TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Xxx Xxxxx, Xx 000 - Xxxxxx Xxxxxx - XXX 00000-000 - Xxxx Xxxxxxxxx - XX - xxx.xxxx.xxx.xx Andar: SS Sala: 04
DECISÃO Nº 9717
Autos nº 0057840-67.2019.8.13.0000
EMENTA: CONSULTA. OFÍCIO DE REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS. CONTRATO DE PARCERIA AGRÍCOLA. AUSÊNCIA DE VALOR DECLARADO. POSSIBILIDADE. LEI ESTADUAL 15.424/2004, NOTA II DA TABELA 5 E ART. 10, §4º, INCISO VI. PROVIMENTO CONJUNTO Nº 93/2020, ART. 135. ORIENTAÇÃO.
Vistos etc.
Trata-se de e-mail encaminhado pela Oficial Interina Xxxxxx Xxxxxx, do Ofício de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Monte Belo/MG, narrando que "com o exercício das funções, foi possível observar algumas práticas e costumes locais extremamente enraizadas no município e que eram (e ainda são), em sua grande parte, consideradas ilícitas ou, até mesmo ilegais".
Aponta que "a serventia de RTDCPJ era a responsável por elaborar os contratos que ali eram registrados, com destaque particular aos contratos de parceria agrícola. Ao que parece, a situação teria começado devido à ausência de profissional capacitado para a redação de tais negócios jurídicos à época de instalação da própria serventia. E perpetuou-se mesmo com a chegada de advogados e demais profissionais à cidade. Como recebiam pelo serviço advocatício prestado, com o tempo e com as modificações da legislação estadual sobre a cobrança dos emolumentos, moldaram as redações dos contratos de parceria agrícola para que todos fossem registrados como contrato "sem valor", com o objetivo de incidir na nota II da Tabela do Tribunal de Justiça, valor muito aquém ao devido".
Afirma que "os serviços advocatícios realizados não se limitavam à elaboração de contratos e a cobrança em valores à menor que o previsto na Tabela da Corregedoria do Tribunal de Justiça culminaram em em prestígio social da família responsável pela serventia, que por muitos anos acumulou também o Tabelionato de Notas. Frases como "o antigo dono do cartório fazia meu contrato e ainda me dava desconto", "a família era muito boa, as vezes cobrava só para fazer o contrato" são comuns no dia a dia. A questão chegou até mesmo a ganhar um viés político, pois as relações de amizade entre os responsáveis pela serventia e a bacharel em Direito responsável pela orientação dos Sindicato dos Trabalhadores Rurais da cidade, levaram à adesão do "contrato de parceria agrícola sem valor declarado", o modelo de contrato adotado no município e, somado à outros fatores, à eleição como vice prefeita da referida bacharel".
Esclarece que, após "consulta ao Doutor Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito Diretor
do Foro, que além de ter que dizer em sua decisão a respeito do local onde os contratos de fato deveriam ser registrados, também se manifestou a respeito de como seria a cobrança. Nos termos da decisão, as partes deveriam indicar os valores dos contratos ou a serventia poderia indicar preço aproximado. De agosto de 2018 à presente data, a serventia passou a não mais aceitar "contrato de parceria agrícola sem valor declarado" como um contrato sem valor. E, na ausência de indicação dos valores pelas partes, passou a imputar valores aproximados aos contratos. Passou-se a calcular a possível a produção dos pés de cafés e a usar este valor como o valor do contrato. Para se chegar no cálculo ideal que poderia ser servido como base para se verificar a possível produção dos pés de cafés foram mais estudos, pois deveriam ser consideradas algumas variantes como a cultura bienal. Segundo informações da própria EMATER- MG, no município de Monte Belo 1 hectare tem cerca de 3 mil pés de cafés, e produz cerca de 27 - 40 sacas, a cada dois anos. Partindo dessas informações, a Serventia passou a realizar cálculos com base no pior cenário possível, ou seja, promovendo Regras de 3 considerando como ponto de partida que a cada 3 mil pés de cafés produzia 27 sacas a cada 2 anos. O valor obtido em sacas é convertido em dinheiro nos termos da cotação do site Agrolink. Como na decisão da consulta (em anexo), o Juiz Diretor do Foro não manifestou o modo como deveríamos proceder a conversão, realizamos agora uma consulta à Corregedoria Geral de Justiça com o objetivo de formalizar oficialmente o sistema adota pela serventia, diante de todo o cenário apresentado" (evento nº 2968725).
