente no sentido de que a remuneração do obreiro, mediante pagamento de seu salário, afastaria o direito à percepção da parcela em discussão; o próprio conteúdo dos documentos juntados às fls. 130 e seguintes (em especial o da fl. 136), no qual se observa a instituição de prêmio no valor de até dez salários mínimos para os vencedores do concurso (Operação Time 2000) rechaça a tese patronal. Estando amplamente comprovada a participação, com êxito, aliás, do recorrido no curso, não há o que reparar no julgado’.
Assim, rejeito a alegação de incompetência” (fls. 400/402).
Quanto ao mérito, o v. acórdão do Regional encontra-se assim fundamentado, ipsis litteris:
“Tratam os autos de pedido de indenização em razão da meação nos inventos ou aperfeiçoamento de equipamentos.
O reclamante, que exercia o cargo de Técnico Especializado em mecânica, alega que em 1983, sem prejuízo das funções de seu cargo, nos intervalos das tarefas, idealizou, desenvolveu e concluiu dois inventos ou
aperfeiçoamentos nos vagões da reclamada. Segundo o autor, o primeiro invento ou aperfeiçoamento
consiste no seguinte: os vagões da reclamada são engatados um ao outro mediante um conjunto composto de três peças: a primeira denominada ‘engate rotativo’. Essa peça é introduzida na segunda a qual é denominada ‘braçadeira rotativa’. A terceira, denominada ‘colar rotativo’, serve para fixar a primeira na segunda. Esse
conjunto era importado dos Estados Unidos sob a marca ‘National’. Quando se quebrava o engate – o que ocorria com freqüência – as três peças do conjunto eram sucateadas e vendidas como ferro velho, embora as duas outras peças estivessem em bom estado de conservação e uso. Isso porque essas peças, quer isoladamente, quer em conjunto, não mais eram, como não são, importadas, não tendo a reclamada como
adquiri-las, e a braçadeira rotativa só podia ser usada com o engate e colar da mesma fabricação. Assim a inutilização do engate acarretava a automática inutilização das duas outras peças.
O invento do Reclamante consiste em modificação na braçadeira do conjunto em apreço. Mediante essa modificação, dita braçadeira pode ser utilizada em conjunto com engate de marca ‘Cobrasma’, de fabricação nacional. Dito engate – ‘Cobrasma’ – pode ser adquirido no Brasil isoladamente, formando com a braçadeira importada, modificada pelo reclamante, um novo conjunto. Isso possibilitou à reclamada o reaproveitamento, até a presente data, de cerca de 5.000 (cinco mil) braçadeiras, em perfeito estado de uso e conservação que
seriam sucateadas em face da inutilização dos respectivos engates. Para chegar ao invento ou
aperfeiçoamento em apreço o reclamante teve que criar vários dispositivos mecânicos até então inexistentes e indispensáveis à execução do projeto.
No segundo invento afirma o reclamante que os vagões dos veículos utilizados pela reclamada sofriam rupturas em suas extremidades, inutilizando-as. O invento consistiu na alteração do formato da extremidade do vagão. Para a execução dos projetos, o reclamante afirma que contou com a colaboração de outros
empregados.
A empresa, em sua defesa e recurso, afirma que a invenção ou aperfeiçoamento realizado pelo reclamante se deu no horário de trabalho e que estas eram as atividades do reclamante:
‘Acompanhar, controlar e realizar estudos sobre instalações, manutenções e reparações mecânicas, tendo como atribuições gerais acompanhar os esquemas técnicos de instalações, manutenções e reparações
mecânicas, orientando sua execução; controlar as diversas operações, verificando as especificações e padrões de funcionamento dos equipamentos e máquinas; analisar programas de montagem e conservação dos
equipamentos, fornecendo dados a chefia superior para correções e modificações nos planos de manutenção;
analisar especificações dos equipamentos e informar sobre sua aplicação, obedecidos os padrões; realizar estudos técnicos que lhe forem determinados pela chefia superior’.
