Janeiro
Janeiro
Responsabilidade bancária Contrato de depósito Contrato de mandato Operação de bolsa Obrigação de restituição
I - Sendo próprio do depósito bancário (irregular) o depositário poder dispor do dinheiro depositado como lhe aprouver, por deter a respectiva titularidade, impondo-se apenas a sua devolução quando solicitada pelo titular da conta, a inoponibilidade da utilização jamais poderá fundar-se nesses poderes do banqueiro.
II - Assim, a actuação da R. ao utilizar capital do depósito e conta dos AA. para operações bolsistas sempre seria lícita, só não podendo recusar a restituição quando pedida.
III - Demonstrado, porém, que houve mandato expresso para utilização do capital entregue e exis- tente na conta em causa em operações de bolsa - compra e venda de acções - já não se está, quanto ao pagamento pedido e à causa invocada, perante uma questão relativa ao contrato de depósito bancário e respectivo cumprimento, como vem peticionado, mas perante uma outra causa (um outro contrato) com conteúdo prestacional bem diverso.
IV - Consequentemente, indemonstrados os fundamentos da pretensão, o acto ilícito - traduzido na recusa infundada da devolução do dinheiro depositado e juros, com incumprimento do contrato de depósito -, a acção tinha de improceder, pois que não estava em causa a apreciação da eficá- cia e execução do contrato de mandato.
10-01-2008
Revista n.º 4225/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Acidente de viação Danos futuros
Danos não patrimoniais Equidade
I - Provado que o acidente ocorreu em 14-07-2001, tendo o recorrente então vinte anos de idade; das lesões que advieram do acidente para aquele resultaram 444 dias com incapacidade total para o trabalho e após esse período ficou com uma incapacidade permanente geral de 10%; aquando do acidente exercia as funções de aprendiz de pintor de automóvel, onde auferia o vencimento mensal de € 350,00, tendo posteriormente frequentado com aprovação um curso de formação profissional de pintor de automóveis, ponderando os factores acima mencionados e a factualidade exposta, e tomando em conta os montantes fixados em outras decisões deste STJ, parece-nos equilibrado o montante de € 12.500,00 fixado pelo acórdão recorrido a título de danos futuros.
II - Provado ainda que em consequência do acidente, o autor foi transportado de ambulância ao hospital por ter sofrido fractura de fémur esquerdo e traumatismo violento do membro inferior esquerdo sendo então logo examinado, radiografado e operado, efectuando uma osteossíntese do fémur; até ter tido alta definitiva foi tratado nos serviços clínicos da ré, tendo efectuado ses- sões diárias de fisioterapia; sofreu dores que foram fixadas no grau 4; as sequelas de que ficou a padecer são em termos profissionais compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforço suplementar; e o dano estético foi fixável no grau de 2/7, parece-nos adequa-
do fixar em € 7.500,00 o montante para reparar os danos não patrimoniais sofridos pelo recor- rente.
10-01-2008
Revista n.º 3602/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxx Xxx Xxxxxxxx
Contrato-promessa de compra e venda Venda de bens alheios
Eficácia real Interpelação admonitória Fixação judicial do prazo
I - Estando em causa um contrato-promessa com efeitos puramente obrigacionais e não reais, não se pode aplicar o disposto no art. 892.º do CC, relativo à venda de bens alheios, apesar da equipa- ração prevista no art. 410.º, n.º 1, do CC, que, aliás, ressalva não só as regras do contrato pro- metido referentes à forma, mas também aquelas que pela sua razão de ser não devem conside- rar-se extensivas ao contrato-promessa.
II - Se se tratar de contrato-promessa (de venda de bens alheios) a que se atribua eficácia real (art. 413.º do CC), uma vez que o promitente vendedor não tem na sua esfera jurídica o direito com base no qual constitui o direito real menor (direito real de aquisição) a favor do promitente comprador, a razão de ser da nulidade prevista no art. 892.º do CC estará presente.
III - Como tal, o contrato-promessa, no que concerne ao seu efeito real, será nulo, podendo, porém, subsistir quanto ao seu efeito obrigacional, nos termos do disposto no art. 292.º do CC.
IV - Se a promitente vendedora ou quem lhe sucedeu, não criou as condições legais para a outorga da escritura prometida, verificar-se-á (salvo prova em contrário) um comportamento (omissão) culposo que impossibilita a celebração do negócio prometido, o que corresponde ao incumpri- mento culposo da obrigação (art. 801.º do CC) e dá lugar ao direito do A. de exigir a restituição do sinal em dobro (art. 442.º, n.º 2, do CC).
V - Não tendo sido fixado prazo para a celebração da escritura, não tinha o A. de instar a R. para aquele efeito, pelo menos antes de ter procurado, por acordo, fixar uma data consensual para a sua realização, conforme o convencionado no contrato, e só frustrando-se tal combinação é que deveria recorrer a tribunal nos termos do art. 777.º, n.º 2, do CC.
VI - Faltando interpelação válida a R. não chegou a constituir-se em mora. Portanto, a obrigação de celebrar a escritura prometida não está ainda vencida, pelo que, nada permite afirmar que à data do vencimento a R., com a autorização dos demais comproprietários ou com o registo rec- tificado ou simplesmente actualizado, não se encontra em condições de outorgar no prometido negócio de compra e venda.
10-01-2008
Revista n.º 3088/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Divórcio litigioso Arrolamento Bens próprios
Regime da separação
O Tribunal de Família onde corre termos o processo de divórcio, é materialmente competente para conhecer da providência cautelar de arrolamento, não obstante os bens que se pretende salva- guardar serem bens próprios do requerente marido e o casamento em vias de dissolução ter sido contraído segundo o regime da separação de bens.
10-01-2008
Agravo n.º 4175/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Acidente de viação Dano morte
Perda do direito à vida
É de manter o valor de € 75.000,00 fixado nas instâncias pela perda do direito à vida, por corres- ponder em termos de equidade, consoante determina o art. 496º, n.º 2, do CC, à gravidade do dano considerado. Corresponde absolutamente porque a vida é o bem maior da pessoa humana. E corresponde relativamente por que à data do acidente a vítima tinha 25 anos de idade e a filha que deixou 7; porque constituía com o seu marido e filha uma família unida e feliz; por- que desempenhava cabalmente o seu papel de jovem mulher e mãe; e porque a sua contribui- ção em termos materiais para a manutenção da vida familiar era relevante.
10-01-2008
Revista n.º 3716/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Princípio dispositivo
Contrato-promessa de compra e venda Incumprimento definitivo
Mora Sinal Restituição
I - O princípio dispositivo que vigora no nosso ordenamento jurídico impede o juiz de decidir com fundamento numa causa de pedir não alegada (por isso se diz que tem de existir coincidência entre a causa de pedir e a causa de julgar), assim como o impede de condenar em objecto diverso do que se pedir e de apreciar questões não suscitadas pelas partes, com excepção das que sejam de conhecimento oficioso.
II - A lei, porém, não o sujeita às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e apli- cação das regras de direito, o que significa que goza de liberdade na qualificação jurídica dos factos introduzidos no processo, e até, em sentido mais lato, no enquadramento dos termos do litígio.
III - O tribunal não está vinculado à apreciação de todos os argumentos invocados pelas partes nem à análise do caso ajuizado sob todas as perspectivas jurídicas teoricamente imagináveis, devendo apenas, escolhido o ângulo de abordagem tido por decisivo, apreciar e decidir as ques- tões pertinentes, que são integradas, em termos rigorosos, pelas pretensões formuladas no pro- cesso e pelas excepções deduzidas contra elas (ou a conhecer oficiosamente), conectadas aos respectivos fundamentos.
IV - Não se afigurando justo e razoável, perante a matéria de facto apurada, afirmar que uma das partes contribuiu em medida mais acentuada do que a outra para a não realização da escritura
de compra e venda, entende-se que há lugar à restituição do sinal prestado em singelo, única forma de, sob pena de enriquecimento ilegítimo, colocar as partes na situação em que se encontrariam se o negócio ajuizado não tivesse sido concluído.
10-01-2008
Revista n.º 3814/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Contrato de agência Requisitos Resolução
Justa causa
I - São elementos típicos do contrato de agência: a obrigação do agente promover a celebração de contratos; a actuação do agente por conta da outra parte; a actuação do agente numa certa área geográfica ou num determinado círculo de pessoas; a autonomia do agente; o carácter de esta- bilidade da relação contratual entre as partes, a remuneração paga pelo principal ao agente.
II - Provado que o A. e R. mantinham o compromisso de o primeiro incentivar segundo o seu crité- rio, mas por conta da segunda, a realização de negócios de compra e venda dos produtos desta; que foi estabelecida a área de actuação, a remuneração e o respectivo prazo de vigência, tradu- zindo-se o conteúdo da obrigação do A. numa prestação de facto, que consiste na prática de actos necessários à conquista e desenvolvimento do mercado do principal e concluir contratos, sendo esta actuação do A. feita por conta do principal e não por si, e os actos por si praticados, nos seus efeitos, têm por efeito a esfera jurídica da ré, encontram-se preenchidos todos os ele- mentos do contrato de agência.
III - Ora, perante a matéria de facto fixada as instâncias entenderam, e bem, que o A. negligenciou o cumprimento da obrigação contratual de respeitar as instruções da outra parte, violando o prin- cipio da boa fé, ao não acatar as instruções da R. no que toca às margens de açúcar fornecidas aos clientes, sobretudo se tivermos em conta que elas eram essenciais, à boa gestão do negócio e à correcta estruturação dos ganhos e perdas.
IV - A violação dos deveres decorrentes de tal princípio, sendo certo que o escrupuloso cumprimen- to das bonificações acordadas era objecto de periódica insistência por parte da Ré, implica que o incumprimento assume o carácter de uma gravidade tal que não é exigível a subsistência do vínculo contratual.
V - Mas o incumprimento não foi apenas grave como reiterado, o que reforça a conclusão anterior da não exigibilidade da subsistência do vínculo.
VI - Assim, ao abrigo do disposto no art. 30.º do DL n.º 178/86, a Ré pode pôr termo ao contrato por resolução por justa causa, resolução que é válida, uma vez que foi feita por escrito e do teor da carta a comunicar a rescisão se extrai, de forma bastante, a motivação em que se funda, como exige o art. 31.º do citado DL.
10-01-2008
Revista n.º 3797/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Contrato de permuta
Alteração anormal das circunstâncias Resolução
Obrigação de indemnizar
Restituição do imóvel Determinação do valor
I - A obrigação de restituir (art. 289.º do CC) não é uma dívida de valor, nem uma obrigação pecu- niária, só indirectamente podendo constituir-se numa obrigação deste tipo quando a restituição em espécie, não for possível. De qualquer modo esta obrigação alternativa (restituição do valor equivalente) não está sujeita ao princípio nominalista previsto no art. 550.º e faz todo o sentido equipará-la à situação prevista no art. 566.º, n.º 2, do CC.
II - Se o valor declarado dos terrenos objecto do contrato de permuta - cuja resolução foi decretada por alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar - devesse ter-se por correspondente ao valor de mercado a simples actualização monetária desse valor permitiria encontrar o valor correspondente.
III - Como não está garantido que no negócio, os valores atribuídos outra coisa não pretendessem que equiparar as prestações das partes, condenando-se a Autora a restituir à Ré o valor dos lotes que recebeu em permuta, segundo o valor dos mesmos, que vier a ser apurado em liqui- dação de sentença, com a ressalva de que a avaliação a efectuar deverá ater-se ao valor dos prédios na actualidade, com referências às características e circunstâncias dos mesmos, à data da celebração do negócio.
IV - Desta forma, afigura-nos que o que a Ré vai receber corresponderá ao valor que os terrenos representariam no seu património, se o negócio não se tivesse efectuado e as suas característi- cas e circunstancialismo envolvente tivessem permanecido inalterados: ou seja vai receber o que prestou.
10-01-2008
Revista n.º 4023/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx
Propriedade intelectual Lei estrangeira
Marcas
Obra feita por encomenda Estabelecimento comercial Cessão da posição contratual Direito patrimonial
Nome de estabelecimento Insígnia do estabelecimento Concorrência desleal
Dolo
I - O desenho ou elemento figurativo das marcas em causa nos autos foi adquirido pela A. socieda- de X, por encomenda à sociedade “Empresa-E, S.A.”, onde prestava serviços W, desenhador gráfico; este desenhador cedeu os direitos de exploração sobre o desenho da marca “.. & ...”, em todo o mundo, tendo aceite que o desenho em causa pudesse ser registado como marca; e que os direitos de exploração do mesmo fossem cedidos pela sociedade X a terceiros; foi com base neste contrato que a A. sociedade X autorizou a A. sociedade Y a registar as ditas marcas; os estabelecimentos da cadeia “.. & ...”, das AA., possuem tais marcas como sinais distintivos de comércio.
II - Em matéria de titularidade do direito de autor, o princípio da territorialidade sofre uma derroga- ção, cabendo à lei do país de origem da obra definir a quem é atribuído o direito de autor; ora, a lei aqui aplicável é a lei espanhola - Ley de Propiedad Intelectual de 12 de Abril de 1996, Decreto Legislativo 1/1996, de 12 de Abril, que aprovou o texto refundido da Ley de Propie-
dad Intelectual, regularizando, aclarando e harmonizando as disposições legais vigentes sobre a matéria -, resultando do art. 45.º de tal diploma que a inobservância da forma escrita não acar- reta a nulidade do contrato de transmissão de direitos de autor, podendo este último, apenas e observado o condicionalismo ali fixado, resolver o contrato, até então validamente celebrado.
XXX - Xxxxx, e em rigor, aquele art. 45.º é inaplicável ao caso concreto discutido nestes autos, que se configura antes como obras feitas por encomenda.
IV - A expressão “Companhia”, ou a sua forma abreviada “Cª”, é uma expressão de uso comum que não pode ser objecto de apropriação exclusiva pelas AA.; a expressão “...” distingue-se clara- mente das marcas utilizadas pela A. sociedade X no seu comércio, quer foneticamente quer graficamente; nenhuma das partes tem o monopólio do comércio de sandes nem isso constitui sequer problema discutido nos autos; a mera utilização pela R. do desenho de um pão, tipo “baguette” - aliás, diferente do desenho utilizado pelas AA. nas suas marcas -, também não constitui qualquer infracção quanto à constituição da insígnia dos seus estabelecimentos.
V - Para se apurar da invalidade do nome e insígnia dos estabelecimentos da ré deve atender-se apenas à composição das marcas das autoras e, claro, ao tipo de actividade económica desen- volvida pelas respectivas empresas, abstraindo de qualquer comparação quanto aos restantes elementos - funcionais ou decorativos - dos estabelecimentos comerciais.
VI - Todo o aspecto visual dos estabelecimentos das AA., incluindo o dos seus elementos compo- nentes e decorativos, resulta de um projecto original, concebido e executado para esse efeito; tal projecto foi adquirido pela A. sociedade X à firma “Empresa-F, S.A.”.
VII - O sobredito projecto de design, mais tarde concretizado nos estabelecimentos das AA., consti- tui uma obra artística merecedora da protecção própria da propriedade intelectual, assumindo até um grau apreciável de originalidade e de novidade - cfr. o n.º 1 do art. 10.º da citada Ley de Propiedad Intelectual, intitulado “Obras y títulos originales”.
VIII - No caso dos autos não ficou provado que os elementos funcionais e decorativos dos estabele- cimentos da R. resultaram de imitação dos estabelecimentos das autoras, embora se tenha apu- rado que o referido projecto de design das AA., e respectiva implementação em Espanha, tenha surgido em primeiro lugar.
IX - A protecção não pode deixar de recair sobre a obra criada em primeiro lugar; no caso de coin- cidência na criação de obras artísticas, considera-se haver uma só obra, pois esta é tomada objectivamente, com independência do seu autor; embora tenha havido dois actos de criação, o segundo não acrescentou nenhuma obra ao mundo da cultura, porque aquela obra já existia.
X - Comparando os elementos decorativos e funcionais dos estabelecimentos das AA. e da R., não podemos deixar de afirmar a existência de uma semelhança nos seus traços essenciais, aliás, de notável coincidência se atentarmos na relativa complexidade da conjugação daqueles diversos elementos: o uso dos elementos de xadrez, a disposição dos balcões e dos armários e até dos próprios produtos de venda; assim, a visão de conjunto daqueles estabelecimentos é susceptível de gerar confusão nos consumidores, o que, aliás, ocorre.
XI - Portanto, o uso pela ré dos mencionados elementos funcionais e decorativos constitui violação do direito de propriedade intelectual das AA. - representado pelo seu projecto de design do interior de estabelecimento -, tal como significa um acto de concorrência desleal, não relevan- do aqui para a prática destes ilícitos uma intenção ou dolo específico.
10-01-2008
Revista n.º 2208/07 - 6.ª Secção Xxx Xxxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Audiência de julgamento Tribunal colectivo Tribunal singular Nulidade sanável
Interpretação da lei
I - Ainda que a lei aplicável seja anterior às reformas de 1995, designadamente o n.º 3 do art. 646.º do CPC, na redacção da época, em que se afirma “se as questões de facto forem julgadas pelo juiz singular, quando o devam ser pelo tribunal colectivo, será anulado o julgamento”, há que interpretar esta norma à luz dos valores e princípios processuais consagrados no tempo em que o acto foi praticado, mais de oito anos depois da propositura da acção.
