A EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO
A EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Especialização em Direito Contratual
Campinas 2013
A EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO
Monografia apresentada ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, Especialização em Direito Contratual, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Especialista em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Orientadora: Profa. Dra. Xxxxxx Xxxxxx Nerling Xxxxxx.
Campinas 2013
A EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO
Monografia apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Especialista em Direito Contratual.
Aprovada com média
São Paulo, de de
Banca examinadora:
Aos meus pais, familiares e amigos por todo apoio e dedicação.
O presente estudo pretende abordar discussão acerca da possibilidade de exigir o cumprimento de contrato preliminar de doação, analisando o disposto no ordenamento jurídico brasileiro, o posicionamento de doutrinadores nacionais e estrangeiros, bem como entendimento adotado pelos Tribunais. Propõe-se com o presente trabalho o estudo das características do contrato de doação e do contrato preliminar, para após proceder à análise de elementos fundamentais atinentes ao assunto, como a manifestação de vontade do doador (animus donandi), os princípios de Direito que incidem sobre a problemática, bem como a explanação das teorias existentes acerca da validade e exigibilidade do contrato preliminar de doação, visando, ao fim, apontar uma solução plausível para dirimir as divergências existentes.
Palavras-chave: Doação. Contrato Preliminar. Princípios. Promessa de Doação.
This study aims to address the discussion regarding the possibility of promoting the enforcement of the preliminary donation agreement, analyzing the provisions regarding such matter in the Brazilian system of law, the position of the Brazilian and foreigner doctrine, as well as the courts position over this subject. This study has also the intention to analyze the main characteristics of the donation agreement and the preliminary agreement, to further proceed with the verification of the main elements regarding this matter such as the manifestation of the donator’s intentions (animus donandi), the law’s principles which influence this subject, as well as the analysis of the existing theories related to the validity and enforceability of the preliminary donation agreement with the purpose to indicate a feasible solution to solve the existing controversies.
KEY WORDS: Donation. Preliminary Agreement. Principals. Donation Promise.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 8
2 CONTRATO DE DOAÇÃO 9
2.1 Considerações iniciais 9
2.2 Elementos da Doação 12
2.2.1 Transferência de patrimônio 12
2.2.2 Animus donandi 13
2.2.3 Aceitação 15
2.3 Partes 17
2.4 Capacidade 17
2.4.1 Ativa 17
2.4.2 Passiva 19
2.5 Forma 20
2.6 Objeto 22
2.6.1 Doação universal 24
2.6.2 Doação inoficiosa 26
2.7 Principais modalidades 28
2.7.1 Pura 28
2.7.2 Com encargo 29
2.7.3 Com condição 30
2.7.4 Com termo 31
2.7.5 Remuneratória 31
2.7.6 Contemplativa 32
2.7.7 Em forma de subvenção periódica 33
2.7.8 Conjuntiva 34
2.7.9 Doação com cláusula de reversão 34
2.7.10 Ao nascituro 35
2.7.11 Entre cônjuges 36
2.7.12 Doação de ascendente para descendente 37
2.7.13 À entidade futura 37
2.8 Formas de extinção 38
2.8.1 Contratual 38
2.8.2 Por revogação 39
2.8.2.1 Por descumprimento do encargo 40
2.8 2.2 Por ingratidão do donatário 41
3 CONTRATO PRELIMINAR 43
3.1 Conceito e características do contrato preliminar 43
4 EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO 49
CONCLUSÃO 57
REFERÊNCIAS 62
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho, intitulado A exigibilidade do contrato preliminar de doação, versa sobre o tema dos contratos de doação, espécie prevista no Capítulo IV, artigos 538 a 564 do Código Civil Brasileiro, em especial para abordar se há possibilidade de configuração de contrato preliminar, como previsto nos artigos 462 a 466 do mesmo Código.
O tema da exigibilidade do contrato preliminar de doação encontra-se plenamente em voga, inclusive com posicionamentos divergentes entre diversos julgadores e doutrinadores, o que permite melhor análise das correntes desenvolvidas/adotadas, bem como discussão, de modo a aprofundar os resultados sobre as vantagens e desvantagens de cada um dos posicionamentos existentes.
Desta forma, devido à ausência de posição uniforme sobre o assunto, no âmbito doutrinário, tem o presente trabalho o condão de trazer mais luz ao tema e concluir de modo não só a demonstrar o posicionamento majoritário adotado, mas também para discutir se este é o caminho correto ou não.
Foi o presente trabalho motivado pela seguinte pergunta: é exigível ou não o contrato preliminar de doação?
O presente estudo foi estruturado em três itens. O primeiro deles versa sobre o contrato de doação e suas características, esmiuçando quais são seus requisitos essenciais, bem como quais são suas modalidades e formas de extinção.
No segundo item, abordam-se as características dos contratos preliminares em geral, e, ainda, sobre a sua exigibilidade no ordenamento jurídico atual.
Em seguida, abordamos a problemática da exigibilidade do contrato preliminar de doação, considerando as nuances sobre o animus donandi, bem como sobre os princípios da autonomia da vontade e da boa-fé objetiva e os diferentes posicionamentos adotados pela doutrina nacional e estrangeira e pela jurisprudência nacional.
2 CONTRATO DE DOAÇÃO
2.1 Considerações iniciais
De acordo com o artigo 538 do Código Civil Brasileiro, “considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por mera liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.
Da análise do referido artigo é possível extrair que a doação possui, natureza contratual, sendo um negócio jurídico pelo qual se opera a transferência de bens e direitos, sem que haja contraprestação, ou seja, ocorre por mera liberalidade do doador1.
Trata-se, portanto, de contrato com características próprias, que o diferencia das demais espécies de contrato.
Nas palavras de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald2:
Etrementes, a estrutura da doação traz consigo, ao revés, uma enorme grandeza de caráter, uma explícita generosidade. Enquanto a venda está baseada na reciprocidade das vantagens econômicas, a doação funda-se em uma manifestação de ajuda ao próximo. Daí, inclusive, a sua origem etimológica: donatio, significa dar de presente. Cuida-se, então de ato decorrente da solidariedade humana, de um sentimento de ajuda ao próximo, sem contrapartida. (grifo autor)
Cumpre ressaltar que, embora o contrato de doação ocorra sem que haja contraprestação direta pelo donatário, não há qualquer dúvida quanto ao seu caráter contratual, tendo em vista que a aceitação do donatário é imprescindível para o aperfeiçoamento da doação. Neste aspecto, o posicionamento de Maria Helena Diniz3:
[...] nosso Código Civil considerou expressamente a doação como um contrato, requerendo para a sua formação a intervenção de duas partes contratantes, o doador e o donatário, cujas vontades se entrosam para que se perfaça a liberalidade por ato inter vivos, distinguindo-se dessa maneira do testamento, que é liberalidade causa mortis [...]. Nítida é a natureza contratual da doação, visto que
1 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Tratado Teórico e Prático dos Contratos, volume 2. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 47.
2 XXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxx de; XXXXXXXXX, Xxxxxx. Curso de Direito Civil: direito dos contratos. 2. ed. Salvador: Jus Podivm, 2012, p. 696. v. 4
3 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 228. v. 3
gera apenas direitos pessoais, não sendo idônea a transferir a propriedade do bem doado.
Considerando a característica contratual e visando uma definição mais precisa e objetiva acerca de sua natureza jurídica, necessário se faz levar em consideração a modalidade básica de doação, qual seja, pura e simples.
As peculiaridades relativas à natureza jurídica das demais modalidades de doação existentes na legislação civil serão oportunamente tratadas nos próximos itens deste estudo.
A doação é disciplinada pelos artigos 538 a 564 do Código Civil, sendo, portanto contrato típico.
É, ainda, um contrato comutativo, uma vez que as partes conhecem todos seus direitos e deveres no momento da contratação.
Quanto ao momento em que se aperfeiçoa o contrato de doação, a doutrina possui posicionamentos divergentes. Parte classifica o contrato de doação como consensual, por entender que o contrato se aperfeiçoa com a manifestação de vontade das partes.
Neste sentido é o posicionamento de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano4:
Efetivamente, em regra, a doação aparece em nosso sistema jurídico como contrato consensual, pois, para existir, exige apenas o acordo de vontades entre doador e donatário. A tradição da coisa doada constitui fase de execução do contrato, que se opera no plano da eficácia. Na hipótese de inadimplemento, poderá ser exigido o seu cumprimento coercitivo, desobrigando-se apenas o doador do pagamento de juros moratórios (art. 552 do CC/2002).
Para outros doutrinadores como Paulo Lôbo5, o contrato de doação se aperfeiçoa com a tradição e/ou registro em cartório, a depender do bem doado pelo doador ao donatário.
No mesmo sentido é o posicionamento de Fabrício Zamprogna Matiello6:
Nunca é demais ressaltar que, como todo contrato, a doação não transfere por si só o domínio, pois isso acontece por intermédio da tradição ou do registro, respectivamente, para coisas móveis ou imóveis. Somente se opera o exaurimento da doação por intermédio
4 SANSEVERIANO, Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxx. Contratos nominados II: contrato estimatório, doação, locação de coisas, empréstimo (comodato e mútuo). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 72. v. 2.
5 XXXX, Xxxxx. Direito Civil: Contratos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 281.
6 XXXXXXXX, Fabrício Zamprogna. Curso de Direito Civil: dos contratos e dos atos unilaterais. São Paulo: LTr, 2008, p. 216. v. 3.
da efetiva transferência da coisa doada. A essência do contrato reside na geração do dever positivo e pessoal de transferir algo, não se conformando com a mera inércia, renúncia ou ato similar. Assim, o perdão de uma dívida não representa doação, mas sim remissão.
Arnaldo Rizzardo7 ressalta que os efeitos da celebração do contrato de doação são, na verdade, de caráter obrigacional, já que sua efetiva execução dar- se-á com a efetiva transferência ou registro do bem doado:
É, finalmente, um contrato que produz efeitos obrigacionais. Sem dúvida, embora seja a doação um contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o patrimônio de outra, na verdade, o contrato é apenas o título, a causa da transferência. Para que esta efetivamente se opere, mister é que se verifique a tradição, se móvel o bem; ou o registro imobiliário, se de imóvel tratar-se.
Embora alguns autores considerem a doação um contrato real, melhor é a posição majoritária, que sustenta que o seu aperfeiçoamento ocorre com a aceitação, independente da entrega da coisa.8
O contrato de doação é considerado gratuito, uma vez que somente uma das partes, o donatário, é contemplado por vantagem econômico-patrimonial, não havendo qualquer contraprestação nesse sentido. Com relação à gratuidade do referido contrato, discorre Maria Helena Diniz9:
[...] gratuito, porque o donatário terá enriquecimento em seu patrimônio sem qualquer contraprestação, embora possa parecer oneroso se o doador impuser um encargo ao donatário no ato de efetuar a generosidade, ficando claro que mesmo assim a liberalidade sobreviverá.
Ademais, o contrato de doação é considerado unilateral, tendo em vista que, via de regra, só gera obrigações à uma das partes contratantes, o doador, que se obriga a transferir parte de seu patrimônio ao donatário. Sobre este tema, a lição de Flávio Tartuce10:
O contrato unilateral é aquele em que apenas um dos contratantes assume deveres em face do outro. É o que ocorre na doação pura e simples: há duas vontades (a do doador e a do donatário), mas do concurso de vontades surgem deveres apenas para o doador; o
7 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 418.
8 XXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Civil Brasileiro: contratos e atos unilaterais. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 257.
9 DINIZ, 2010, v. 2, p. 49.
10 TARTUCE, Xxxxxx. Direito Civil: Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie. 6. ed. São Paulo: Método, 2011, p. 51. v. 3.
donatário apenas auferirá vantagens. [...] Percebe-se, assim, que nos contratos unilaterais, apesar da presença de duas vontades, apenas uma delas será devedora, não havendo contraprestação. (grifo do autor)
Por fim, via de regra, o contrato de doação é formal, pois, para que tenha validade sua celebração, as partes devem observar as formas e demais condições previstas na legislação específica, o que será posteriormente abordado neste estudo quando da discussão sobre a forma pela qual a doação se aperfeiçoa.
2.2 Elementos da Doação
2.2.1 Transferência de patrimônio
Para a configuração da doação é necessária a transferência de bens ou direitos do doador para o donatário, ou seja, é imprescindível que haja movimentação de patrimônio11.
Os bens ou vantagens deixarão de integrar o patrimônio do doador e passarão a agregar o patrimônio do donatário.
Conforme definido por Xxxxxxx,12 a doação é negócio jurídico inter vivos que possui como característica o enriquecimento de alguém pela vontade do doador, diretamente ligado ao empobrecimento pela perda do objeto doado. Resta claro, assim, o entendimento de que a doação só se manifesta na ocorrência concomitante do enriquecimento do donatário e do empobrecimento do doador.
No mesmo sentido são os comentários de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano13 sobre esta questão:
O primeiro elemento característico da doação é a presença efetiva de uma transferência de bens ou vantagens do patrimônio do doador para o do donatário. Constitui ela o elemento objetivo da doação, em face da ocorrência do empobrecimento do doador e do enriquecimento do donatário como efeito patrimonial do contrato.
A transferência de patrimônio é, portanto, elemento objetivo do contrato de doação. Se não houver a diminuição do patrimônio do doador e o correspondente
11 DINIZ, 2006, v. 2, p. 50.
12 XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx xxx. Traité de Droit Romain. 2. ed. T. IV. Paris: Librairie de firmin dito freres. 1856.
13 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 63.
aumento patrimonial do donatário, não há que se falar em contrato de doação. Segundo Maria Helena Diniz14:
O doador deve sacrificar o seu patrimônio para beneficiar o de outrem por querer desinteressadamente melhorar a situação deste. Entretanto, esse princípio de altruísmo, de desinteresse ou de generosidade não é essencial à noção jurídica de doação, já que não deixarão de constituir doações as ofertas interesseiras de político que doa seus subsídios para angariar votos, bem como a de empresário que oferece banco ao jardim público de sua cidade contendo propaganda do doador.
