ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO CONSULTORIA
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PARECER N. 14.880
COMPANHIA ESTADUAL DE SILOS E ARMAZÉNS – CESA. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. CONTRATAÇÃO DE EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇO. A DITA TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS É ATIVIDADE LÍCITA, DESDE QUE ATENDIDAS AS PRESCRIÇÕES LEGAIS E REGULAMENTARES. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO TEM DENTRE SUAS RELEVANTES ATRIBUIÇÕES GARANTIR A OBSERVÂNCIA E O RESPEITO AOS DIREITOS DOS TRABALHADORES, AOS QUAIS NÃO É PROIBIDO CELEBRAR CONTRATOS DE TRABALHO COM PESSOAS JURÍDICAS QUE TENHAM POR FINALIDADE A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. A CONTRATAÇÃO DE COOPERATIVAS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELA VIA UNIVERSAL DA LICITAÇÃO – TAMBÉM NÃO LEGALMENTE VEDADA – MERECE O CONTROLE, A FISCALIZAÇÃO E A PRUDÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, SUJEITA AO CRIVO OBJETIVO DOS MECANISMOS DE CONTROLE SOCIAL SEMPRE QUE PROCEDER COMPROVADAMENTE DE FORMA CONTRÁRIA À ORDEM LEGAL. NÃO PODE, CONTUDO, A ATIVIDADE PÚBLICA
– ASSIM COMO A ATIVIDADE DE INICIATIVA PRIVADA – SER PAUTADA GENÉRICA E GLOBALMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, NÃO OBSTANTE A SUA RELEVÂNCIA INSTITUCIONAL E SUA NOBRE COMPETÊNCIA.
Provém da Companhia Estadual de Silos e Armazéns – CESA
este processo administrativo.
Vê-se que o Ministério Público do Trabalho apresentou minuta de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC, derivado da Peça de Informação n. 104/04, mediante o qual a CESA comprometer-se-ia às condições nele elencadas, todas relativas à inviabilização de celebração de contratos de prestação de serviços sob a forma terceirizada. O descumprimento do pacto sujeitaria a CESA ao pagamento de multa nos valores fixados no termo.
A CESA manifesta-se no sentido de considerar inviável o comprometimento proposto. Diz, verbis:
“Ademais, tramita perante a PGE um processo administrativo no qual a CESA solicita a abertura de concurso público, precedido da contratação emergencial de servidores, pois se impõe como única solução constitucional e de boa gestão para a continuidade da CESA. Por esses e outros motivos é que se torna inviável à CESA comprometer-se a não contratar mão-de-obra terceirizada, sob pena de inviabilidade na continuação da prestação do serviço público.”
Nesta Casa, o feito esteve sob a consideração do Órgão que concentra a coordenação das assessorias jurídicas da Administração Direta e Indireta e me foi dado ao exame.
É o relatório
A Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, atribui ao Ministério Público do Trabalho a competência – dentre outras lhe especificamente atribuídas e que não dizem respeito diretamente ao caso sob exame – de promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais
constitucionalmente garantidos (art. 83, III), incumbindo-lhe, no âmbito das suas atribuições, exercer funções institucionais, especialmente as de instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para assegurar a observância dos direitos sociais dos trabalhadores (art. 84, II).
Para que se perfaça a atuação de controle do Ministério Público do Trabalho, pois, há que estarem presentes ao menos duas premissas, não necessariamente concomitantes: a) deve ocorrer o desrespeito a direitos sociais constitucionalmente garantidos aos trabalhadores e, b) há que restarem inobservados direitos sociais de trabalhadores.
Como lógica decorrência, então, a presença do Ministério Público se dá frente a irregularidade percebida ou detectada pelo agente do parquet trabalhista, de desrespeito ou inobservância de prerrogativas sociais dos trabalhadores, cabendo-lhe instaurar o procedimento investigatório da ilegalidade constatada, do qual poderão decorrer a proposta de celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta com o indicado infrator ou o ajuizamento de Ação Civil Pública.