II - Do referido normativo apenas se conclui tratar-se de nulidade cujo efeito é a anulação do julga- mento. A norma nada esclarece sobre o carácter oficioso do respectivo conhecimento e quanto ao prazo da respectiva arguição.
III - Considerando que, à data da audiência de julgamento, a intervenção do tribunal colectivo não era imperativa, dependendo da vontade das partes e constituindo regra o julgamento pelo juiz singular, não tem qualquer cabimento defender o carácter oficioso do respectivo conhecimento e a sua natureza insanável.
IV - A nulidade em causa não é de conhecimento oficioso e só pode ser arguida até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento, como resulta do art. 205.º, n.º 1, do CPC.
10-01-2008
Agravo n.º 3136/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Embargos de executado Oposição à execução Extemporaneidade Despacho liminar
Caso julgado formal
I - O despacho em que o julgador recebe os embargos e ordena a notificação da embargada, sem se pronunciar sobre a respectiva tempestividade não constitui caso julgado formal sobre esta, pois o Juiz não a apreciou (art. 672.º do CPC).
II - Aliás, o julgador não podia decidir pela respectiva tempestividade sem antes dar a oportunidade à embargada de se pronunciar sobre ela, dando cumprimento ao princípio do contraditório (art. 3.º, n.º 1, do CPC).
III - Nos termos do art. 813.º, n.º 1, do CPC, o prazo para a oposição à execução conta-se sempre da citação para os termos desta, quer já tenha havido ou não uma penhora.
IV - No caso de ter havido penhora, o executado deve cumular as oposições à execução e à penhora (n.º 2 do art. 813.º); o que não pode é, tendo sido citado para a execução antes de efectivada a penhora, aproveitar a notificação desta penhora para deduzir extemporânea oposição à execu- ção.
10-01-2008
Revista n.º 4399/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato-promessa de compra e venda Eficácia real
Registo predial Falência
Execução específica
Registo da acção
I - O celebrado contrato-promessa de compra e venda (de um prédio urbano) não tem eficácia real porque as partes lha não atribuíram pela forma legal - escritura pública e inscrição no registo (arts. 413.º, n.ºs 1 e 2, e 875.º do CC).
II - O caso em apreciação está previsto no art. 164.º-A, n.º 1, do CPEREF que refere que o contrato- promessa sem eficácia real que se encontre por cumprir à data da declaração de falência extin- gue-se com esta; extinto o contrato, não há lugar à execução específica.
III - O registo da acção não transfigura um contrato-promessa meramente obrigacional em contrato com eficácia real - arts. 271.º, n.º 3, do CPC e 5.º do CRgP.
10-01-2008
Revista n.º 572/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Mota Miranda
Pires da Rosa (vencido)
Contrato de compra e venda Pagamento
Preço
Venda de coisa defeituosa Excepção de não cumprimento Indemnização
I - O fornecimento de materiais de construção, com datas e vencimentos diferentes, integram con- tratos de compra e venda diferentes, embora sejam prestações da mesma natureza provenientes do desenvolvimento da relação contratual (sinalagma funcional).
II - Cada uma delas impõe ao comprador, como sinalagma genético, a obrigação de pagar o respec- tivo preço.
III - Muito embora caiba nesse nexo sinalagmático o direito de o comprador peticionar indemniza- ção pelo fornecimento defeituoso de alguns desses materiais, tal nexo já não existe para que o comprador possa recusar-se ao pagamento dos materiais não defeituosos fornecidos.
IV - Independentemente dos direitos do credor previstos nos arts. 913.º e 915.º do CC, pode o mes- mo reclamar do vendedor indemnização pelos danos que o cumprimento defeituoso lhe causa, não se tornando necessário que se verifiquem os pressupostos da anulação do contrato por erro ou por dolo.
10-01-2008
Revista n.º 4332/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) * Mota Miranda
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Incapacidade permanente parcial Danos futuros
Cálculo da indemnização Reforma
I - Quer no caso de IPP quer no caso de morte, a força de trabalho diminuída ou a sua perda total devem ser indemnizadas, por a restauração natural não ser possível.
II - A capitalização dessa indemnização em dinheiro, correspondente ao dano futuro previsível, deve abranger a vida activa da vítima, sendo durante ela que o lesado tem a sua capacidade de trabalho diminuída.
III - Porque actualmente se discute o alargamento tendencial da reforma até aos 70 anos, do que deriva um previsível alargamento da idade da reforma, a indemnização deve ser capitalizada até essa idade.
10-01-2008
Revista n.º 4606/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) * Mota Miranda
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Alegações de recurso Tempestividade Ónus da prova Meios de prova Prova testemunhal
I - A prova da apresentação tempestiva das alegações - no caso, para o tribunal da Relação - cabe aos recorrentes; e essa prova apenas pode ser feita por documento donde resulte a respectiva data do registo; é através do registo que se prova a “data da prática do acto processual” - art. 150.º, n.º 1, al. b), do CPC.
II - Não pode essa prova ser substituída por prova testemunhal, ainda para mais do escritório do advogado/mandatário do recorrente.
10-01-2008
Agravo n.º 4621/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Mota Miranda
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Acção de reivindicação Usucapião
Animus possidendi Servidão de passagem Minas
Janelas
Direito de tapagem
I - Os autores/recorrentes, por si e antepossuidores, vêm, há mais de 20 anos, aproveitando a água da mina existente na parcela de terreno situada a sul do seu prédio rústico, procedendo à lim- peza da mesma e acedendo à mina pela indicada parcela, o que vêm fazendo ininterruptamen- te, à vista de todos, sem oposição de ninguém e na convicção de que não lesam direitos de outrem e de que são seus legítimos proprietários.
II - Assim, a actuação dos autores corresponde ao exercício de um direito de servidão e não de pro- priedade sobre o terreno.
III - Esta ilação não é prejudicada pelo facto de os autores terem actuado na convicção de serem os legítimos proprietários uma vez que deve reportar-se essa convicção à água da mina e não ao terreno onde ela se situa.
IV - O afastamento da janela relativamente ao prédio dos autores é inferior ao estabelecido no art. 1360.º, n.º 1, do CC, em 2 a 5 cm - logo, viola o afastamento legalmente imposto de 1,5 m relativamente ao prédio vizinho.
V - Como não lograram os autores demonstrar que são proprietários da reivindicada faixa de terreno e que faz ela parte integrante do seu prédio rústico, a circunstância de ser para a dita faixa con-
finante que deita directamente a xxxxxx da casa dos réus obsta ao pretendido tapamento da mesma.
10-01-2008
Revista n.º 4322/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contrato-promessa Cônjuge
Sucessão mortis causa
Abuso do direito
Tu quoque
Venire contra factum proprium
I - O contrato-promessa pode ter como objecto a efectivação de um ou mais actos jurídicos unilate- rais.
II - O contrato celebrado entre os cônjuges, não levado a cabo em convenção antenupcial, em que cada um renuncia à herança do outro é nulo.
III - Sendo igualmente nulo o contrato-promessa, não inserto em tal convenção, em que cada um deles promete vir a repudiar, quando o outro morrer, a herança deste.
IV - Aquele que outorga com o cônjuge, em contrato-promessa, no sentido de cada um deles, reci- procamente, se obrigar a repudiar a herança do outro quando ele morrer, coloca-se em terreno ilícito, não podendo a sua sucessora legitimamente - atenta a figura do tu quoque - invocar o abuso do direito contra o cônjuge sobrevivo que se recusa a levar a cabo o prometido repúdio.
V - Em qualquer caso, esta recusa, sem prova de outros factos interessantes, não integra a figura do
venire contra factum proprium.
10-01-2008
Revista n.º 3972/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Contrato de mútuo
Perda do benefício do prazo Juros de mora
Xxxxx remuneratórios Liberdade contratual
I - Se, com a perda do benefício do prazo nos termos do art. 781.º do CC, o credor tem, perante ele, a exigibilidade imediata, passa a faltar o deferimento no tempo entre o abrir mão do capital e o seu reaver que justifica os juros remuneratórios.
II - Não há, pois, razão para o surgimento destes, sem prejuízo de, continuando o devedor, interpe- lado, a não pagar, passarem a vir a lume os juros moratórios.
III - No âmbito da liberdade contratual, consignada no art. 405.º, n.º 1, do CC, as partes podem esti- pular regime diferente.
10-01-2008
Revista n.º 4304/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Acidente de viação Concorrência de culpas Excesso de velocidade Xxxxxxx penal condenatória Danos futuros
Centro Nacional de Pensões Subsídio por morte
Pensão de sobrevivência Sub-rogação
I - O acidente ficou a dever-se não só à deficiente e contraditória sinalização existente no local, mas também ao excesso de velocidade a que seguia o condutor do veículo RS, podendo afirmar-se, como nas instâncias, que, se não fosse a velocidade excessiva - mais do que 100 km/h face à proibição de exceder os 40 km/h - a que circulava o condutor, o acidente teria ocorrido de forma diferente, sendo outros os danos e decerto menos gravosos, sendo correcto repartir a responsabilidade pelos danos na proporção de 70% para o condutor do veículo e de 30% para os réus (que efectuavam trabalhos de reparação na estrada).
II - Não tendo, hoje, eficácia erga omnes a decisão penal condenatória, a condenação criminal do segurado constitui apenas, em relação às seguradoras na acção cível conexa, como terceiros, uma presunção ilidível.
III - O falecido condutor, na altura com 33 anos de idade, exercia uma actividade profissional pela qual auferia um salário mensal de 648,44 €; assim, mostra-se conforme à equidade o montante encontrado pelo acórdão recorrido - 166.000,00 €, reduzidos à percentagem de culpa que foi imputada à segurada da ré Companhia de Seguros -, atribuído, a título de danos patrimoniais futuros, quer à viúva, quer aos filhos menores.
IV - Às importâncias atribuídas a título de indemnização pelos danos patrimoniais a pagar pela seguradora aos lesados - viúva e filhos menores - serão subtraídas as quantias pagas pelo Cen- tro Nacional de Pensões, a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência já pagas.
10-01-2008
Revista n.º 4486/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Serra Baptista
Causa de pedir
Caso julgado material
I - Na primeira acção, a autora fundamenta as suas pretensões no facto de ter sido retirada uma pla- ca que estava colocada na Capela de Nossa Senhora e terem sido mudadas as fechaduras da mesma Capela de forma a impedir a autora de aí entrar, factos estes, praticados pelo réu, páro- co da freguesia e com a conivência da arquidiocese, que causaram à autora humilhação e mágoa e puseram em causa o seu nome, a sua dignidade e a sua própria honra.
II - Nesta acção, a segunda, a autora fundamenta as suas pretensões nos mesmos factos, invocando apenas a sua prática pelo réu.
III - Em relação ao réu existe identidade de sujeitos, tendo sido demandado em ambas as acções; não existem dúvidas que os pedidos nas duas acções são rigorosamente iguais.
IV - Uma vez que já transitou em julgado a sentença proferida na primeira acção, verifica-se - na segunda acção - a excepção do caso julgado.
10-01-2008
Revista n.º 4411/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxx
Acidente de viação Menor
Concorrência de culpas Incapacidade permanente parcial Danos futuros
Danos não patrimoniais Cálculo da indemnização
I - No momento em que o menor iniciou a travessia da rua da direita para a esquerda da condutora do veículo QE, surgindo subitamente pela traseira de um carrinha estacionada, que o encobria totalmente aos olhos daquela condutora, foi colhido por aquela viatura quando ela circulava pela metade esquerda da faixa de rodagem, atendendo ao sentido em que seguia.
II - E que circulava por esta metade em virtude da presença desse veículo estacionado, que obrigou a sua condutora a guinar o veículo para a sua esquerda; por não ter visto o menor, a condutora do veículo não travou nem abrandou a marcha do veículo.
III - Assim, a repartição da culpa na ocorrência do acidente deve ser igual para a condutora do veí- culo e para o menor, ou seja, metade para cada um.
IV - À data do acidente, o menor tinha 4 anos de idade e, em consequência das lesões, ficou a pade- cer de uma incapacidade permanente geral de 25%, à qual acresce, a título de dano futuro, mais 5%.
V - Sofreu várias lesões, nomeadamente fractura craniana, fractura e perda de três dentes, fractura do externo da clavícula esquerda, fractura do ramo isquiopúbico; esteve internado em hospi- tais, registando um coma profundo durante vários dias; foi submetido a diversas e delicadas intervenções cirúrgicas; ficou com cicatrizes que constituem defeito estético notório e apreciá- vel; sofreu dores com as lesões e com os tratamentos.
VI - Assim, mostram-se equitativos os montantes fixados a título de danos futuros e danos não patrimoniais, respectivamente de 120.000,00 € e 100.000,00 € - destes montantes há que dedu- zir metade, uma vez que o autor foi considerado responsável pela ocorrência do acidente na proporção de 50%.
10-01-2008
Revista n.º 4518/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Serra Baptista
Propriedade horizontal Fracção autónoma Título constitutivo
Direitos de personalidade Direito ao repouso
Direito à qualidade de vida Ruído
Licença de estabelecimento comercial e industrial Actividade comercial
Actividade industrial Abuso do direito
I - O autor, por virtude da actividade industrial da sociedade ré, fica impedido de abrir as janelas da sua habitação, sem que um cheiro intenso a pão, bolos e óleos provenientes da sua laboração invada a sua fracção, o que causa sensações de enjoo e mau estar; a sua habitação é também invadida por fumos e fuligens provenientes da laboração da ré, que impedem o arejamento.
II - É constante, e perfeitamente audível, na fracção do autor, o arrastar de elementos como cadeiras e mesas, pancadas secas, quedas de objectos, arrastar de tabuleiros e cestos do pão; são audí- veis ruídos diversos, tais como o de uma batedeira, o raspar de tabuleiros, o constante bater e chiar de portas, que se desenvolvem a qualquer hora do dia e da noite e mesmo ao fim de semana; tudo isto perturba o sono e o descanso do autor e sua família.
III - O calor produzido pelos fornos da ré provoca temperaturas elevadíssimas na fracção do autor, o que se agrava no verão, tornando quase insuportável aí habitar durante esse período; isso causa ao autor e sua família abundante transpiração, mau estar e desidratação.
IV - É inevitável a conclusão de que o fumo, fuligem, vapores, cheiros e ruídos provenientes da fracção da ré arrasta um prejuízo substancial para o uso da fracção do autor, conferindo a este o direito de se opor a tais factos - art. 1346.º do CC -, mesmo que a ré tenha obtido licença camarária que autorize o funcionamento de uma padaria/pastelaria.
V - Tal oposição do autor não constitui abuso do direito.
VI - Quando o título constitutivo da propriedade horizontal menciona como destino da fracção o “comércio, profissões liberais ou outras actividades económicas” claramente não inclui a indústria entre os seus destinos.
VII - Foi perfeitamente possível destrinçar o que é comércio de padaria e pastelaria do que é indús- tria de panificação, por forma a poder manter em funcionamento o comércio e encerrar a indústria.
10-01-2008
Revista n.º 413/07 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) Custódio Montes
Mota Miranda
Acção de reivindicação
Contrato-promessa de compra e venda Direito de retenção
Ocupação de imóvel Indemnização
Responsabilidade extracontratual Abuso do direito
Venire contra factum proprium
I - Reconhecido ao autor o direito de propriedade sobre a fracção predial, devem os réus ser conde- nados a entregar-lha por virtude de a ocuparem à margem de algum direito real ou pessoal de gozo.
II - Como o proprietário da fracção predial não outorgou no contrato-promessa que o promitente- vendedor incumpriu, não obstante o primeiro haver entregue as respectivas chaves ao promi- tente-comprador, este não tem direito de retenção contra ele com fundamento em direito de indemnização devida pelo segundo.
III - Autorizada pelo autor a ocupação da fracção predial, excluída está a sua ilicitude com vista à indemnização no quadro da responsabilidade civil extracontratual por violação do direito de propriedade e prejuízo dela decorrente.
IV - A citação dos réus para a acção é insusceptível de relevar como interpelação para entrega da fracção predial e transmutação da ocupação lícita em ilícita para efeitos de indemnização a arbitrar.
V - A mera entrega das chaves da fracção predial aos réus por parte do autor não justifica a conclu- são de abuso do direito no accionamento de reivindicação, designadamente na modalidade de venire contra factum proprium.
10-01-2008
Revista n.º 4660/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Poderes da Relação Impugnação da matéria de facto Contrato de seguro
Seguro de vida
Cláusula contratual geral Dever de comunicação Exclusão de responsabilidade Acidente de viação Alcoolemia
Nexo de causalidade Presunções judiciais
I - Não tendo o recurso de apelação envolvido a impugnação da decisão da matéria de facto proferi- da, não havendo fundamento para oficiosamente operar a sua alteração, tendo-se a Relação limitado a interpretá-la, não havia fundamento para que determinasse a renovação das provas.
II - Por não ter sido previamente comunicada ao tomador do seguro, não é oponível à pessoa segura a cláusula contratual geral integrada em contrato de seguro, segundo a qual a seguradora não garantia o pagamento das importâncias seguras caso o falecimento da pessoa segura fosse devido a acidente sobrevindo à primeira por virtude do consumo de bebidas alcoólicas.