Cumpre ressaltar que atos de mera liberalidade que não possuam tal elemento objetivo não podem ser confundidos com o contrato de doação. Neste aspecto assevera Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano15:
Muitas liberalidades não chegam a configurar doação por falta desse elemento caracterizador. Por exemplo, a renúncia de uma herança, embora motivada, com frequência, por um gesto de generosidade, não chega a se caracterizar como doação, pois não ocorre esse empobrecimento patrimonial do doador [...], eis que ela não ingressou no patrimônio do renunciante.
E corrobora Xxxxxx xx Xxxxx Venosa16:
Muitas situações, até mesmo sem conteúdo contratual, mas com sentido de liberalidade, não se convertem em doação, ora porque lhes falta ânimo de doar, ora porque não ocorre a diminuição do patrimônio do doador. [...] A renúncia de direitos pode decorrer de liberalidade, mas não configura doação, salvo expressa ressalva legal ou vontade do doador. A esse respeito, por exemplo, deve ser examinada a renúncia da herança.
2.2.2 Animus donandi
O animus donandi é elemento subjetivo do contrato de doação, sendo este considerado fator determinante para o seu aperfeiçoamento17.
Trata-se da livre e espontânea vontade do doador de praticar o ato de disposição do seu patrimônio em benefício do donatário, sem esperar qualquer contrapartida ou retribuição.
14 XXXXX, 2010, v. 2, p. 50.
15 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 63.
16 XXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxx. Direito Civil: contratos em espécie. 12. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2012, p. 105. v. 3.
17 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 64
Nas palavras de Carlos Kenedy da Costa Leite18, aninus donandi é:
[...] caráter de liberalidade provindo da índole de generosidade que emana da vontade do doador no momento do ato de doação. Tal propósito, como dito, configura o elemento subjetivo da doação e deve estar despido de qualquer preocupação por parte do autor da liberalidade, em ver seu patrimônio reintegrado através de uma contra-prestação por parte do donatário.
Cumpre ressaltar que nas demais modalidades de doação, como na doação onerosa, o ato do doador é imbuído de liberalidade, uma vez que o encargo imposto não representa uma contraprestação, ou seja, não tem como finalidade recompor o patrimônio do doador.
Neste sentido são as lições de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano19:
Mesmo na doação modal ou com encargo, o animus donandi está presente. Exige-se somente que o encargo não chegue a construir uma contrapartida à liberalidade, apenas se apresentando como um dever imposto pelo doador ao donatário. Se o encargo igualar ou ultrapassar o valor do bem doado, estará descaracterizada a doação. [...] A liberalidade presente na doação constitui uma modalidade de ato gratuito. Entretanto, não se devem confundir as duas figuras jurídicas (liberalidade e gratuidade).
Xxxxx Xxxxx xxxxxx, com precisão, que ‘o conceito de ato a título gratuito é mais amplo, que prescinde do duplo elemento – o enriquecimento e o empobrecimento -, como sucede no mandato civil, ou no contrato de depósito. Na liberalidade, ao contrário species do ato gratuito, é de sua essência a translatividade de um bem ou de um direito real sobre um bem, o que configura o enriquecimento do donatário e o empobrecimento do doador’.
Em igual sentido destaca Silvio de Salvo Venosa20 que “a doação não se perfaz tendo por objetivo uma contraprestação patrimonial. A aposição de encargo não faz o negócio desviar-se da liberalidade”.
Legalmente, é irrelevante os motivos que levaram o doador a praticar tal ato de liberalidade, bastando a presença do aninus donandi e dos demais requisitos legais para configurar o contrato de doação. Este, inclusive, é o posicionamento de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano21:
18 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx. O princípio da exigibilidade na promessa de doação pura. Âmbito Xxxxxxxx.xxx.xx, 2005. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxx- xxxxxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxx.xxx?x_xxxxxxxxxxxx_xxxxxxx_xxxxxxx&xxxxxx_xxx000>. Acesso em 04 out. 2013.
19 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 64.
20 VENOSA, 2012, v. 3, p.105.
21 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 65
A motivação do doador é irrelevante para o reconhecimento da liberalidade, não merecendo ser investigada. Xxxxxxxxx Xxxxx lembra com argúcia: ‘Liberalidade é gratuidade, dispensada a sondagem íntima (p.10)’. Ocorre que apesar de a motivação estar ligada a nobres sentimentos como o amor, a amizade, a filantropia e a gratidão, pode também derivar de razões corriqueiras, como o temor da reprovação alheia, a vaidade ou o interesse em vantagens futuras, como pode ocorrer nas doações em período eleitoral.
2.2.3 Aceitação
Outro elemento essencial para caracterização do contrato de doação é a aceitação do donatário22.
Vale lembrar que a doação possui natureza jurídica de contrato, sendo, portanto, imprescindível para sua configuração que haja manifestação de vontade de ambas as partes contratantes23.
Assim, o donatário deve manifestar sua vontade a fim de aceitar a doação que lhe é pretendida pelo doador, ou seja, deve estar presente o ânimo de receber a doação.
A aceitação pelo donatário pode se dar em três modalidades: expressa, tácita ou presumida.
A aceitação expressa, como o próprio nome diz, é aquele em que o donatário expressa sua aceitação de forma explícita, sendo, portanto, incontestável sua vontade de aceitar a benesse do doador.
Referida aceitação pode se dar de forma escrita, oral ou até gestual24.
Quanto à aceitação presumida da doação, importa observar o disposto no artigo 539 do Código Civil25, que confere ao doador a faculdade de definir um prazo para que o donatário manifeste sua aceitação ou não.
Decorrido o prazo estabelecido pelo doador sem que haja manifestação pelo donatário, presume-se que o donatário aceitou a liberalidade do doador, salvo nos
22 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 65
23 DINIZ, 2006, v. 2, p. 51.
24 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 66
25 Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo.
casos de doação com encargo, onde o silêncio do doador faz presumir a recusa da doação.
Interessante é o comentário de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx e Rodolfo Pamplona Filho26 sobre esta modalidade de aceitação, já que afirmam que “cuidando-se de doação sem encargo (pura), estaríamos diante de uma situação peculiar, em que o silêncio de uma das partes produziria efeito aquisitivo de direitos” (grifo do autor).
A aceitação tácita, por sua vez, ocorre quando o donatário não manifesta seu consentimento expressamente, no entanto, pratica atos que corroboram com a aceitação da liberalidade. O comportamento do donatário leva a crer que ele aceitou a doação.
Nas palavras de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald27:
Tácita é a aceitação comportamental. Xxxxxx-se por meio de condutas praticadas pelo beneficiário evidenciando o seu desejo de aceitar o beneplácito que lhe foi dedicado. É o caso do donatário que, sem manifestar expressamente a sua vontade, recolhe o imposto de transmissão ou concede o bem em garantia a um terceiro. (grifo do autor)
No mesmo sentido é o posicionamento de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano28:
A aceitação tácita ocorre quando o donatário, embora sem declarar expressamente sua aceitação, pratica atos que denotam o seu consentimento, sendo o seu comportamento incompatível com a recusa.
No Código Civil de 1916 era previsto, ainda, o consentimento ficto, ocorrido nos casos em que o donatário era pessoa incapaz. Previa o artigo 1.170 que “às pessoas que não puderem contratar é facultado, não obstante, aceitar doações puras”.
Nas palavras de Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxxxxxx,“a aceitação era considerada ficta, pois, a rigor, o consentimento seria inválido, em face da falta de capacidade do donatário.”29
26GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Xxxxxxx. Novo Curso de Direito Civil:
contratos em espécie. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 135. v. IV, t. 2.
27 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 714.
28 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 67.
29 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 68.
O Código Civil atual, em seu artigo 543, por sua vez, dispensa os absolutamente incapazes da manifestação de consentimento quando tratar-se de doação pura.
De acordo com o artigo 543, do Código Civil, “se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura”.
Portanto, as doações realizadas à absolutamente incapazes prescindem do ato de aceitação, sendo dispensada a manifestação de seus representantes legais, desde que se trate de doação pura, onde há manifesta vantagem ao donatário.
2.3 Partes
De acordo com o artigo 104 do Código Civil, a validade do negócio jurídico requer agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e deve obedecer à forma prescrita ou não defesa em lei.
Tendo em vista que o contrato de doação é um negócio jurídico, para que seja válido, devem estar presentes todos os requisitos previstos no referido artigo.
As partes no contrato de doação são doador e donatário, sendo o doador aquele que por mera liberalidade pratica ato de disposição de bens ou direitos em favor de terceiro e donatário aquele que é agraciado com algum bem ou direito de titularidade do doador sem qualquer ônus ou dever de prestar contraprestação, conforme disposto no artigo 538 do Código Civil.
Não obstante a previsão legal supramencionada, existem determinadas particularidades e situações envolvendo a capacidade das partes no contrato de doação que devem ser observadas, tendo em vista os desdobramentos advindos de tal questão.
2.4 Capacidade
2.4.1 Ativa
No contrato de doação entende-se por capacidade ativa, a vocação que tem o doador de dispor de parcela de seu patrimônio em benefício de outrem, sem exigir contraprestação para tanto.
Para doar o doador deve estar em pleno gozo de sua capacidade, apto a praticar os atos da vida civil, conforme disposto no artigo 104 do Código Civil.
Diante disso, não possuem capacidade ativa aqueles considerados absolutamente incapazes, uma vez que estes se encontram impedidos de praticar os atos da vida civil, inclusive, o ato de doar.
Sobre este aspecto, assevera Agostinho Alvim30:
Não temos dúvida de que o absolutamente incapaz não pode doar, nem mesmo quando o representante seja o pai. As liberalidades nunca se consideram como feitas no interesse do representado. O representante não deve celebrar negócios aleatórios, arriscados, e muito menos a título gratuito. Além disso, a doação requer um ânimo especial, o animus donandi, que supõe algum amadurecimento e sanidade mental; e disso carecem os absolutamente incapazes. Poder-se-ia objetar que um menor de dezesseis anos não é incapaz daquele ânimo, pois as pessoas nessa idade têm afetos, desejos de bem-fazer [...] ainda pondo de parte a impossibilidade de o representante celebrar negócios a título gratuito em nome do representado, o certo é que o Código Civil não leva em consideração aqueles sentimentos, quando emanados de pessoas menores de dezesseis anos.
O mesmo impedimento se aplica aos relativamente incapazes, tendo em vista que, tal como os absolutamente incapazes, estes não possuem o discernimento necessário para praticar um ato de doação.
Observe-se que mesmo aos menores de 18 e maiores de 16 anos não é conferida a possibilidade de dispor de seus bens através da doação, ainda que representados, pois, conforme anteriormente elucidado, atos de liberalidade não são tidos como feitos no interesse do representado.
Neste sentido, destaca-se o entendimento do jurista Eduardo Espínola31:
[...] embora tenham capacidade para fazer testamento, não podem dispor dos seus bens por doação. [...] os maiores de dezesseis anos gozam de capacidade testamentária ativa, podendo assim praticar atos de liberalidade mortis causa (instituir herdeiros ou legatários). Não lhes é facultado, porém, dispor de seus bens por ato de liberalidade inter vivos (contratar doações). [...] Entre nós, cessando a incapacidade pela emancipação e pelas outras causas indicadas no art. 9º, § 1º, n. I a V [Código Civil de 1916], não há na lei qualquer restrição no tocante às doações.
30 XXXXX, Xxxxxxxxx. Da Doação. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 25
31 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Dos Contratos Nominados no Direito Civil Brasileiro. Atual. Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx. Campinas: Bookseller, 2002, p. 231.
Além das incapacidades previstas nos artigos 3º. e 4º. do Código Civil, existem outras restrições a capacidade ativa de doar, conforme demonstrar-se-á a seguir.
Conforme explanado por Maria Helena Diniz32, os cônjuges casados em comunhão universal ou parcial de bens, estão impedidos de fazer doação dos bens e rendimentos comuns, que possam integrar futura meação, sem a devida autorização do outro consorte, exceto nos casos de doação remuneratória. Para os casados em regime de participação final nos aquestos, é possível a realização de doação apenas dos bens particulares.
Ademais, é vedada a doação realizada pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice, conforme disposto no artigo 550 do Código Civil. Tal doação é anulável, podendo o cônjuge traído ou seus herdeiros necessários pleitearem a anulação do ato no prazo de 2 (dois) anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.33
No tocante às restrições à doação quanto ao seu objeto, o presente trabalho abordará de forma detalhada adiante.
2.4.2 Passiva
A capacidade passiva se refere à aptidão do donatário em receber o bem ou vantagem doados por mera liberalidade pelo doador.
Conforme anteriormente explanado, para que o negócio jurídico seja válido é necessário que as partes sejam capazes, de forma que é igualmente necessária a capacidade civil do donatário para que o contrato de doação seja válido.
No entanto, existem algumas ressalvas no contrato de doação.
De acordo com o artigo 543 do Código Civil, é possível que o absolutamente incapaz seja beneficiário de uma doação, desde que essa se dê em sua forma pura, ou seja, sem encargos.
Neste caso, o referido diploma legal dispensa o consentimento pelo donatário, possibilitando o recebimento de doação pura e simples pelo absolutamente incapaz.
32 DINIZ, 2010, v. 2, p. 56.
33 DINIZ, loc. cit
Cumpre observar que a restrição à prática de atos civil pelos absolutamente incapazes tem como finalidade proteger seus interesses, impossibilitando que este disponha de seus bens e direitos de forma irresponsável.
Assim, considerando que a doação pura não gera nenhum ônus, mas tão somente o benefício de aumentar seu patrimônio, o legislador entende que não há riscos ao relativa ou absolutamente incapaz, considerando válida a doação pura feite em benefício deste.
Neste sentido, complementam Xxxxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxx e Nelson Rosenvald34:
[...] o art. 543 do Codex dispensa, expressamente, a aceitação quando se tratar de doação pura e simples, sem a imposição de encargo. Isto porque as regras legais tendem à proteção do incapaz e ele não pode, a toda evidência, manifestar a sua aquiescência, motivo pelo qual o sistema entende dispensável a manifestação do representante legal. Certamente, em se tratando de doação com encargo em prol de incapaz, a necessidade de aceitação, através do representante, será imperiosa, pois o encargo (ou modo) imporá obrigações para aquele.
