Contratos de Planos de Saúde:
Contratos de Planos de Saúde:
Princípios Básicos da Atividade
Xxxxxx Xxxx Xxxxxxx 1
O contrato é um acordo de vontade que gera obrigações (efeitos jurídicos) de natureza jurídica bilateral; ou seja, toda manifestação da von- tade que angaria consequências jurídicas é negócio jurídico. Essa expressão tem uma ligação, um liame, com os negócios jurídicos bilaterais, mas não essencialmente, porque há também negócios jurídicos unilaterais, como, por exemplo, o testamento, que se forma apenas com a declaração da von- tade daquele que quer dispor dos seus bens para após a sua morte.
No contrato, predomina o interesse econômico e possui, em regra, dois personagens (exceção – contrato de sociedade com a formação da pessoa jurídica).
Os princípios que norteiam os contratos são:
Autonomia da vontade
Por liberdade e iniciativa de alguém que tem a iniciativa de contratar e conduzir essa vontade ao outro contraente, surge o contrato. Desse princípio se extrai que as partes têm toda a liberdade de estipular o conteúdo do con- trato, a modalidade (típico ou atípico) e com quem contratar.
O Direito Romano consagrava a vontade inconsequente de contratar, mas, com a evolução da sociedade, verificou-se que tal liberdade nem sempre era boa, vez que aquele que desfrutava de maior poder econômico impunha as condições do contrato, o que representava freio à autonomia da vontade.
1 Juiz de Direito da 3a Vara Cível de Teresópolis.
A ordem pública é compreendida por normas de caráter impositi- vo, obrigatório; em certas situações desde o Direito Romano, verificava-se a possibilidade de intervenção do Estado. Um exemplo típico é o pacto comissório, que considera nula a cláusula que estipula que o credor será o titular do bem se o devedor não cumprir a obrigação – art. 765 do NCC. Hoje, não se permite mais aos contraentes a total liberdade, como pre- conizado antigamente. Pode-se até dizer que, com o advento do CODECON,
começamos a ter uma verdadeira intervenção estatal nas normas contratuais. Nos contratos de plano de saúde também se verifica essa interven-
ção, dado o interesse público predominante do direito à saúde, consagrado como direito fundamental na atual Constituição. A esse respeito, existem diferenças sociais que tendem a fazer com que o mais frágil se submeta ao mais forte. O contrato é livre, desde que haja equilíbrio entre as partes.
O art. 157 do NCC é um exemplo da intervenção da ordem jurídica. Ocorre, por exemplo, quando as pessoas que não têm como pagar as dívidas procuram o sistema financeiro para renegociá-las. No desespero, elas se sub- metem mais ainda às condições impostas pelo credor, ficando cada vez mais sujeitas a ele. Trata-se de obrigação manifestamente desproporcional.
Os artigos 157 e 156 do NCC prevêem duas formas de anulabilida- de do negócio jurídico. Tais normas são regidas por dois princípios inau- gurados expressamente na nossa Lei Civil, que são os arts. 421 e 422 do NCC. A autonomia da vontade está totalmente afastada por motivo social predominante – deve prevalecer sempre a função social do contrato.
Por isso, o magistrado, ao interpretar o contrato, deve sempre levar em consideração a função social do contrato; mas o legislador foi mais além, porque, no art. 422, ele expressa o princípio da boa-fé; agora, a au- tonomia da vontade se submete à ordem pública: o dirigismo contratual e autonomia da vontade são princípios que se completam.
Relatividade dos efeitos do contrato
Os contratos geram efeitos somente entre as partes contratantes e não podem produzir efeitos para terceiros.
Pacta sunt servanda
No momento em que o contrato ingressa na disciplina do ordena- mento jurídico, obriga as partes (os contraentes). Não pode mais ser alte- rado; não admite o arrependimento; apenas o distrato, que ocorre quando ambas as partes espontaneamente resolvem findar o contrato. Não há, em princípio, rescisão unilateral (a resilição pode ocorrer em determinadas si- tuações).