III - Face à referida solução quanto a tal vertente de mérito, prejudicado fica o conhecimento da questão relativa à problemática quanto à interpretação da aludida cláusula no que concerne ao nexo de causalidade entre o consumo de bebidas alcoólicas pela pessoa segura e o acidente em que ela pereceu.
IV - É vedado o conhecimento no recurso de revista da ilegalidade invocada pelos recorridos even- tualmente derivada de o tribunal da primeira instância haver considerado verificado o referido nexo de causalidade por via de presunção natural, por não se tratar de situações susceptíveis de integrarem a ampliação do âmbito do recurso nem de substituição do tribunal recorrido.
10-01-2008
Revista n.º 4690/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Acção de preferência Direito de preferência Depósito do preço IMT
I - O “preço devido”, a que alude o art. 1410.º do CC, diz apenas respeito à contraprestação que deve ser paga ao vendedor, não abrangendo quaisquer outras despesas deste ou do adquirente, nomeadamente a sisa (hoje IMT), despesas de registo ou de escritura.
II - O depósito do preço visa apenas garantir o vendedor contra o perigo de, finda a acção, o prefe- rente se desinteressar da compra ou não ter possibilidades financeiras para a concretizar, per- dendo aquele também o contrato com o primeiro comprador; o depósito da mencionada con- traprestação é bastante para remover esse perigo.
10-01-2008
Revista n.º 3588/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Confiança judicial de menores Adopção
Revelando a factualidade provada que a conduta do pai das menores - dado ao consumo excessivo de álcool e, quando alcoolizado, agressor da mulher e das filhas, prejudicando a formação e integração destas na escola -, da mãe - descurando a vida doméstica e transferindo tarefas para as filhas crianças -, e a situação das filhas - entregues a si próprias ou ao cuidado de irmãs mais velhas, todas menores -, todo um leque de comportamentos e incúria que colocam em perigo grave a segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento das crianças, mostrando-se completamente comprometida a sua integração na família biológica, conclui-se ser a situação dos autos subsumível no art. 1978.º, n.º 1, al. d), do CC, sendo, por isso, adequada a medida de confiança das menores a instituição com vista a futura adopção.
15-01-2008
Agravo n.º 3535/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Condenação em quantia a liquidar
I - É hoje entendimento uniformemente adoptado neste Supremo Tribunal considerar que o art. 661.º, n.º 2, do CPC abrange não apenas os casos de inexistência de factos provados por os mesmos ainda não serem conhecidos ou estarem em evolução aquando da instauração da acção ou como tais se apresentarem no momento da decisão, mas também os casos em que, tendo-se formulado pedido específico, não se demonstraram factos suficientes, por fracasso da prova na acção, para se fixar, com precisão o objecto ou a quantidade da condenação.
II - Assim, o preceito previne a situação em que haja a certeza do direito accionado, mas não tenha sido possível concretizar a prestação devida. Na verdade, estando provados os danos, mas não determinado o seu concreto ou exacto valor, trata-se apenas de proceder ao apuramento do valor do efectivo prejuízo que os concretos danos realmente provados causaram, e não de facultar uma nova oportunidade para provar os danos.
15-01-2008
Agravo n.º 4294/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Matéria de facto Factos provados Prova documental
Reprodução de documento
I - Os documentos não são mais do que meios de prova de factos ou declarações que neles estão representados ou contidos.
II - Não é correcto proceder na sentença ou no despacho de condensação à reprodução de documen- to do processo ou à remissão para o seu conteúdo como se de factos se tratasse, sem indicação, em concreto, dos factos a que se pretende aludir através da mera referência ao contido no documento. Num tal caso, o tribunal de recurso e as partes não ficam em situação de apreen- der, com segurança, o que está ou não efectivamente provado.
III - Tal prática não se confunde, todavia, com a remissão de um concreto facto provado para o con- teúdo de um documento que apenas lhe completa o conteúdo, dispensando a reprodução do texto.
IV - Neste último caso, o facto está devidamente identificado e o reenvio para o conteúdo do docu- mento está seleccionado e concretizado, destinando-se apenas a complementá-lo ou integrá-lo. Daí que a matéria de facto disponível constitua base suficiente para a decisão de direito sobre as pretensões das partes, não se justifica lançar mão do excepcional remédio previsto no n.º 3 do art. 729.º do CPC.
15-01-2008
Revista n.º 4325/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Decisão arbitral Anulação
Jogador profissional
I - Tendo as partes renunciado ao recurso à jurisdição comum para sindicar o mérito da decisão arbitral, esta só pode ser impugnada através de acção anulatória, com base na comissão de um ou mais vícios taxativamente elencados no art. 27.º, n.º 1, da Lei n.º 31/86, de 28-09 (LAV).
II - Entendendo o tribunal arbitral que a questão de mérito (atinente à interpretação e aplicação de cláusula contratual) era apenas de direito, a sua decisão, de rejeitar as provas oferecidas pela sociedade anónima desportiva, ora recorrente, insere-se na apreciação de mérito, emergindo de um juízo juridicamente fundamentado sobre a irrelevância da prova que pudesse vir a ser pro- duzida sobre a vontade das partes na emissão da declaração negocial.
III - Isto porque se entendeu-se no acórdão recorrido que essa vontade, por imperativo legal, só poderia ser determinada objectivamente e estava condicionada pela natureza do negócio (um contrato de trabalho desportivo) e limitação dos seus efeitos (resultante do disposto no art. 122.º, al. d), do Código do Trabalho e do art. 9.º, n.º 4, do CCT).
IV - A recusa de audição das testemunhas arroladas na contestação, para prova dos factos aí alega- dos, não constituiu uma violação do princípio do contraditório, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 27.º, n.º 1, al. c), e 16.º, al. c), da LAV.
15-01-2008
Revista n.º 4393/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Contrato-promessa de compra e venda Promessa unilateral
Interpretação da declaração negocial
Execução específica Sinal
Prédio rústico
I - Uma promessa monovinculante é totalmente diferente da bivinculante. Na primeira, surge uma parte sujeita ao livre arbítrio da outra, o que não sucede na segunda.
II - A omissão de declaração expressa de que uma das partes promete comprar à outra a coisa objec- to do contrato não transforma o contrato-promessa bilateral em contrato-promessa unilateral, se de outras declarações contidas no documento que titula o contrato, aliadas ao facto do promi- tente-comprador ter entregue ao promitente-vendedor determinada em quantia em dinheiro, se conclui, inequivocamente, que aquele se quis vincular à obrigação de celebrar o contrato defi- nitivo de compra e venda.
III - Tendo a Autora (sociedade comercial) manifestado junto do Município (Réu) o seu interesse em construir um centro de reciclagem numa zona industrial do concelho, vindo a ser tomada deliberação camarária no sentido da disponibilização, para o efeito, de um lote de terreno, a preço simbólico, após o que foi outorgado contrato-promessa de compra e venda, tendo a Autora pago a quantia de 328 € referida no contrato-promessa, por conta do preço convencio- nado, para aquisição dos prédios rústicos em questão, ficando o remanescente por liquidar aquando da realização da escritura, o facto de não ter ficado expressamente referido no contra- to-promessa a obrigação de comprar, por parte da Autora, não obsta que o contrato deva ser interpretado como constituindo um contrato-promessa bilateral de compra e venda.
IV - Na verdade, o contrato surgiu precisamente a pedido da Autora, assumindo esta a vontade de se obrigar a comprar, com a antecipação do pagamento parcial do preço, tendo-lhe sido entregue imediatamente a posse dos terrenos.
V - Existindo sinal passado, não pode haver lugar à execução específica do contrato, nos termos do art. 830.º, n.ºs 1 e 2, do CC, por o sinal corresponder a convenção de não se pretender a sua execução específica, assim improcedendo a presente acção.
15-01-2008
Revista n.º 4249/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxxx
Contrato de seguro
Condução sob o efeito do álcool Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula
Dever de comunicação
I - A cláusula incluída nas Condições Gerais de um contrato de seguro, segundo a qual não são objecto de cobertura os riscos devidos a acção de pessoa influenciada pelo álcool, encontra-se em consonância, no que toca à condução sobre o efeito do álcool, com normas prescritivas e de ordem pública definidas pelo direito positivo português.
II - A lei aplicável aos contratos de seguro que cubram riscos situados em território português não poderá envolver ofensa dos princípios fundamentais da ordem pública do Estado Português.
III - São tidos como contrários à ordem pública os contratos de seguro que garantam, designada- mente, o risco de responsabilidade criminal.
IV - Por isso, embora tratando-se de uma cláusula contratual geral, a falta de comunicação ao segu- rado do teor dessa cláusula, ou a falta de informação sobre o seu concreto alcance e significa- do, não envolve a exclusão dessa cláusula, ao abrigo do art. 8.º als. a) e b), do DL n.º 446/85.
15-01-2008
Revista n.º 4318/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator) * Xxxxx Xxxxxxx
Nuno Cameira
Recurso de agravo na segunda instância Admissibilidade de recurso
Oposição à execução Despacho do relator Rejeição de recurso Caso julgado formal
I - O despacho liminar do relator em sede de recurso, seja de que espécie for e após a subida dos autos do tribunal a quo tem, tal como o despacho de admissão da 1.ª instância, mero carácter provisório, e não vincula a conferência, pois é sempre lícito a qualquer dos adjuntos suscitar a reapreciação das questões sobre que se pronunciou expressamente aquele despacho, inclusive quanto ao não conhecimento do objecto do recurso, como decorre do disposto no art. 708.º do CPC.
II - Logo, tal despacho não forma caso julgado formal, numa situação em tudo análoga à prevista no art. 510.º, n.º 3, para o saneamento do processo, face à tabelar afirmação da inexistência de excepções ou nulidades.
III - O normativo do art. 923.º do CPC, com a redacção introduzida pelo DL n.º 38/2003, veio excluir categoricamente os recursos de agravo em 2.ª instância no âmbito da acção executiva. E as decisões de que cabia agravo não respeitam apenas à acção executiva mas a todas as decre- tadas nos respectivos enxertos declarativos, designadamente na oposição, como decorre da conjugação de tal preceito com o anterior art. 922.º que em exclusivo se ocupa dos recursos de apelação das decisões proferidas na liquidação, no apenso da verificação e graduação de crédi- tos e na oposição.
IV - Assim, só nas situações excepcionais previstas nos n.ºs 2 e 3 do art. 678.º e n.º 2 do art. 754.º (oposição de acórdãos), conforme ressalva da parte final do citado art. 923.º, o agravo é admis- sível.
15-01-2008
Agravo n.º 3124/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Contrato de mútuo Pagamento em prestações Prescrição
I - A prescrição de curto prazo, no que respeita a prestações de amortização do capital mutuado, derivadas de acordo de regularização de dívida subsistente, só começaria a correr quando as mesmas prestações, apesar de vencidas, não tivessem sido exigidas pelo mutuante.
II - Na verdade, é a inércia do titular do direito no seu exercício que fundamenta a prescrição e den- tro do período de tempo que a lei fixa em função da sua natureza.
III - Assim, só as prestações que se tivessem vencido nos 5 anos antes da citação dos devedores para a execução, data em que se interromperia, nos termos gerais (art. 323.º, n.º 1, do CC) o novo prazo de prescrição iniciado após aquele reconhecimento, é que poderiam ser considera- das extintas por operância da dita excepção peremptória.
IV - Não, portanto, as posteriores, entretanto vencidas, pois quanto a elas não chegou a decorrer o prazo de prescrição respectivo.
15-01-2008
Revista n.º 4059/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Título executivo Documento particular Assinatura Assinatura a rogo
Reconhecimento notarial
I - As circunstâncias que legitimam o reconhecimento da assinatura a rogo são as do rogante não saber ou não poder assinar e não propriamente a da leitura do documento ao rogante o qual se configura como um pressuposto do reconhecimento presencial.
II - Não constitui requisito do acto notarial de reconhecimento da assinatura a rogo a menção da leitura do documento ao rogante.
III - No caso de assinatura por pessoa - o ora embargante - que não sabe ler, nem escrever, unica- mente conseguindo “garatujar” o seu nome, tanto que no seu bilhete de identidade se faz men- ção de não saber assinar, a sua assinatura ainda que reconhecida presencialmente e do seu punho não o pode vincular ao teor do documento - dado à execução - o qual não pode, por isso, funcionar como título executivo.
IV - Na verdade, por aplicação directa do disposto no art. 373.º, n.º 3, do CC, a menção da leitura do documento particular assinado por pessoa que em rigor não podia assumir a respectiva auto- ria constitui um requisito essencial de validade do termo de reconhecimento.
V - O reconhecimento em causa faz prova plena da genuinidade da assinatura aposta no dito docu- mento, já que feita ou confirmada perante a funcionária que lavrou o termo, mas não faz prova plena da vinculação do subscritor ao contexto do documento, dada a comprovada condição de iletrado do mesmo, só possível de ultrapassar com a respectiva leitura, de que se não fez men- ção no termo do reconhecimento e tão pouco da circunstância justificativa (não saber ler).
VI - Não se trata, assim, de nenhum caso de falsidade do termo de reconhecimento, pois nem se põe em dúvida o que nele se atestou, ou seja, que a assinatura era do punho do próprio.
15-01-2008
Revista n.º 4247/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Compromisso arbitral Arbitragem
Interpretação da declaração negocial Preterição do tribunal arbitral
I - Constitui uma convenção de arbitragem a cláusula, com a epígrafe “tribunal arbitral”, nos termos da qual:“1 - Em caso de litígio emergente da interpretação, aplicação ou integração do presente contrato, as partes diligenciarão, por todos os meios de diálogo e modos de composição de interesses, obter uma solução concertada para a questão. 2. Quando não for possível uma solu- ção amigável negociada nos termos previstos no n.º anterior, qualquer das partes poderá, a todo momento, recorrer à arbitragem, nos termos dos n.ºs seguintes. 3. As partes renunciam expres- samente ao foro ordinário para dirimir qualquer litígio emergente deste acordo, obrigando-se a
submeter a sua resolução exclusivamente a juízo arbitral, que julgue segundo a lei portuguesa.
4. O Juízo arbitral será composto ... 5. Na falta de acordo ...”.
II - De harmonia com o disposto no art. 236.º do CC, temos, na interpretação da mesma, de excluir o sentido literal do seu n.º 3, bem como afastar do círculo dos litígios ou diferendos definidos no n.º 1 os emergentes do incumprimento do contrato.
III - Não foi um qualquer litígio emergente do contrato que as partes, à luz do declarado, pretende- ram, em primeira linha, resolver por concertação amigável e, em segunda linha, com o com- promisso arbitral, excluir a sua solução com recurso à via judicial, mas apenas os litígios expressamente delimitados e logo confinados à interpretação, validade e eficácia das respecti- vas disposições.
IV - Assim, pretendendo a Autora na presente acção que a Ré seja condenada a pagar as contrapres- tações mensais e despesas de condomínio a que se obrigou no acordo de utilização da loja do centro comercial explorado e gerido pela Autora, não se pode a mesma considerar abrangida pela convenção de arbitragem, pois diz respeito ao continuado incumprimento das obrigações assumidas no contrato, e não a qualquer desacordo quanto à validade, conteúdo e eficácia do contrato.
15-01-2008
Agravo n.º 4363/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Coacção moral Requisitos Confissão de dívida Assunção de dívida Título executivo
Embargos de executado
I - A coacção moral é um vício da declaração negocial perturbador da vontade, traduzido no medo resultante de ameaça ilícita de um dano, de um mal, visando extorquir a declaração negocial.
II - Só existe tal vício da vontade, quando a liberdade do coacto não foi totalmente excluída, quando lhe foram deixadas possibilidade de escolha, embora a submissão à ameaça fosse a única esco- lha normal.
III - Não é obtida mediante coação moral a declaração confessória de dívida subscrita pelo filho de sacador de cheque, cuja ordem de pagamento entretanto cancelou, que ao ser abordado pelo tomador acede em assumir a dívida titulada pelo cheque, ante o anúncio de que se o não fizesse o tomador recorreria a juízo para obter a cobrança coerciva.
IV - Não tendo havido ameaça de que não pudesse escapar, não se pode considerar que tenha havi- do coacção moral, porquanto não existe uma intransponível relação de causa e efeito, entre a pretensa ameaça e a actuação do signatário de tal documento (ora embargante) em função dela.
V - Aquela declaração escrita e reconhecida notarialmente - referida em III) - assumindo a existên- cia da dívida do pai do signatário de tal declaração, porque isenta de vício na formação e emis- são da declaração de vontade, constitui título executivo exprimindo assunção da dívida.
15-01-2008
Revista n.º 4313/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator) *
Xxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Responsabilidade extracontratual
Contrato de arrendamento Dever de vigilância Inundação
I - Sendo os Réus arrendatários, e como tal detentores e fruidores do andar superior ao arrendado (e subarrendado) às Autoras, sobre eles impendia a obrigação de adoptar comportamentos idó- neos a não causar danos pelo uso, o que passa pelo dever de vigilância dos factores de poten- cial risco, como a conservação e vigilância do bom estado da instalação eléctrica, das canaliza- ções ou das torneiras (uso da água).