Destaca-se que a capacidade passiva possui certos pontos relacionados com o Direito de Família, tais como a doação ao nascituro e a realizada em contemplação de casamento futuro, que serão debatidos adiante.
2.5 Forma
De acordo com o artigo 541 do Código Civil, a doação aperfeiçoar-se-á mediante a celebração de escritura pública ou instrumento particular, conforme o caso, observado o seu objeto.
A doação será obrigatoriamente realizada por escritura pública se o bem doado for imóvel cujo valor supere aquele previsto no artigo 108 do Código Civil.
Já para as doações de imóveis de valor inferior ao limite previsto no referido artigo 108, ou mesmo de bem móvel de valor considerável em relação ao patrimônio do doador, o instrumento particular é o meio mais adequado para a formalização da doação.
Vale trazer a baila os comentários de Xxxxxx Xxxx Xxxxxx e Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx 35:
34 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 715.
No Brasil, pode-se fazer doação por instrumento público ou particular e todas as partes devem declarar, na mesma forma, a vontade de assumir o vínculo obrigacional, desta maneira específica exigida pela lei, sob pena de inexistência do ato. No caso da doação, existem dois elementos categoriais inderrogáveis, um formal, qual seja, a solenidade exigida pela lei, de declaração em instrumento público ou particular, ou seja, a forma escrita; e outro objetivo, qual seja, a gratuidade da transferência efetiva do bem. Isso significa que, ausentes estes elementos, não existe doação.
Entretanto, de acordo com o parágrafo único do artigo 541 do Código Civil, a doação pode ser realizada verbalmente, desde que o objeto da doação seja um bem móvel de pequeno valor e sua tradição ocorra imediatamente ao ato de doação. Nesse sentido são os comentários de Paulo Nader36 sobre o tema:
[...] Na hipótese em que é permitida a celebração verbal da doação - bem móvel e de pequeno valor - tem-se uma exceção à consensualidade, pois o contrato se aperfeiçoa apenas com a tradição, conforme prevê o parágrafo único do art. 541 do Código Civil. O contrato de doação é de natureza formal, uma vez que se exige a escritura pública ou particular, como regra geral, segundo prescreve o caput do art. 541 do Código Civil. Admite-se a forma verbal para a hipótese destacada no parágrafo anterior deste texto. Necessariamente a forma deverá ser por escritura pública, quando o objeto da doação for imóvel de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo do país. Não sendo coisa móvel de pequeno valor, nem imóvel de valor excedente àquele limite, o contrato deverá ser formalizado por instrumento particular, podendo as partes optar por escritura pública. É lógico que os contratantes poderão formalizar o contrato, ainda quando for livre a forma.
A extensão patrimonial do doador em relação ao objeto doado é o critério adotado pelo legislador para definir se a doação deve ocorrer através de instrumento particular, ou verbalmente.
Neste sentido é o posicionamento da jurisprudência, conforme se verifica nos acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, respectivamente:
Direito Civil e Processual Civil. Doação à namorada. Empréstimo. Matéria de prova.
I - O pequeno valor a que se refere o art. 1.168 do Código Civil há de ser considerado em relação à fortuna do doador; se se trata de pessoa abastada, mesmo as coisas de valor elevado podem ser
35 XXXX XXXXXX, Xxxxxx, XXXX, Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Código Civil Comentado. 7. ed. rev. ampl. e atual. até 25.8.2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 609.
36 XXXXX, Xxxxx. Curso de Direito Civil: contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 238.
doadas mediante simples doação manual (Washington de Xxxxxx Xxxxxxxx).
II - No caso, o acórdão recorrido decidiu a lide à luz da matéria probatória, cujo reexame é incabível no âmbito do recurso especial.
III - Recurso especial não conhecido.37
APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA. DOAÇÃO VERBAL.
PEQUENO VALOR. VALIDADE. A doação verbal será válida, quando for de pequeno valor. Inteligência do artigo 541, parágrafo único, do CCB. Contudo, o pequeno valor não é aferido por si só, mas sim através de cotejo do valor doado com o patrimônio do doador. Precedentes jurisprudenciais. Doação de valor equivalente a 15% do patrimônio do doador não se configura elevada demais, para fins de invalidar a doação verbal. DERAM PROVIMENTO.38
Assim, é imprescindível a análise da situação econômico-financeira do doador para constatar se o bem doado possui valor razoável e, portanto, sua doação deve ocorrer através de instrumento particular, ou se o valor do bem doado é insignificante, podendo a doação ocorrer verbalmente.
Importa observar que a inobservância da forma prescrita em lei afeta a validade do contrato, tal como disposto no artigo 104 do Código Civil.
2.6 Objeto
Por tratar-se de um contrato, assim como os demais negócios jurídicos, a doação deve obedecer ao disposto no artigo 104, inciso II, do Código Civil, de forma que eu objeto deve ser lícito, possível, determinado ou determinável.
Conforme disposto no artigo 538 do Código Civil, é possível a doação de bens ou vantagens, desde que estes integrem o patrimônio do doador39.
Não há na legislação rol taxativo dos bens ou vantagens passíveis de serem doados, no entanto, diante do previsto no artigo supramencionado, tem-se que o
37 BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 155240/RJ, 3ª Turma. Relator: Min. Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, X. 07.11.2000, DJ 05.02.2001. Disponível em:
<http://xxx.xxx.xxx.xx/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=Doa%E7%E 3o+e+%22pequeno+valor%22+&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO>. Acesso em 20 nov. 2013.
38 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Apelação Cível 70042601799, 8ª. Câmara Cível, Relator Des. Xxx Xxxxxxxxx, X. 04.08.2011, D.J. 10.08.2011. Disponível em: <xxxx://xx-xx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/00000000/xxxxxxxx- civel-ac-70042601799-rs>. Acesso em 20 nov. 2013.
39 DINIZ, 2006, v. 2, p. 51.
objeto do contrato de doação deve ser algo que possua valor comercial, ou seja, que haja expressão econômica.40
Vale lembrar que o contrato de doação caracteriza-se pela diminuição do patrimônio do doador em benefício do aumento do patrimônio do donatário.
Assim, são passíveis de doação todos os bens de titularidade do doador, sejam eles móveis, imóveis, corpóreos ou incorpóreos, desde que apresentem certo valor econômico. O bem objeto da doação deve ser passível de alienação, de modo que se possa auferir sua vantagem econômica.
Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves41:
[...] Pode ser objeto de doação todo bem que esteja in commercium, ou seja, qualquer coisa que tenha expressão econômica e possa ser alienada. Incluem-se os bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos, consumíveis e inconsumíveis.
O artigo 538 do Código Civil dispõe ainda serem passíveis de doação determinadas vantagens. Para uma melhor compreensão, Paulo Lobo42 descreve essas vantagens como todas as “situações positivas que possam ser valoradas economicamente e transferidas gratuitamente para a titularidade de outro sujeito”. E exemplifica ao dizer que tais vantagens podem ser entendidas como “créditos que o doador tenha a receber de seus devedores, os títulos de crédito, ações e dividendos de empresas, entre outros”.
A doutrina diverge quanto à possibilidade de doação de bens ou vantagens futuros, ou seja, que ainda não fazem parte do patrimônio do doador no momento da doação.
Na visão de Silvio de Salvo Venosa43, a doação de bens futuros não é condizente com o instituto da doação, uma vez que não há o efetivo deslocamento do bem do patrimônio do doador para o donatário.
Na mesma linha é o entendimento de Orlando Gomes44, que sustenta que a doação de coisa futura é proibida ”pois ninguém pode transferir do seu patrimônio o que neste não está”.
40 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 259.
41 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 259.
42 LÔBO, 2011, p. 284.
43 VENOSA, 2012, v. 3, p. 108.
44 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 214.
No entanto, a razão parece estar com Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano45, que defende a possibilidade de doação de bens futuros:
Essa opinião não merece acolhida, pois se mostra perfeitamente compatíveis com o nosso sistema jurídico as doações de bens futuros, que ainda não integram o patrimônio do doador no instante da liberalidade. Reconhecida a natureza predominantemente consensual da doação, basta que, no momento do cumprimento da obrigação nascida do contrato, o bem esteja integrado ao patrimônio do doador para sua entrega ao donatário.
Caio Mario da Silva Pereira46, sublinha que “não é, porém, vedada a doação de bens futuros. O ato terá o caráter de contrato condicional, e não chegará a produzir nenhum efeito, se a coisa doada não vier a ter existência e disponibilidade por parte do doador”.
2.6.1 Doação universal
O Código Civil não fazer qualquer restrição expressa no tocante ao objeto do contrato de doação, no entanto, referido diploma legal prevê restrições quanto à quantidade dos bens envolvidos na doação, a fim de coibir lesões ao próprio doador, aos seus herdeiros, ou mesmo quaisquer tipos de fraudes.
De acordo com o artigo 548 do Código Civil é nula a doação de todos os bens, sem que haja reserva de parte, ou de renda suficiente para a subsistência do doador.
Tal disposição legal tem como objetivo proteger não só o próprio doador, mas também todos aqueles a ele diretamente ligados, tais como herdeiros, cônjuge, credores, entre outros, de modo a evitar eventuais dificuldades decorrentes da ausência de patrimônio e renda necessária à subsistência.
Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves47:
A limitação visa proteger o autor de liberalidade tão ampla, impedindo que, por sua imprevidência, fique reduzido à miséria, bem como a sociedade, evitando que o Estado tenha de amparar mais um carente. Não basta que o donatário se comprometa a assisti-lo, moral e materialmente. A nulidade recai sobre a totalidade dos bens,
45 SANSEVERIANO, 2005, v.2, p. 81.
46 XXXXXXX, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx. Instituições de Direito Civil: contratos. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 157. v. 3.
47 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 274.
mesmo que o doador seja rico e a nulidade de uma parte basta para que viva bem.
Ainda que haja a intenção de antecipar a partilha de bens causa mortis entre os herdeiros através da doação, se esta for realizada sem qualquer tipo de reserva, verifica-se a existência incontroversa de doação universal, em total descumprimento ao artigo 548 do Código Civil, sendo a referida doação nula de pleno xxxxxxx00.
A fim de não incorrer em doação universal vedada pela legislação, o doador que tem por objetivo antecipar a partilha de seus bens pode celebrar contrato de doação com cláusula de reserva de usufruto, de forma que os bens doados e transferidos ao patrimônio dos herdeiros ficam gravados com cláusula de natureza real que garante o uso e fruição dos bens pelo doador de modo a prover sua subsistência futura até seu falecimento.
Neste aspecto, são os comentários de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald49 sobre o tema:
O ato será nulo quando o volume do patrimônio doado (mesmo que não se trate da integralidade do patrimônio do benfeitor) comprometer a subsistência do doador, periclitando a sua dignidade. Nesta mesma tocada, o ato será válido mesmo que a doação abranja integralmente o patrimônio do doador, quando há reserva de renda ou parte idônea para a sua subsistência. É o caso de pessoa que, apesar de ter doado todo o seu patrimônio, gravou-o com cláusula de usufruto vitalício em seu favor. [...] Também é a hipótese do doador que, apesar de se desfazer integralmente de seus bens, tem renda mensal suficiente para a sua manutenção. [...] Em cada circunstância, será aferido o limite entre o possível e o vedado, em termos de disponibilidade patrimonial, perquirindo-se as circunstâncias econômicas do doador.
Uma vez caracterizada a doação universal, verifica-se a existência de nulidade absoluta, sendo cabível a ação declaratória visando à desconstituição de tal doação50.
São partes legítimas para a propositura dessa ação os herdeiros do doador, seu cônjuge, ou mesmo quaisquer credores que porventura sentirem seu direito de crédito lesado ou ameaçado51.
48 DINIZ, 2006, v. 2, p. 60.
49 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 718-719.
50 DINIZ, 2006, v. 2, p. 69.
51 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 273-276.
2.6.2 Doação inoficiosa
Outro mecanismo utilizado pelo legislador para impedir que a doação prejudique terceiros ligados ao doador é a proibição da doação inoficiosa.
O artigo 549 do Código Civil, considerada nula a doação que exceda a parte disponível do patrimônio do doador, ou seja, o doador não pode dispor de quinhão reservado aos seus herdeiros necessários.
Para um melhor entendimento do presente artigo, mister se faz ressaltar as palavras de Paulo de Tarso Sanseveriano52, que aduz que a doação inoficiosa pode ser entendida como "a doação que excede a parte disponível do doador, que tenha herdeiros necessários, prejudicando a sua legítima."
De acordo com o artigo 1.845 do Código Civil, são herdeiros necessários os descendentes, ascendentes e o cônjuge do doador. Ainda neste sentido, importante relembrar que, de acordo com o artigo 1.846 do Código Civil, caberá aos herdeiros necessários a parte legítima, sendo esta última entendida como a metade de todos os bens que compõem o acervo da herança.
Vale ressaltar que a regra contida no artigo 549 do Código Civil encontra sua base no artigo 2.007, parágrafo terceiro, do Código Civil. Este dispositivo legal dispõe sobre as hipóteses de redução das doações em que se verifica o excesso do doador no ato da doação e, neste sentido, ressalta serem passíveis de redução as doações que porventura excederem a parte legítima. Neste aspecto, as lições de Arnaldo Rizzardo53:
O conceito da inoficiosidade é ditado pelo § 3º do art. 2.007 [...] Daí depreender-se que o art. 549 (art. 1.176 do Código anterior) não proíbe a doação que ultrapassar a metade dos bens, e sim a que ultrapassar o valor que o testador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
Para constatação da doação inoficiosa deve ser levado em consideração o patrimônio do doador no momento da liberalidade, ou seja, é preciso verificar se a doação superou a parte disponível, atingindo a parte legítima.
52 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 126
53 XXXXXXXX, 2011, p. 445.
A nulidade gerada pela doação inoficiosa pode ser considerada parcial, pois apenas atinge a parcela que excedeu a parte legítima, permanecendo plenamente válida a doação no tocante à parte disponível do patrimônio do doador.
A ação competente para denunciar a doação inoficiosa é a denominada ação de redução de doação inoficiosa, que tem como finalidade reduzir a doação especificamente no tocante à parte que ultrapassou a parte disponível.