No contrato de trabalho – fls. 64/66 – não há qualquer disposição expressa sobre pesquisa, invenção ou aperfeiçoamento.
Aduz que o reclamante fazia parte de um grupo pioneiro de controle de qualidade, modificando dimensões e formas de peças. Alega que entre as atribuições do reclamante estava acompanhar, controlar e realizar
estudos sobre instalações, manutenções e reparações mecânicas, tendo como atribuições gerais acompanhar os esquemas técnicos de instalações, manutenções e reparações mecânicas, orientando sua execução.
Afirma a empresa que a peça ‘engate rotativo’ já existe, sendo objeto de patente originária dos EUA, sendo a Cobrasma a detentora de licença para produção em nosso país.
(...)
Aduz a Lei 5.772/71, aplicável na hipótese, eis que vigente quando do trabalho do reclamante: Do invento ocorrido na vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços
Art. 40. Pertencerão exclusivamente ao empregador os inventos, bem como os aperfeiçoamentos, realizados durante a vigência do contrato expressamente destinado a pesquisa no Brasil, em que a atividade inventiva do assalariado ou prestador de serviços seja prevista, ou ainda que decorra da própria natureza da atividade contratada.
Art. 41. Pertencerá exclusivamente ao empregado ou prestador de serviços o invento ou o aperfeiçoamento realizado sem relação com contrato de trabalho ou prestação de serviços ou, ainda, sem utilização de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador.
No contrato de trabalho – fls. 64/66 – não há qualquer disposição expressa sobre pesquisa, invenção ou
aperfeiçoamento, razão pela qual inaplicável o disposto no artigo 40. Da mesma forma, o próprio reclamante afirma que se utilizou de material, recursos, dados, e meios da empresa, não sendo aplicável o artigo 41.
Resta-nos o artigo 42:
Art. 42. Salvo expressa estipulação em contrário, o invento ou aperfeiçoamento realizado pelo empregado ou pelo prestador de serviços não compreendido no disposto no artigo 40, quando decorrer de sua contribuição pessoal e também de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, será de propriedade comum, em partes iguais, garantido ao empregador o direito exclusivo da licença de exploração, assegurada ao empregado ou prestador de serviços a remuneração que for fixada.
§ 1º A exploração do objeto da patente deverá ser iniciada pelo empregador dentro do prazo de um ano, a contar da data de expedição da patente, sob pena de passar à exclusiva propriedade do empregador ou do prestador de serviços o invento ou aperfeiçoamento.
§ 2° O empregador poderá ainda requerer privilégio no estrangeiro, desde que assegurada ao empregado ou prestador de serviços a remuneração que for fixada.
§ 3º Na falta de acordo para iniciar a exploração da patente, ou no curso dessa exploração, qualquer dos co- titulares, em igualdade de condições, poderá exercer a preferência, no prazo que dispuser a legislação
comum.
Como bem afirmado pelo Juízo a quo , a prova pericial produzida nos autos comprovou a existência dos
aperfeiçoamentos tecnológicos tanto no conjunto de engates de vagões quanto em relação às alterações nas extremidades dos vagões, ressaltando, todavia, que em nenhum caso houve modificação do princípio do funcionamento do conjunto. Quanto ao primeiro engenho, não resta dúvida que resultou de ato inventivo do reclamante, que introduziu disposições novas, em relação ao estado de técnica, em objeto já existente, permitindo uma melhor utilização na função a que se destina. A inovação, neste caso, mesmo para um técnico no assunto, não decorre de maneira comum ou vulgar do estado da técnica. Destarte, tem-se
assentado que o mencionado aperfeiçoamento (modificação da braçadeira rotativa) caracteriza-se como modelo de utilidade. No que diz respeito à alteração da caixa dos vagões, o ato inventivo caracterizou-se
como um mero processo de ‘adoçamento’ (diminuição de arestas no encontro de duas superfícies), ou seja,
consistiu em pequenas mudanças de formato que não introduziram princípio novo de projeto, sendo que, para um técnico no assunto, a alteração proposta pelo reclamante sobrevem à sua mente de maneira comum, sem maiores elucubrações.
