PARECER JURÍDICO
PARECER JURÍDICO
Interessado: Câmara Municipal de Ponta de Pedras/PA.
Assunto: Análise de viabilidade jurídica de inexigibilidade de licitação. Inexigibilidade de Licitação nº 6/2023-001
Direito Administrativo. Contratação de Xxxxxx Xxxxxxxx para prestação de serviços de assessoria jurídica destinados ao atendimento das demandas da Câmara Municipal de Vereadores de Ponta de Pedras. Preenchimento dos requisitos legais. Viabilidade.
1 - RELATÓRIO
Trata-se de consulta formulada pela Comissão de Licitação da Câmara Municipal de Ponta de Pedras, quanto à viabilidade jurídica de contratação direta, mediante inexigibilidade de licitação, do escritório de advocacia XXXXXX XXXXX MARQUES SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, inscrito no
CNPJ nº 36.571.569/0001-54, para prestação de serviços de consultoria/assessoria jurídica capacitada em direito público, no intuito de acompanhar e assessorar os trâmites administrativos em favor da Câmara Municipal de Ponta de Pedras, com valor global de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais).
Constam dos autos a solicitação do Departamento Administrativo; a autorização e declaração de adequação orçamentária do ordenador de despesas; despacho contendo a dotação para aporte da despesa; proposta e documento do escritório cuja contratação se pretende, e a justificativa da Comissão de Licitação.
É o relatório.
2) FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
O dever de licitar encontra-se insculpido no art. 37, XXI da Constituição Federal, configurando limitação imposta à administração pública, em todos os
seus níveis, com o objetivo de garantir a proposta mais vantajosa na aquisição de bens ou contratação de serviços pelo Poder Público.
Nesse sentido, os procedimentos necessários à escorreita realização dos certames licitatórios e das contratações entre a administração pública e os particulares estão previstos na Lei nº 8.666/93 e nas demais normas pertinentes, de acordo com as particularidades de cada modalidade.
Dessa forma, a Lei nº 8.666/93 estabelece as hipóteses em que a licitação será dispensada, dispensável e inexigível, consoante elencado em seus artigos 17, 24 e 25.
Ressalte-se que a incidência da dispensa ou inexigibilidade de licitação não desobriga a estrita observância dos procedimentos pertinentes às referidas hipóteses pela Administração Pública. Logo, mesmo diante de licitações dispensáveis ou inexigíveis, a legislação estabelece formalidades indispensáveis a serem atendidas pelos órgãos e entidades licitantes, sob pena de apuração da responsabilidade administrativa e criminal cabível.
Consoante a doutrina de Maria Sylvia Di Pietro1, a seleção da modalidade de inexigibilidade de licitação ocorre nas circunstâncias em que não há possibilidade de competição, em razão da existência de apenas um objeto ou uma pessoa que seja responsável pelo atendimento das demandas da administração, sendo a licitação, portanto, inviável para determinado objeto, de modo que a inexigibilidade é decorrência da inviabilidade de competição. Ou seja, quando a competição inexiste, não há que se falar em licitação, mas tal inviabilidade deve ficar adequadamente demonstrada.
Nesse sentido, o art. 25 da Lei nº 8.666/93 enumera, de forma não exaustiva, as hipóteses em que será inviável a realização do certame licitatório, dentre os quais a contratação de serviços técnicos de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização. Vejamos:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
II - Para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;
§ 1o Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências,
1 Di Xxxxxx, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Administrativo. 31. ed. Rio de janeiro: Forense, 2018. Ebook.
publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.
§ 2o Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.
Complementarmente, o art. 13 da Lei de Licitações prevê que são considerados serviços técnicos especializados os de assessoria e consultoria, bem como patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas:
Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:
III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;
V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;
A natureza singular, afasta os serviços corriqueiros, ainda que técnicos, e de outro, não restringe a ponto de ser incomum, inédito, exclusivo, etc, mas especial, distinto ou até mesmo dotado de uma criatividade ímpar. Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx ensina:
"A singularidade, como textualmente estabelece a Lei, é do objeto do contrato; é o serviço pretendido pela Administração que é singular, e não o executor do serviço. Aliás, todo profissional é singular, posto que esse atributo é próprio da natureza humana.
Singular é a característica do objeto que o individualiza, distingue dos demais. É a presença de um atributo incomum na espécie, diferenciador. A singularidade não está associada a noção de preço, de dimensão, de localidade, de cor ou forma".
Assim, a singularidade implica no fato de que o serviço não esteja incluído entre aqueles corriqueiros realizados pela Administração Pública. Necessário se faz que o objeto possua uma característica particularizada, individual, que o situe fora do universo dos serviços comuns. Escreveu Xxxx Xxxxx Xxxxxxxx:
"...Tem-se entendido, também, que serviços singulares são aqueles que podem ser prestados com determinado grau de confiabilidade por determinado profissional ou empresa cuja especialização seja reconhecida."