Com relação ao tema em comento, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:
CIVIL. DOAÇÃO INOFICIOSA.1. A doação ao descendente é considerada inoficiosa quando ultrapassa a parte que poderia dispor o doador, em testamento, no momento da liberalidade. No caso, o doador possuía 50% dos imóveis, constituindo 25% a parte disponível, ou seja, de livre disposição, e 25% a legítima. Este percentual é que deve ser dividido entre os 6 (seis) herdeiros, tocando a cada um 4,16%. A metade disponível é excluída do cálculo. 2. Recurso especial não conhecido.54 (grifo meu)
CIVIL E PROCESSUAL. Acórdão Estadual. Nulidade não Configurada. Ação de Reconhecimento de Simulação cumulada com Ação de Sonegados. Bens adquiridos pelo pai, em nome dos filhos varões. Inventário. Doação Inoficiosa Indireta. Prescrição. Prazo vintenário, contado da prática de cada ato. Colação dos próprios imóveis, quando ainda existentes no patrimônio dos réus. Exclusão das benfeitorias por eles realizadas. CC anterior, arts. 177, 1.787 e 1.732, § 2º. [...]. I. [...]. II. Se a aquisição dos imóveis em nome dos herdeiros varões foi efetuada com recursos do pai, em doação inoficiosa, simulada, em detrimento dos direitos da filha autora, a prescrição da ação de anulação é vintenária, contada da prática de cada ato irregular. III. Achando-se os herdeiros varões ainda na titularidade dos imóveis, a colação deve se fazer sobre os mesmos e não meramente por seu valor, ao teor dos arts. 1.787 e 1.792, § 2o, do Código Civil anterior. IV. Excluem-se da colação as benfeitorias agregadas aos imóveis realizadas pelos herdeiros que os detinham (art. 1.792, parágrafo 2o). V. [...]. VI. Recurso especial conhecido em parte e provido.55
54 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Civil. Recurso Especial nº. 112.254 - SP (1996/0069084-7). Relator: Min. Xxxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em 16/11/2004. Disponível em
<xxxxx://xx0.xxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxxxxx/Xxxx_Xxxxxxxxx.xxx?xXxxx000000&xXxxx0000000 90847&sData=20041206>. Acesso em 20 nov. 2013.
55 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Civil e Processual. Recurso Especial nº. 259.406 - PR (2000/0048914-0). Relator: Min. Aldir Passarinho Junior. Julgado em 17/02/2005. Disponível em
<xxxxx://xx0.xxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxxxxx/Xxxx_Xxxxxxxxx.xxx?xXxxx000000&xXxxx 200000489140&sData=20050404>. Acesso em 20 nov. 2013.
Estão legitimados à propositura de tal ação os herdeiros lesados pela doação inoficiosa56.
A ação de redução poderá ser proposta pelos herdeiros necessários, a qualquer tempo, inclusive ainda em vida do doador, sem que haja qualquer infração à previsão legal no tocante à questão da "herança de pessoa viva", vedada pelo Código Civil (artigo 426). Neste sentido, válidas são as reflexões de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald57 sobre esta questão:
[...] Em verdade, o que se tem é um contrato de doação, negócio jurídico inter vivos, cuja nulidade surge ao tempo da liberalidade. Assim, nasce uma pretensão imprescritível (CC, art. 169) de obter, em juízo, a redução do excesso, em razão da violação do direito subjetivo à legítima do herdeiro necessário.
2.7 Principais modalidades
2.7.1 Pura
São várias as modalidades de doação, sendo a pura a que melhor traduz o conceito previsto no artigo 538 do Código Civil.
É a doação realizada sem qualquer interesse ou expectativa, por mero altruísmo do doador, que tem como única finalidade acrescer o patrimônio do donatário.
Orlando Gomes58 a conceitua da seguinte forma:
A doação pura é a que se faz por espírito de liberalidade, sem subordinação a qualquer acontecimento futuro ou incerto, ao cumprimento de encargo ou em consideração do mérito ou reconhecimento de serviços por este prestados pelo favorecimento. É a mais simples espécie de doação, a mais comum, a que responde genuinamente ao espírito do ato. Na doação pura, não há limitações ao direito do donatário, nem motivo especial que a determine. É a liberalidade plena.
É, portanto, a doação pura, a modalidade de doação na sua essência, onde se verifica claramente a liberalidade do doador, sem a interferência de qualquer encargo, realizada de forma eminentemente gratuita59.
56 DINIZ, 2006, v. 2, p. 61.
57 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 721.
58 XXXXX, 1995, p. 215-216.
59 VENOSA, 2006. v. 3. p. 113.
2.7.2 Com encargo
Doação modal ou com encargo, prevista no artigo 553 do Código Civil, é aquela em que o doador atribui uma incumbência ao donatário em favor do próprio doador, de terceiro, ou, ainda, em prol da sociedade60.
O encargo a ser cumprido pelo donatário não é uma contraprestação pela doação recebida, de forma que a gratuidade do contrato não é atingida. Trata-se, no entanto, de uma obrigação acessória imposta ao donatário.
Nas palavras de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald61:
O encargo é uma restrição à liberalidade, pois não implica uma contraprestação do donatário ao doador (o que causaria o desvirtuamento do negócio), mas a imposição de um pequeno sacrifício ao donatário. Exemplificando, se uma pessoa destina gratuitamente um apartamento à outra, com o encargo de esta auxiliar as obras de caridade da Igreja local, não há contraprestação, mas uma imposição de obrigação, de uma onerosidade.
Diferentemente dos demais elementos acidentais do Contrato de Doação, a Doação realizada com encargo tem eficácia plena e imediata, isto é, a existência do encargo não suspende ou mesmo retarda a consecução dos efeitos do Contrato de Doação.
Nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxx Lisboa62:
A doação modal possui eficácia desde o momento em que o contrato é celebrado, pouco importando que o encargo ainda venha a ser cumprido. Caso o encargo não seja efetivado pelo donatário, o doador poderá desfazer o contrato.(grifo do autor)
Cumpre observar que o encargo imposto ao donatário deve ser lícito e possível, sob pena de ser considerado inválido.
Em caso de mora, o cumprimento do encargo pode ser exigido judicialmente, salvo quanto instituído em benefício do próprio donatário63.
60 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 263.
61 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 728
62 LISBOA,Xxxxxxx Xxxxxx. Manual de Direito Civil - Contratos, p. 253
63 VENOSA, 2006. v. 3. p. 113.
Tem legitimidade para exigir o cumprimento o doador, o terceiro beneficiado, ou o Ministério Público, nos casos em que o encargo é instituído no interesse geral e o doador já tiver falecido64.
A inexecução do encargo pode, ainda, ensejar a revogação da doação pelo doador, conforme disposto no artigo 562 do Código Civil65.
2.7.3 Com condição
A doação pode ser realizada com condição, hipótese em que esta só produzirá efeitos após ou até a ocorrência de evento futuro e incerto66.
Segundo Francisco Amaral67:
Condição é o acontecimento futuro e incerto de que depende a eficácia do negócio jurídico. Da sua ocorrência depende o nascimento ou a extinção de um direito. Sob o aspecto formal, apresenta-se inserida nas disposições escritas do negócio jurídico, razão por que muitas vezes se define como a cláusula que subordina o efeito do ato jurídico a evento futuro e incerto [...].
São duas as modalidades de condição que podem ser impostas ao contrato de doação, a suspensiva e a resolutiva.
Quando o contrato de doação for gravado com cláusula de condição suspensiva, este só passará a irradiar seus regulares efeitos após a ocorrência de evento futuro e incerto estipulado pelo doador. Nas palavras de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx: “Enquanto este não se verificar, o donatário não adquirirá o direito”.68
Neste sentido, Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald69 asseveram que “somente com o cumprimento da condição é que o beneficiário poderá exercer seus direitos sobre o bem doado.”
64 VENOSA, 2006, v. 3, p. 113.
65 Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário, assinando-lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida.
66 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 76.
67 XXXXXX, Xxxxxxxxx. Direito Civil: introdução. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 460-461.
68 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 262
69 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 727.
Por sua vez, a doação com condição resolutiva produz efeitos desde a celebração do contrato, perdendo sua eficácia com a ocorrência de condição estabelecida pelo doador, ou seja, a doação se resolve com o implemento da condição estabelecida.
2.7.4 Com termo
Semelhante à doação com condição é a doação com termo. No entanto, nesta modalidade a doação é condicionada à ocorrência de evento futuro e certo, ou determinável.
Ensinam Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxxx Filho70:
[...] É o caso da doação condicional e da condição a termo, cujas denominações são autoexplicativas. De fato, no primeiro caso, é estipulada uma condição (evento futuro e incerto) ao negócio, e, no segundo, é estabelecido um termo (evento futuro e certo) que delimita um prazo, findo o qual o donatário passa a exercer o domínio sobre a coisa alienada.
Assim como na doação com condição, o termo estabelecido pelo doador pode ser suspensivo ou resolutivo.
Na doação com termo suspensivo, esta passa a irradiar efeitos somente após a ocorrência de evento futuro e certo estipulado pelo doador.
A doação com termo resolutivo, por sua vez, perde a sua eficácia com a ocorrência de evento futuro e certo, resolvendo-se, assim, o contrato de doação.
2.7.5 Remuneratória
Na doação remuneratória, o doador tem a intenção de retribuir os serviços prestados pelo donatário.
Observe-se que não se trata de pagamento propriamente dito, posto que este não pode ser exigido pelo donatário, mas sim de uma liberalidade realizada pelo doador em gratidão aos serviços prestados71.
De acordo com os ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves72:
70 GAGLIANO, PANPLONA FILHO, 2011, v. IV, t. 2, p. 151.
71 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 263
Na doação remuneratória não há, assim, dever jurídico exigível pelo donatário. Todavia o doador sente-se no dever moral de remunerá-lo em virtude da prestação de um serviço que aquele lhe prestou e, por alguma razão pessoal, não exigiu o co-respectivo ou a ele renunciou.
Para Xxxxx Xxxxxx Gagliano73:
Doação Remuneratória [...] É aquela feita em retribuição a serviços prestados pelo donatário. É o caso do médico de família que serviu ao doador, com dedicação, durante toda a vida, sem cobrar nada por isso. Xxxxx está, entretanto, que essa doação não consiste tecnicamente em pagamento, mas sim, tão somente, em um justo reconhecimento do doador pelos favores recebidos.
2.7.6 Contemplativa
Para verificar a ocorrência de doação contemplativa ou meritória é necessário verificar os motivos que levaram o doador a realizar tal ato, uma vez que esta modalidade de doação tem com objetivo contemplar, reconhecer alguma virtude do donatário, ou algum feito por ele executado74.
Segundo os ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa75:
A doação por merecimento do donatário submete-se aos mesmos princípios (art. 540; antigo, art. 1.167), por aproximar-se da remuneratória, pois pressupõe uma recompensa de favor ou serviço prestado que não se converte em obrigação. (grifo do autor)
Para Paulo Lôbo76:
A doação meritória, ou “feita em contemplação de merecimento”, traz à tona o motivo da doação, que é reconhecer e premiar atos ou realizações do donatário, considerados relevantes pelo doador, ou mesmo em virtude de apreço especial. (...) Esse tipo de doação não tem como pressuposto a recompensa de um favor ou de um serviço recebido. [...] Exemplo frisante é de doação feita a uma pessoa famosa por ter adquirido mérito no campo cultural ou científico, considerado indiscutível na comunidade nacional ou internacional, por ter relevante serviço prestado à promoção da paz ou por descoberta científica de valor universal. A relevância do motivo não retira o caráter de liberalidade.
72 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 264
73 Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, O Contrato de Doação. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.120.
74 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 75.
75 VENOSA, 2006, v. 3, p. 114.
76 LÔBO, 2011, p. 293
Vale salientar que o donatário não tem o dever de provar ser merecedor da doação, tendo em vista que esta é realizada por liberalidade do doador, em manifesto apreço e consideração pela pessoa do donatário.
2.7.7 Em forma de subvenção periódica
A doação em forma de subvenção periódica ocorre quando o doador, por mera liberalidade, estabelece em benefício do donatário contribuições periódicas. Trata-se de uma única liberalidade, cuja execução se protrai no tempo77.
A periodicidade das doações é definida pelo doador, podendo ser mensal, anual, ou de outra forma que melhor lhe convier78.
O artigo 545 do Código Civil estabelece que a doação periódica extingue-se com a morte do doador, salvo se o este tiver estipulado em contrário.
Referido artigo estabelece outro limite temporal, qual seja, a morte do donatário. Assim, com a morte do donatário extingue-se definitivamente a obrigação estabelecida no contrato de doação. Neste sentido são as lições de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx:
[...] Além de proclamar a admissibilidade desse tipo de doação, o citado art. 545 tem também a finalidade de estabelecer o limite temporal da obrigação, que é a vida do doador. Sua morte gera a extinção da obrigação, salvo se ele próprio outra coisa houver estipulado. Neste caso, os herdeiros só serão obrigados dentro das forças da herança, não podendo porém a obrigação “ultrapassar a vida do donatário”.
No mesmo sentido são as lições de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano79:
O ideal é que, no próprio instrumento contratual, seja ajustado o prazo para o cumprimento do compromisso pactuado (v.g., até a maioridade do donatário; até encerrar o curso universitário; pelo prazo de dez anos). Não havendo fixação de prazo, o termo final será a morte do doador (...). Nessa hipótese, não poderá ultrapassar a vida do donatário, que será o seu termo final, consoante regra inserida pelo CC/2002 na parte final do art. 545 em comento. [...] A limitação estabelecida pelo legislador brasileiro corrige, em boa hora, o texto legal anterior, mostrando-se bastante razoável e evitando a eternização, por disposição negocial, da liberalidade.
77 XXXXXXXXX, 2006, v.3, p.265.
78 XXXXXXXXX, 2006, loc. cit.
79 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 111-112
2.7.8 Conjuntiva
Na doação conjuntiva o doador, simultaneamente, realiza a doação de um determinado bem ou vantagem para duas ou mais pessoas.
Conforme ensina Sílvio de Salvo Venosa80, “Doação conjuntiva é aquela feita a mais de uma pessoa, distribuindo-se porção entre os beneficiados [...].”