A perícia deixa claro que a inovação resultou da natureza dos serviços para os quais o reclamante fora contratado, isso no que concerne à alteração na caixa dos vagões. Mas no que tange à modificação de braçadeira, a situação é diversa, eis que o tal aperfeiçoamento decorreu da contribuição pessoal do
reclamante, com a utilização de recursos da empresa (como confessado), incidindo o disposto no artigo 42 da lei citada. Neste caso, o invento pertence ao empregado e ao empregador, em partes iguais, cabendo a este último a sua exploração, porém, devendo assegurar ao autor da invenção uma participação (prêmio) que tenha por base o ganho econômico auferido pela empresa na utilização do invento.
O fato de o aperfeiçoamento ser decorrência de ciclo de estudos de controle de qualidade, não viabiliza a pretensão, já que o autor se encontrava à disposição da empresa.
O fato alegado pela empresa no sentido de que a indenização está vinculada à existência de um proveito
econômico e que esta não foi provado é muito bem apreciado na sentença que aduz reconhecida a existência do ato inventivo, consubstanciado no modelo de utilidade da braçadeira rotativa, mister averiguar-se o proveito econômico decorrente de sua utilização. Havia à época, por medida de política governamental (substituição de importação), restrições à importação da peça denominada engate rotativo, de fabricação norte-americana, face a existência de similar nacional. Tal peça quebrava-se com bastante freqüência, resultando no sucateamento das outras duas peças componentes do Sistema Rotativo de Acoplamento, a
saber: colar rotativo e braçadeira rotativa, todos da marca ‘National Casting’. Com o aperfeiçoamento tecnológico realizado na braçadeira rotativa, tornou-se possível utilizá-la com o engate e colar de fabricação nacional, evitando, assim, que grande quantidade de braçadeiras fossem sucateadas, nisso resultando o ganho econômico para a reclamada. E ficou evidente nos autos que a reclamada aprovou o modelo de utilidade desenvolvido pelo reclamante, passando então a utilizar-se do mesmo, auferindo ganho econômico. De
acordo com o documento de fls. 96, havia 1.098 braçadeiras em estoque e 3.601 em circulação, todas da marca ‘National Casting’, passíveis de ser reutilizadas em conjunto com outras peças de fabricação nacional, após passarem pelo processo criado pelo reclamante. O ganho econômico está claro e pode ser verificado na fase de liqüidação (em arbitramento) conforme determinado pela sentença.” (fls. 402/408).
Seguiu-se então a oposição de embargos de declaração (fls. 410/415),
mediante os quais a reclamada buscava ver sanadas as seguintes omissões: que o reclamante alegou, na petição inicial, que a invenção ocorrida
seria mista, e, portanto, a indenização devida seria a societária, na forma de meação, e não aquela denominada “prêmio-incentivo”, típica da relação de emprego e regulamentada por normas internas da reclamada, o
que afastaria, aparentemente, a competência da Justiça do Trabalho; que o “adoçamento” da caixa de vagões é uma invenção de serviço, porque se
limitou a diminuir o tamanho daquela caixa para permitir o uso de peças nacionais; que o fato constitutivo do direito postulado não é o invento em si, mas sim o suposto proveito econômico dele decorrente, que não
teria sido provado; e que a apuração na fase de liqüidação daquele
proveito econômico não será possível, porque as braçadeiras, objetos da lide, são de 1984, há muito fora de uso em razão do avanço tecnológico dos vagões e provavelmente já vendidas como sucata.
Os referidos embargos foram acolhidos (fls. 423/427) apenas para
esclarecer que o fato constitutivo do direito postulado é o invento, por força do artigo 42 da Lei nº 5.772/71, e que a inexistência de proveito econômico é fato extintivo ou impeditivo do direito, e, portanto, sua
prova é ônus da reclamada.