Diante da gravidade dos fatos narrados no presente expediente (evento nº 2968725), a Direção do Foro de Monte Belo/MG foi intimada para manifestação. A Diretora do Foro de Monte Belo/MG, MMª Juíza de Direito Xxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxx informou que "entrou em exercício na Comarca de Monte Belo em 09/12/2019, pelo que não tinha conhecimento da presente consulta administrativa realizada, bem como não tem conhecimento da forma como a cobrança dos emolumentos está sendo realizada". Xxxxxxxxxx, ainda, cópia de decisão em consulta administrativa realizada pela mesma Oficiala ao Juiz Diretor do Foro, na qual se lê:
"(...)
O que se conclui é que o Cartório de Registro de Imóveis não possui competência, frente a ausências de fundamento legal, para proceder ao registro de contratos desta espécie, que, conforme se extrai da lei 6.015/73, deverá ser feito no Registro de Títulos e Documentos, onde se lhe conferirá a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia do ato. A averbação será facultativa no Registro de Imóveis, com fundamento no artigo 246 do mesmo diploma legal e, por analogia, ao artigo 622, II, do Provimento 260/2013, após o registro no RTD.
Quanto à forma de cálculo dos emolumentos, não se verifica a hipótese de se fixá-la de forma abstrata neste procedimento, sob pena de usurpação de competência da Corregedoria-Geral de Justiça, que fixa as tabelas das serventias extrajudiciais.
(...)
Sugere-se que, caso o contrato não declare o valor econômico, que seja oportunizado às partes contratantes aditá-lo valorando-o ou a própria serventia adequar o valor que mais se aproxime da vantagem econômica pretendida na contratação".
(evento nº 3288522)
Outrossim, instada a manifestar à luz dos ditames da Nota II1 da Lei nº 15.424/2004 (evento nº 2968725), a Oficial Interina Xxxxxx Xxxxxx, do Ofício de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Monte Belo/MG, comunicou estar ciente da decisão, mas ressaltou que a dúvida permanece acerca de "como deverá ser atribuído valor aos contratos" em caso de
contrato "sem valor declarado". (evento nº 3232935).
É o relatório do essencial.
A presente matéria foi objeto de análise nos autos nº 71.506/2014 (evento nº 4012235), cujo conteúdo passo a transcrever:
" (...)
A nota II da Tabela 5 - Atos do Oficial de Registro de Títulos e Documentos - do Anexo da Lei Estadual nº 15.424/2004, que "dispõe sobre a fixação, a contagem, a cobrança e o pagamento de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, o recolhimento da Taxa de Fiscalização Judiciária e a compensação dos atos sujeitos à gratuidade estabelecida em lei federal e dá outras providências", estabelece que:
NOTA II – Em contrato de arrendamento, comodato, carta de anuência e parceria agrícola, envolvendo bens patrimoniais, sem valor declarado, o registro de que trata o número 5 desta tabela será cobrado tendo como parâmetro para enquadramento na tabela o valor de R$ 11.244,00 (onze mil duzentos e quarenta e quatro reais), caso seja por prazo indeterminado; sendo por prazo determinado, o parâmetro para enquadramento nesta tabela corresponderá ao valor de R$ 937,00 (novecentos e trinta e sete reais), multiplicado pelo número de meses de vigência do contrato, até o limite de R$ 11.244,00 (onze mil duzentos e quarenta e quatro reais).
O número 5 da tabela, por sua vez, se relaciona a "registro completo, incluindo anotações e remissões com conteúdo financeiro".
Assim, não havendo valor declarado no instrumento contratual, deve-se observar se a negociação é por tempo indeterminado ou determinado.
(...)
Atente-se, ainda, para outra hipótese envolvendo os contratos de parceria, arrendamento ou outros que envolvam as mesmas características desses prevista no art. 10 da Lei Estadual nº 15.424/2004, que estipula o seguinte:
Art. 10. Os atos específicos de cada serviço notarial ou de registro, para cobrança de valores, nos termos das tabelas constantes no Anexo desta Lei, são classificados em:
(...)
II - atos relativos a situações jurídicas com conteúdo financeiro e valores fixos, ou fixados mediante a observância de faixas que estabeleçam valores mínimos e máximos, nas quais enquadrar-se-á o valor constante do documento apresentado aos serviços notariais e de registro.
(...)
§ 4º Para fins do enquadramento a que se refere o § 3º deste artigo, serão considerados ainda os seguintes parâmetros:
(...)
VI - para registro de contratos de arrendamento, parceria ou qualquer outro que reúna as mesmas características destes, cujas quantias venham expressas em percentuais ou em quantidades do produto, resultantes do negócio jurídico, far-se-á a sua conversão em moeda nacional, correspondente ao valor daquele conteúdo financeiro, na data da realização do registro.