Se o contrato de doação não prever expressamente a parte que cabe a cada um dos donatários, entende-se que a doação foi realizada em parcelas iguais, conforme disposto no artigo 551 do Código Civil.
O parágrafo único do referido artigo estabelece que quando a doação conjuntiva for realizada a donatários casados entre si, na hipótese de morte de apenas um dos cônjuges, a doação subsistirá, em sua totalidade, ao cônjuge sobrevivente, de forma que os sucessores do cônjuge falecido não fazem jus a qualquer direito sobre a doação81.
Cumpre destacar ainda, que o direito de acrescer na doação conjuntiva não é a regra, no entanto, além da previsão em casos específicos determinados em lei, pode ser estipulado pelo doador.
Assim ensina o professor Flávio Tartuce82:
Por regra, não há direito de acrescer entre os donatários na doação conjuntiva. Dessa forma, falecendo um deles, sua quota será transmitida diretamente a seus sucessores e não ao outro donatário. Mas o direito de acrescer pode estar previsto no contrato (direito de acrescer convencional) ou na lei (direito de acrescer legal). (grifo do autor)
2.7.9 Doação com cláusula de reversão
De acordo com o disposto no artigo 547 do Código Civil, o doador pode estabelecer cláusula de reversão no contrato de doação.
Uma vez estabelecida a cláusula de reversão, o bem doado pode retornar ao patrimônio do doador, caso este sobreviva ao donatário.
Trata-se de uma condição resolutiva, de forma que uma vez implementada, extingue-se o contrato de doação, retornando o bem doado ao doador.
80 VENOSA, 2006, v. 3, p. 115.
81 XXXXXXXXX, 2006, v.3, p.267.
82 TARTUCE, 2011, v. 3, p. 345.
De acordo com os ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves83:
A cláusula de reversão só terá eficácia se o doador sobreviver ao donatário. Se morrer antes deste, deixa de ocorrer a condição e os bens doados incorporam-se definitivamente ao patrimônio do beneficiário, transmitindo-se, por sua morte, aos seus próprios herdeiros.
Cumpre observar que o referido artigo estabelece que a reversão pode se dar, exclusivamente, em benefício do doador, não sendo possível convenciona-la em favor de terceiro.
Neste aspecto, interessante é a constatação de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano84 sobre o tema em questão:
O Código Civil de 2002 posicionou-se restritivamente acerca do tema, estatuindo, através da regra inserida no parágrafo único do art. 547, a vedação expressa dessa modalidade de substituição na doação, ao estabelecer que "não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro". [...] Portanto, restringiu o legislador do Código Civil de 2002 o âmbito de incidência dessa norma permissiva da doação com cláusula de reversão, vedando expressamente que o beneficiário seja terceiro, e não o doador, e afastando, consequentemente, a doação com cláusula fideicomissória.
2.7.10 Ao nascituro
De acordo com o artigo 542 do Código Civil “a doação ao nascituro valerá, sendo aceita por seu representante legal”.
O nascituro pode ser beneficiado com doações, uma vez que o artigo 2º. do referido diploma legal põe a salvo seus direitos, desde a concepção85.
Cumpre observar que a doação ao nascituro só se torna válida com o nascimento com vida. No entanto, os efeitos da doação são produzidos antecipadamente.
Ensina Carlos Roberto Gonçalves86:
A aceitação do representante legal do nascituro não torna o contrato de doação definitivamente válido. A validade deve ser entendida nos limites do direito expectativo: condicionada ao nascimento com vida. Enquanto perdurar o estado de nascituro são produzidos os efeitos da doação antecipadamente. O nascimento resolve o estado de
83 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 271
84 SANSEVERIANO, 2005, v.2, p.120.
85 XXXXXXXXX, 2010, v. 3, p. 265
86 GONÇALVES, loc. cit.
incerteza e a doação produz todos os efeitos, contemplando os anteriores, sem necessidade de recurso à retroatividade.
Cumpre observar que, se o nascimento se der sem vida, a doação será considerada inexistente e o bem voltará a incorporar o patrimônio do doador87.
2.7.11 Entre cônjuges
A doação entre cônjuges, conforme disposto no artigo 544 do Código Civil, importa em “adiantamento do que lhes couber por herança”.
Tal regra, no entanto, não é absoluta, uma vez que os artigos 2.005 e 2.006 permitem que o doador, seja ele ascendente ou cônjuge, dispense a colação no próprio contrato de doação88.
Importa verificar na doação entre cônjuges o regime de comunhão de bens estabelecido entre eles.
Quando casados em regime de comunhão universal de bens, certo é que a doação versará sobre bem particular do doador, ou seja, aquele que é excluído da comunhão, uma vez que em tal regime o patrimônio é comum a ambos os cônjuges, sendo, portanto, inócua a doação de bens que pertencem a ambos.
No regime da comunhão parcial de bens, a doação entre cônjuges também deve versar sobre bem particular do cônjuge doador.
Já na separação absoluta de bens, seja ela legal ou convencional, todos os bens podem ser doados, uma vez que inexistem bens comuns entre os cônjuges.
No regime da participação final dos aquestos, são passíveis de doação os bens particulares de cada cônjuge, excluídos os aquestos.
Cabe trazer à baila as lições de Maria Helena Diniz89:
[...] pode haver doação de um cônjuge a outro, sendo o regime de separação convencional de bens o de comunhão parcial, desde que haja patrimônio particular, ou o de participação final nos aquestos, no que se refere aos seus bens particulares.
87 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx de. Os direitos dos nascituros no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em:
<xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxx.xx/xxxxxxx/xxxxx.xxx/XXXX/xxxxxxx/xxxxXxxx/0000/0000>. Acesso em 22 nov. 2013.
88 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 267.
89 DINIZ, 2006, v. 2, p. 57.
2.7.12 Doação de ascendente para descendente
O artigo 544 do Código Civil também se aplica às doação realizadas de ascendente à descendentes, de forma que os bens doados pelos pais aos filhos importa em adiantamento de herança, e devem ser conferidos no inventário do doador, através de colação, salvo se o doador a dispensar expressamente90.
Sobre a dispensa da colação, cabe trazer à baila os ensinamentos de Silvio Rodrigues91:
[...] é mister que o doador a inclua em sua quota disponível, com expressa menção que o donatário fica dispensado da colação. Caso isso não ocorra, entende-se que a doação do pai ao filho nada mais é do que adiantamento daquilo que por morte do doador o donatário receberia.
Cumpre observar que para que ocorra a doação do ascendente ao descente não é necessária a anuência dos demais descentes, posto que tal exigência se dá apenas nos casos de compra e venda e de permuta entre bens de valores desiguais, conforme disposto nos artigo 496 e 533, inciso II, do Código Civil92.
2.7.13 À entidade futura
É possível realizar doação em benefício de entidade futura, podendo tal entidade ser uma pessoa jurídica, de direito público ou privado ou, ainda, entes não personificados como o condomínio edilício93.
De acordo com o artigo 554 do Código Civil, a doação realizada à entidade futura caduca em 2 (dois) anos, se esta não for constituída regularmente94.
A constituição da entidade se dá com o seu registro no órgão competente, conforme disposto no artigo 45 do Código Civil.
Cumpre observar que o prazo de 2 (dois) anos é decadencial, de forma que não é possível a prorrogação ou interrupção deste.
Não constituída a entidade dentro do prazo legal, extingue-se a doação.
90 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 268.
91 XXXXXXXXX, Xxxxxx. Direito Civil. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 204. v. 3.
92 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 268.
93 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 273.
94 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 86.
2.8 Formas de extinção
2.8.1 Contratual
O contrato de doação, tal como os demais contratos, extingue-se pelo cumprimento da obrigação de doação nos termos e condições estabelecidos pela lei, conforme a modalidade de doação, ou ainda pela formalização de distrato, onde as partes, de comum acordo, colocam fim ao contrato, sem que esse gere seus efeitos, conforme disposto no artigo 472 do Código Civil95.
Além das hipóteses de extinção acima elencadas, o contrato de doação pode extinguir-se se verificada a existência de causas de invalidade do negócio jurídico, ou seja, nas hipóteses de nulidade e anulabilidade, como, por exemplo, no caso de inobservância da forma prescrita em lei, ou, ainda, na celebração de contrato de doação contra legem, como nos casos de doação universal ou inoficiosa, entre outras hipóteses.
Nesta esteia, os comentários de Carlos Roberto Gonçalves96:
Tendo natureza contratual, a doação pode contaminar-se de todos os vícios do negócio jurídico, como erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores [...]. A sua natureza contratual torna dispensável qualquer menção à hipótese, no Código, dada a sua evidência. Pode também ser declarada nula como os demais contratos, se o agente for absolutamente incapaz, o objeto ilícito, impossível ou indeterminável, ou não for observada a forma prescrita [...], bem assim se ocorrerem vícios que lhe são peculiares ou exclusivos, como nas hipóteses de inoficiosidade (art. 549), de compreensão de todos os bens, de ser feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice ou entre cônjuges, casados no regime da separação legal. Pode, ainda, ser rescindida, de comum acordo, ou resolver-se revertendo os bens para o doador.
Ainda que o contrato de doação seja válido e esteja em plena irradiação de efeitos, este pode ser extinto, através da revogação da doação, conforme se verificará a seguir.
95 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 85
96 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 276-277.
2.8.2 Por revogação
De acordo com o disposto no artigo 555 do Código Civil, o contrato de doação pode ser revogado por inexecução do encargo estabelecido pelo doador e nos casos em que ficar evidenciada a ingratidão do donatário.
Para revogação do contrato de doação, é imprescindível que o doador ajuíze uma ação requerendo a revogação da doação, demonstrando a ocorrência de uma das hipóteses mencionadas acima97.
Com relação à revogação da doação, são os comentários de Xxxxxxxxx Xxxxxx de Xxxxxx e Nelson Rosenvald98:
Pode causar certa estranheza a revogação da doação, afinal de contas não se pode olvidar que, após a aceitação do donatário, o contrato se torna perfeito e acabado, irretratável para as partes Pois bem, de fato o negócio se torna irretratável para as partes, que não podem desfazê-lo pela simples manifestação volitiva. A revogação da doação autorizada por lei, por sua vez, depende de reconhecimento judicial da sua causa posterior, nas estreitas hipóteses contempladas no Código Civil [...], não contemplando interpretação ampliativa. [...] O efeito jurídico da revogação é o desfazimento do vínculo negocial, impondo-se, via de consequência, ao donatário a restituição do bem recebido, caso esteja em sua posse. Trata-se de caso típico de propriedade resolúvel por causa superveniente (CC, art. 1.360).
Cumpre observar que é vedado ao doador realizar qualquer ato que implique em renúncia prévia do direito de revogação da doação, no entanto, a legislação silencia no que diz respeito à renúncia posterior ao direito de revogação.
Neste sentido são os comentários de Jones Figueiredo Alves99:
O direito de revogação é de ordem pública. Assim, a faculdade do exercício de direito de o doador revogar a doação por ingratidão é irrenunciável por antecipação. A renúncia prévia corresponderia conceder ao donatário carta de indenidade para ele vulnerar o dever ético-jurídico de corresponder, dignamente, à liberalidade do doador e, desse modo, não ser-lhe grato. A renúncia posterior coabita tacitamente, diante dos atos da ingratidão, se o doador não exercitar o direito no prazo prescricional, ou, de modo expresso, quando comunica ao donatário o perdão concedido. Nula será a cláusula dispondo, de antemão, a renúncia desse direito. (grifo nosso)
97 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p. 87.
98 XXXXXX, XXXXXXXXX, 2012, v. 4, p. 738.
99 XXXXX, Xxxxx Figueirêdo. Novo Código Civil Comentado. Coordenação: Xxxxxxx Xxxxx. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 500.
2.8.2.1 Por descumprimento do encargo
A inexecução ou a mora no cumprimento do encargo pelo donatário pode ensejar o pedido de revogação da doação pelo doador, conforme disposto no artigo 562 do Código Civil.
Ademais, verificado o atraso ou até mesmo o descumprimento do encargo estabelecido na doação modal, poderá o doador requerer, judicialmente, a execução específica do encargo, a fim de obter o cumprimento integral da obrigação imposta ao donatário.
Cumpre observar que a execução específica pode ser pleiteada pelo doador, pelo terceiro beneficiado com a estipulação do encargo, ou até mesmo o Ministério Público, se envolvido direito de interesse público. Já a revogação da doação só pode ser pleiteada pelo doador, sendo a ação personalíssima100.
Para o ajuizamento de qualquer uma das medidas judiciais mencionadas, é necessário prova inconteste que o donatário está em mora no tocante ao cumprimento do encargo.
Caso o contrato de doação não estipule o prazo para o cumprimento do encargo, para constituição em mora do donatário, o doador deverá intentar uma notificação judicial, assinalando o prazo razoável para cumprimento da obrigação pelo donatário101.
Neste sentido, os comentários de Paulo Geraldo de Oliveira Medina102:
No Direito brasileiro, a doação pode ser revogada em duas hipóteses: ingratidão do donatário ou inexecução do encargo, em consonância com o disposto no art. 555 da Lei Civil. [...] Quanto à revogação por inexecução de encargo, dispõe o art. 562 que, para tanto, mister se faz incorrer o donatário em mora, a qual se verifica quando excedido o prazo estipulado contratualmente, ou aquele razoável inserto em notificação judicial.
Se o encargo não foi cumprido pelo donatário por motivo de força maior, fica afastada a mora, uma vez que não é possível verificar a culpa do donatário na inexecução do encargo103.
100 GONÇALVES, 2006, v. 3, p. 277.
101 XXXXXXXXX, 2006, loc. cit.
102 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx. A doação. In: NETTO, Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx; XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx; XXXXXXX XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx (Xxxxx.). O Novo Código Civil: estudo em homenagem ao professor Xxxxxx Xxxxx. 2. ed. São Paulo: Ltr, 2006, p. 493.
A ação revocatória visa a quebra do vínculo contratual, de forma que, julgada procedente, o bem objeto do contrato de doação deve ser restituído ao doador.