Esse seria um segundo aspecto da expressão "natureza singular": a singularidade do objeto em relação ao sujeito, entendimento já pacificado nos Tribunais de Contas.
Outro aspecto do termo refere-se ao modo de executar o serviço. Xxxxxxxxxx se faz, ainda, que o sujeito execute de modo especial o objeto, o que é, em síntese, o que busca a Administração Pública: a execução do serviço de modo particularizado, de forma a assegurar seja alcançado o objetivo almejado, atendendo ao interesse público.
Sobre este aspecto, traz-se à colação a doutrina de Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx:
"Em suma: a singularidade é relevante e um serviço deve ser havido como singular quando nele interferir, como requisito de satisfatório atendimento da necessidade administrativa, um componente criativo de seu autor, envolvendo o estilo, o traço, a engenhosidade, a especial habilidade, a contribuição intelectual, artística ou a argúcia de quem o executa, atributos, este, que são precisamente os que a Administração reputa convenientes e necessita para a satisfação do interesse público em causa.
Embora outros, talvez até muitos, pudessem desempenhar a mesma atividade científica, técnica ou artística, cada qual o faria à sua moda, de acordo com os próprios critérios, sensibilidades, juízos, interpretações e conclusões, parciais ou finais, e tais fatores individualizadores repercutirão necessariamente quanto à maior ou menor satisfação do interesse público. Bem por isto não é indiferente que sejam prestados pelo sujeito "A" ou pelos sujeitos "B" ou "C", ainda que todos os estes fossem pessoas de excelente reputação.
É natural, pois, que, em situações deste gênero, a eleição do eventual contratado - a ser obrigatoriamente escolhido entre os sujeitos de reconhecida competência na matéria - recaia em profissional ou empresa cujos desempenho despertem no contratante a convicção de que, para o caso, são presumivelmente mais indicados do que os de outros, despertando-lhes a confiança de que produzirá a atividade mais adequada para o caso".
A importância do modo de executar o objeto do contrato, que influencia, consequentemente, o resultado, é fato percebido pelos Tribunais de Contas, como podemos observar da decisão abaixo transcrita, da lavra do Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxx, do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro:
"Contrato. Prestação de serviços de consultoria. Notória especialização. A notória especialização como motivo determinante da dispensa formal de licitação configura-se quando os serviços a serem contratados pela Administração tiverem características de notável
singularidade no modo da prestação ou resultado a ser obtido, suscetíveis de execução somente por determinados profissionais ou firmas de reconhecida e correspondente especialização. (RTCE 21, p. 165).
Em síntese, as características especiais e particularizadas do sujeito devem, necessariamente, mostrar-se presentes no processo de execução do serviço contratado, de forma a alcançar o objetivo buscado pela Administração pública.
Desse modo, vislumbra-se que o rigor da lei tem sido abrandado no caso concreto, com vista sempre a buscar o pronto atendimento do interesse público, evitando excessos e rigorismos que possam ser mais prejudiciais do que produtivos.
Ademais, no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 45, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento quanto à possibilidade de contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública mediante inexigibilidade de licitação. Vejamos:
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 13, V, E 25, II, DA LEI Nº 8.666/1993. CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, POR INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO.
[...]
3. Necessidade de conferir segurança jurídica à interpretação e aplicação dos dispositivos legais objeto da presente ação, mediante o estabelecimento de critérios e parâmetros dentro dos quais a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, estará em consonância com os princípios constitucionais da matéria, especialmente a moralidade , a impessoalidade e a eficiência . Precedentes: Inquérito 3.074, j. em 26.08.2014; MS 31.718, j. em 16.05.2018
4. Necessidade de procedimento administrativo formal (art. 26 da Lei nº 8.666/1993). Como todos os contratos celebrados mediante inexigibilidade de licitação, também a contratação direta de serviços advocatícios sob esse fundamento deve observar, no que couber, as exigências formais e de publicidade contidas na legislação de regência, especialmente o dever de motivação expressa, a fim de permitir a verificação de eventuais irregularidades pelos órgãos de controle e pela própria sociedade.
5. Notória especialização do profissional a ser contratado (art. 13, V, da Lei nº 8.666/1993). A escolha deve recair sobre profissional dotado de especialização incontroversa , com qualificação diferenciada, aferida por elementos objetivos, reconhecidos pelo mercado ( e.g . formação acadêmica e
profissional do contratado e de sua equipe, autoria de publicações pertinentes ao objeto da contratação, experiência bem-sucedida em atuações pretéritas semelhantes).
6. Natureza singular do serviço (art. 25, II, da Lei nº 8.666/1993). O Objeto do contrato deve dizer respeito a serviço que escape à rotina do órgão ou entidade contratante e da própria estrutura de advocacia pública que o atende. Inviabilidade de contratar-se profissional de notória especialização para serviço trivial ou rotineiro, exigindo-se que a atividade envolva complexidades que tornem necessária a peculiar expertise . Existência de característica própria do serviço que justifique a contratação de um profissional específico, dotado de determinadas qualidades, em detrimento de outros potenciais candidatos. Precedente: AP 348, Rel. Min. Xxxx Xxxx, x. em 15.12.2006.