II - Tendo no andar em causa, onde os Réus instalaram uma sociedade comercial (que não é parte na presente acção), alguém deixado, inadvertidamente aberta uma torneira e, por causa disso, a água jorrado para o andar inferior, onde funcionam os escritórios das Autoras, inundando-o e causando prejuízos, são os Réus responsáveis por estes, pois a eles cabia o dever de vigiar o imóvel, mesmo sendo possuidores em nome de outrem.
III - Aos Réus competia provar que, quando deixaram o andar no dia da inundação, tinham tomado as precauções adequadas a evitar danos e, uma delas, seria verificar se as torneiras ficaram fechadas.
IV - Sobre os Réus recaia igualmente o ónus da prova de que tinha sido moderada ou leve a sua culpa, para poder ser tomada em atenção ao computar a indemnização, em função da equidade, nos termos do art. 494.º do CC.
V - O mecanismo deste normativo, envolvendo uma apreciação com base na equidade, implica que só deva ser aplicado quando a indemnização reparadora de todos os danos, se revelar clara- mente injusta, o que no caso não sucede, justificando-se a condenação dos Réus a pagarem às Autoras a quantia que se liquidar em incidente de liquidação, necessária para reparar os estu- ques, pinturas de paredes e tecto e verniz do chão, bem como a quantia a liquidar em incidente de liquidação relativamente a telemóveis e outros acessórios danificados.
15-01-2008
Revista n.º 4344/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator)
Xxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Acidente de viação
Instituto de Estradas de Portugal Tribunal administrativo Tribunal comum
Competência material
I - Face ao disposto nos arts. 1.º, n.º 1, do ETAF e 212.º, n.º 3, da CRP, a competência dos tribunais administrativos e fiscais, dependerá da ponderação sobre se está, ou não, perante pleitos deri- vados de relações jurídicas administrativas (e fiscais), sendo que só no primeiro caso tal com- petência se verificará.
II - No presente litígio, que tem por objecto a apreciação da responsabilidade civil extracontratual do Instituto de Estradas de Portugal emergente de acidente de viação, alegadamente causado por condutor seu “empregado”, que conduzia por conta, no interesse e sob as ordens daquele instituto público, está em causa somente uma relação jurídica de natureza privada.
III - O Instituto de Estradas de Portugal age aqui no exercício de uma actividade meramente pessoal ou privada. A sua intervenção deriva, somente, da circunstância de ser o proprietário do veícu- lo interveniente no acidente dos autos. Existe aqui uma posição de absoluta paridade com os particulares em geral.
IV - Não derivando a situação controversa de relações provenientes das suas atribuições, competên- cias ou funções públicas ou sequer de actos de gestão privada, praticados no exercício de fun-
ções públicas, antes estando e causa uma relação jurídica intrinsecamente privadas, conclui-se pela competência, em razão da matéria, dos tribunais comuns para apreciação do presente plei- to.
V - Situação diferente seria se o IEP (hoje E.P.) fosse demandado, mesmo por responsabilidade extracontratual, em razão de factos derivados de suas atribuições, como por exemplo, por danos provenientes de um acidente provocado por uma deficiente conservação de uma estrada ou por prejuízos provocados por obras de beneficiação de uma via. Nestas hipóteses, tratar-se- ia de apreciar a responsabilidade civil extracontratual da E.P., derivadas de actuação enquanto órgão de natureza pública, ou seja, estaria em causa a apreciação de actos praticados por essa entidade no exercício de funções públicas.
15-01-2008
Agravo n.º 4073/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Enriquecimento sem causa Acessão industrial
Condenação em quantia a liquidar
I - Dando-se como provado que a construção de casa pelo Autor no prédio dos Réus, prédio que foi condenado - por sentença transitada em julgado - a restituir-lhes, aumentou o valor do prédio destes, conclui-se que o património destes passou a valer mais, existindo na diferença entre o antes e o depois um enriquecimento.
II - Existiu aqui uma deslocação patrimonial, não por efeito de uma prestação do empobrecido a favor do enriquecido mas por efeito de uma “intromissão” daquele num bem jurídico destes.
III - Apesar de não se ter provado o valor gasto pelo Autor na construção da casa (resposta negativa ao facto 2.º da base instrutória), é facto notório que a construção de uma casa custa dinheiro àquele que a constrói. Com a resposta negativa ao dito quesito, apenas se pode inferir que não se provou o montante concreto que o Autor diz ter gasto na construção da habitação, mas já não, como fazem as instâncias, que o Autor nada despendeu com a edificação que efectuou.
IV - O enriquecimento não tem causa justificativa, não se vislumbrando qualquer razão para que os Réus beneficiados retenham o proveito auferido. No caso, parece ocorrer uma situação de acessão industrial imobiliária, sendo que tanto na situação do art. 1340.º (obras feitas de boa fé) como no caso do art. 1341.º (obras feitas de má fé), existirá sempre lugar a uma compensa- ção àquele que, no terreno, deixa a construção.
V - Embora a situação devesse ter sido discutida na acção de reivindicação (anteriormente proposta pelos agora Réus contra o ora Autor), devendo este aí ter deduzido reconvenção (art. 274.º, n.ºs 1 e 2, al. b), do CPC), tal não obsta ao preenchimento dos requisitos do enriquecimento sem causa, pese embora a sua natureza subsidiária, não se vendo outro fundamento jurídico que permita reintegrar o património empobrecido do demandante.
VI - A obrigação de restituir por parte dos Réus consistirá no valor equivalente à valorização do prédio, valor que, porém, não poderá exceder o valor do empobrecimento do Autor. Como esse valor não está determinado, o respectivo montante deverá ser calculado em execução de sen- tença, como decorre do disposto no art. 661.º, n.º 2, do CPC.
15-01-2008
Revista n.º 4164/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Acidente de viação Privação do uso de veículo Presunções judiciais
I - A normalidade das coisas aponta para a circunstância de um veículo pesado licenciado para o transporte público mercadorias e pertencente a uma empresa de transportes e terraplanagens que se inutilizou em virtude de uma colisão rodoviária, ter assegurada uma utilização diária - computados apenas os dias úteis -, no período imediato ao do acidente.
II - Resulta também da normalidade das coisas que o motorista que conduzia aquele veículo ficaria, pelo menos, subaproveitado no referido período posterior ao acidente em causa.
III - Aponta, por isso, a normalidade das coisas para que a inutilização temporária do veículo cause à lesada proprietária daquele um prejuízo decorrente da privação do rendimento que auferiria da utilização do veículo nos dias úteis seguintes à inutilização, pois sai dessa normalidade o não aproveitamento diário da viatura.
IV - Logo, não tendo o lesante provado essa ausência de utilização potencial, tem de ser aceite a mesma potencialidade de utilização para o efeito da aplicação do disposto no art. 566.º, n.º 3, do CC, fixando-se equitativamente o montante dos danos resultantes da privação do uso do veículo da autora em 13.150 €, considerando o montante diário que a Autora receberia da utili- zação do veículo multiplicado pelo número de dias úteis em que o veículo esteve imobilizado.
15-01-2008
Revista n.º 4436/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxx Xxx Xxxxxxxx
Propriedade horizontal Obras
Abuso do direito Litigância de má fé
I - Podem os condóminos em assembleia geral e através da Administração do Condomínio exigir a reposição da fracção de outro condómino, o ora Autor-reconvindo, ao estado anterior às obras ilegais que este nela efectuou e exigir a devolução ao Condomínio do espaço indevidamente ocupado pelas mesmas, não podendo o Autor justificar-se com a existência de outras ilegalida- des praticadas por outros condóminos. Uma ilegalidade não justifica outra.
II - Estando em causa a realização de obras nas partes comuns do condomínio - substituição de cai- xilharia das janelas e colocação de estores - tinha a Administração do Condomínio poderes e responsabilidade para as implantar.
III - Tendo o Autor autorizado que as novas caixilharias das janelas do prédio fossem colocadas, assumindo posteriormente posição contrária, aproveitando-se da não (rigorosa) conformidade do material e do desenho da caixilharia nova com a velha, para exigir na presente acção a sua remoção, a sua pretensão é manifestamente contrária à boa fé, tornando por isso ilegítimo o exercício do direito que se arroga - art. 334.º do CC.
IV - Mas não pode o Autor ser condenado a pagar uma indemnização ao Condomínio Réu- reconvinte pelo facto de a recusa do Autor ter contribuído para não ter sido recebida (ainda) a comparticipação do RECRIA nas obras em causa, pela simples razão de que não é seguro que essa comparticipação tenha sido definitivamente perdida.
V - Considerando que a par de deduções legítimas, como as que obtiveram acolhimento na acção, o Autor deduziu pretensões contra os Réus-reconvintes (Condomínio e condóminos), cuja falta de fundamento não podia ignorar; e opôs-se também sem fundamento a pretensões destes, ale- gando factos que não correspondiam à realidade e que, por serem pessoais, não podia ignorar ou perverter, conclui-se que o Autor extravasou o conceito de lide temerária que a Relação
entendeu guardar-lhe quando o poupou à condenação como litigância de má fé que a 1.ª instân- cia tinha determinado.
VI - Daí que deva ser reposta a decisão da 1.ª instância, aplicando-se ao Autor a condenação em multa de 6 UCs, concretizando desde já a indemnização aos Réus, que se fixa em 1.500 € - art. 456.º do CPC.
VII - Com a condenação como litigante de má fé, o Autor perde o apoio judiciário que lhe havia sido concedido.
15-01-2008
Revista n.º 3676/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Acidente de viação Confissão judicial Depoimento de parte
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
Danos não patrimoniais Danos futuros
Perda da capacidade de ganho Arbitramento de reparação provisória
I - Constando da matéria de facto assente, por acordo das partes nos articulados, que o Autor traba- lhava e que deixou de receber o seu vencimento por se encontrar incapacitado para o trabalho em virtude do sinistro (ocorrido em 29-08-2002), mas tendo este, quando prestava o seu depoimento de parte, afirmado que “se despedira do seu emprego em 20-08-2002 porque pre- tendia emigrar para a Suiça a fim de aí trabalhar durante meio ano na construção civil, após o que pretendia prestar provas para funcionário de investigação criminal da Polícia Judiciária”, afirmações que ficaram consignadas na acta, estamos perante uma confissão que vem esbarrar com factos que haviam sido dados por provados, criando-se uma contradição a nível da matéria de facto que não pode manter-se.
II - A solução é-nos dada no art. 722.º, n.º 2, do CPC, onde se enuncia que o STJ tem o poder de sindicar a decisão da Relação em matéria de facto quando constate que houve violação do direito material probatório, in casu por violação do disposto no art. 358.º, n.º 1, do CC, sendo este, de resto, um dos casos residuais em que o Supremo pode alterar a matéria de facto fixada na Relação.
III - Assim, num primeiro momento tem de ser eliminado o ponto da matéria de facto assente por acordo das partes atinente à perda de vencimento e alterados o ponto da matéria de facto assen- te e a resposta ao quesito atinentes à actividade laboral desempenhada pelo Autor, ficando a constar que o fazia antes de 20-08-2002; mais se deverá acrescentar um facto novo à matéria de facto provada, que consiste na parte integrante da declaração confessória do Autor, tendo como suporte o facto de a Ré se pretender aproveitar da situação de confissão do desemprego deste, ou seja, que o Autor se despediu do emprego que tinha porque pretendia ir para a Suíça, a fim de aí trabalhar durante 6 meses na construção civil, tencionando depois concorrer à Polí- cia Judiciária.
IV - Provando-se que em consequência do acidente o Autor sofreu fractura exposta do fémur esquerdo, fractura do cúbito esquerdo e fractura de ambas as colunas do acetábulo esquerdo, tendo sido sujeito a vários tratamentos que se prolongarão no futuro, ficando a sofrer dificul- dades de locomoção e ligeira claudicação com o membro inferior esquerdo, duas cicatrizes no membro superior esquerdo e 8 cicatrizes no membro inferior esquerdo, afectado com uma incapacidade permanente geral de 10%, acrescida de 5% a título de dano futuro, continuando a
ter dores e desconforto que se irão prolongar até ao fim da sua vida, considera-se como equili- brada, justa e equitativa a indemnização compensatória de 30.000 € fixada pela Relação a título de danos não patrimoniais.
V - Considerando que a incapacidade permanente geral de 10%, acrescida de 5% a título de dano futuro, de que o autor ficou afectado é impeditiva do exercício da actividade profissional de guarda-nocturno que o mesmo vinha exercendo, bem como do exercício de qualquer tipo de trabalho que implique esforços físicos, nomeadamente deambulação prolongada, permanência em pé ou sentado durante períodos de tempo consideráveis e transporte de pesos, sendo no entanto compatível com outras profissões da área da sua preparação técnico-profissional (indi- ferenciada), desde que não impliquem esforços físicos como os referidos, embora o seu desempenho exija ao Autor esforços suplementares, deverá ser considerado, como ponto de partida, para o cálculo da indemnização por danos futuros decorrentes da perda da capacidade de ganho uma incapacidade geral de 100% para o exercício da sua profissão ou similar.
VI - Por outro lado, o único rendimento que nos oferece garantias de fiabilidade com previsível segurança para o cálculo a fazer é o que auferiu como guarda-nocturno (até 9 dias antes do aci- dente) e que era de 600,42 € mensais.
VII - Considerando a idade da vítima - 20 anos -, o n.º de anos até atingir a reforma - 45 anos -, o valor índice de 24,77545 que corresponde a este n.º de anos de acordo com a tabela decorrente da aplicação do programa Excell à taxa de juro de 3%, o rendimento anual líquido do Autor (600,42 € x 14 = 8.405.88 €), a taxa de IPP de 100%, e a não concorrência da vítima para a lesão, chegamos a um valor inicial de 208.259 €, assim calculado: 8.405.88 € x 24,77545 x 100%).
VIII - Uma vez que a utilização das fórmulas matemáticas ou tabelas financeiras só pode servir para determinar o minus indemnizatório, afigura-se-nos que o valor de 150.000 € atribuído na 1.ª instância constitui um valor equilibrado para a indemnização atribuída a título de danos futu- ros.
IX - Já tendo a Ré seguradora efectuado o pagamento de importâncias arbitradas na providência cautelar apensa a título de renda provisória, impõe-se descontar esses valores à indemnização final a atribuir. O acórdão recorrido, ao mandar descontar esses valores, não violou o disposto no art. 660.º, n.º 2, do CPC, uma vez que apenas reconheceu que a indemnização começou logo a ser paga através das importâncias arbitradas no apenso.
15-01-2008
Revista n.º 4057/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Acção de preferência Prédio urbano Prédio rústico
Direito de preferência Omissão de pronúncia
Baixa do processo ao tribunal recorrido Respostas aos quesitos
Factos conclusivos
I - A designação de prédio misto retrata apenas uma realidade de facto, que não jurídica (excepto para fins fiscais), visto que, para a lei civil, os prédios são rústicos ou urbanos, sendo que a ideia essencial que preside à distinção consiste em se tratar de solo (porção de solo delimitado) ou construção nele implantada (cfr. art. 204.º, n.º 2, do CC).
II - Perguntando-se no quesito se a parte rústica do prédio “está economicamente afecta e dependen- te da sua parte urbana”, deverá ter-se como não escrita a resposta de provado que lhe foi dada,
por analogia com o disposto no art. 646, n.º 4, do CPC, uma vez que tal quesito apresenta uma formulação puramente conclusiva, não contendo em si qualquer facto material.
III - Será, pois, com base nos factos materiais disponíveis nos autos que se terá de concluir pela natureza urbana ou rústica do prédio em causa. Tratando-se de uma “quinta” com 34,360 m2, na qual se encontra implantada uma morada de casas com 3 compartimentos, casa de banho, casa de jantar e cozinha, com a área coberta de 72 m2 e logradouro de 128 m2, estando a área de 3000 m2 afecta ao cultivo de hortícolas (regadio), sendo a restante área de 28.000 m2 um terreno com aptidão cultural arvense, onde se encontram implantados sobreiros, não é possível considerar que há prevalência do fim habitacional sobre a exploração rural da maioria do solo, antes pelo contrário, sendo de classificar o prédio objecto do direito de preferência que aqui se quer fazer valer como prédio rústico.
IV - Tendo a Relação, em face da qualificação que fez do prédio como urbano, decidido julgar improcedente a presente acção de preferência, não conhecendo da apelação intentada pelos Autores, já que as questões e recurso ficaram prejudicados pela solução encontrada, torna-se necessária, alterada que foi agora tal qualificação, conhecer das restantes questões suscitadas na apelação.
V - Surge, assim o problema de saber se este Supremo Tribunal se deve substituir à Relação no conhecimento das ditas questões e recurso, nos termos do disposto no art. 715.º, n.ºs 2 e 3, do CPC. Se, por um lado, o art. 726.º, ao ressalvar apenas o n.º 1 do art. 715.º, parece inculcar a ideia de que deve o STJ substituir-se à Relação, conhecendo das questões que esta não apre- ciou por as julgar prejudicadas pela solução dada ao litígio, por outro lado, quando se trata de nulidade por omissão de pronúncia (art. 668.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC), determina a lei a baixa do processo à Relação (art. 731.º, n.º 2, do CPC) retirando ao STJ o poder de se substituir ao Tribunal recorrido, impondo a solução da mera cassação.