2.8 2.2 Por ingratidão do donatário
O artigo 557 do Código Civil também admite a revogação da doação nos casos de ingratidão do donatário.
Por ingratidão entende-se a conduta do donatário contrária, prejudicial ou até mesmo afrontosa ao doador. Nas palavras de Paulo de Tarso Vieira Sanseveriano104: "a noção popular de ingratidão é a do indivíduo mal agradecido, que não reconhece os benefícios que recebeu de outrem".
As hipóteses de ingratidão que ensejam a revogação da doação estão previstas no artigo 557 do Código Civil:
Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:
I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele;
II - se cometeu contra ele ofensa física;
III - se o injuriou gravemente ou o caluniou;
IV - se, podendo, ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que necessitava.
A ingratidão verificada contra o cônjuge, ascendentes, descendentes, ou contra o irmão do doador também pode fundamentar o propositura de ação revocatória, conforme disposto no artigo 558 do Código Civil.
Em atendimento ao disposto no artigo 563 do Código Civil, a revogação por ingratidão do doador não pode prejudicar os direitos adquiridos por terceiros, nem mesmo obrigar o donatário a restituir eventuais frutos percebidos antes da citação válida, no entanto, os frutos percebidos após a citação deverão ser restituídos ao doador pelo donatário.
Referido artigo preceitua, ainda, que, caso não seja possível a restituição da coisa doada, o donatário deverá indenizar o doador.
Cumpre ressaltar que as doações i) puramente remuneratórias, ii) oneradas com encargo já cumprido, iii) realizadas em cumprimento de obrigação natural e iv)
103 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 277
104 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p.60-61
feitas para determinado casamento, não são passíveis de revogação por ingratidão, de acordo com o disposto no artigo 564 do Código Civil.
Assim como na revogação por inexecução do encargo, nas hipóteses de ingratidão é necessário ajuizamento de ação revocatória.
Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves105:
A revogação, por qualquer desses motivos, deve ser postulada “dentro de um ano, a contar de quando chegue ao conhecimento do doador o fato que a a autorizar, e de ter sido o donatário o seu autor” (CC, art. 559). Os dois requisitos para o início da contagem do prazo são cumulativos. Trata-se de ação personalíssima, pois o direito de pleitear a revogação “não se transmite aos herdeiros do doador, nem prejudica os do donatário. Mas aqueles podem prosseguir na ação iniciada pelo doador, continuando-a contra os herdeiros do donatário, se este falecer depois de ajuizada a lide” (art. 560). (grifo do autor)
105 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 281.
3 CONTRATO PRELIMINAR
3.1 Conceito e características do contrato preliminar
A complexidade das relações que permeiam a sociedade atual torna imprescindível a utilização de mecanismos que tenham por finalidade garantir maior segurança no cumprimento das obrigações e na aquisição de direitos.
Neste diapasão, o contrato revela-se instrumento imprescindível para a convivência harmoniosa em sociedade.
A necessidade de imprimir segurança aos negócios jurídicos praticados, bem como garantir a sua execução estende-se, inclusive, aos atos praticados antes mesmo da concretização do negócio jurídico.
As partes podem não achar oportuno, ou talvez não seja possível contratar de forma definitiva, plena e acabada, seja porque precisem realizar maiores estudos, aguardar situação econômica mais favorável, ou remover algum obstáculo que impeça a contratação naquele momento. Entretanto, a fim de não perder o que fora definido durante as negociações, mostra-se conveniente a realização de uma contratação preliminar, antevendo um futuro contrato106.
Neste cenário, surge o denominado contrato preliminar, também chamado de promessa de contrato, precontrato, contrato preparatório ou compromisso.
O contrato preliminar é o instrumento pelo qual as partes assumem a obrigação de contratar definitivamente.
Vale trazer à baila as palavras de Xxxxxx xx Xxxxx Xxxxxx sobre o contrato preliminar:
Convenções que objetivam a realização de um contrato, gerando deveres e obrigações a uma ou a ambas as partes. Nessas avenças, podem as partes determinar com maior ou menor amplitude as cláusulas que vão constar do contrato definitivo. Terminologicamente, dizemos que, com o contrato preliminar, as partes buscam a conclusão de um contrato principal ou definitivo.
106 XXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxx. Direito Civil: parte geral. 4. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2004, p. 418, v.1.
No mesmo sentido são os ensinamentos de Enzo Roppo107:
Há pouco fez-se referência à hipótese de formação sucessiva do contrato, que ocorre quando – sendo as negociações particularmente longas e complexas – as partes fixam, no decurso das mesmas, os acordos parciais já alcançados, redigindo uma minuta, ou esboço, de contrato, reservando-se prosseguir as negociações para a definição dos outros pontos – porventura só acessórios – deixados em suspenso e assim chegar à estipulação definitiva do contrato. (...) A peculiaridade de tal instrumento jurídico é justamente esta: as partes já definiram os termos essenciais da operação econômica que tencionam realizar (suponhamos, a venda de um imóvel por um certo preço) mas não querem passar de imediato a actuá-la juridicamente, não querem concluir, desde já, o contrato produtor dos efeitos jurídico-economicos próprios da operação; preferem remeter a produção de tais efeitos para um momento subsequente, mas, ao mesmo tempo, desejam a certeza de que estes efeitos se produzirão no tempo oportuno [...]
De tais lições é possível extrair que o contrato preliminar é um contrato e como tal deve preencher os requisitos de validade dos contratos em geral, previstos no artigo 104 do Código Civil, quais sejam: agente capaz e objeto lícito, possível, determinado ou determinável.
Neste sentido, dispõe o artigo 462 do Código Civil que “o contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado”.
Observe-se que, quando celebrado o contrato preliminar, as partes devem definir os termos essenciais do contrato definitivo, no entanto, por vontade destas, os efeitos do contrato definitivo serão postergados.
O contrato preliminar é uma forma de garantir que o contrato definitivo será devidamente assinado, uma vez que concluído o precontrato, as partes passam a ter um vínculo obrigacional, que pode, inclusive, ser exigido judicialmente.
De acordo com o artigo 463 do Código Civil, concluído o contrato preliminar, desde que não haja cláusula de arrependimento, qualquer uma das partes pode exigir a celebração do contrato definitivo, assinando prazo à outra parte.
Assim, se uma das partes contratantes se recusar a celebrar o contrato definitivo, a parte prejudicada pode ajuizar ação a fim de exigir o cumprimento da promessa de contrato e requerer, inclusive, a supressão judicial da vontade do contratante inerte.
107 XXXXX, Xxxx. O Contrato. Coimbra: Almendium, 2009, p. 102-103.
Conforme preceitua o artigo 464 do Código Civil, “poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação”.
Na hipótese da supressão judicial da vontade ser contrária à natureza da obrigação, como nos casos de obrigação personalíssima, poderá o credor se valer de indenização por perdas e danos (CC, art. 465).108
A exigibilidade do contrato preliminar apoia-se fundamentalmente nos princípios norteadores do ordenamento jurídico atual, quais sejam, a boa-fé objetiva e a função social do contrato.
A boa-fé objetiva e a função social do contrato surgiram de forma expressa no ordenamento jurídico com o advento do Código Civil de 2002, promulgado com a proposta de conferir maior efetividade aos princípios sociais previstos na Constituição Federal e garantir a aplicação de um Direito menos individualista.
Na lição de Xxxxxx Xxxxx, “O novo Código Civil demanda que a lei seja compreendida em permanente vinculação com valores éticos e sociais”.109
Tal mudança ocorreu em virtude da necessidade de alterar o modelo liberal, cujo foco era prestigiar a liberdade individual, a prevalência da autonomia da vontade e a imutabilidade dos contratos (pacta sunt servanda), para um modelo social, preocupado com as consequências que as relações jurídicas realizadas entre pares têm na sociedade como um todo110.
Sob o modelo econômico liberal, são as palavras de Rodrigo Garcia da Fonseca111:
Na concepção liberal, não deve o Estado intervir na relação interna entre os contratantes. As pessoas são livres para contratar, e se resolverem contratar, o pacto deve ser respeitado. Cada um sabe o que é melhor para si, e se todos são iguais, não caberia ao Estado tutelar as relações entre os particulares a ponte de influir naquilo que resolveram pactuar. O papel do Estado se limita a verificar se a vontade foi livremente manifestada, e a partir daí, a garantir que as partes cumpram o que foi combinado, seja qual for o conteúdo da contratação.
108 VENOSA, 2006, v. 2, p. 422.
109 XXXXX, Xxxxxx. Estudos Preliminares do Código Civil. 1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 36.
110 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx da. A Função Social do Contrato e o Alcance do Artigo 421 do Código Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 37.
111 FONSECA, 2007, p. 99.
A autonomia da vontade e o pacta sunt servanda não deixaram de ser aplicados, no entanto, encontraram nos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato um limite. Isso porque o Estado Social busca não apenas a preservação da liberdade individual, mas também o bem estar social e a igualdade112.
Nas palavras de Eros Roberto Grau113:
A teoria clássica do laissez faire se reduziria a algo na linha de “se todos fizermos exatamente aquilo que nos agrada, tudo certamente se resolverá pelo melhor”. A frase pode parecer simplória, ou mesmo irônica, mas no fundo bem reflete o pensamento econômico oitocentista predominante, de um capitalismo liberal radical.
A Constituição Federal de 1988 tem outra feição muito distinta. Ainda acredita nos benefícios da livre inciativa e da propriedade privada, mas duvida que sem a intervenção estatal, direta ou indireta, e mediante normatização, a regulação e a fiscalização, o mercado possa sozinho gerar e distribuir riqueza a contendo.
Dentro da atual perspectiva socioeconômica, os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato possuem importante papel.
O princípio da função social do contrato está previsto no artigo 421 do Código Civil, que dispõe “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”
Sua finalidade é limitar a liberdade de contratar, posto que o contrato não pode ser celebrado visando tão somente a vontade individual dos contratantes, mas deve preocupar-se com os efeitos que serão irradiados na sociedade, ou seja, o contrato não pode ser realizado em detrimento da coletividade.
Nas palavras de Miguel Reale114:
Como se vê, a atribuição de função social ao contrato não vem impedir que as pessoas naturais ou jurídicas livremente o concluam, tendo em vista a realização dos mais diversos valores. O que se exige é apenas que o acordo de vontades não se verifique em detrimento da coletividade, mas represente um dos seus meios primordiais de afirmação e desenvolvimento.
112 FONSECA, 2007, P. 37
113 GRAU, Xxxx Xxxxxxx. Um novo paradigma dos contratos? Revista Trimestral de Direito Civil. Rio de Janeiro, vol. 5, a. 2, jan/mar. 2001. p. 77
114 XXXXX, Xxxxxx. Função Social do Contrato. Disponível em
<xxxx://xxx.xxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxxxxxx.xxx>. Acesso em: 03 nov. 2013.
O princípio da boa-fé objetiva, por sua vez, é contemplado pelo artigo 422 do Código Civil que prevê: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Os conceitos de boa-fé e probidade não estão expressos no Código Civil, de forma que o artigo supracitado é considerado cláusula aberta que permite ao juiz, quando da aplicação do direito, interpretar o contrato e analisar qual era a vontade das partes no momento da sua celebração115.
A boa-fé tem como expoente o Direito Civil alemão, cuja previsão legal também se dá no modelo das cláusulas abertas.
O princípio da boa-fé – Treu um Glauben – como regente das relações obrigacionais no direito alemão, consagrado no § 242 do BGB, é um dos exemplos típicos de cláusula geral, e permitiu aos juízes que fizessem uma evolução construtiva do direito contratual alemão ao longo do tempo, se afastando paulatinamente dos excessos individualistas do século XIX.116
Embora seja livre a interpretação de boa-fé e probidade, a doutrina encarregou-se de conceituar tais vocábulo à luz do ordenamento jurídico, razão pela qual entende-se por probidade e boa-fé a conduta reta, honesta, leal do contratante, que deve levar em consideração não somente seus anseios individuais, mas também a expectativa gerada por sua conduta na parte que contrata consigo117.
Nas palavras de Judith Martins-Costa118:
(...) modelo de conduta social, arquétipo ou stardad jurídico, segundo o qual cada pessoa deve ajustar a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria um homem reto: com honestidade, lealdade, probidade (...) ao conceito de boa-fé objetiva estão subjacentes as idéias e ideais que animaram a boa-fé germânica: a boa-fé como regra de conduta fundada na honestidade, na retidão, na lealdade e, principalmente, na consideração para com os interesses do “alter”, visto como um membro do conjunto social que é juridicamente tutelado. Aí se insere a consideração para com as
115 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx. Os princípios da boa-fé objetiva, função social e equivalência das prestações no novo Código Civil. Disponível em: < xxxx://xxx.xxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxx.xxx>. Acesso em 5 out. 2013.
116 XXXX, Xxxxxx. Droit Privé Allemand. Actes Juridiques, Droits Subjectifs. Paris: Litec, 1992, p. 35-36.
117 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx de. Notas sobre a promessa de doação. Revista Trimestral de Direito Civil. Rio de Janeiro, v. 24, p. 17.
118 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. Crise e modificação da idéia de contrato no direito brasileiro. Revista de Direito civil, imobiliário, agrário e empresarial. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 59, p. 411-412, jan./mar. 1992.
expectativas legitimamente geradas pela própria conduta, nos demais membros da comunidade, especialmente no outro polo da relação obrigacional.
Assim, considerando os princípios supracitados, expressamente previstos no Código Civil, a exigibilidade do contrato preliminar ganha força, sobretudo sob o aspecto da boa-fé objetiva.
Isso porque não pode a parte, desistir de celebrar o contrato definitivo sob o fundamento de que esta não é mais a sua vontade. Não se pode simplesmente ignorar os efeitos que a promessa de contrato gerou não só na parte adversa, mas na sociedade como um todo119.
Uma vez que o contrato preliminar foi celebrado a partir da manifestação livre e consciente da vontade entre as partes contratantes, a celebração do contrato definitivo é uma consequência necessária. É o que se espera em uma relação entre pessoas de boa-fé, que agem com lealdade e honestidade.
Diante do exposto, verifica-se que o cumprimento da obrigação assumida contratualmente não é uma consequência meramente negocial, mas uma necessidade ética, moral.
