ESTADO DA PARAÍBA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ESTADO DA PARAÍBA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GAB. DES. XXXX XXXXXXX XX XXXX
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023724-55.2012.815.0011
RELATOR: Des. Xxxx Xxxxxxx xx Xxxx
APELANTE: Pneus Teixeira Indústria e Comércio Ltda. ADVOGADO: Xxxxxx Xxxxxxxxxx xx Xxxxxxx APELADA: WL Comércio e Importação Ltda.
ADVOGADO: Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx
ACÓRDÃO
CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA – CONTRATO DE LOCAÇÃO – ALUGUÉIS RECEBIDOS PELA APELADA/ARREMATANTE NO PERÍODO EM QUE ESTAVA SUB JUDICE A VALIDADE DA ALIENAÇÃO JUDICIAL DO BEM – DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA ARREMATAÇÃO, POR VÍCIO FORMAL, EM MOMENTO POSTERIOR – IMPROCEDÊNCIA – APELAÇÃO CÍVEL – IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PERSEGUIDAS – POSSE DE BOA FÉ DA ARREMATANTE – DIREITO À PERCEPÇÃO DOS FRUTOS - APLICAÇÃO DO ART. 1.214, DO CÓDIGO CIVIL – PARTICIPAÇÃO DA RECORRIDA NA AÇÃO QUE ENSEJOU A NULIDADE DA VENDA JUDICIAL – SITUAÇÃO QUE NÃO DESCARACTERIZA A BOA FÉ – MANUTENÇÃO DO DISPOSITIVO DA SENTENÇA - DESPROVIMENTO DO RECURSO.
- A declaração de nulidade da arrematação reflete que a posse do arrematante no bem objeto da alienação invalidada estava qualificada pela boa-fé, enquanto ela perdurou.
- De acordo com o que dispõe o art. 1.214, do Código Civil, o possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos. O dispositivo autoriza o recebimento de aluguéis pela recorrida enquanto perdurou a validade da arrematação do imóvel locado.
- O fato de a recorrida ter participado do polo passivo da ação declaratória que ensejou a nulidade da arrematação não transmuda sua posse de boa-fé em posse de má-fé, já que inexistia a certeza de que seria outorgada a tutela jurisdicional pretendida pela autora.
VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos.
ACORDAM os integrantes da Terceira Câmara Cível, à unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator e da certidão de julgamento de fl. 204.
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta por Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx e Comércio Ltda. contra sentença, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Campina Grande, que julgou improcedente o pedido constante da ação de cobrança de aluguéis ajuizada em face da WL Comércio e Importação Ltda.
Alega a recorrente que, tendo como objeto o uso de imóvel de sua propriedade, foi firmado contrato de locação com uma terceira empresa (Central da Construção Ltda.), no qual restou estabelecido o pagamento de aluguel no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).
Assevera que o bem foi levado à hasta pública na Justiça Laboral, tendo sido arrematado pela recorrida, que celebrou nova avença com a locatária, majorando a mensalidade para R$ 12.000,00 (doze mil reais).
Informa que obteve, naquela Justiça Especializada, a declaração de nulidade da arrematação, sendo restabelecida da posse em 30/05/2012.
Aduz que a recorrida já foi ressarcida do que foi pago pela arrematação e que a nulidade decretada gera efeitos ex tunc, razão pela qual o negócio jurídico entre aquela e a locatária não gerou efeitos.
Por essa razão, pugna pelo provimento do apelo, para que seja julgado procedente o pedido, no sentido de ser ressarcida dos aluguéis pagos no período compreendido entre a celebração do segundo contrato de locação e a declaração da nulidade da arrematação.
Intimada, a recorrida apresentou contrarrazões rechaçando a tese recursal e pleiteando a manutenção da sentença.
Nesta instância, o Ministério Público opinou pelo regular trâmite
recursal.
É o relatório.
VOTO.
Pretende a autora, ora apelante, o recebimento de aluguéis decorrentes de contrato de locação de imóvel de sua propriedade durante o período em que estava sub judice a validade da arrematação do bem empreendida pela promovida/apelada através de hasta pública realizada perante a Justiça Laboral.
Afirma a insurgente que a recorrida, após ter arrematado o imóvel, firmou novo negócio jurídico com a empresa locatária (Central da Construção Ltda.), majorando significativamente o valor do aluguel, e que, declarada a nulidade da arrematação, faz jus ao proveito econômico auferido.
Na sentença, o Juízo a quo foi pela improcedência do pedido, ao fundamento de que, embora tenha sido declarada nula a arrematação, enquanto a mesma vigorou, a empresa demandada agiu na qualidade de possuidora de boa fé, que, nos termos do art. 1.214, do Código Civil, tem direito aos frutos percebidos em decorrência da posse. Vejamos o que dispõe a norma:
“Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.”
Prestadas tais informações, penso que, de fato, o dispositivo da sentença deve ser mantido em todos os seus termos.
Assim, constata-se, com facilidade, que não foi a apelada/arrematante que deu causa à nulidade do ato judicial que extirpou, temporariamente, o imóvel litigado do acervo patrimonial da insurgente, mas sim um vício formal na condução da execução trabalhista.