VI - Inclinamo-nos para esta última solução, por ser a mais lógica e que melhor se harmoniza com o sistema (cfr. designadamente a solução da lei quanto ao agravo de 2.ª instância - art. 762.º, n.º 2, do CPC). No caso concreto, ainda que se pudesse defender a regra da substituição (art. 715.º, n.º 2, do CPC) quanto às restantes questões colocadas no âmbito da apelação dos Réus, já o mesmo não seria defensável em relação ao recurso de apelação dos Autores, que globalmente não foi conhecido, situação que não cabe na letra ou sequer no espírito do n.º 2 do art. 715.º acima referido.
VII - Deverão, por isso, os autos baixar à Relação para aí se conhecerem as questões suscitadas pelos Réus na sua apelação e que foram tidas por prejudicadas face à solução dada ao litígio, bem como, se disso for caso, se conhecer também da apelação dos Autores, igualmente tida por prejudicada pela decisão ora revogada.
15-01-2008
Revista n.º 4320/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de compra e venda Imóvel destinado a longa duração Condomínio
Propriedade horizontal Defeitos
Prazo de caducidade
I - O prazo para serem denunciados os defeitos existentes nas partes comuns (1 ano) inicia-se, nos termos do art. 1225.º, n.º 2, do CC, com o conhecimento daqueles defeitos pelo Administrador do Condomínio, ou seja, com a entrega das partes comuns aos órgãos de administração do Condomínio, e não com o conhecimento que os condóminos tiveram dos defeitos.
II - Para a contagem desse prazo de caducidade, apenas releva o auto de recepção definitiva e não o auto de recepção provisória. Com efeito, tendo as partes declarado que os trabalhos executados se encontravam em condições de serem recebidos provisoriamente, apesar de subsistirem algumas pequenas anomalias, não pode ter-se esse momento como data da entrega para efeitos de início do prazo de caducidade, já que os próprios intervenientes reconhecem que a obra apresenta defeitos.
15-01-2008
Revista n.º 4226/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Graduação de créditos Crédito laboral Crédito hipotecário Lei interpretativa
Aplicação da lei no tempo
I - O disposto no art. 377.º do Código do Trabalho é aplicável a todos os direitos de crédito dos trabalhadores constituídos desde o dia 28-08-2004, independentemente de derivarem de rela- ções jurídicas laborais ou de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho celebrados ou aprovados, conforme os casos, antes ou depois daquela data - cfr. arts. 3.º e 21.º, n.º 2, al. e), da Lei n.º 35/2004, de 29-07 (que regulamentou a Lei n.º 99/2003, de 27-08).
II - O concurso de credores abre-se com o trânsito em julgado da sentença que declara a falência, sendo a essa data que se deve atender para definir as situações jurídicas provenientes das rela- ções jurídicas havidas entre os seus credores. Com a declaração da falência surgiu o direito ou a situação jurídica dos credores verem graduados os seus créditos, de acordo com as garantias constituídas.
III - No caso concreto, os direitos de créditos reclamados pelos trabalhadores estavam vencidos e eram exigíveis em razão da declaração da falência da respectiva empregadora antes da própria entrada em vigor do Código do Trabalho, pelo que é inaplicável o disposto no art. 377.º do Código do Trabalho.
IV - A nova redacção introduzida pelo DL n.º 38/2003, de 08-03, no art. 751.º do CC constitui nor- ma interpretativa que, nos termos do art. 13.º, n.º 1, do CC, se integra nas leis que atribuíram aos créditos laborais privilégio imobiliário geral.
V - Assim sendo, os reconhecidos créditos dos trabalhadores emergentes de contrato de trabalho em apreço nos autos não podem ser graduados à frente dos créditos que têm garantia hipotecária anterior, por lhes ser aplicável o regime do art. 749.º do CC.
15-01-2008
Revista n.º 4238/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx
Contrato de seguro Seguro de vida Contrato de adesão
Interpretação da declaração negocial
I - O contrato de seguro é um contrato formal, que se regula pelas estipulações da respectiva apólice não proibidas por lei e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições do Código Comercial
(cfr. arts. 426.º e 427.º do CCom), e que é definido em geral como a convenção pela qual uma seguradora se obriga, mediante retribuição a pagar pelo segurado, a assumir determinado risco, e, caso ele se concretize, a satisfazer ao segurado ou a terceiro uma indemnização pelo prejuízo ou um montante previamente estipulado.
II - Trata-se de um contrato de adesão, definido este como o contrato que integra cláusulas gerais que foram elaboradas sem prévia negociação individual e que proponentes ou destinatários se limitam a subscrever, e, consagrada nele a obrigação de garantia de pagamento, ao beneficiá- rio, da quantia devida pelos segurados, configura-se como um contrato a favor de terceiro (art. 443.º, n.º 1, do CC).
III - Tendo sido celebrado, em 23-08-2000, entre o Autor e a sua então noiva, como mutuários, e um determinado Banco, como mutuante, um contrato de mútuo com hipoteca, confessando-se aqueles devedores da importância de 25.000.000$00, que seria entregue aos mutuários à medi- da que as obras de construção a efectuar no prédio rústico hipotecado fossem sendo realizadas, e tendo, na mesma data, sido celebrado entre aqueles Autor e noiva, na qualidade de segurados, com a ora Ré, na qualidade de seguradora, um contrato de seguro do ramo vida, o qual, em conformidade com as respectivas condições gerais e especiais, garante o pagamento do “capital em dívida ao (Banco) beneficiário” no caso de ocorrer a morte do segurado, vindo a segurada, então já esposa do Autor, a falecer em 28-12-2000, altura em que do montante do empréstimo concedido já tinham sido utilizados pelo Autor 15.000 contos, não pode a Ré limitar-se a pagar esta quantia ao Banco, pois deverá entender-se que a expressão capital em dívida se reportava a todo o capital seguro, deduzido das prestações entretanto pagas pelos segurados.
IV - Tal resultado interpretativo coincide com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição dos segurados, podia deduzir dos termos da apólice de seguro, visto ser lógica a con- clusão de que, encontrando-se segura a totalidade do capital, e sendo em relação a essa totali- dade que o prémio do seguro fora calculado, o pagamento garantido seria também o da totali- dade do mesmo capital, dado que esse montante seria o que ficaria em dívida pelos segurados ao mutuante em consequência do oportuno cumprimento do contrato de mútuo, ressalvado apenas, como é óbvio, o montante das prestações entretanto pagas pelos mutuários.
15-01-2008
Revista n.º 2730/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Responsabilidade civil por facto lícito Escavações
Nexo de causalidade
I - São requisitos do direito de indemnização previsto no art. 1348.º do CC, em primeiro lugar, a abertura de minas ou poços ou a feitura de escavações num determinado prédio pelo seu pro- prietário; depois, a privação, nos prédios vizinhos, em resultado dessas obras, do apoio neces- sário para evitar desmoronamentos ou deslocações de terra, privação essa que em si já constitui um dano; além disso, com ou sem aquela privação, a produção de outros danos para os proprie- tários vizinhos, consistentes na concretização desses desmoronamentos ou deslocações, ou na ameaça dessa provável concretização, ou noutros; finalmente, o nexo de causalidade entre os danos e as obras.
II - Tal nexo pode ser considerado sob duas vertentes: a do nexo naturalístico, que constitui matéria de facto, insindicável por este Supremo, e a do nexo de adequação, que integra matéria de direito, que este Supremo pode sindicar. Só que a apreciação desta adequação pressupõe a pré- via verificação do nexo naturalístico, a fim de este Supremo poder verificar se esse facto causal constitui ou não causa adequada; e, não se demonstrando a existência do nexo-facto, não há lugar também a que se possa afirmar a sua adequação.
III - Não se justifica a pretendida interpretação extensiva do art. 1348.º, n.º 1, do CC, cujo teor mos- tra bem traduzir os limites do pensamento do legislador. Além disso, as hipóteses em que haja escavações num prédio de um proprietário que causem danos noutro prédio de proprietário diferente sem que haja privação do apoio necessário para evitar desmoronamento ou desloca- ções de terra, não cabendo na previsão daquele n.º 1 como geradores do direito de indemniza- ção, apenas caberiam na do seu n.º 2, mas sempre sem que se pudesse prescindir do menciona- do nexo de causalidade.
15-01-2008
Revista n.º 4250/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Citação
Sociedade comercial Sociedade anónima Administrador Renúncia
Registo comercial
I - Pode considerar-se regularmente citada a sociedade comercial, ora Ré, se a citação foi efectuada na pessoa de um seu antigo administrador, ora agravado, que renunciara já às suas funções, tendo caducado o registo (provisório) dessa renúncia, por não ter sido convertido em definitivo (art. 391.º, n.º 4, do CSC, e 14.º do CRgCom).
II - O registo da renúncia não é elemento constitutivo desta: a renúncia existe e é eficaz desde que se verifique o condicionalismo previsto no art. 404.º do CSC, ainda que não registada.
III - Portanto, mesmo que designado por prazo certo, na hipótese de renúncia, o administrador renunciante não se mantém em funções até nova designação (salvo se esta tiver lugar antes de a renúncia produzir efeito), mas apenas até ao final do mês seguinte àquele em que tiver comuni- cado a sua renúncia, ou antes, se for logo designado ou eleito substituto.
IV - Esta solução compreende-se na medida em que a renúncia implica que o renunciante não se sente capaz ou não se encontra na disposição, por qualquer motivo de ordem pessoal, de bem desempenhar as funções de administrador, o que justifica, até como salvaguarda dos interesses sociais, que não lhe seja imposto o prolongamento da sua administração.
V - Embora seja certo que renúncia produz efeitos no que se refere às relações entre o renunciante e a sociedade comercial (art. 13.º, n.º 1, do CRgCom), resulta do disposto no art. 14.º do CRg- Com que a mesma renúncia não pode produzir efeitos em relação a terceiro, tanto mais que a possibilidade de este propor acções contra a sociedade se encontra no domínio do comércio jurídico, como meio de defesa dos direitos que sobre ela lhe assistam.
VI - Logo, para um terceiro, o ora Autor, tudo se passa como se o administrador renunciante conti- nuasse a ser administrador da sociedade, ora Ré, podendo em consequência pretender a citação da Ré na pessoa daquele administrador, que, para ele Autor, continuava a ter a posição de representante legal da mesma, não ocorrendo em consequência violação do disposto no art. 231.º, n.º 1, do CPC.
VII - Caberia à sociedade ora Ré (art. 17.º do CRgCom) providenciar pelo registo definitivo da cessação de funções a fim de a poder opor a terceiro, como o Autor, com vista a impedir que algum interessado a pudesse accionar ou negociar com ela sem o fazer através do seu novo representante legal, que para tal interessado inexiste sem o respectivo registo.
VIII - Não o tendo feito, só de si se poderá queixar, tendo de suportar as consequências daí adve- nientes, não se podendo furtar à demanda judicial mediante aproveitamento de uma renúncia que não curou de registar definitivamente, não lhe podendo também por isso aproveitar a invo- cação da renúncia feita pelo administrador renunciante, ora agravado.
IX - O agravo por este interposto na 1.ª instância, da decisão que julgou a Ré regular e pessoalmen- te citada, não devia ter sido admitido, uma vez que não ocorre a situação prevista no art. 680.º, n.º 2, do CPC.
X - Com efeito, o despacho da 1.ª instância em nada responsabiliza o agravado perante o Autor nem possibilita que ele seja responsabilizado perante este, a nada podendo o agravado ser condena- do no presente processo por não ser parte nele nem nada contra ele ser pedido; e também do despacho da 1.ª instância não deriva qualquer possibilidade de responsabilização do agravado, de forma directa e imediata ou não, perante a Ré, tanto mais que sempre poderá invocar, peran- te esta, a sua renúncia, mesmo não registada.
15-01-2008
Agravo n.º 4366/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Acção de divórcio Extinção da instância
Numa acção de divórcio intentada com fundamento em separação por mais de um ano e sem oposi- ção do outro cônjuge (art. 1781.º, al. c), do CC), a notícia trazida aos autos pela R. de que, entretanto, já intentou uma outra acção de divórcio contra o A. só pode significar o seu acordo com a “solução-divórcio”, não podendo nunca justificar a extinção da instância.
15-01-2008
Agravo n.º 4625/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxx (Relator) *
Xxxxx Xx Xxxxx Xxxx
Contrato de mútuo Aval
Fiança
Interpretação da declaração negocial Benefício da excussão prévia
O fiador que, num concreto contrato de mútuo, declarou aceitar expressamente todos os termos e condições de tal negócio, assumindo, nos mesmos termos dos beneficiários, a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações pecuniárias dele emergentes, vinculou-se perante o mutuante sem o benefício da prévia excussão dos seus bens.
17-01-2008
Revista n.º 3110/07 - 7.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxxx (Relator) Maria dos Prazeres Beleza Xxxxxxxx xx Xxxxx
Recurso de agravo na segunda instância Admissibilidade de recurso
Justo impedimento
Não coincidindo quer a situação de facto, quer a lei aplicada, nos acórdãos fundamento e recorrido, não ocorre a contradição jurisprudencial na qual o recorrente baseia a excepção de admissibili-
dade do agravo para o STJ (art. 754.º, n.º 2, 2.ª parte, do CPC), pelo que não deve ser conheci- do o objecto do recurso.
17-01-2008
Agravo n.º 1755/07 - 7.ª Secção Xxxxxxx Xxxx (Relator)
Pires da Rosa Custódio Montes
Contrato de arrendamento Arrendamento rural Oposição
Denúncia
I - Revelando os factos provados que o arrendatário tinha, ao tempo da denúncia do contrato de arrendamento rural, 70 anos de idade e a sua mulher 69, auferindo pensões de reforma no total de 498,00 € mensais, recebendo rendimentos prediais no montante anual de 9.960,00 €, e tendo 3 prédios urbanos no valor global de 375.000,00 €, a preços de mercado, que podem e devem ser por eles rentabilizados, deve concluir-se que o despejo da “Quinta X” não põe em sério ris- co a subsistência do arrendatário e do seu agregado familiar, como exige o art. 19.º, n.º 1, da LAR.
II - Este normativo, ao invés do previsto nos arts. 15.º, n.º 3, e 18.º, n.º 1, do DL n.º 201/75, de 15- 04, e da Lei n.º 76/77, de 29-09 (na redacção dada pela Lei n.º 76/79, de 03-12), respectiva- mente, não se contenta para a procedência da oposição à denúncia com o abaixamento do nível de vida do arrendatário ou com o simples risco da sua subsistência económica e do seu agrega- do familiar; o art. 19.º, n.º 1, da LAR é bem mais exigente, pois prescreve antes o risco sério.
17-01-2008
Revista n.º 2630/07 - 7.ª Secção Xxxxxxx Xxxx (Relator)
Pires da Rosa Custódio Montes
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
Presunções judiciais Acidente de viação
I - O STJ pode fixar factos por via normativa, mas não por convicção (art. 722.º, n.º 2, do CPC).
II - Uma conclusão retirada dos factos é ainda o resultado de uma convicção do julgador, insindicá- vel assim pelo STJ, salvo no caso de manifesto ilogismo da conclusão.
III - Nada tem de ilógico a conclusão retirada pelas instâncias de que o concreto condutor de um veículo pesado, ao realizar a manobra de marcha-atrás não podia avistar alguém que seguia a pé na sua retaguarda; apenas o seria se os factos e as regras da experiência desmentissem de forma inequívoca tal versão.
17-01-2008
Revista n.º 4229/07 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Recurso de revisão
Admissibilidade de recurso Nulidade de acórdão
Caso julgado formal
I - Tendo o processo baixado à Relação a fim de aí ser suprida uma omissão de pronúncia, sendo esta decidida e interpondo uma das partes recurso de agravo na segunda instância, pode o STJ não receber tal recurso se considerar que não estão concretamente preenchidos os requisitos a que se refere o art. 754.º do CPC.
II - Não existe qualquer contradição entre este despacho de não recebimento do recurso e o anterior despacho, proferido pelo anterior relator do processo, que ordenou a baixa do processo à Rela- ção para, em conferência, aí ser suprida uma omissão de pronúncia.
17-01-2008
Agravo n.º 2253/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Xxxx Xxxxxxx
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Acção executiva Oposição à execução
Providências de recuperação Concordata
Avalista
I - Do DL n.º 177/86, de 02-07 (alterado pelo DL n.º 10/90, de 05-01), que instituiu o processo especial de recuperação de empresas, decorria o regime segundo o qual os credores concorda- tários, após a homologação da concordata, ficavam inibidos de exercer contra a empresa os seus direitos, excepto os relativos à parte abatida nos créditos, conservando, no entanto, os direitos contra co-obrigados ou garantes da empresa.
II - O art. 13.º, n.º 1, do DL n.º 10/90, veio tornar aplicável aos co-obrigados ou garantes tal inibição desde que os titulares dos respectivos créditos tivessem aceitado, votando em conformidade na assembleia de credores, as providências tomadas.
III - No entanto, no caso de a medida adoptada ser a concordata, os credores conservam todos os seus direitos contra os garantes ou co-obrigados, independentemente de terem ou não aceitado ou votado tal medida, podendo demandá-los autonomamente antes de decorrido o prazo previs- to na medida de recuperação.
17-01-2008
Revista n.º 4036/07 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de mútuo Taxa de juro
Condenação em quantia a liquidar
I - Não é admissível relegar para execução de sentença a determinação da taxa de juro de um con- creto empréstimo que não conseguiu ser demonstrada.