O Compromisso de Ajustamento de Conduta, comumente denominado Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, foi agregado ao rol de instrumentos que equipam a Ação Civil Pública (Lei Federal n. 7.347/1985) pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal n. 8.078/1990) que, por seu artigo 113, acrescentou novo dispositivo, o parágrafo 6º, ao artigo 5º da Lei da Ação Civil Pública, na linha do que se constituíra pelo artigo 211 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal n. 8.069/1990), tornando possível o estabelecimento de regras de conduta a serem observadas pelo interessado, que formaliza, espontaneamente, sua intenção de se adequar a exigências legais ou de reparar dano, inclusive pela adoção de medidas destinadas à salvaguarda do interesse difuso atingido.
É o TAC instrumento autônomo e auto-executável, constituído de uma obrigação de fazer ou de não fazer, que tem sua existência ligada à Ação Civil Pública e, pois, sua aplicação também. Apenas aquilo que pode ser objeto de Ação Civil Pública pode dar origem ao TAC. E não haverá o TAC sem que existam pressupostos suficientes ao ajuizamento da Ação Civil Pública; devem estar presentes as premissas que fundamentam a Ação Civil Pública para que se possa dar origem ao compromisso de ajustamento.
Não se desconhece posição que confere ao compromisso de ajustamento natureza não-contratual, configurando-o como um ato administrativo negocial – negócio jurídico de direito público. Na acepção de XXXX XXXXX XXXXXXXX0, o compromisso consubstancia uma declaração de vontade do Poder Público coincidente com a do particular (o causador do dano, que concorda em adequar sua conduta às exigências da lei). O autor, porém, não deixa de referir que “o compromisso de ajustamento é apenas um instrumento legal destinado a colher, do causador do dano, um título executivo extrajudicial de obrigação de fazer, mediante o qual o compromitente assume o dever de adequar sua conduta às exigências da lei (da lei, repare-se) sob pena de sanções fixadas no próprio termo. (...) O compromisso presta-se, sem dúvida, a exigir o cumprimento das regras legais (das regras legais, saliente-se) fixando prazos a partir dos quais poderão ser executadas as cominações ajustadas no termo, independentemente de ação de conhecimento.” Vê-se que apenas podem integrar o TAC as inobservâncias ou desrespeitos à regra estrita da lei, não se indicando o instrumento, é óbvio, à hipótese da incerteza jurídica, esta sujeita incondicionalmente à jurisdição.
Inegável, à evidência, que o TAC, como uma forma de composição amigável concertada de forma prévia a procedimento judicial encerra, sem dúvida, expressiva carga de transação. Nesse sentido, o posicionamento de TALDEN FARIAS2, citando XXXX XXXXXX, XXXXX XXXXXX
e XXXXXX XXXXXXXX0 quanto a constituir o TAC mecanismo de solução pacífica de conflito, “com natureza jurídica de transação, consistente no estabelecimento de certas regras de conduta a serem observadas pelo interessado, incluindo a adoção de medidas destinadas à salvaguarda do interesse difuso atingido.” Segundo leciona o articulista, o objetivo do TAC é fazer com que determinadas condutas que resultem em ameaça ou lesão a direitos de natureza transindividual possam ser corrigidas por meio de negociação entre as partes interessadas. É, pois, em essência, o acordo, a transação, antecipada ou não, que envolve os interesses inevitavelmente submetidos à via judicial e que recebem, pela vontade e interesse das partes, solução negociada.
É lógico que a transação não envolve disposição de direitos, o que é defeso ao Poder Público tanto na condição de agente (autor) quanto na de paciente (réu). Explica-se: os direitos transindividuais são indisponíveis e, por conseqüência, não podem ser alienados nem renunciados, mesmo quando considerados sob a ótica do direito privado. Na forma do artigo 841 do Código Civil, “só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação”, razão pela qual o TAC adquire condição de envolver o compromisso de agir no sentido de ajustar a conduta impondo obrigação de fazer ou de não fazer o que, indiscutivelmente, encerra a disposição do agir, de fazer incidir a regra do direito indisponível.
É como opina TALDEN FARIAS4, afirmando que existem limites que devem ser respeitados na celebração do TAC, já que os direitos em questão são indisponíveis:
“(...) para ser celebrado, o TAC exige uma negociação prévia entre as partes interessadas com o intuito de definir o conteúdo do compromisso, não podendo o Ministério Público ou qualquer outro ente ou órgão público legitimado impor a sua aceitação. Caso a negociação não chegue a termo, a matéria certamente passará a ser discutida no âmbito judicial. (...) O
TAC é um título executivo extrajudicial fruto de um acordo formal entre as partes interessadas, que contém uma obrigação de fazer ou de não fazer e uma cominação para o caso de descumprimento dessa obrigação, devendo servir para a regularização de situações que possam estar colocando em risco direitos de natureza transindividual.”