Nesse contexto, inviável cogitar-se de negativa de prestação
jurisdicional que ensejasse a admissão do recurso de revista da reclamada.
Com efeito, no que diz respeito ao tema “competência”, a suposta omissão apontada pela reclamada – a saber, o suposto fato de o reclamante haver alegado, na exordial, a natureza “mista” do invento, e não a natureza de “invento de serviço” – é irrelevante para a solução da controvérsia, nos termos do artigo 794 da CLT.
Realmente, mesmo se admitido tal fato, subsistiria a premissa sobre a
qual se fundou a rejeição da preliminar de incompetência, a saber, de que a indenização postulada decorre de invenção intrinsecamente ligada à
execução do contrato de trabalho, nos termos do artigo 114 da Constituição Federal de 1988.
Quanto às demais supostas omissões, salvo no que tange ao tema
“distribuição do ônus da prova do proveito econômico do invento”, todas já haviam sido examinadas pelo v. acórdão do Regional, razão por que a
rejeição dos embargos de declaração, no particular, não implica negativa de prestação jurisdicional.
Finalmente, no que tange à distribuição do ônus da prova do proveito econômico do invento, houve expressa manifestação do i. Juízo a quo, quando do julgamento dos embargos de declaração, razão por que não há
como se admitir o recurso de revista por violação dos artigos 832 da CLT,
458 do CPC ou 93, IX, da Constituição Federal de 1988.
II – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO
No que diz respeito à competência da Justiça do Trabalho para apreciar a questão relativa à indenização de invenção prevista no Código de
Propriedade Industrial, a revista tampouco merece ser admitida.
A matéria está compreendida na expressão “outras controvérsias
decorrentes da relação de trabalho” do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, conforme corretamente reconhecido pela instância ordinária.
Este c. Tribunal Superior do Trabalho já examinou a questão, como demonstrado pelos precedentes abaixo transcritos, in verbis:
“REMUNERAÇÃO - PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS - INVENÇÃO OU APERFEIÇOAMENTO -
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. A competência da Justiça do Trabalho para apreciar controvérsia em torno de invenção ou aperfeiçoamento, que não deixa de ser um trabalho inventivo, por parte do empregado, é determinada pela Lei 5.772/71 e artigo 454 da Consolidação das Leis do Trabalho, este abrangido pela referida lei e não revogado. A competência firma-se em decorrência do contrato de trabalho, sem o qual tal criação não teria ocorrido. Nos artigos 40 e parágrafos, 41 e 42 da Lei 5.772/71
estabelecem-se as hipóteses de ocorrência de invenção e os direitos respectivos, sendo garantido ao obreiro no caso de invento ou aperfeiçoamento realizado, na hipótese de decorrer de sua contribuição pessoal e também de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, a remuneração que foi fixada, alem do direito de propriedade conjuntamente com o empregador, em partes iguais. A remuneração devida ao empregado em virtude dos lucros auferidos com sua criação (invento ou
aperfeiçoamento) por parte da empresa, ainda que constitua participação nos lucros tem a característica remuneratória trabalhista, procedente o pleito de integração no salário e reflexos nas demais verbas, não havendo falar em maltrato da Lei 5.772/71, antes pelo contrário, exata aplicação do artigo 42 deste diploma legal.” (TST-RRR-1.426/79, Reapreciação de Recurso de Revista, 1ª Turma, Rel. Juiz Convocado Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, DJU de 25.11.88, p. 31.160; grifos não constantes do original).