II - Com efeito, a falência de prova quanto a certo facto essencial para o apuramento do montante dos juros não justifica a dilação para momento posterior.
17-01-2008
Revista n.º 4355/07 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxx xx Xxxxx
Compropriedade Propriedade horizontal Usucapião
I - A usucapião, para gerar a constituição do regime da propriedade horizontal, implica uma actua- ção concordante de todos os compossuidores do prédio, auto-limitando os respectivos poderes de facto a cada uma das partes que o compõem, e exercendo a posse conjunta sobre aquelas que são de utilização comum, pelo período de tempo necessário para essa transformação quali- tativa.
II - Implica, pois, a susceptibilidade de usucapião de um tal direito - propriedade horizontal - um acordo tácito de todos os comproprietários, futuros condóminos.
17-01-2008
Revista n.º 4599/07 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de empreitada Cláusula penal Presunção de culpa
I - É lícita a estipulação de cláusula penal no contrato de empreitada.
II - A cláusula penal pode ser compensatória ou moratória, exigindo esta modalidade a verificação dos requisitos da responsabilidade civil contratual, entre os quais a culpa do devedor, que neste âmbito se presume (art. 799.º, n.º 1, do CC).
17-01-2008
Revista n.º 4497/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Acidente de viação Responsabilidade pelo risco Culpa
Concorrência de culpas Incapacidade permanente parcial Danos futuros
Danos não patrimoniais
I - O art. 508.º, n.º 1, do CC tem o seu âmbito de aplicação cingido aos acidentes de viação sem culpa dos responsáveis, isto é, aos casos de responsabilidade pelo risco ou objectiva.
II - Estando assente que o embate entre os dois velocípedes se deu quando os respectivos conduto- res se cruzaram ao descrever uma curva na zona do eixo da via, é manifesto que ambos trans- grediram o preceituado nos arts. 3.º e 13.º, n.º 1, do CEst aprovado pelo DL n.º 114/94, de 03- 05 (então vigente) e concorreram causalmente para a eclosão do acidente, com culpa.
III - Considerando que o velocípede A circulava com um passageiro, sendo um veículo de apenas um lugar, deve-se entender que o risco dele na produção do acidente é maior, pois o passageiro atrapalha o condutor, aumenta o peso do veículo e põe em causa a sua estabilidade.
IV - Conclui-se, pois, pela atribuição ao condutor do velocípede A de 60% de culpa na eclosão do acidente e de 40% ao condutor do velocípede B.
V - Tendo a autora ficado a padecer, em consequência do acidente, de extensas e visíveis cicatrizes, dores e tristeza muito intensas e dificuldades de locomoção e flexão do joelho esquerdo, e atendendo ainda à sua idade (15 anos), tem-se por equitativa a quantia de 30.000,00 € e desti- nada ao ressarcimento dos danos não patrimoniais.
VI - Revelando os factos provados que a autora tinha 15 anos à data do acidente, entraria no xxxxx- xx xx xxxxxxxx xxx 00 xxxx, xxxxxxxxx (xxxx menos) o salário mínimo nacional (fixado em 1999 em 61.300$00) e ficou a padecer de uma IPP de 30 %, cifrando-se nos 65 anos de idade a expectativa da sua vida activa, tem-se por adequada a indemnização de 50.000,00 € (e não 60.000,00 €, conforme entendeu a Relação) destinada ao ressarcimento dos danos patrimoniais futuros.
17-01-2008
Revista n.º 4527/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Expropriação por utilidade pública
Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça Admissibilidade de recurso
Oposição de julgados Xxxxxxx fundamento
I - O acórdão uniformizador de 30-05-1997, publicado no DR, I-A Série, de 15-05-1997, interpre- tando o art. 64.º, n.º 2, do CExp de 1991, vedou o recurso para o STJ das decisões que fixam indemnização por expropriação por utilidade pública.
II - Este vedar de recurso não afasta os casos, excepcionais, de admissibilidade, como os do art. 678.º, n.º 4, do CPC, ou seja, o da decisão de que se recorre estar em contradição com outra dessa ou de diferente Relação.
III - O sítio xxx.xxxx.xx é um ponto de referência comum entre quem lida com a vida judicial, pelo que é admissível a indicação de uma decisão ali publicada integralmente a título de acórdão fundamento.
17-01-2008
Incidente n.º 3825/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Relator)
Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Acidente de viação Morte
Danos futuros
Gabinete Português da Carta Verde Fundo de Garantia Automóvel
I - A indemnização por dano futuro tem sido atribuída (pacificamente) a quem, em consequência de acidente causado por terceiro, fica com uma incapacidade permanente para o trabalho.
II - Trata-se claramente de um dano, futuro e previsível do próprio lesado, um dano em que o lesado se viu privado em consequência de acto ilícito de outrem; a perda de um rendimento que ele, titular de direitos, como ser dotado de personalidade e capacidade jurídica, poderia obter e dei- xou de obter em consequência do acidente (arts. 66.º e 67.º do CC).
III - Porém, com a morte, a vítima (de acidente de viação) deixa de ser titular de direitos, deixa de poder, consequentemente, obter rendimentos resultantes de relações com outrem, relações que decorrentemente, se extinguiram (art. 68.º do CC).
IV - Daí que extintas, não possam transferir-se para os seus sucessores (arts. 2024.º e 2025.º do CC).
V - O Gabinete Português da Carta Verde não pode ser responsabilizado pelo acidente ocorrido em Portugal no qual interveio um veículo automóvel sem seguro e sem matrícula (dado que a que ostentava não era válida).
VI - Tal responsabilidade cabe, antes, ao Fundo de Garantia Automóvel.
17-01-2008
Revista n.º 3920/07 - 7.ª Secção Mota Miranda (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Procuração
Negócio consigo mesmo Contrato de compra e venda Conflito de interesses Contrato-promessa
I - O negócio celebrado pelo representante consigo mesmo é anulável, só o não sendo se houver consentimento do representado ou inexistência de conflito de interesses (art. 261.º, n.º 1, do CC).
II - No caso da compra e venda, embora quem compra o faça no seu interesse e quem vende realize também um interesse próprio, o certo é que em tal negócio não ocorre necessariamente conflito de interesses entre quem vende e quem compra, em termos de se dever afirmar que a prossecu- ção do interesse do comprador se faz à custa do interesse do vendedor.
III - Ademais, não há conflito de interesses quando o conteúdo do negócio se encontra prefixado pelo representado, assim como também não o há nos casos em que o representante actua no cumprimento de um contrato-promessa anterior.
17-01-2008
Revista n.º 4024/07 - 7.ª Secção Xxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Embargos de terceiro Direito de crédito
I - Os embargos de terceiro estão previstos para todos os que, não sendo partes na acção, sejam atingidos no seu direito real de posse ou direito incompatível com a finalidade da penhora determinada judicialmente num processo executivo.
II - A invocação pelo embargante, terceiro, da titularidade de um direito de crédito sobre o executa- do, não afecta o direito do exequente, titular de um direito com preferência de pagamento, como lhe confere a concreta penhora de um imóvel (art. 822.º do CC).
III - Com efeito, esse direito de crédito não colide com a execução, penhora e venda daquele imóvel nem impede a realização da função da diligência decretada; antes se concilia e coexiste, não obstando a que se proceda à venda do bem.
IV - Logo, os embargos de terceiro não são o meio processual próprio para o embargante fazer valer o seu direito de crédito sobre o executado.
17-01-2008
Revista n.º 4239/07 - 7.ª Secção Mota Miranda (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Capitão de porto Detenção
Navio
Acto administrativo Tribunal competente Tribunal Marítimo Prazo de caducidade
I - A decisão do Capitão do Porto de Lisboa que determinou a detenção do navio no âmbito de uma inspecção realizada ao abrigo do disposto no Regulamento de Inspecção de Navios Estrangei- ros, aprovado pelo DL n.º 195/98, de 10-07 - (RINE) -, reveste natureza administrativa (arts. 1.º, n.º 1, e 4.º do ETAF e 120.º do CPA).
II - Tal decisão pode ser impugnada e eventualmente anulada com fundamento na sua ilegalidade, a pedido dos interessados (arts. 50.º e 55.º do CPTA e 23.º, n.º 1, do RINE).
III - Para conhecer dessa impugnação - apesar de o seu objecto revestir natureza administrativa - são competentes os tribunais marítimos (art. 23.º, n.º 1, do RINE).
IV - Para impugnar esse acto anulável dispõe o interessado de prazo: um ano, se a impugnação for promovida pelo Ministério Público; três meses, nos restantes casos.
V - Tal prazo inicia-se com a notificação do interessado, ou seja, e nas situações de detenção do navio, do comandante do navio (art. 23.º do RINE).
17-01-2008
Revista n.º 4438/07 - 7.ª Secção Mota Miranda (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
IFADAP
Título executivo Inconstitucionalidade
A circunstância de o DL n.º 31/94, de 05-02, não conter a assinatura do ministro competente em razão da matéria (no caso, o Ministro da Justiça), não acarreta a inconstitucionalidade formal das certidões de dívida emitidas pelo IFADAP enquanto títulos executivos.
17-01-2008
Incidente n.º 3111/07 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx
Gravação da prova Nulidade processual Prazo de arguição Alegações de recurso
I - Consubstancia nulidade processual secundária (arts. 201.º, n.º 1, e 204.º a contrario, do CPC), a arguir mediante reclamação, nos termos do art. 205.º, n.ºs 1 e 3, do supracitado diploma legal, a deficiência (ou mesmo inexistência) de gravação da prova prevista no art. 9.º do DL n.º 39/95, de 15-02.
II - Não constando dos autos a data da entrega da cópia a que alude o art. 7.º, n.º 2, do nomeado DL, deve ter-se por tempestiva a arguição da nulidade processual radicada no vertido em I, operada nas alegações do recurso de apelação.
17-01-2008
Revista n.º 4233/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Recurso de apelação Reapreciação da prova Poderes da Relação Matéria de facto
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Recurso de revista
Recurso de agravo na segunda instância Admissibilidade de recurso
I - O uso indevido dos poderes pelo art. 712.º, n.º 2, do CPC conferidos, no concernente ao critério nele acolhido de reapreciação da prova gravada, não consubstanciando nulidade, deve conduzir ao uso, pelo STJ, da faculdade conferida pelo art. 729.º, n.º 3, do predito Corpo de Leis, uma vez que a ampliação da matéria de facto prescrita neste último normativo pode decorrer da rea- preciação de factos que o terão sido deficientemente.
II - Não é sindicável pelo STJ a decisão da matéria de facto das instâncias fundada em depoimento de testemunhas e documentos não dotados de força probatória plena.
III - No recurso de revista só devem ser apreciados os fundamentos repousantes em violação de lei de processo, cumulados com arrimo no art. 722.º, n.º 1, do CPC, se se verificarem os requisitos elencados no n.º 2 do art. 754.º de tal compêndio normativo.
17-01-2008
Revista n.º 4333/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Alegações repetidas Xxxxxxx por remissão
Não se mostrando o acórdão impugnado elaborado por remissão (art. 713.º, n.º 5, do CPC), não se estando ante caso excepcional previsto no art. 722.º, n.º 2, nem havendo lugar ao fazer jogar o plasmado no art. 729.º, n.º 3, ambos do CPC, dissenso inocorrendo quanto à bondade da deci- são sob recurso e respectivos fundamentos, a alegação do recurso instalado para STJ não pas- sando de uma mera reprodução da que foi apresentada perante a Relação, justifica-se, plena-
mente, o uso da faculdade remissiva, ao abrigo do n.º 5 do art. 713.º, ex vi do exarado no art. 726.º, os dois, ainda, do predito Corpo de Leis.
17-01-2008
Revista n.º 4432/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx Xxxx Xxxxxxxx (xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxx (vencido)
Acidente de viação
Incapacidade permanente parcial Danos não patrimoniais
Danos futuros Danos patrimoniais
Cálculo da indemnização Equidade
I - A indemnização por danos não patrimoniais, exigida por uma profunda e arreigada consideração de equidade, sem embargo da função punitiva que outrossim reveste, tem por fim facultar ao lesado meios económicos que, de alguma sorte, o compensem da lesão sofrida, por tal via repa- rando, indirectamente, os preditos danos, por serem hábeis a proporcionar-lhe alegrias e satis- fações, porventura de ordem puramente espiritual, que consubstanciam um lenitivo com a vir- tualidade de o fazer esquecer ou, pelo menos, mitigar o havido sofrimento moral.
II - Tal indemnização não deve ser simbólica ou miserabilista, antes significativa, que não arbitrá- ria, na fixação do seu quantum, a levar a cabo não olvidado o exarado no art. 496.º, n.º 3, do CC, urgindo, inter alia, não obliterar os patrões de indemnização que vêm sendo adoptados pela jurisprudência, especialmente a mais recente, tal-qualmente as flutuações do valor da moeda.
III - A incapacidade parcial permanente (IPP), mesmo que não impeça o lesado de continuar a tra- balhar, que se não prove, sequer, ser fonte de quebra, actual, da sua remuneração, constitui um dano patrimonial indemnizável, na fixação de indemnização por danos futuros em handicap repousante, a operar com a temperança própria da equidade (art. 566.º, n.º 3, do CC), sem fic- cionar que a vida física do sinistrado correspondente à sua activa, importando ter presente que cálculos matemáticos ou tabelas financeiras a que não raro se recorre no achamento da justa indemnização supracitada, feita dedução correspondente à entrega imediata do capital, não são infalíveis, como instrumentos de trabalho, em ordem à obtenção da justa indemnização, antes devendo ser tratados.
17-01-2008
Revista n.º 4538/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Direito de propriedade Usucapião
Registo predial Ónus de alegação
I - A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade e não é condicionada pela sua inscrição no registo.
II - A produção dos seus efeitos subordina-se ao cumprimento de determinados pressupostos, o principal dos quais é o decurso do tempo em que aquele que pretender fazer valer o efeito aquisitivo da usucapião - ser proprietário - pratica actos concretos de detenção ou fruição sobre o bem com o comportamento consciente e querido como se fosse titular do direito real corres- pondente aos actos cometidos.
III - A usucapião não produz efeito ipso jure; carece de ser invocada, implícita ou tacitamente, por banda do titular do direito (arts. 303.º, 342.º, n.º 1, e 1292.º, todos do CC, e art. 5.º, n.º 2, al. a), do CRgP).
17-01-2008
Revista n.º 3003/07 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx (Relator) Xxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Falência
Impugnação pauliana Má fé
Matéria de facto Acto oneroso Ónus da prova
I - A má fé, enquanto requisito da impugnação pauliana, consiste na consciência do prejuízo que o negócio questionado cause ao credor, não sendo, por isso, necessário comprovar a intenção de originar tal prejuízo.
II - No art. 612.º, n.º 1, do CC, na parte em que prescreve que “o acto oneroso só está sujeito a impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má fé; se o acto for gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro agissem de boa fé (…)”, o legislador teve apenas em vista a impugnação de actos posteriores ao crédito, pois quanto aos actos anteriores ao cré- dito rege a 2.ª parte da al. a) do art. 610.º do CC.
III - O art. 612.º do CC é, assim, um complemento do art. 610.º do mesmo Código e não uma dispo- sição revogatória daquele preceito ou, mesmo, interpretativa.
IV - O art. 610.º, al. a), 2.ª parte, do CC não faz qualquer destrinça entre actos de natureza onerosa e gratuita nem é legítima a extensão do art. 612.º do CC como estabelecedor dessa distinção.
V - A existência da "consciência do prejuízo que o acto causa ao credor" é conclusão a extrair de factos que a patenteiem; ou seja, trata-se de pura matéria de facto cujos conhecimento e apu- ramento constituem prerrogativa exclusiva das instâncias, estando o STJ impedido de extrair ilações ou conclusões de factos provados.
VI - O art. 611.º do CC, ao prescrever que “incumbe ao credor a prova do montante das dívidas e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor”, representa uma excepção à regra geral contida no art. 342.º do CC.
17-01-2008
Revista n.º 3696/07 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx (Relator) Xxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Acção executiva Oposição à execução Reconvenção
I - A oposição à execução (embargos de executado) visa a extinção da execução mediante o reco- nhecimento da inexistência do direito do exequente ou da falta de um pressuposto, específico ou geral, da acção executiva; não é um meio de dedução de pedidos condenatórios autónomos, por parte do executado contra o exequente.
II - Logo, ao executado é vedado reconvir.
17-01-2008
Revista n.º 3961/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) Bettencourt de Faria
Xxxxxx Xxxxxx
Mandato sem representação Execução específica
I - No mandato sem representação, o mandatário, não obstante intervir por conta e no interesse do mandante, não aparece revestido da qualidade de seu representante.
II - Age em nome próprio, pelo que é ele, mandatário, que adquire os direitos e assume as obriga- ções decorrentes dos actos que celebra.
III - O mandatário sem representação é obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos através do mandato, operando-se tal transferência através de um acto de alienação específica.
IV - A execução específica, prevista no art. 830.º, n.º 1, do CC, apenas é aplicável à obrigação emergente de contrato-promessa, face à letra do indicado preceito e aos respectivos trabalhos preparatórios.
V - Por isso, o instituto da execução específica não tem aplicação à obrigação do mandatário de transferir para o mandante os direitos adquiridos em execução de mandato sem representação.