É transação sim, em que não se abre mão de direito indisponível, porque não se está transacionando o direito em si – já que se o considera como decorrente de norma dotada de certeza jurídica - mas o seu exercício, a conduta que presidirá o exercício de tal direito.
XXXXXXX XXXXXX XXXX XXXXX0 traz a noção que caracteriza a natureza transacional do TAC, afirmando:
“Em razão de sua bilateralidade o compromisso de ajustamento pode ser caracterizado como transação, de modo que ‘avençadas as cláusulas e condições, ficam verdadeiramente superadas quaisquer possibilidades de discussão de seus termos’, pois a ‘transação produz entre as partes o efeito de coisa julgada’, como sublinha Xxxxxx Xxxx (XXXX, Xxxxxx. Alternativas à ação civil pública ambiental (reflexões sobre as vantagens do termo de ajustamento de conduta). In MILARÉ, Edis (Coord.) Ação Civil Pública – Lei n. 7.347/1985 – 15 anos. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 119-120).
O compromisso, lembra ainda Hindemburgo Xxxxxxxxxxxxx Xxxxx (XXXXXXXXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxxxxx. Compromisso de ajustamento de conduta. Revista dos Tribunais. São Paulo, Revista dos Tribunais 781/735, nov.2000, p. 733-740) reúne ‘todas as características de um negócio jurídico, pois estende à esfera de poder das partes interessadas a eliminação da incerteza relativa à situação jurídica preexistente, permitindo a prevenção ou o término do conflito no que se aproxima do esquema legal ditado para a transação. Como o interessado se compromete a adequar sua conduta ao que supõe corresponder às exigências da lei, é correto deduzir que o negócio se dirige à eliminação de todas as dúvidas relativas à situação jurídica preexistente’. Desse modo, ‘o significado do ajustamento de conduta do interessado às exigências da lei passa a ter (...) maior amplitude, alcançando, a partir da fixação da situação jurídica
preexistente, todos os efeitos decorrentes do ato, entre os quais se inclui o dever de reparação.”
Na condição de negócio jurídico de acertamento, na nomenclatura que lhe é oferecida pela doutrina italiana, como ensina HINDEMBURGO XXXXXXXXXXXXX FILHO6, o TAC estaria a servir como instrumento para a eliminação do estado subjetivo de incerteza que envolve a posição das partes numa relação jurídica e que desemboca, ao fim, na provocação da ação estatal da jurisdição. Nesse sentido, para prevenir o estado jurídico de incerteza, as partes estariam, de forma um pouco diferente da transação – que envolve disponibilidade de direito a celebrar negócios que incorporariam apenas a declaração da realidade da situação jurídica preexistente, sem gerar sobre essa nenhum efeito modificativo. Estar-se-ia a compor apenas a condição do ajustamento da conduta à lei, sem liberar direito – de resto indisponível.
Ora, dadas as condições verificadas, conclui-se que o TAC – é do TAC prévio à Ação Civil Pública que se trata, visto que o TAC celebrado nos autos de processo judicial assume outras conotações que, por suposto, diante das formalidades que para o acordo judicial se exigem da Administração Pública, podem servir como parâmetro também para as conclusões que dentro em pouco passarei a tecer – visa a obrigar o instado a ajustar a sua conduta no sentido de cumprir a lei. Ora, não se olvide que a ação estatal é, por imperativo constitucional, condicionada à estrita legalidade, (CF, art. 37) o que torna o cumprimento da lei um dos pressupostos para que a administração aja. Os atos da administração detêm a presunção de estarem submetidos à legalidade e não pode o administrador, sob pena de responsabilidade, agir de forma contrária à lei. Se não pode agir contra a lei, também não poderá pressupor que assim fez e, incontinenti, comprometer-se a ajustar sua conduta.
O pressuposto da ação estatal é a legalidade. Não se administra contra a lei e, pois, não se pode ajustar a conduta administrativa à lei,
ressalvada, como é evidente, a jurisdição que se venha a manifestar para restabelecer ou determinar a composição de eventual incerteza, instrumentalizada no processo judicial (CF, art. 5º, LIV e LV).