Cabe trazer à baila os ensinamentos de Maria Celina Bodin de Moraes120:
[...] Há hoje forte imposição ética que domina toda a matéria contratual, vedando-se o emprego da falsidade e da deslealdade, impondo-se a observância da boa-fé e da probidade, tanto na interpretação e execução do negócio, como, evidentemente, na própria celebração do negócio jurídico.
119 XXXXXX, 2005, p. 17
120 XXXXXX, 2005, loc. cit.
4 EXIGIBILIDADE DO CONTRATO PRELIMINAR DE DOAÇÃO
Feitas as considerações acima sobre as particularidades do contrato de doação e do contrato preliminar, bem como sobre a aplicação dos princípios da boa- fé e da função social do contrato, passaremos a abordar a exigibilidade do contrato preliminar de doação.
A aceitação e exigibilidade de eventual contrato preliminar de doação causam arrepios a certa ala da doutrina e da jurisprudência nacional, ao argumento de que esta espécie de contrato tem como principal requisito a espontaneidade da liberalidade ou manifestação de vontade por parte do doador constante do já citado artigo 538 do Código Civil.
O contrato de doação tem como uma de suas características principais o animus donandi, que, conforme já explanado, é a vontade livre, a liberalidade praticada pelo doador, que dispõe de parte de seu patrimônio em benefício do donatário, sem exigir contraprestação para tanto.
Arraigado a este dogma, grande parte dos doutrinadores entendem não ser possível exigir o cumprimento de contrato preliminar de doação, uma vez que estar- se-ia obrigando o doador a realizar determinada doação que, em verdade, deveria ocorrer por mera liberalidade, por livre vontade121.
Para esta corrente, é imprescindível que no momento da doação definitiva haja a presença do animus donandi. A manifestação de vontade do doador deve ser atual, caso contrário, faltaria requisito essencial para a existência da doação.
Neste sentido são os ensinamentos de Paulo de Tarso Sanseveriano122:
[...] há necessidade de o animus donandi estar também presente no momento da celebração do contrato definitivo. Se houver arrependimento posterior não haverá doação. Não há igualmente possibilidade de execução do pacto na hipótese de descumprimento por ser incompatível com a noção de liberalidade inerente às doações.
Filiam-se a esta corrente Serpa Lopes123, Silvio Rodrigues124, Caio Mário da Silva Pereira125 e Agostinho Alvim126.
121 XXXXXXXXX, 2006, v. 3, p. 261.
122 SANSEVERIANO, 2005, v. 2, p.77.
123 XXXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxx xx, Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p. 187. v 3.. São os ensinamentos do autor: “Na verdade (o que ocorreria), se alguém
Agostinho Alvim127 reforça sua posição neste sentido da necessidade da manifestação de vontade atual por parte do doador:
Mas nós pensamos que é dogma fundamental, em matéria de doação, a persistência do animus donandi. Assim sendo, o arrependimento, ou revogação do ato é sempre possível, antes que consumada a doação pela aceitação do donatário. O Código Civil da China vai além, e permite a revogação enquanto a coisa toda não tenha sido entregue (art. 408). O arrependimento, aliás, não contraria o disposto no art. 1080 do Código Civil [art. 427 do Código Civil vigente], que, muito sabiamente, excluiu da regra, ali consignada, certas hipóteses, entre as quais a que se entende com a natureza do negócio. E a natureza do negócio da doação é incompatível com o seu aperfeiçoamento, sem o animus donandi atual.
Nota-se aqui que o princípio da autonomia da vontade do doador é elevado a posição de pressuposto para concretização do negócio, sendo que sua manifestação se dá no momento da contratação definitiva.
Tal posicionamento também é adotado por doutrinadores estrangeiros, tal como o espanhol Xxxx Xxxx-Xxxxxx, que diz sobre o assunto:
Devido à especial estrutura e a causa liberal da gratuidade [...] a promessa unilateral do doador não acarreta para este último nenhuma obrigação, nem mesmo seu cumprimento pode ser exigido e a promessa bilateral, aceita pelo donatário, ou é em si mesma uma doação perfeita ou somente poderá gerar no futuro uma obrigação de efetuar a doação [...] a simples promessa, como negócio de criação de uma obrigação de se efetuar uma doação no futuro [...] não é admissível. (tradução nossa)128
No mesmo sentido é o posicionamento de Xxxxxx Xxxxx:
se comprometesse a doar, a outorgar uma escritura de doação, e no momento da exigibilidade dessa prestação, não a quisesse realizar? Qual a consequência jurídica dessa inadimplência? Poder-se-ia pedir a execução coativa dessa obrigação a título gratuito ou uma indenização por perdas e danos? Entendemos impossível qualquer das duas soluções, já que nos atos a título gratuito, só por xxxx responde aquele a quem o contrato não favoreça”.
124 RODRIGUES, 2002, p. 210.
125 PEREIRA, 2004.
126 ALVIM, 1980, p. 43.
127 ALVIM, 1980, p. 43.
128 “Dada la especial estrutura y la causa liberal de gratuidade [...] la promesa unilateral del donante non engendra para éste ninguma obligación, ni su cumplimento le puede ser exigido [y] la promesa bilateral, aceptada por el donatário, o es ya em sí misma uma donación perfecta, o tampoco puede determinar em el futuro la obligación de realizar uma donación [...] la simple promesa, como negocio de creación de uma obligación de realizar uma donación en el futuro [...] no es admisible.” XXXX-XXXXXX, Xxxx. Fundamentos del derecho civil patrimonial: introdución, teoria del contrato. Madrid: Civitas, v. 1, 1996, p. 337- 338.
O contrato preliminar de doação era considerado inadmissível sob o império do código revogado, já que ele vinha a tolher o caráter de liberdade espontânea da doação, que fazia referência expressa ao artigo 1050 C.C. Atualmente, boa parte da doutrina também sustenta que um contato preliminar de doação constituirá um atentado à espontaneidade à liberdade da doação, visto que a vontade do doador seria forçada ainda que não fosse efetivamente a vontade presente. (tradução nossa)129
A jurisprudência brasileira, em seu entendimento, também adota o posicionamento no sentido de que não é possível exigir o cumprimento de contrato preliminar de doação.
EMENTA: CONSTITUCIONAL. NOTA PROMISSORIA. PROMESSA DE DOAÇÃO. ATO JURÍDICO PERFEITO. DIREITO ADQUIRIDO. I.
- O acórdão não contrariou a norma constitucional do direito adquirido ou do ato jurídico perfeito, dado que, com base nos fatos e na legislação infraconstitucional, decidiu que a nota promissória objeto da demanda não e cambiariamente ou executivamente exigível, porque representava uma promessa de doação, e promessa de doação não se executa, não se exige coercitivamente. II. - R.E. não conhecido130. (grifo nosso)
Promessa de doação. Ato de liberalidade. Inexigibilidade [...] 2. Inviável juridicamente a promessa de doação ante a impossibilidade de se harmonizar a exigibilidade contratual e a espontaneidade, característica do animus donandi. Admitir a promessa de doação equivale a concluir pela possibilidade de uma doação coativa, incompatível, por definição, com um ato de liberalidade. 3. Há se ressaltar que, embora alegue a autora ter o pacto origem em concessões recíprocas envolvendo o patrimônio familiar, nada a respeito foi provado nos autos. Deste modo, o negócio jurídico deve ser tomado como comprometimento à efetivação de futura doação pura. 4. Considerando que a presente demanda deriva de promessa de doação pura e que esta é inexigível judicialmente, revele-se
129 “Il contratto preliminare di donazione era considerato inammissible sotto l’impero del codice abrogato, giacché esso veniva a togliere il carattere di liberalità “spontanea” della donazione, cui faceva espresso riferimento l’art. 1050 C.C. Anche attualmente buona parte della dottrina sostiene che um contratto preliminare di donazione costituirebbe um attentato alla spontaneità e alla liberalità della donazzione, mentre la volontá del donante verrebbe coatta prima che egli effettivamente doni.” XXXXX, Xxxxxx. Il Contratto Preliminare nella Dottrina e nella Giurisprudenza. Roma: Giufrè, 1971, p.11-13.
130 BRASÍLIA, Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n. 122054/RS, 2ª. Turma. Relator: Min. Xxxxxx Xxxxxxx. Julgado em 15 de junho de 1993. Diário de Justiça 06 ago. 1993. Disponível em: xxxx://xxx.xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxXxxxxxxxxxxxxx.xxx?x0x%00XX%00%0XXXXX
%2E+E+122054%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+122054%2EACM
S%2E%29&base=baseAcordaos&url=xxxx://xxxxxxx.xxx/x0xxx0x. Acesso em 25 nov. 2013.
patente a carência do direito de ação, especificamente, em razão da impossibilidade jurídica do pedido.131
[...] A promessa de doação, como obrigação de cumprir liberalidade que não se quer ou não se pode mais praticar, não existe no direito brasileiro. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Hipótese em que, não obstante a promessa de doação fosse modal, a solução é a mesma, porque os encargos não foram cumpridos e se tornaram incompatíveis com a vontade do Estado de desapropriar o imóvel, manifestada em decreto que o declarou de utilidade pública para esse efeito.132
Desta forma, tomando-se por base os argumentos apresentados pelos defensores de tal corrente, possível seria concluir que o contrato preliminar de doação não possui natureza vinculativa entre as partes, haja vista que é resguardado ao doador, até o momento da efetiva concretização do negócio, o direito de arrependimento.
No entanto, existe corrente minoritária, encabeçada por Pontes de Miranda133, Washington de Barros Monteiro134 e Eduardo Espínola135, que prega a validade e a eficácia do contrato preliminar de doação.
Os defensores desta corrente pregam que a manifestação da vontade de doar, a liberalidade do doador, ocorre no momento da celebração do contrato preliminar, razão pela qual não falta ao contrato de doação o animus donandi, podendo o compromisso de doação ser exigível judicialmente, caso o doador não cumpra a obrigação assumida.
Nas palavras de Marcos Catalan136:
131 BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 730626/SP, 4ª Turma, Min. Xxxxx Xxxxxxxxxxx, X. 17.10.2006, DJU 04.12.2006. Disponível em:
<xxxxx://xx0.xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxx/xxxxxxx/xxxxXxxxxxxxx.xxx?xxxxxxxxxxxXXX&xxxxxxxxx l=663031&num_registro=200500342701&data=20061204>. Acesso em 03 novembro 2013.
132 BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 92.787/SP, 2ª. Turma, Relator: Min. Xxx Xxxxxxxxxx. Julgado em 24 de abril de 1997. Disponível em:
<xxxxx://xx0.xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxx/xxx/xxxxXxxxxxxxx.xxx?xxx_xxxxxxxxx000000000000&xx
_publicacao=26-05-1997&cod_tipo_documento=1>. Acesso em 25 nov. 2013.
133 PONTES DE MIRANDA, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de Direito Privado, tomo XLVI, 3 ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, p. 261.
134 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 5. p. 137.
135 ESPÍNOLA, 2002, p. 250.
136 XXXXXXX, Xxxxxx. Considerações sobre o contrato preliminar: em busca da superação de seus aspectos polêmicos. In: XXXXXXX, Xxxxx Xxxx; XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxxx (Org.). Questões controvertidas: no direito das obrigações e dos contratos. São Paulo: Método, v. 4, 2005, p. 4-5.
A última corrente teórica que se preocupou em estudar o assunto sustenta a validade e a eficácia da promessa de doação. Tendo como expoentes Xxxxxxx Xxxxxxxx, Pontes de Xxxxxxx e Xxxxxxxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxxx, sustenta que a espontaneidade deverá estar presente no momento do ajuste preliminar, qualquer que seja o tipo negocial. É nessa ocasião que as partes exercem o poder jurígeno contido na autonomia privada, e, nesse contexto, o contrato a ser pactuado no futuro é uma mera consequência da anterior manifestação volitiva.
Afirma Pontes de Miranda137 que, existindo a promessa de doação, e nela inserto o animus donandi necessário à conclusão do negócio, passa o donatário, eis que credor da manifestação volitiva, a ter o direito de buscar a concretização da doação, por meio de ação cominatória, afirmando, ainda, que o cabimento de indenização por não cumprimento se dará, exclusivamente, na hipótese de inadimplemento, haja vista a impossibilidade culposa do objeto que faria parte do contrato definitivo ou pelo fato do bem prometido pertencer a terceiro, eis que estariam ausentes quaisquer direitos em relação ao proprietário do bem prometido.
Tal tese torna-se cada vez mais atual, na medida em que alterações legais oriundas da doutrina alienígena, e mesmo o balanceamento com outros princípios e institutos de direito, consideram importante não só a manifestação do interesse em doar, mas também a expectativa que esta causa no donatário.
Como exemplo, merece citação o artigo 516 do Código Civil alemão (BGB) que, como bem observado por Maria Celina Bodin de Moraes138, excluiu da definição de doação “qualquer referência ao animus donandi e mesmo algum espírito de liberalidade, mencionando apenas o enriquecimento gratuito do donatário à custa do doador”. Nota-se assim que o animus donandi continua como um efeito natural e comum nas doações, mas deixa de ser a razão jurídica que justifica o contrato.
Defendendo tal ponto de vista, a mesma autora assim afirma:
Superada a teoria voluntarista do animus donandi, o conceito de liberalidade, constante do art. 538 do Código Civil, deve assumir o significado de finalidade, típica e constante, de conferir a outrem uma vantagem patrimonial sem qualquer correspectivo. A causa do contrato de doação, portanto, não é o “espírito de liberalidade” ou “animus donandi”, mas é a liberalidade entendida como livre atribuição de uma vantagem patrimonial sem contraprestação.139
137PONTES DE MIRANDA, 1972, p. 261.
138 XXXXXX, 2005, p. 8.
139 XXXXXX, 2005, p. 11.
No mesmo sentido manifesta-se Marcos Catalan140:
O que precisa ficar claro é que o voluntarismo que inspirou o direito privado morreu com o liberalismo, ou, no mínimo, agoniza nas letras de alguns autores que se recusam a admirar o mundo novo que exsurge diante de seus olhos, e deste modo, o papel da vontade perde força quando posto diante de outros valores, como a confiança depositada no cumprimento de um contrato que hoje deve ser visto como um mecanismo que visa a promoção de valores existenciais. Ademais, não se pode negar que o Código civil deve ser lido a partir das diretrizes fixadas no texto constitucional, dentre elas, a da solidariedade social, o que alterou profundamente o foco da atenção do principal diploma normativo de tutela dos interesses privados.