22-01-2008
Revista n.º 4417/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator) * Xxxxx Xxxxxxx
Nuno Cameira
Acidente de viação
Incapacidade permanente parcial Incapacidade geral de ganho Danos futuros
Danos não patrimoniais Cálculo da indemnização
I - Provado que, em consequência de acidente de viação sofrido aos 17 anos de idade, o autor apre- senta uma incapacidade permanente geral fixável em 70%, à qual acresce, a título de dano futuro mais 5%; as sequelas referidas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual do autor; à data do acidente o autor auferia o salário anual de € 6.298.46; ponderando como limite da vida activa, até ao qual deve ser compensada a perda de capacidade de ganho, a idade de 70 anos, e sabendo-se, no tocante às taxas de juro, situadas hoje à volta dos 3% a 4% ilíquidos, que tendem a subir e a fixar-se próximo dos 5%, sobretudo quando esteja em causa a remuneração de quantias mais elevadas, crê-se ser adequada e conforme à equidade a verba de
€ 125.000,00, a título de dano patrimonial futuro.
II - Provado ainda que, como consequência directa e necessária do embate, o autor sujeitou-se a consultas, exames, tratamentos, intervenções cirúrgicas e internamentos e fisioterapias; apre- senta sequelas do foro de cirurgia maxilofacial, do foro ortopédico, do foro otorrinolarintológi- co, do foro psiquiátrico, do foro oftalmológico, do foro neurológico, bem como do foro esto-
matológico, com colocação de prótese fixa nos dentes incisivos 3.1, 3.2, 4.1 e 4.2; ficou com cicatrizes no lábio e na região orbital esquerda, na anca, joelho e pulso; sofreu, sofre e sofrerá dores, incómodos e desgostos; terá que ingerir medicamentos e sujeitar-se a observação médica durante toda a vida, tem-se por equitativa a compensação de € 50.000,00, fixada pela Relação a título de danos não patrimoniais.
22-01-2008
Revista n.º 4499/07 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Acção executiva Penhora
Bens comuns do casal Transacção judicial Processo de inventário Partilha dos bens do casal Separação de meações Conferência de interessados
I - Efectuado o requerimento para separação de meações (inventário que segue as normas adjectivas próprias do inventário, com as especificidades dos arts. 1404.º a 1406.º do CPC), a instância executiva fica suspensa até à partilha. A partir deste momento prosseguirá sobre os bens penhorados se ficarem a pertencer ao executado, ou sobre outros que lhe tenham cabido, caso os penhorados não lhe couberem (mas fiquem a pertencer ao seu cônjuge).
II - Neste inventário, o cônjuge do executado tem o direito de escolha dos bens que hão-de formar a sua meação. Mas nesse caso, os credores podem reclamar contra essa escolha, fundamentando a sua queixa, inferindo-se do n.º 2 do art. 1406.º que o fundamento da reclamação só pode ser a má avaliação dos bens.
III - Teve aqui o legislador evidentes preocupações com os credores, pois, como é evidente, uma avaliação incorrecta, pode resultar em manifesto prejuízo deles. Note-se que o que se trata aqui é a possibilidade de o exequente vir a penhorar bens que couberam ao executado, sendo evi- dente o dano se existir uma avaliação por defeito dos bens escolhidos pelo cônjuge deste.
IV - Hoje o inventário pode findar na conferência de interessados (em caso de acordo dos interessa- dos e quando o juiz, atendendo à simplicidade da partilha, o consinta). Porém, mesmo nesta circunstância, a partilha terá que ser concretizada e depois judicialmente homologada em acta, onde constarão os elementos relativos à composição dos quinhões e a forma da partilha (art. 1353.º, n.º 6, do mesmo Código).
V - Mesmo que se entenda que o processo pode terminar com uma transacção, nela têm que inter- vir, para além dos interessados no inventário, os credores exequentes cuja penhora em bens comuns do casal originou a instauração do processo (para separação de meações - art. 293.º, n.º 2, do CPC).
VI - Tendo os interessados, no presente inventário para separação de meações, chegado a acordo, sem que estivesse presente a credora, exequente no processo principal, vindo a ser homologada por sentença a referida transacção, fazendo-se terminar o processo, inviabilizou-se a realização da partilha e a consequente adjudicação dos bens a cada um dos cônjuges (ou seja, o preenchi- mento dos respectivos quinhões), não se permitindo, assim, o prosseguimento da execução com penhora de bens.
VII - Deverá, pois, revogar-se a sentença homologatória da transacção, realizando-se nova confe- rência de interessados e subsequente partilha.
22-01-2008
Revista n.º 4033/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Contrato-promessa de compra e venda Xxxx
Incumprimento definitivo Perda de interesse do credor Interpelação admonitória Sinal
I - O retardamento na realização de uma prestação não equivale ao incumprimento do contrato, originando antes a mora.
II - O credor não pode resolver o contrato em razão da mora do devedor. Pode exigir o cumprimen- to da obrigação e indemnização pelos danos causados. Pode, igualmente, perante o art. 808.º n.º 1 do CC, transformar a mora em incumprimento definitivo.
III - Esta conversão tanto poderá suceder pela perda de interesse na prestação por banda do credor, como pela não realização da prestação no prazo que for, razoavelmente, fixado pelo credor (interpelação admonitória). A perda do interesse na prestação (o que se sucederá quando esta, apesar de ser fisicamente concretizável, deixou de ter oportunidade) é apreciada objectivamen- te. Deve-se na interpelação admonitória mencionar que a não realização da prestação no prazo implicará considerar-se como não cumprida a obrigação.
IV - Num contrato-promessa de compra e venda de um imóvel, numa carta em que a promitente compradora diz expressamente que “perdi definitivamente o interesse na celebração do contra- to prometido pelo que venho por este meio resolver o contrato prometido”, a declaração deve ser deve ser interpretada como resolutiva do contrato. Trata-se de uma declaração (receptícia) que se torna eficaz logo que chega ao destinatário, ou é dele conhecida, pelo que se tornou efi- caz logo que a promitente vendedora recebeu a dita carta e se inteirou do respectivo conteúdo.
V - Como a destinatária não aceitou a desistência de realização do negócio pedindo à promitente- compradora para reconsiderar, esta poderia desdizer-se e retirar a declaração de resolução do contrato. Se o fizesse, dada a posição da promitente vendedora (aberta a manter o contrato), a dita declaração poderia ter-se como invalidada e assim, o contrato-promessa poderia reputar-se como ressurgido. Não o tendo feito não se poderá deixar de retirar o consequente efeito, que é de reputar eficaz aquela declaração resolutiva.
VI - Existindo incumprimento do contrato por banda da promitente compradora, deve ter-se como perdido o sinal, a favor da parte contrária. Como tem sido entendido maioritariamente por este Supremo, o mecanismo sancionatório da perda do sinal, só deverá ser aplicado em caso de incumprimento definitivo e não na hipótese de simples mora do devedor.
22-01-2008
Revista n.º 4060/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Acidente de viação
Incapacidade permanente parcial Incapacidade geral de ganho Danos futuros
Danos não patrimoniais Cálculo da indemnização
I - Provado que em consequência do acidente a autora apresenta sequelas que determinam uma incapacidade parcial permanente de 65%; deixou de poder exercer enfermagem especializada para a qual possuía graduação e de que muito gostava, tendo mudado de carreira e dando agora aulas; deixou de exercer a pintura de porcelanas; à data do acidente auferia no exercício da sua actividade profissional de enfermeira o vencimento líquido mensal de 203.321$00 e da sua actividade de pinturas de porcelanas a quantia média ilíquida de cerca de 450.000$00; tendo a autora 33 anos de idade à data do acidente e considerando-se como limite da capacidade de ganho da lesada, uma idade de aproximadamente 70 anos, pelos danos patrimoniais futuros receberá a quantia global de 160.000,00 €, quantia que consideramos equilibrada e criteriosa.
II - Os tratamentos médicos a que foi submetida indiciam patentes transtornos, contrariedades e sofrimentos. Iguais sofrimentos revela a circunstância de se tratar de uma pessoa de 33 anos (isto é, ainda jovem) que antes era uma pessoa saudável, alegre, comunicativa, amante do des- porto e da vida activa, características que perdeu, passando a ser uma mulher triste, de difícil contacto, desconcentrada e ansiosa, que se viu parcialmente incapacitada para o resto dos seus dias. Um grande desgosto e frustração constitui o facto se ver compelida a mudar de carreira e abandonar a sua especialidade de que tanto gostava, bem como deixar de exercer a pintura de porcelanas, actividade que lhe dava grande satisfação e rendimento. As cicatrizes das cirurgias e a deformidade da face interna da coxa direita, bem como rigidez do cotovelo esquerdo, des- feiam-na, o que constitui dano estético assinalável atendendo ao sexo e à idade. Ponderando em todos os elementos salientados e ainda no valor actual da moeda, na ausência de culpa da lesada no evento, na situação económica da R. Seguradora (necessariamente desafogada) somos em crer ser equilibrado fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 35.000,00.
22-01-2008
Revista n.º 4248/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Acção executiva Execução de sentença
Execução para prestação de facto Cálculo da indemnização Liquidação prévia
Liquidação em execução de sentença Danos não patrimoniais
I - A acção executiva para prestação de facto positivo tem natureza complexa.
II - Tendo transitado em julgado a condenação exequenda que não é de indemnização, mas de repa- ração por reconstituição natural, já não podia o tribunal na liquidação da indemnização pela não prestação da obrigação de facto fungível pela qual os exequentes optaram, fazer o juízo de onerosidade excessiva, mas tinha de se limitar a calcular os danos decorrentes da não prestação daquele facto.
III - Em face da não prestação voluntária pela executada do facto em dívida, no prazo que lhe foi fixado para o efeito, foi pelos exequentes declarado pretenderem a indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação, conforme lhe é facultado pelo art. 933.º, n.º 1, do CPC. Por isso, nos termos do art. 934.º é aqui aplicável o disposto no art. 931.º, ou seja, a exe- cução converte-se em execução para pagamento de quantia certa, com prévia liquidação do montante da indemnização devida pela não prestação do facto objecto da sentença condenató- ria.
IV - Na fixação da referida indemnização, há que aplicar a regra legal prevista no n.º 3 do art. 566.º do CC, pois segundo esta na fixação do valor da indemnização, se não puder ser averiguado o
valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por pro- vados.
V - Estando em causa a fixação de uma indemnização decorrente de danos causados, haverá que reparar os danos não patrimoniais desde que existam e sejam merecedores de tutela jurídica.
VI - O facto de os referidos danos não constarem do título executivo não releva pois o título apenas contém a obrigação primitiva, ou seja, a prestação do facto fungível, sendo a indemnização a fixar decorrente não directamente do título executivo, mas da conduta inadimplente da execu- tada e da manifestação da vontade dos exequentes ao abrigo do disposto no art. 933.º, n.º 1, do CPC.
22-01-2008
Revista n.º 3827/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxx Xxx Xxxxxxxx
Responsabilidade civil do Estado Função jurisdicional
Prisão preventiva Prisão ilegal Erro de direito Erro de facto Erro grosseiro Causa de pedir
Alteração da qualificação jurídica Despacho de aperfeiçoamento Audiência preliminar
Decisão surpresa
Decisão penal absolutória Caso julgado penal
I - Saber se a factualidade alegada pelo autor integra o conceito jurídico de “prisão preventiva mani- festamente ilegal” ou prisão preventiva “injustificada por erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto de que depende”, para efeitos do disposto no art. 225.º do CPP, é matéria de qualificação jurídica da factualidade alegada como causa de pedir. A causa de pedir e a sua qualificação jurídica são realidades distintas que não se confundem.
II - A liberdade de qualificação jurídica dos factos é algo que pertence inteiramente às partes, não podendo o julgador impor, ou meramente sugerir - designadamente através de convite ao aper- feiçoamento da petição inicial -, qualificação jurídica diversa daquela porque as partes opta- ram, restando-lhe o poder de qualificar diferentemente a situação de facto já que a lei lhe con- cede plena liberdade na indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 664.º do CPC).
III - Se a matéria submetida a decisão de mérito foi amplamente debatida pelas partes nos seus arti- culados e o julgador não utilizou qualquer argumento inovador com que as partes não pudes- sem razoavelmente contar, a dispensa de audiência preliminar em nada prejudica o princípio do contraditório.
IV - O art. 22.º da CRP estabelece o princípio geral da responsabilidade civil directa do Estado, enquanto o art. 27.º da CRP alarga essa responsabilidade em especial ao exercício da função jurisdicional, impondo o dever de indemnizar aquele que for lesado por privação ilegal ou injustificada da liberdade.
V - O art. 225.º do CPP define, em consonância com a disciplina constitucional, os casos de respon- sabilidade do Estado em função de decisão judicial que decrete a prisão preventiva, visto que o
legislador constitucional devolveu à lei ordinária a definição dos termos em que haverá lugar à indemnização.
VI - Para que nasça o dever de indemnizar por parte do Estado, nos termos do art. 225.º, n.º 1, do CPP, não basta que a prisão preventiva seja ilegal. É ainda necessário que essa ilegalidade, decorrente de erro de direito, seja manifesta ou notória.
VII - Na falta de critério legal, será manifesta a ilegalidade da detenção ou prisão preventiva quando for evidente, fora de qualquer dúvida razoável, que foram efectuadas sem estarem presentes os respectivos pressupostos legais.
VIII - Para os efeitos do disposto no n.º 1 do art. 225.º do CPP é irrelevante o “erro de direito” do juiz que decretou a prisão preventiva, bem como dos demais juízes que a mantiveram, quando o mesmo só pode considerar-se erro por desconformidade com a interpretação normativa adop- tada pelo Tribunal Superior, tratando-se substancialmente apenas de uma diferente interpreta- ção das regras jurídicas aplicáveis, interpretação essa perfeitamente plausível e defensável a vários títulos (nomeadamente na doutrina e jurisprudência).
IX - No caso do n.º 2 do art. 225.º do CPP, estamos perante uma prisão preventiva com cobertura legal, pelo que o erro relevante é o erro de facto, isto é, aquele que incidiu sobre a apreciação dos pressupostos de facto e não sobre os fundamentos de direito.
X - Porém, não releva qualquer erro, exige-se que esse erro se configure como grosseiro ou indes- culpável, seja “escandaloso, crxxxx, supino, que procede de culpa grave do errante; aquele em que não teria caído uma pessoa dotada de normal inteligência, experiência e circunspecção”.
XI - A previsão do art. 225.º, n.º 2, do CPP, apesar de falar em erro grosseiro, abrange também o chamado acto temerário, aquele que, integrando um erro decorrente da violação de solução que os elementos de facto notória ou manifestamente aconselham, se situa num nível de indescul- pabilidade e gravidade elevada, embora de menor grau que o erro grosseiro propriamente dito.
XII - A apreciação a fazer no sentido de qualificar o eventual erro como grosseiro (ou temerário), terá de reportar-se necessariamente ao momento em que a decisão impugnada teve lugar.
XIII - A decisão do acórdão da Relação que anulou o primeiro julgamento, ou a decisão final que na sequência daquele absolveu o ora autor e então arguido do crime que lhe vinha imputado, não vincula este Tribunal quando se trata de saber se estão ou não reunidos os pressupostos de que depende a atribuição ao autor da indemnização por ele peticionada ao Estado.
XIV - Não existindo prisão manifestamente ilegal, pois à data em que foi decretada e mantida a prisão preventiva estavam presentes os requisitos gerais exigidos pelo art. 204.º do CPP, nem prisão injustificada por erxx xxxxxxxxx, já que os fundamentos do acórdão absolutório da Rela- ção - ilegalidade na obtenção da prova - não são pacíficos, não tem o autor direito à peticiona- da indemnização.
22-01-2008
Revista n.º 2381/07 - 1.ª Secção Moxxxxx Xxxxx (Relator)
Alxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Direito de propriedade Ónus real
I - A par das vantagens e benefícios que a integração de um prédio num empreendimento turístico acarreta, também existem encargos e limitações decorrentes do estatuto real a que a lei subme- te os prédios nessas condições.
II - Tais limitações nada têm de inconstitucional decorrendo naturalmente do facto de o direito de propriedade não ser um direito absoluto ilimitado.
22-01-2008
Revista n.º 3021/07 - 1.ª Secção
Moxxxxx Xxxxx (Relator) Alxxx Xxxxx
Moxxxxx Xxxxxx
Matéria de facto Matéria de direito Factos assentes Impugnação pauliana Má fé
Requisitos Simulação Obrigação solidária Ilações
I - A expressão “sociedade off-shore” transitou há muito para o vocabulário comum. Todos sabem o que é e para que serve.
II - Dizer-se que os réus maridos são os “beneficial owners” das rés compradoras, não contém em si qualquer conclusão de direito, pois a simples tradução da expressão inglesa significa que os 1.º e 2.º réus controlam, são os detentores, os possuidores, os donos, das aludidas sociedades.
III - Assim sendo, é claro que tal factualidade devia ser levada aos factos assentes, como foi, podendo ser utilizada na decisão.
IV - Em caso de dívida solidária pouco interessa que um dos devedores solidários possua bens sufi- cientes no seu património, pois o que necessário é que os possua o devedor solidário contra quem é intentada a acção de impugnação pauliana. Só assim pode o demandado fazer naufra- gar a impugnação.