O que se impõe evitar é o paradoxo decorrente de o administrador público, jungido constitucionalmente à legalidade, ser requestado a ajustar sua conduta à lei via termo prévio, a cuja celebração se dispense qualquer formalidade, o que não ocorreria se viesse a ser gestado nos autos da ação respectiva.
Na doutrina, que já é vasta acerca da matéria, não se vê tratarem os juristas da hipótese de estar a Administração Pública na condição de celebrante, na posição de compromissado de ajustamento de conduta, pois a justa conduta é pressuposto da própria existência da Administração.
O instrumento preventivo e preparatório consistente do TAC não se ajusta à Administração Pública, sem qualquer dúvida, considerando-se, também, que a ação estatal está vinculada a um vasto aparato legal que a obriga a operar sob determinadas formalidades, falecendo ao administrador o poder de disposição acerca de determinados critérios e procedimentos de gestão.
Verifique-se, no caso, exemplificativamente, a questão da Lei de Licitações (Lei Federal n. 8.666/1993). Não pode o administrador dispor no sentido de restringir a universalidade do certame licitatório sob pena de invadir perigosamente a área da igualdade e da isonomia, de hierarquia muito superior à que se pode deduzir da posição jurídica de agentes do Ministério Público acerca da conveniência ou da oportunidade de restringir-se a adjudicação do serviço a determinado competidor do certame.
É evidente que a indisponibilidade dos direitos da Administração e o princípio da legalidade impedem seu agente de celebrar
acordos ou compromissos que não redundem de autorização legal ou administrativa. À Administração em juízo são impostas condições legais para a disposição de direitos e para assumir obrigações e compromissos; não há como juridicamente dispensá-las na prévia concertação representada pelo denominado compromisso de ajustamento de conduta.
Valho-me, novamente, do dizer de XXXXXXX XXXXXX BOAS CUEVA7 que considera ser o TAC o “instrumento genericamente voltado para a extinção negociada pela Administração de conflitos que envolvem interesses transindividuais” enfatizando que os procedimentos a serem utilizados pelo administrador para a sua celebração devem se encontrar dentre aqueles mecanismos legalmente permitidos para a celebração de transações (judiciais ou não) passíveis de adoção segundo os critérios e parâmetros que envolvem os atributos do ato e da gestão administrativos (legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade, legitimidade, participação, razoabilidade, economicidade e motivação) postos na Constituição Federal, no artigo 37 e na Carta Magna gaúcha, no artigo 19.
Caso contrário, advirta-se, ao Ministério Público se proporcionará a compartilhada e não-comprometida gestão da Administração Pública via compromissos de ajustamento de conduta que podem condicionar a ação estatal a compromissos não necessariamente legitimados pelos sistemas de equilíbrio – já tantas vezes fragilizados, por oportuno se diga – do estado de direito.
Ilustra bem a matéria a ponderação de XXXXXXX XXXXXX XXXXX 8 ao referir:
“De todo o expendido nos precedentes parágrafos deste breve ensaio, parece-nos ter sido clarificado que o Ministério Público somente pode utilizar o importante instrumento de tutela de interesses públicos e sociais relevantes nos casos
expressamente previstos na legislação em vigor. E mesmo assim, dada a excepcionalidade de sua atuação mediante a ação civil pública, quando, a par do suporte legal, seja oportuna e conveniente a sua propositura, que deverá concretizar-se objetivamente, sem qualquer conotação personalística e, obviamente sem um mínimo de paixão; vale dizer, com absoluta exação.”
Diz mais o estudioso e notável jurista:
“Somando-se a tudo isso a também equivocada interpretação (e conseqüente errônea aplicação) do disposto nos artigos 287 do Código de Processo Civil e 11 e 12 da Lei n. 7.347/85, (...) não temos dúvida em afirmar, conclusivamente, e com o máximo respeito, que a utilização da ação civil pública, pelo Ministério Público, a par de exagerada, tem-se mostrado realmente abusiva.”
Vejo, portanto, até mesmo revisitando meu posicionamento anterior, com muita apreensão e reservas a celebração indiscriminada de TACs pela Administração, firmados por quem carece de atribuição legal de compromissá-lo, e sem autorização legal, tanto por sua Administração Direta quanto pela Indireta e Vinculada, eis que todas, ao final, estão jungidas sob os princípios e regras que presidem a atuação estatal.