A meu ver, essa situação, por si só, demonstra a boa fé da recorrida na aquisição, tida por nula, do imóvel, autorizando, por isso, a aplicação da norma supratranscrita, já que, enquanto considerada válida a arrematação, é impossível não qualificar a adquirente como, no mínimo, possuidora do bem.
Logo, no período em que esteve na posse de boa fé do imóvel locado, em decorrência da arrematação, repito, com vício formal, poderia a
1 Art. 687. […]. § 5o O executado terá ciência do dia, hora e local da alienação judicial por intermédio de seu advogado ou, se não tiver procurador constituído nos autos, por meio de mandado, carta registrada, edital ou outro meio idôneo.
recorrida perceber os frutos dele advindos, assim como destacam os julgados que, agora, colaciono:
AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUERES - COISA COMUM - METADE IDEAL DE IMÓVEIS ADQUIRIDOS EM ARREMATAÇÃO OCORRIDA EM PROCESSO TRABALHISTA
- IMÓVEIS LOCADOS - ARREMATAÇÃO ANULADA POR VÍCIO PROCESSUAL - PRETENSÃO DOS AUTORES EM RECEBER PARTE DOS VALORES DOS ALUGUÉIS HAVIDOS ENTRE A DATA DA ARREMATAÇÃO E A SENTENÇA QUE A DECLAROU NULA - IMPOSSIBILIDADE -PEDIDO FORMULADO COM BASE NO DIREITO DE PROPRIEDADE QUE DEIXOU DE EXISTIR - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.RECURSO IMPROVIDO. (TJ-SP
, Relator: Xxxxx Xxxxxx, Data de Julgamento: 19/04/2011, 2ª Câmara de Direito Privado)
TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA. ARREMATAÇÃO. LOCAÇÃO. INDENIZAÇÃO. IMPERTINÊNCIA. POSSE. BOA-
FÉ. 1 - A declaração de nulidade da arrematação reflete que a posse do locatário no bem objeto da alienação invalidada estava qualificada pela boa-fé. 2 - Arrematado o bem, fica resolvido o contrato de locação. A posterior nulidade não o revigora. A posse do locatário nesse interstício, porquanto de boa-fé, não implica pagamento de valores ao proprietário. 3 - Declarada nula a arrematação em face do pagamento do débito tributário imputado ao devedor, em data que antecedeu a hasta, razoável suportar a União o pagamento de 50% do valor dos aluguéis devidos ao proprietário. (TRF-4 - AC: 2258 RS 2005.71.03.002258-9, Relator: XXXXX XXXXX XX XXXXX,
Data de Julgamento: 27/10/2009, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: D.E. 18/11/2009)
Em razão disso, mesmo que a declaração de nulidade do ato expropriatório gere efeitos ex tunc, subsistiu o exercício da posse de boa fé pela recorrida, sendo esta autorizada, por lei, a perceber os frutos gerados pelo bem naquele período, independente de ter ocorrido, posteriormente, a devolução dos valores da arrematação.
Por fim, convém ressaltar que a participação da apelada na ação declaratória de nulidade na Justiça Laboral não descaracteriza sua posse de boa fé, até porque, enquanto não transitada em julgado, não haveria como saber que o resultado final daquela demanda seria favorável à promovente, tanto que a decretação da nulidade somente veio ser determinada através de acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, que reformou decisão de primeiro grau julgando improcedente o pedido.
Corroborando esse entendimento, colaciono o seguinte precedente da Corte Superior de Justiça:
[…]. 1. Controvérsia acerca da caracterização do possuidor como de má-fé em razão da sua ciência sobre a tramitação de
ação rescisória visando anular a decisão que lhe conferiu a posse sobre imóvel. […]. Embora seja certo que o recorrido sempre teve ciência da mencionada ação rescisória, tendo sido, inclusive, citado para respondê-la, na qualidade de parte (réu), esse fato não transmuda sua posse de boa-fé em posse de má-fé, situação que afastaria o direito de retenção pelas benfeitorias realizadas no imóvel. 6. O fato dos recorrentes terem promovido a ação rescisória não implicaria necessariamente que lhes fosse outorgada a tutela jurisdicional pretendida, de declaração de nulidade da ação de extinção de condomínio, permanecendo, portanto, incólume a boa-fé do recorrido no exercício da posse do bem. 7. O fundamento do recebimento do valor que foi pago pelo recorrido na arrematação anulada decorre da garantia da evicção e da boa- fé do recorrido quando da aquisição em hasta pública. […]. (STJ - REsp: 1217597 PR 2010/0184427-8, Relator: Ministra XXXXX XXXXXXXX, Data de Julgamento: 27/08/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/09/2013) – grifo nosso.
Ante todo o exposto, nego provimento ao apelo, mantendo na íntegra o dispositivo da sentença atacada.
É como voto.
Presidiu a Sessão o Exmo Sr. Des. Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xx e Xxxxxxxxx. Participaram do julgamento, o Exmo. Des. Xxxx Xxxxxxx xx Xxxx (relator), o Exmo. Dr. Xxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, Juiz convocado em subsitituição a Exma. Desª. Xxxxx das Graças de Morais Guedes e o Exmo. Des. Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xx e Xxxxxxxxx.
Presente ao julgamento a Dra. Xxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Promotora de Justiça Convocada.
Sala de Sessões da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, João Pessoa, 18 de agosto de 2015.