Resta clara, portanto, a perda de importância, ao longo do tempo, do animus donandi, sendo certo que as correntes que se fundamentam nele como argumento principal tornam-se insustentáveis, pesando ainda contra tais teses, que negam validade à promessa de doação o fato de que, quando exigida judicialmente, como afirma Xxxxx Xxxx Xxxxx Xxxx, “não há liberalidade por imposição do juiz, mas imposição do juiz ao cumprimento de obrigação contraída por motivo de liberalidade”.141
Tal posicionamento, ainda se coaduna com os princípios norteadores do ordenamento jurídico atual, que tem como escopo o Estado Social, que busca não apenas a preservação da liberdade individual, mas também o bem estar social e a igualdade. A vontade do indivíduo não se sobrepõe à vontade da coletividade, exaltando institutos como a confiança e o papel do contrato na promoção de valores existenciais.
Pautado no princípio da boa-fé objetiva, o contrato preliminar de doação é plenamente exigível, uma vez que não se pode ignorar a expectativa que tal contrato gerou no credor/donatário.
Ao frustrar as expectativas do beneficiário do contrato definitivo, o promitente doador estará agindo com deslealdade, adotando comportamento contraditório ao ato de liberalidade praticado quando da celebração do contrato preliminar de
140 XXXXXXX, Xxxxxx. Reflexões acerca da eficácia da promessa de doação no direito brasileiro. RKL Escritório de Advocacia Dr. Xxxxx Xxxxx Xxxxx, 2007. Disponível em: < xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxx/xxx_xxx_xxxxxxx00000000000000.xxx>. Acesso em: 02 nov. 2013.
141 XXXX, Xxxxx Xxxx Xxxxx. Da Compra e Venda; Da Troca ou Permuta; Do Contrato Estimatório; Da Doação (Arts. 481 a 564). In: XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx (Coord.) Comentários ao código civil: parte especial: das várias espécies de contratos. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 287. v. 6.
doação, o que vai de encontro com a probidade e a honestidade que se espera entre contratantes.
Nesse sentido são as palavras de Marcos Catalan142:
A valorização da confiança depositada no vínculo obrigacional e o respeito aos anseios do credor – desde que fidedignos -, enfim, têm força suficiente para provocar uma verdadeira virada de Copérnico no tratamento dogmático da temática explorada. Não se pode negar que a nova ordem social impõe às partes o respeito às legítimas expectativas depositadas na conduta do parceiro negocial, realidade legitimada por uma dimensão ética, “a exigir o cumprimento efetivo das promessas feitas, ainda que futuras.”
[...] Enfim, a frustração da expectativa do beneficiário, quando da recusa em concluir o contrato definitivo por parte de quem prometeu doar, merece ser protegida também em razão da vedação contida no sistema quanto à adoção de comportamentos contraditórios.
Ainda sobre o assunto, pertinentes são as observações feitas por Xxxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxx:
Em busca do equilíbrio contratual, a lei passa a favorecer determinados interesses sociais, valorizando a confiança depositada no vínculo, as expectativas e a boa-fé das partes contratantes. A teoria da confiança quer proteger prioritariamente as expectativas legítimas que nasceram no outro contratante, o qual confiou na postura, nas obrigações assumidas e no vínculo criado através da declaração. Protege-se, pois, a boa-fé e a confiança que o contratante depositou nas declaração. Assim, “a teoria da confiança atribui responsabilidade àquele que, por seu comportamento na sociedade, gera no outro contratante justificada expectativa no adimplemento de determinações obrigacionais”.
[...]
O respeito aos compromissos assumidos representa um objetivo do nosso ordenamento jurídico e não parece haver qualquer razão especial que justifique a possibilidade de se descumprir, sem qualquer sanção possível, uma promessa de doação feita a outrem. Seu cumprimento é essencial porque uma promessa não mantida é uma falsa promessa, e não uma promessa inexistente. O adimplemento, portanto, voluntário ou coativo, é uma consequência lógica e necessária da promessa, isto é, é sua premissa: de fato, posta a premissa que se prometeu algo, deduz-se que se deve manter o que se prometeu, seja voluntariamente, seja com o auxílio da força do ordenamento.143
Como argumento, agora puramente jurídico, vale menção também ao fato de que, como se constata da atenta leitura dos dispositivos reguladores dos contratos preliminares constantes do Código Civil, certamente não há nenhuma menção que
142 CATALAN, 2007.
143 XXXXXX, 2005, p. 17 e 19.
exclua a categoria da doação do rol daqueles aptos a serem celebrados de forma preliminar, sendo certo que o próprio artigo 462 alega que para sua celebração este deve, apenas, conter todos os requisitos essenciais do contrato definitivo.
CONCLUSÃO
Considerando-se as mudanças ocorridas com a transição do estado Liberal para o estado social, o surgimento de novos valores sociais aptos a balizar as relações privadas, a detalhada análise dos pormenores da promessa de doação e sua relação com os modernos princípios contratuais, agregados a evolução da teoria geral dos contratos, por certo pode-se declarar a viabilidade jurídica da exigibilidade do contrato preliminar de doação.
Tomando-se em conta a inerência da boa-fé objetiva e da função social dos contratos ao princípio clássico da autonomia privada, cristalino o fato de que o contrato preliminar de doação é válido e legítimo, sendo sua exigibilidade consequência lógica decorrente da vontade expressada pelo doador quando da celebração do pacto preliminar.
Tendo em vista que a causa da promessa é sua consumação, com a efetiva transferência do bem doado ao patrimônio do donatário, a título gratuito, a sua exigibilidade nada mais é do que uma consequência do reconhecimento da validade da promessa, e sua exigibilidade é inerente ao cumprimento efetivo de sua função social e intenção inicial.
Não se discute aqui a liberdade cabível ao doador de realizar atos espontâneos em benefício de terceiro sacrificando seu próprio patrimônio, mas sim o fato de que, uma vez manifestado tal desejo por meio de contrato preliminar, passa este a produzir efeitos jurídicos entre as partes, vinculando-as, sendo certo que a vontade de doar, já foi devidamente expressa e manifestada na promessa de doação, manifestação esta na qual o donatário confiou, sendo certo o surgimento de expectativa de direito por parte deste.
Nota-se assim que se apresenta ao contrato de doação outra característica essencial, que, no caso, é a capacidade de dispor da coisa doada, sem a qual se torna ineficaz a doação realizada ou mesmo a promessa desta.
Assim, para a eficácia do contrato de doação, ou mesmo para sua promessa, basta a existência de capacidade no momento em que a declaração de vontade do doador for expressa.
Há desta forma, a manifestação de dois direitos fundamentais em tal situação, igualmente tutelados e de mesmo nível: a autonomia do doador quanto à
concretização da promessa e a confiança do donatário em tal relação jurídica, decorrente da boa-fé objetiva contratual.
Dentre outras motivações aptas a justificar a exigibilidade da promessa de doação, não traz o Código Civil, quando aborda os contratos preliminares (artigos 462 a 466), qualquer restrição à sua aplicabilidade ao contrato preliminar de doação, sendo certo que tal instituto não mais se restringe apenas à promessa de compra e venda. Desta forma, qualquer contrato definitivo, independente de sua natureza ou origem, pode ser objeto de celebração de contrato preliminar, incluído-se neste rol o contrato de doação.
Dentre tais artigos, merece destaque o artigo 463 do Código Civil, que permite à parte a exigibilidade do contrato preliminar, por meio da denominada “tutela específica”, quando o juiz, ao ser chamado a resolver o litígio irá conferir caráter definitivo ao contrato preliminar, disposição que consta do artigo 464 do Código Civil.
Ainda que clara a letra da lei, insiste o Superior Tribunal de Justiça, em nossa visão, erroneamente, em negar a exigibilidade do contrato preliminar de doação, com fulcro no fato de o doador não poder ser constrangido a realizar liberalidades.
Novamente, certo é que a manifestação de vontade por parte do doador já foi realizada quando da celebração do contrato preliminar, ali se encontra expressa, sendo certo que a autonomia individual do doador foi preservada, mas é tutelada até o momento em que este decide celebrar o contrato definitivo, que uma vez efetivado, se submeterá às regras civis que versam sobre a exigibilidade como qualquer outro contrato preliminar.
Outro ponto é o fato de que a promessa de doação, assim como os demais contratos preliminares, é irretratável e irrevogável, não podendo o doador, em tese, se negar ao cumprimento da promessa por argumento de arrependimento, salvo se existir cláusula expressa neste sentido e inserida pelas partes de comum acordo (e, neste caso, tal cláusula impedirá que se origine o nascimento da relação de confiança). O artigo 463 é claro ao afirmar que as condições para a exigibilidade de qualquer contrato preliminar exige apenas o preenchimento dos requisitos gerais de qualquer contrato.
Por conseguinte, acerca da hipótese de existência de fato futuro que impeça a concretização da doação e sobre a suposta insegurança jurídica causada por esse fato, apresentamos solução baseada no direito alemão, em que o doador poderá simplesmente se recusar a cumprir a promessa de doação se estiver impossibilitado
de cumpri-la sem por em risco seu sustento e o daqueles que dependem do devedor.
Por fim, outro motivo que se apresenta a fundamentar a possibilidade da plena exigibilidade da promessa de doação é o dever da tutela da confiança depositada pelo donatário na pessoa do doador. Como já dito, na transição do Estado Social para o Estado Liberal, perdeu a autonomia do doador força perante os demais princípios contratuais, devendo-se velar, nas atuais relações, pela ética contratual e pela boa-fé objetiva, que passam a figurar como principal ponto balizador das relações privadas. E é daí que nascem outros direitos fundamentais inerentes às relações privadas, como a confiança contratual, ou a legitimidade para defender a expectativa de direito gerada no donatário.
A confiança figura como direito fundamental inerente às relações jurídicas na sociedade, fundada no respeito ao ser humano, decorrendo de preceitos éticos relacionados ao princípio da boa-fé, cuja existência está intimamente ligada à confiança que as pessoas depositam nas declarações de vontade, independente de sua natureza, sendo valor fundamental e base das relações jurídicas em geral, em especial das relações privadas.
Certo é que aquele que exterioriza sua vontade resta por materializar seu desejo acerca de determinada declaração, destinada a outrem, que por sua vez terá sua conduta alterada com base na manifestação exteriorizada, confiando corresponder ao desejo deste.
Não há, sequer que se indagar se o ato é benéfico, ou gratuito, ou seja, se trará vantagens àquele que manifestou sua vontade, importando, apenas e tão somente, que aquele que se manifestou é responsável pelos efeitos jurídicos decorrentes de sua manifestação. Desta forma, sendo certo que ninguém pode, em uma sociedade livre, ser compelido a manifestar-se em contrato preliminar, válido e juridicamente perfeito, não pode, ao mesmo tempo, recusar-se a cumprir o que restou acordado, não cabendo o argumento ultrapassado da autonomia privada perante a necessária tutela dos interesses e da confiança depositada na relação.
Certo é, assim, que a promessa de doação nada mais é do que um contrato preliminar que decorre do acordo de vontades manifestado livremente por um de seus sujeitos, mediante aceitação do outro. No momento da celebração da promessa, se encontra presente o animus donandi, surgindo a autonomia privada
neste momento, quando da exteriorização da vontade, cujo objeto é o compromisso de celebrar, futuramente, contrato de doação.
Desta forma, encontra-se a autonomia do doador protegida até o momento de sua exteriorização, sendo certo que não pode o doador ser obrigado a manifestá-la. Porém, uma vez externada, por meio da promessa, deve ser compelido a cumprir a liberalidade a que se obrigou, eis que a promessa gerará efeitos jurídicos próprios, inclusive o direito do donatário de exigir a execução do contrato preliminar e consequente adimplemento do contratado, cuja recusa ou arrependimento, fundamentado em violação à autonomia privada, não se justifica.
Denota-se, assim, uma inversão de valores, eis que declarar inexigível o contrato preliminar é dar carta branca ao doador para que aja de forma arbitrária, autoritária, com plena liberdade e, porque não, desonestidade, institutos estes incompatíveis com os valores constitucionais propagados e que norteiam as relações privadas e, principalmente, com a boa-fé objetiva. A espontaneidade, assim, encontra-se presente quando da celebração da promessa, sendo o contrato definitivo mera consequência lógica do ajuste preliminar firmado.
Nota-se, por todo o exposto, que não se pode basear a análise apenas no bel prazer do doador, excluindo os planos eventualmente construídos pelo donatário baseados na expectativa de direito oriunda da promessa, deve-se, sempre, considerar a confiança depositada por este na exteriorização de vontade do doador, impedindo assim, e por todos os motivos supraexpostos, a declaração de inexigibilidade do contrato preliminar.
Em suma, ainda que em clara divergência com o sistema atualmente aplicado nos pretórios nacionais, entendemos restar patente a necessidade de repensar-se a atual posição majoritária sobre o tema, de modo a, partindo de tal reflexão, reformar o entendimento para que seja declarada a validade e a exigibilidade da promessa de doação como contrato preliminar, seja pela vinculação existente entre as partes quando da celebração do precontrato, ou pela mudança de valores e princípios aplicáveis à teoria geral dos contratos, pela ausência de exceção à doação no rol dos contratos preliminares, ou simplesmente por se mostrar a teoria mais justa à ambas as partes envolvidas no negócio.
Concluímos, portanto, ainda que em sentido contrário ao da atual doutrina e jurisprudência vigentes em nosso Direito, que o contrato preliminar de doação possui
plena validade e exigibilidade, sendo as decisões proferidas em contrário certamente derivadas de entendimentos antiquados e ultrapassados.
Não nos parece justo pensar que pode um doador comprometer-se a efetivar a doação do bem, e, a seu bel prazer, desistir de tal transação futuramente, frustrando as expectativas daquele que receberia o bem doado, com o qual contava e certamente fazia planos acerca de seu uso.
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