Quando o contratante não pode cumprir a obrigação por motivo de força maior, o CDC prevê somente a possibilidade do contrato não ser executado quando ele se torna oneroso para o consumidor. O CC/16 não trouxe a teoria da imprevisão.
O NCC traz três dispositivos em que se faz menção à teoria da im- previsão – os arts. 478, 479 e 480 não têm correspondente no CC/16. Trata-se de situação em que o contrato pode automaticamente se extinguir, o princípio do pacta sunt servanda não vai prevalecer.
Formação dos contratos
O contrato surge por iniciativa da pessoa que quer contratar: nes- se momento, há o proponente e o destinatário, que poderá tomar três atitudes: aceitar, recusar ou fazer uma contraproposta. Se ele aceitar, faz surgir o contrato; se recusar, a proposta é um nada jurídico. Para ocorrer o contrato, tem que haver a a aceitação final; pode até ser que anteriormente tenham ocorrido várias propostas e várias contrapropostas, mas é essencial que as partes cheguem a um denominador comum.
Os contratos de saúde são bilaterais, porque existe um vínculo de reciprocidade; ou seja, ambas as partes têm vantagens e desvantagens.
A importância dessa classificação diz respeito à exceção do contrato não cumprido, pois ninguém é obrigado a pagar a empresa de plano de saúde se essa não cumpre sua parte. Somente nos contratos bilaterais ocor- re a exceptio non adimpleti contractus. Se o contrato só tem obrigação para
uma das partes, não pode se extinguir por inadimplemento da outra.
Por isso, o art. 476 do NCC tem essa redação claríssima. Somente nos contratos bilaterais ocorrerá a resolução por exceção de contrato não cumprido, que implica a defesa da pessoa, quando estiver sendo demanda- da a cumprir o contrato. Além do mais, somente em contratos bilaterais haverá incidência de cláusula resolutiva, que pode ser expressa (art. 474 do NCC 1a parte) ou tácita (2a parte do art. 474 do NCC). Ex: O contrato vai se extinguir porque eu não pago o plano de saúde. É uma hipótese de resolução do contrato pelo inadimplemento; alguns autores o designam como rescisão do contrato. Somente neste tipo de contrato bilateral cabe a incidência da cláusula resolutiva.
Quando a cláusula resolutiva é expressa, opera independentemente de
interpelação judicial; quando for tácita, depende de interpelação judicial.
O contrato de plano de saúde é oneroso; ou seja, com ônus pa- trimonial para ambas as partes, como ocorre com os contratos bilaterais. Por outro lado, o contrato de plano de saúde é aleatório; ocorre a álea, o risco; as partes não sabem de antemão quando o serviço será utilizado. São também de execução continuada, se protraem no tempo, de trato sucessivo (prestações sucessivas).
A importância prática é que apenas esse tipo de contrato se submete à influência do tempo. Só o contrato de execução de trato sucessivo de eficácia diferida pode ser resolvido por onerosidade excessiva, conforme o Código Civil, dando origem à revisão contratual, nos termos do Código de Defesa do Consumidor – artigo 6º IV e a teoria da imprevisão.
À propósito, recentemente o Supremo Tribunal Federal manifes- tou-se pela existência de repercussão geral de tema contido no Recurso Extraordinário (RE) 630852, sobre a aplicação do Estatuto do Idoso aos planos de saúde.
A relatora Ministra Xxxxx Xxxxxx verificou que a questão contida no referido recurso apresenta relevância do ponto de vista econômico, po- lítico, social e jurídico, nos termos do parágrafo 1º do artigo 543-A do Código de Processo Civil, porque ela alcança grande número de idosos usuários de planos de saúde e salientou que o Supremo, no julgamento
do RE 578.801, reconheceu a existência de repercussão geral da matéria relativamente à incidência da Lei dos Planos de Saúde (Lei nº. 9.656/98) sobre os contratos firmados anteriormente à sua vigência.