Assim, há a possibilidade também de o contrato de arrendamento ou parceria não apresentar o valor do negócio em moeda nacional, mas em percentuais ou quantidades do produto. Nesses casos, o Oficial
deverá realizar a conversão com bases em índices oficiais do Ministério da Agricultura e Pecuária.
Diferenciam-se, portanto, as situações enquadradas na Nota II da Tabela 5 e aquelas previstas no art. 10,
§4º, inciso Vi, da Lei Estadual nº 15.424/2004. Nas primeiras, não há qualquer valor declarado; já nas segundas, há valor declarado, porém não em moeda nacional.
(...)
Por fim, havendo valor expresso em moeda corrente no contrato, aplica-se o item 5 da Tabela 5 de Emolumentos, utilizando como parâmetro para enquadramento, o valor nele expresso".
Cumpre registrar que as disposições do artigo 135 do Provimento Conjunto nº 93/2020, que possibilita ao notário e/ou registrador solicitar que o usuário apresente declaração do valor real ou de mercado do bem ou negócio, não se aplica as hipóteses estabelecidas na Nota II da Tabela 5 e no artigo 10, §4º, inciso VI, da Lei Estadual nº 15.424/2004, uma vez que tais atos, apesar de possuírem conteúdo financeiro, podem ser apresentados em percentuais ou quantidades de produto, bem como sem valor declarado.
Art. 135. O ato notarial ou registral relativo a situação jurídica com conteúdo financeiro será praticado com base nos parâmetros constantes no § 3º do art. 10 da Lei estadual nº 15.424, de 2004, prevalecendo o que for maior.
§ 1º Se o preço ou valor econômico do bem ou do negócio jurídico inicialmente declarado pelas partes, bem como os demais parâmetros previstos em lei, estiverem em flagrante dissonância com seu valor real ou de mercado, será previamente observado o seguinte:
I - o tabelião ou oficial de registro, na qualidade de agente arrecadador de taxas, esclarecerá o usuário sobre a necessidade de declarar o valor real ou de mercado do bem ou negócio;
II - sendo acolhida a recomendação, o ato será praticado com base no novo valor declarado, que constará do corpo do ato;
III - não sendo acolhida a recomendação, poderá ser instaurado procedimento administrativo de arbitramento de valor perante o diretor do foro, adotado o procedimento previsto nos arts. 150 a 161 deste Provimento Conjunto. § 2º O novo valor declarado ou arbitrado será utilizado tão somente para fins de recolhimento da TFJ e dos emolumentos.
Posto isto, a orientação recebida pela Oficial Interina Xxxxxx Xxxxxx, do Ofício de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Monte Belo/MG, de que "as partes deveriam indicar os valores dos contratos ou a serventia poderia indicar preço aproximado", nega validade à norma, que permite que estes documentos sejam apresentados sem valor declarado, em percentuais ou quantidades do produto, ou em moeda nacional, configurando-se em prática abusiva.
Oficie-se a consulente com cópia desta decisão e dos precedentes (evento nº 4012235), para que observe as normas atinentes ao seu ofício e aos dispositivos a que está submetida no exercício da função delegada.
Oficie-se, ainda, a Direção do Foro de Monte Belo/MG para conhecimento. Após, arquive-se o feito e lance-se esta decisão no banco de precedentes.
Belo Horizonte, 13 de julho de 2020.
XXXXXX XX XXXXXXXX XXXXXX
Juíza Auxiliar da Corregedoria Superintendente Adjunta dos Serviços Notariais e de Registro
1. NOTA II – Em contrato de arrendamento, comodato, carta de anuência e parceria agrícola, envolvendo bens patrimoniais, sem valor declarado, o registro de que trata o número 5 desta tabela será cobrado tendo como parâmetro para enquadramento na tabela o valor de R$ 11.244,00 (onze mil duzentos e quarenta e quatro reais), caso seja por prazo indeterminado; sendo por prazo determinado, o parâmetro para enquadramento nesta tabela corresponderá ao valor de R$ 937,00 (novecentos e trinta e sete reais), multiplicado pelo número de meses de vigência do contrato, até o limite de R$ 11.244,00 (onze mil duzentos e quarenta e quatro reais).
Documento assinado eletronicamente por Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx, Juiz Auxiliar da Corregedoria, em 15/07/2020, às 15:45, conforme art. 1º, § 2º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
A autenticidade do documento pode ser conferida no site xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxx informando o código verificador 4012249 e o código CRC 8F58A94D.
0057840-67.2019.8.13.0000 4012249v13