Nesse sentido, tratando da Ação Civil Pública, mas, sem dúvida, pertinente, é o julgado do Superior Tribunal de Justiça que, repare-se, espelha a sua jurisprudência remansosa:
“1. O Ministério Público esta legitimado para propor ação civil pública para proteger interesses coletivos. 2. Impossibilidade do juiz substituir a Administração Pública determinando que obras de infra-estrutura sejam realizadas em conjunto habitacional. Do mesmo modo, que desfaça construções já realizadas para atender projetos de proteção ao parcelamento do solo urbano. 3. Ao Poder Executivo cabe a conveniência e a oportunidade de realizar atos físicos de
administração (construção de conjuntos habitacionais, etc.). O Judiciário não pode, sob o argumento de que está protegendo direitos coletivos, ordenar que tais realizações sejam consumadas. 4. As obrigações de fazer permitidas pela ação civil pública não têm força de quebrar a harmonia e independência dos Poderes. 5. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário está vinculado a perseguir a atuação do agente público em campo de obediência aos princípios da legalidade, da moralidade, da eficiência, da finalidade e, em algumas situações, o controle do mérito. 6. As atividades de realização dos fatos concretos pela Administração depende de dotações orçamentárias prévias e do programa de prioridades estabelecidos pelo governante. Não cabe ao Poder Judiciário, portanto, determinar as obras que deve edificar, mesmo que seja para proteger o meio ambiente.” (Recurso Especial n. 226.927 – 1ª Turma, publicado na imprensa oficial em 16 de junho de 1998)
Como diz XXXX XXXXXXXX XXXXX XXXXXX0:
“Deve-ser alcançar o exato limite de razoabilidade: incabível é a provocação da tutela jurisdicional com o fito exclusivo de controle do mérito do ato administrativo, entendido este como os critérios de conveniência e oportunidade de competência exclusiva do administrador público, sob pena de colocar em risco o princípio da separação dos poderes. Por outro lado, tal afirmação não pode ser levada ao extremo, principalmente, em pleno século XXI onde se verificam situações claras de abuso de poder e falta de motivação dos atos praticados no âmbito administrativo, além da falta de legitimidade.”
No caso específico sob exame, propõe-se a celebração de um TAC mediante o qual se compromete a sociedade de economia mista CESA a realizar atos de gestão que envolvem a contratação de prestação de serviços de forma terceirizada e os atos que necessariamente devem compor a execução de um contrato no âmbito da administração, seja pública, seja privada.
Impõe-se compromisso de fiscalização pela contratante do cumprimento pela contratada das cláusulas do pacto de prestação de serviços,
bem sujeita-se a CESA a rescindir, em 60 dias, todos os contratos de prestação de serviços que, segundo o proponente, envolvam a terceirização de atividades- fim.
O compromisso de ajustamento de conduta é proposto para vigorar por prazo indeterminado, podendo ser revisto a qualquer tempo, “caso se altere a realidade fático-jurídica que deu origem ao instrumento”.
A cada oportunidade em que evidenciada a quebra do compromisso, a CESA obriga-se a pagar R$ 5.000,00 (cinco mil reais), aos quais se acrescem R$ 500,00 (quinhentos reais) por trabalhador que venha a ser considerado em situação irregular, sem prejuízo das obrigações assumidas no TAC. As penalidades podem ser substituídas por obrigação alternativa, a critério do Ministério Público do Trabalho.
Não vejo razão jurídica para que a ação estatal se paute por compromisso de ajustamento de conduta, mormente nos termos propostos, os quais, pela sua generalidade, dão ao parquet virtualmente o poder e a condição de gerir e controlar a companhia no tocante à política de seus recursos humanos, infligindo-lhe castigo pecuniário – ou outra admoestação, a seu critério
– quando agir mal.
A terceirização de serviços é lícita e existe regulamentação legal e orientação da jurisprudência suficientes para fundamentar satisfatoriamente a atuação do administrador.
Não há razão jurídica para que a CESA se comprometa a cumprir a lei – coisa a que já está submetida – ou a ajustar-se a posicionamento jurídico patrocinado pelo Ministério Público antecipada e previamente à resolução jurisdicional das incertezas eventualmente originadas dos comportamentos administrativos da companhia.
A Administração não se obriga a celebrar TACs, salvo em situações devidamente focalizadas, posteriormente a exame profundo e fundamentado das condições e razões para sua firmatura, sempre por agente legitimado, a quem a lei faculte comprometer a ação administrativa.