7. Inadequação da prestação do serviço pelo quadro próprio do Poder Público . A disciplina constitucional da advocacia pública (arts. 131 e 132, da CF) impõe que, em regra , a assessoria jurídica das entidades federativas, tanto na vertente consultiva como na defesa em juízo, caiba aos advogados públicos. Excepcionalmente , caberá a contratação de advogados privados, desde que plenamente configurada a impossibilidade ou relevante inconveniência de que a atribuição seja exercida pelos membros da advocacia pública.
8. Contratação pelo preço de mercado . Mesmo que a contratação direta envolva atuações de maior complexidade e responsabilidade, é necessário que a Administração Pública demonstre que os honorários ajustados encontram-se dentro de uma faixa de razoabilidade, segundo os padrões do mercado, observadas as características próprias do serviço singular e o grau de especialização profissional. Essa justificativa do preço deve ser lastreada em elementos que confiram objetividade à análise ( e.g. comparação da proposta apresentada pelo profissional que se pretende contratar com os preços praticados em outros contratos cujo objeto seja análogo).
Acrescente-se ainda que a Lei n. 14.039/2020 alterou a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da OAB) e o Decreto-Lei nº 9.295, de 27 de maio de 1946, para dispor sobre a natureza técnica e singular dos serviços prestados por advogados e por profissionais de contabilidade. Senão vejamos o que dispõe o seu art. 3º:
Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB):
Art. 3º-A. Os serviços profissionais de advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando comprovada sua notória especialização, nos termos da lei.
Parágrafo único. Considera-se notória especialização o profissional ou a sociedade de advogados cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu
trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.
Estabelecidas tais premissas, observa-se que no caso em tela, pretende- se a contratação direta do escritório de advocacia XXXXXX XXXXX MARQUES SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, inscrito no CNPJ nº
36.571.569/0001-54, para prestação de serviços de consultoria/assessoria jurídica capacitada em direito público, no intuito de acompanhar e assessorar os trâmites administrativos em favor da Câmara Municipal de Ponta de Pedras, com valor global de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais).
Nesse sentido, em relação aos serviços contratados, não há dúvidas de que se tratam de serviços técnicos que se incluem no rol do art. 13 da Lei de Licitações, por estarem contemplados em mais de uma das hipóteses legais, visto que se trata de assessoria especializada para a prestações de serviços de assessoria jurídica destinados ao atendimento das demandas da Câmara Municipal de Vereadores de Pontas de Pedras.
Outrossim, no que tange à notória especialização o art. 25, § 1º da Lei 8.666/93 define que:
"Considera-se notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato."
Nesse ponto, observa-se que a sociedade advocatícia possui desempenho anterior, tendo apresentado atestado de capacidade técnica para comprovação da prestação de serviço semelhante a outra municipalidade.
Portanto, a empresa a ser contratada apresenta as características de qualificação exigidas, tais como singularidade, tanto do objeto quanto do sujeito, pela relação de confiança, além da notória especialização e adequação dos serviços ao rol daqueles especificados no art. 13 da Lei nº 8.666/93, justificando a inviabilidade da licitação e, via de consequência, tornando inexigível o processo licitatório.
Finalmente, consoante se extrai da justificativa da Comissão de Licitação, o valor proposto pela empresa se coaduna com a realidade mercadológica, de
modo que se encontra satisfeita a exigência contida no art. 26 da Lei de Licitações.
3 - CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, OPINA-SE pela viabilidade jurídica da contratação direta, mediante inexigibilidade de licitação, do escritório de advocacia XXXXXX XXXXX MARQUES SOCIEDADE INDIVIDUAL DE
ADVOCACIA, inscrito no CNPJ nº 36.571.569/0001-54, para prestação de serviços de consultoria/assessoria jurídica capacitada em direito público, no intuito de acompanhar e assessorar os trâmites administrativos em favor da Câmara Municipal de Ponta de Pedras, com valor global de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais); visto que preenchidos os requisitos dispostos no art. 25, II e art. 13, III e V da Lei nº 8.666/93, tratando-se de consultoria técnica de natureza singular e especializada, bem como porque justificada a escolha do fornecedor e do preço, atendendo aos ditames do art. 26 do referido diploma legal.
É o parecer. S.M.J.
Ponta de Pedras/PA, em 29 de dezembro 2022.
XXXXXX XXXXXXXX XX XXXXX XXXXXXXX:81544162200
Assinado de forma digital por XXXXXX XXXXXXXX XX XXXXX XXXXXXXX:81544162200 Dados: 2022.12.29 10:28:27
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