“RECURSO DE REVISTA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - INVENÇÃO DO
EMPREGADO - CÓDIGO DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL. A fixação da competência da Justiça do Trabalho se faz pela matéria ou natureza do litígio, desde que decorrente da relação de trabalho (art. 114 da CF). Não é porque o Código de Propriedade Industrial trata da invenção, que a matéria seria exclusiva da jurisdição civil (Vantuil Xxxxxx), ainda mais quando há capítulo específico nessa lei, cuidando "Do invento ocorrido na vigência do contrato de trabalho", disso também falando o vetusto art. 454 da CLT. A
competência firma-se em decorrência do contrato de trabalho, sem o qual essa criação não teria ocorrido (Xxxxxxxxx Xxxxxxx). Recurso de Revista conhecido e acolhido.” (TST-RR-593.729/99, 2ª Turma, Rel. Juiz Convocado Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, DJU de 16.2.2001, p. 702).
III – INDENIZAÇÃO POR INVENTO – ARTIGO 42 DA LEI Nº 5.772/71
Finalmente, no que diz respeito ao mérito do recurso, a saber, ao direito do reclamante à indenização prevista pelo artigo 42 da Lei nº 5.772/71,
melhor sorte não assiste à reclamada.
Com efeito, o artigo 42, caput , da Lei nº 5.772/71, compreendido no
título XIV, denominado “do invento ocorrido na vigência de contrato de trabalho ou de prestação de serviços”, está assim redigido, in verbis:
“Art. 42. Salvo expressa estipulação em contrário, o invento ou aperfeiçoamento realizado pelo empregado ou pelo prestador de serviços não compreendido no disposto no artigo 40, quando decorrer de sua
contribuição pessoal e também de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do
empregador, será de propriedade comum, em partes iguais, garantido ao empregador o direito exclusivo da licença de exploração, assegurada ao empregado ou prestador de serviços a remuneração que for fixada”.
O v. acórdão do Regional adotou as premissas de que o aperfeiçoamento realizado pelo reclamante, na peça denominada “braçadeira de engate”,
permitiu à reclamada a substituição das peças importadas por outras, de fabricação nacional, mais baratas; e ainda que tal aperfeiçoamento, que não era o objeto do contrato de trabalho, decorreu da contribuição
pessoal do reclamante, com a utilização de recursos da empresa, por força de ciclo de estudos de controle de qualidade.
Nesse contexto, inviável cogitar-se de violação direta e literal do artigo 42 da Lei nº 5.772/71, que ensejasse a admissão do recurso de revista, pois o v. acórdão do Regional, na verdade, aplicou-o
corretamente.
Relativamente à pretensão da reclamada de enquadrar a hipótese dos autos na regra do artigo 40 da Lei nº 5.772/71 – segundo a qual “pertencerão
exclusivamente ao empregador os inventos, bem como os aperfeiçoamentos, realizados durante a vigência de contrato expressamente destinado a
pesquisa no Brasil, em que a atividade inventiva do assalariado ou do prestador de serviços seja prevista, ou ainda que decorra da própria natureza da atividade contratada” –, encontra óbice insuperável no
Enunciado nº 126 do TST, pois o v. acórdão do Regional consigna de forma expressa que não há previsão de atividade inventiva no contrato de
trabalho e ainda que o aperfeiçoamento produzido pelo reclamante não decorreu da própria natureza da atividade contratada.
Já no que tange à apontada violação do artigo 89 da Lei nº 9.279/96,
também não autoriza a admissão do recurso de revista, pois não estava em vigor na época do aperfeiçoamento produzido pelo reclamante.
Finalmente, o único paradigma colacionado às razões de revista
relativamente ao mérito da ação (fl. 445) é inespecífico, nos termos do Enunciado nº 296 do TST, porque apreciou questão fática em que há
previsão de atividade inventiva no contrato de trabalho e ainda porque o
aperfeiçoamento produzido pelo empregado decorreu da própria natureza da atividade contratada, nos termos do artigo 40 do Código de Propriedade
Industrial de 1971, e não da hipótese do artigo 42 do mesmo diploma legal, apreciada pelo v. acórdão recorrido.
Com estes fundamentos, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.
Brasília, 14 de abril de 2004.