O contrato de saúde é consensual, pois se perfaz com o simples consenso das partes e de adesão, cujo conceito se encontra no artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor. Essa legislação traz duas modalidades de contrato de adesão, definindo-se em favor do aderente, que é a parte mais fraca.
Tal regra de hermenêutica influenciou o Código de Defesa do Con- sumidor e também o Novo Código Civil. As cláusulas que não favorece- rem o aderente têm que estar expressas, de maneira bem explícita, vez que as ambíguas serão interpretadas em benefício do aderente. E, por fim, o contrato de saúde é típico, porque tem regulamentação expressa na lei.
Os princípios específicos do direito de saúde suplementar
Princípio da defesa do mercado
As normas de direito de saúde suplementar devem ser rígidas, para garantir equilíbrio econômico-financeiro do mercado e preservar as empre- sas que operaram no mercado.
A prestação de serviço é financiada pela iniciativa privada. Logo, se as normas regulamentadoras não forem rígidas para garantir e proteger a atividade, inclusive os lucros da operação, as empresas que operam nesse segmento não terão interesse em prestar os serviços e tenderão a fechar, seja por falta de recursos, seja por livre iniciativa.
Princípio da defesa do consumidor
A CRF/88 previu a elaboração de uma legislação para o consumidor (art. 5º XXXII, e 48 ADCT). Sendo assim, o Código veio cumprir um comando constitucional, que se originou no reconhecimento da vulnera- bilidade do consumidor diante do fornecedor de produtos e serviços.
Nos últimos tempos, a produção massificou-se; nesses contratos, a proposta está pré-fixada; basta o consumidor aceitar ou não, não cabe dis- cutir. Os contratos de adesão são consequências inexoráveis do processo de globalização e de massificação da economia. Tais contratos têm reduzida a autonomia de vontade do aderente e provocaram a lesão em massa, eis que, valendo-se da imutabilidade da proposta, os fornecedores de produtos e serviços inseriram cláusulas extremamente vantajosas para si e prejudiciais aos aderentes.
Nesse contexto, o adquirente teve extremamente diminuído seu poder de barganha, pois ele precisa do produto/serviço e não tem acesso direto ao fabricante, só tem como adquirir o produto/serviço quase sempre pelos contratos de adesão, não tendo, portanto, como negociar cláusulas e condições. Resulta daí o estado de vulnerabilidade do consumidor diante do fornecedor.
Por outro lado, houve aumento do poder econômico do fornecedor, via de regra, grande empresa, às vezes multinacional. Tem posição econo- micamente fortalecida em relação ao consumidor, inferiorizado na relação de consumo.
Tudo isso levou o constituinte a pensar numa forma de compensar o desnível e promover releitura na teoria geral dos contratos. Os velhos dogmas começaram a ser mitigados e, aos poucos, o contrato perde sua aparência individualista, adquirindo feição social.
Princípio da efetiva tutela da saúde
As normas de direito de saúde suplementar devem garantir sempre ao consumidor atendimento médico adequado e eficaz, com o propósito de restabelecer o seu estado físico-psíquico ou prevenindo doenças e enfer- midades diversas.
À propósito, sobre o tema, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que a empresa de plano de saúde tem obrigação de pagar as despesas com cirurgia bariátrica de segurada com obesidade mórbida, porque tal cirurgia é essencial à sobrevida do segurado que sofria de outras
comorbidades decorrentes da obesidade em grau severo, sendo, portanto, ilegal a recusa do plano em cobrir as despesas da intervenção. Naquela oportunidade, o Relator do recurso, Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, enten- deu que:
“O tratamento pleiteado pela autora e indicado por especialista, com a concordância de outros médicos de diversas especialida- des, dentre eles, psiquiatra, endócrino, pneumologista e cardio- logista, não possuía fim estético, considerando que a obesidade mórbida da autora trazia riscos à sua saúde, como comprovam
os laudos anexados ao processo” (REsp 117616). ♦