Concluindo, pelas razões expendidas, manifesto-me no sentido de desaconselhar a celebração indiscriminada de Compromissos de Ajustamento de Conduta pela Administração Pública, salvo em situações específicas, devidamente revestidas das formalidades legais e jurídicas que se impõem à ação estatal.
Cabe à CESA atender ao regramento legal e administrativo a que está obrigada, não havendo razão para se obrigar ao ajustamento à legalidade que é de sua própria essência, firmando o Termo de Ajustamento de Conduta ora proposto.
É o Parecer.
Porto Alegre, 09 de abril de 2008.
XXXXXXX XXXXXXX XXXXXX XX XXXXXXX, PROCURADOR DO ESTADO.
Processo n. 96354-10.00/07-7
1 XXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. Compromisso de ajustamento de conduta: evolução, fragilida- des e atuação do Ministério Público. Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, x. 00, x. 00, x. 00-000, jan./mar. 2006.
2 XXXXXX, Xxxxxx. Termo de ajustamento de conduta e acesso à Justiça. Revista Dialéti- ca de Direito Processual, São Paulo: Dialética, v. 52, p. 116-124, julho 2007.
3 MILARÉ, Xxxx, XXXXXX, Xxxxx e XXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxxxxxx de Ajustamento de Conduta: evolução e fragilidades – Atuação do Ministério Público. Revista Direito e Xxxxxxxxx, Xxxxxxx. 0000, p. 191.
4 XXXXXX, Xxxxxx. Termo de ajustamento de conduta e acesso à Justiça. Revista Dialéti- ca de Direito Processual, São Paulo: Dialética, v. 52, p. 121, julho 2007.
5 CUEVA, Xxxxxxx Xxxxxx Bôas. Termo de compromisso no processo administrativo san- cionador do Banco Central: possibilidade e limites. In: OSÓRIO, Xxxxx Xxxxxx (Coord.). Direito sancionador. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 281-309.
6 XXXXXXXXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxxxxx. Compromisso de Ajustamento de Conduta. Revista dos Tribunais. São Paulo, 781/735, p. 733-740.
7 CUEVA, Xxxxxxx Xxxxxx Boas Termo de compromisso no processo administrativo sanci- onador do Banco Central: possibilidade e limites. In: OSÓRIO, Xxxxx Xxxxxx (Coord.). Direito sancionador. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 305.
8 XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx. Ação Civil Pública: abusiva utilização pelo Ministério Público e distorção pelo Poder Judiciário. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre: Magister, v. 1, n. 2, p. 49-82, set./out. 2004.
9 XXXXXX, Xxxx Xxxxxxxx Xxxxx. Ação civil pública e o controle dos atos administrati- vos: outros argumentos. Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo: Dialética, v. 55, p. 82-89, outubro 2007.
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL GABINETE DA GOVERNADORA
Processo no 96354-10.00/07-7.
Acolho as conclusões do PARECER nº. 14.880, de au- toria do Procurador do Estado Doutor XXXXXXX XXXXXXX XXXXXX XX XXXXXXX da Procuradoria de Pessoal.
Encaminhe-se a Excelentíssima Senhora Governadora do Estado para sua aprovação. Após, ao Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Agronegó- cio.
Em 11 de agosto de 2008.
Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx, Procuradora-Geral do Estado.
Processo nº 096354-10.00/07-7
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO CONSULTORIA
APROVO as conclusões do Parecer nº 14.880, da Procuradoria-Geral do Estado, dando orientação jurídico-normativa à administração pública estadual, face o contido no artigo 82, inciso XV, da Constituição Estadual, e diante da indisponibilida- de dos direitos da Administração e do primado da legalidade, determino que qualquer compromisso de ajustamento de conduta proposto à Administração Pública tenha por referência situações específicas e delimitadas, sendo precedida a sua celebração de aná- lise da Procuradoria-Geral gaúcha quanto as sua razões, condições e finalidades.
À Procuradoria-Geral do Estado para as anotações de praxe e providências que entender necessárias.
Em 06 de agosto de 2008.
PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 05 de setembro de 2008.
XXXX XXXXXX XXXXXXX, XXXXXXXXXXX XX XXXXXX.
00
XXXXXX XX XXX XXXXXX XX XXX GABINETE DA GOVERNADORA