V - Não tendo o autor alegado directa e expressamente que os réus tinham consciência do prejuízo que para si resulta dos negócios dispositivos impugnados, não podia a Relação tirar tal ilação dos factos provados.
VI - Mesmo considerando-se que tal alegação estava implícita noutros factos, o certo é que essa matéria, cujo ónus da prova pertencia ao autor, uma vez submetida ao contraditório da prova foi julgada não provada, consequentemente a ilação retirada pela Relação contraria o julga- mento feito em sede própria, dessa matéria, o que redunda numa alteração proibida da matéria de facto.
22-01-2008
Revista n.º 4525/07 - 1.ª Secção Moxxxxx Xxxxx (Relator)
Alxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Transacção judicial Sentença homologatória
Erro sobre o objecto do negócio Requisitos
Anulação do negócio
I - A relevância do erro sobre o objecto do negócio jurídico ou as suas qualidades depende, de acor- do com os arts. 247.º e 251.º do CC, da reunião de três requisitos: 1.º - Que a vontade declarada esteja viciada por erro sobre o objecto do negócio ou as suas qualidades e, por isso, seja diver- gente da vontade que o declarante teria tido sem tal erro; 2.º - Que, para o declarante, seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que não teria celebrado o negócio jurídico se se tivesse apercebido do erro; 3.º - Que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante.
II - Tendo o aqui Autor (um Município) reconhecido, em transacção judicial homologada pelo tri- bunal, o direito de propriedade dos aqui Réus, entre outros bens, de uma parcela de terreno que desconhecia ser sua propriedade e constar do sistema de inventário e cadastro de bens munici- pais - sendo que os Réus sabiam que o Autor nunca transaccionaria sobre um bem imóvel que constituísse bem público sem qualquer contrapartida financeira -, é manifesto que, por estarem preenchidos os mencionados requisitos do erro, tem o Autor direito a ver anulada a transacção celebrada, na parte correspondente, pois que a desistência total do pedido de indemnização pelos agora Réus não pode constituir elemento decisivo para se concluir que não se demonstra que os declaratários conhecessem ou não devessem ignorar a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro.
22-01-2008
Revista n.º 4326/07 - 1.ª Secção Moxxxxx Xxxxxx (Relator) * Urxxxx Xxxx
Paxxx Xx
Contrato de arrendamento
Transmissão da posição do arrendatário Senhorio
Autorização Reconhecimento do direito
O art. 1049.º do CC traduz a consagração do princípio de que o reconhecimento do cessionário como arrendatário implica a consolidação da cessão (ou cedência do locado), mesmo que esta não haja sido previamente autorizada.
22-01-2008
Revista n.º 4326/07 - 1.ª Secção Moxxxxx Xxxxxx (Relator) Urxxxx Xxxx
Paxxx Xx
Sucessão legitimária Procuração irrevogável Fraude à lei
I - Procuração post mortem é aquela cujos efeitos típicos apenas se produzem a partir do momento da morte do dominus originário, e não antes.
II - Os poderes de representação conferidos pelo co-réu a sua filha, a co-ré e ora recorrente, não ficaram sujeitos à verificação do acontecimento futuro morte; é uma procuração que produz efeitos imediatos, que logo se torna eficaz, no sentido de que os poderes representativos ali atribuídos pelo representado não ficaram dependentes de nenhuma condição suspensiva.
III - Trata-se da impropriamente chamada procuração irrevogável, que por ter sido, como nela expressamente se declara, conferida no interesse da mandatária, não poderá ser revogada sem o seu acordo, salvo ocorrendo justa causa, nos termos do art. 265º, n.º 3, do CC.
IV - Não se encontrando aberta a sucessão do réu, nem estando alegada e provada, sequer, a realiza- ção de qualquer negócio jurídico ao abrigo da procuração outorgada, não se vê como pode logicamente sustentar-se que esta, por si só, preenche os requisitos da fraude à lei.
V - Com efeito, no negócio em fraude à lei o que releva, o que é decisivo para se poder afirmar a respectiva ilicitude e consequente nulidade é, mais do que a intenção dos contraentes, o resul- tado obtido; se este não coincidir com aquele a que a norma imperativa pretende obstar não há fraude juridicamente relevante.
VI - X xegócio em fraude à lei define-se por um elemento de carácter objectivo cuja presença se torna indispensável à sua caracterização - a idoneidade do negócio realizado para alcançar um resultado análogo ao legalmente proibido.
VII - No caso dos autos, precisamente porque a sucessão do réu não se abriu, apresenta-se como uma pura e simples conjectura, sem nenhuma correspondência no plano dos factos, a conclusão de que a procuração ajuizada, pela simples circunstância de ter assumido a latitude inerente à sua irrevogabilidade, atentou contra normas imperativas da sucessão legal (e quem diz suces- são legal diz também sucessão legitimária, cujas normas são de igual modo cogentes - arts. 2156º e ss. do CC).
22-01-2008
Revista n.º 4255/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Soxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Contrato de arrendamento Resolução
Responsabilidade contratual Benfeitorias úteis
Danos não patrimoniais Indemnização
I - No caso de resolução contratual, a correspondente indemnização circunscreve-se aos danos deri- vados da não conclusão do contrato (interesse contratual negativo).
II - Sendo a resolução do contrato de arrendamento imputável ao senhorio, é irrelevante a cláusula incluída no contrato prevendo a inexistência do direito a indemnização por obras.
III - Já o clausulado quanto à proibição de realizar obras interiores no arrendado, sem prévia autori- zação da senhoria, dada por escrito, releva para aferição da licitude das obras que venham a ser realizadas.
IV - A procedência do pedido relativamente às benfeitorias demanda a prova pelo arrendatário do valor das que ficaram no prédio, por não ser possível levantá-las sem detrimento deste, e do enriquecimento do locado daí decorrente.
V - Embora seja imputável à Autora, senhoria, a resolução do contrato de arrendamento operada pelos Réus-reconvintes, arrendatários, improcede a pretensão destes a serem indemnizados pelas despesas, no valor de 60.000 €, com obras que efectuaram no locado necessárias à utili- zação prevista no contrato, se não resultou demonstrado que tenham sido os Réus a proceder ao pagamento de tais obras, nem sequer o valor das benfeitorias efectuadas, não levantadas e que não pudessem ser restituídas em espécie.
VI - Nesse caso, não se verifica um dos requisitos da responsabilidade civil, ou seja, que os Réus tenham sofrido um dano imputável à Autora e qual a grandeza desse dano, podendo até aconte- cer que as obras em causa representem um encargo para o senhorio, atenta a futura aplicação do prédio.
VII - Resultando provado que, no período compreendido entre 28-04-2003 e 31-03-2004, o Réu e as demais pessoas que trabalhavam no escritório da Ré ficaram afectadas psicologicamente pelo barulho e fumo provenientes do 4.º andar do edifício, também propriedade da Autora, que o arrendou para aí funcionar uma escola profissional, situação que os impediu de trabalhar durante o dia, tendo o Réu, em especial, sentido dificuldade de concentração e necessidade de trabalhar em casa, tendo sido levado pela perturbação causada e pela necessidade de procurar outro escritório a renunciar à candidatura a Vice-Presidente da União Internacional dos Advo- gados, estamos perante danos não patrimoniais que a Autora deverá ressarcir, afigurando-se adequado fixar o quantum indemnizatório em 20.000 €, acrescidos de juros de mora devidos a partir da notificação à Autora do pedido reconvencional.
22-01-2008
Revista n.º 4154/07 - 1.ª Secção Paxxx Xx (Relator) *
Mário Cruz Garcia Calejo
Litigância de má fé Advogado
I - Constatando-se que a actuação dos agravantes tem-se caracterizado por desrespeito absoluto dos parâmetros da boa fé processual, trazendo permanentemente à discussão questões já resolvidas e exorbitando do âmbito dos incidentes e dos recursos, como se evidencia no presente recurso em que continuam a atacar uma decisão da juíza da 1.ª instância, assim originado que o proces- so estivesse na Relação durante cerca de um ano, determinando várias decisões do relator e o acórdão recorrido, é de manter a condenação dos agravantes como litigantes de má fé.
II - Sendo certo que toda esta actuação é da responsabilidade pessoal e directa do seu mandatário, tal justifica que se dê conhecimento do facto à Ordem dos Advogados para os efeitos do dis- posto no art. 459.º do CPC.
22-01-2008
Agravo n.º 4263/07 - 1.ª Secção Paxxx Xx (Relator)
Mário Cruz Garcia Calejo
Acidente de viação Atropelamento Excesso de velocidade Sinal vermelho
Incapacidade permanente parcial Danos não patrimoniais
Danos futuros
I - Resultando da matéria de facto provada que o veículo segurado na Ré circulava a velocidade vedada à condução urbana e inadequada às concretas condições de circulação (excesso de velocidade absoluto e relativo) e que o seu condutor desrespeitou o sinal de semáforos que lhe impunha a paragem, a mera circunstância de o Autor, no momento do seu atropelamento, estar a atravessar a via fora das (duas) passadeiras existentes a menos de 50 metros do local, não permite concluir pela culpa (exclusiva ou sequer concorrente) deste último na produção do aci- dente, já que não se tratou de uma invasão inopinada da faixa de rodagem pela vítima, mas de travessia entre carros que estavam a aguardar parados que o sinal passasse a verde, tendo o Autor sido colhido quando estava prestes a alcançar o passeio.
II - Provando-se que o Autor sofreu fracturas do fémur e do úmero direitos, lesões que implicaram um período de cura directa de mais de 1 ano, determinaram uma intervenção cirúrgica do foro ortopédico e subsequentes tratamentos particularmente agressivos e dolorosos, tendo o respec- tivo quantum doloris sido avaliado em 6, numa escala de 7, com períodos consideráveis de internamento, tendo ainda resultado um prejuízo estético avaliado em 3 numa escala de 7, afi- gura-se adequado o valor de 35.000 € fixado pelas instâncias para ressarcir os danos não patri- moniais.
III - O dano biológico, de cariz patrimonial, justifica a indemnização, para além da valoração que se imponha a título de dano não patrimonial, tendo que ser indemnizada a maior dificuldade para
o exercício das actividades profissionais e da vida quotidiana até ao fim da vida activa (até ao termo médio de 73 anos, no caso dos homens).
IV - Tendo o Autor, que é professor do ensino secundário e exercia funções de chefia da Área Edu- cativa de Coimbra na Direcção Regional de Educação do Centro, ficado portador de sequelas que se traduzem numa incapacidade permanente geral parcial de 25%, agravada no futuro em mais 5%, apresentando dificuldades em elevar o braço direito e em escrever no quadro, sentin- do dores na perna e braço direitos, o que lhe limita acentuadamente a sua vida profissional, considera-se adequado ao ressarcimento da afectação parcial da capacidade laboral futura do Autor o montante de 125.000 € fixado pela Relação.
22-01-2008
Revista n.º 4338/07 - 1.ª Secção Paxxx Xx (Relator) *
Mário Cruz Garcia Calejo
Mandato sem representação Revogação tácita Comportamento concludente
I - A previsão do art. 1171º do Código Civil não afasta a possibilidade de revogação tácita do man- dato por qualquer outro comportamento concludente do mandante, que não a designação de outra pessoa para a prática dos mesmos actos.
II - Se a lei considera que existe revogação tácita quando o mandante designa outra pessoa para a prática dos mesmos actos, por maioria de razão, também existe revogação tácita se o mandante chama a si o cumprimento da tarefa que havia confiado ao mandatário, dando-lhe disso conhe- cimento ao solicitar-lhe expressamente que efectuasse o pagamento da mercadoria à empresa contactada para a respectiva aquisição. Este é, evidentemente, o sentido que um declaratário normal, previamente contactado para cumprir, retiraria do comportamento inequívoco do man- dante.
22-01-2008
Revista n.º 4129/07 - 6.ª Secção Rux Xxxxxxxx (Relator)
Fonseca Ramos
Caxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Acção de reivindicação Quota social
Cessão de quota
Nulidade por falta de forma legal
I - A transmissão de quotas sociais entre vivos está condicionada, quanto à sua respectiva validade, à formalidade da mesma ter de constar de escritura pública, conduzindo a sua inobservância à nulidade do negócio jurídico que teve por objecto a referida transmissão - arts. 228.º, n.º 1 do CSC e 220.º do CC.
II - Tendo em linha de consideração que a causa de pedir aduzida pelos AA. se fundou, única e exclusivamente, na existência de um acordo verbal, não pode ter acolhimento a pretensão dos AA/recorrentes, no sentido do ingresso no seu património de um bem cuja propriedade se não mostra legalmente constituída a favor dos mesmos.
III - Assim, não há que apreciar a legalidade de uma eventual contitularidade de quotas, pela inexis- tência da prévia constituição do direito de propriedade a tal inerente, de tal decorrendo, portan- to, que terão de improceder as conclusões apresentadas.
22-01-2008
Revista n.º 3912/07 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Saxxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
Contrato de mútuo Fiança
Contrato de adesão Cláusula contratual geral Dever de comunicação Nulidade
I - O dever de comunicação adequada consagrado no art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25-10, reporta-se apenas às condições gerais do contrato, e não às particulares, onde constam os elementos essenciais do negócio, pelo que, sendo aquelas substituídas pelas normas supletivas aplicáveis, nada impõe a nulidade da fiança.
II - Com efeito, os elementos essenciais do mútuo e da fiança encontram-se integrados nas cláusulas particulares que precedem as assinaturas, no que se refere ao montante do financiamento, prazo de amortização, 1 AEG, e montante da entrada inicial e das prestações, podendo o restante do respectivo regime ser integrado por normas supletivas, e, se necessário, com recurso às regras de integração do negócio jurídico, nos termos do art. 9.º do mesmo DL, que precisamente con- sagra a subsistência dos contratos singulares nos casos previstos no art. 8.º, vigorando na porte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso se necessário àquelas regras (n.º 1), ape- nas com duas excepções, em que estabelece a sanção da nulidade: quando, não obstante o recurso às regras supletivas afastadas pelas cláusulas contratuais gerais e aos elementos de integração dos negócios jurídicos, se apure uma indeterminação insuprível de aspectos essen- ciais do contrato, ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé.
22-01-2008
Revista n.º 4319/07 - 6.ª Secção Sixxx Xxxxxxx (Relator)
Nuxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Propriedade horizontal Condição suspensiva Proprietário
Contrato de mandato
Contrato de prestação de serviços Despesas de condomínio
Eficácia externa das obrigações
I - O único proprietário de um edifício, ao submetê-lo ao regime da propriedade horizontal, age com o objectivo de posteriormente transmitir o seu direito sobre partes determinadas desse prédio.
II - Os efeitos próprios da propriedade horizontal apenas actuarão quando uma das fracções for alienada a um novo proprietário; ou seja, só com a existência de mais do que um condómino é que os efeitos deste instituto se produzirão totalmente.
III - A nomeação de um terceiro como administrador do condomínio, feita pelo então único proprie- tário do prédio constituído em propriedade horizontal e antes da venda de qualquer fracção, consubstancia-se num contrato de mandato, pois aquele terceiro ficou incumbido de praticar os actos inerentes àquela administração e por conta do dono do prédio.
IV - Exigindo a administração do empreendimento serviços de limpeza e portaria, e tendo estes sido contratados pelo terceiro administrador com uma sociedade especializada (ora autora), deve considerar-se que a celebração deste contrato de prestação de serviços reportou todos os seus efeitos na esfera jurídica do mandante (o dono do prédio), designadamente a obrigação civil de pagamento da respectiva retribuição (arts. 1178.º, n.º 1, e 258.º do CC).
V - Tendo os proprietários das fracções autónomas adquiridas ao dono do prédio reunido em assembleia geral, pela primeira vez, em 21-10-2002, e deliberado eleger como administrador do condomínio uma outra sociedade, é aquele (enquanto mandate) o responsável pelo paga- mento dos serviços de limpeza e portaria prestados até ao final desse mês pela autora.
24-01-2008
Revista n.º 4408/07 - 7.ª Secção Alxxxxx Xxxxxxxx (Relator) Maria dos Prazeres Beleza Saxxxxxx xx Xxxxx
Falência
Aplicação da lei no tempo Graduação de créditos Créditos laborais Hipoteca
IMI
Constitucionalidade
I - O art. 152.º do CPEREF é aplicável às acções pendentes à data da entrada em vigor do DL n.º 132/93, de 23-04 (que aprovou o CPEREF), sem que tenha sido proferida sentença de verifica- ção e graduação de créditos (art. 3.º da Lei n.º 96/2001, de 20-08).
II - Considerando que a falência foi decretada em 29-04-1992 e que os créditos reclamados pelos trabalhadores decorrem de contratos de trabalho que se extinguiram por força da falência, aqueles direitos gozam de privilégio imobiliário geral sobre o prédio apreendido (arts. 12.º da Lei n.º 17/86, de 14-06, e 4.º da Lei n.º 96/2001).
III - Tais créditos dos trabalhadores, no confronto com créditos assegurados por hipoteca, devem ser graduados depois destes, não enfermando esta asserção de inconstitucionalidade alguma.
IV - Porém, os créditos dos trabalhadores devem ser graduados com preferência sobre os créditos das autarquias locais emergentes de contribuição predial/autárquica ou de IMI.
24-01-2008
Revista n.º 4439/07 - 7.ª Secção Alxxxxx Xxxxxxxx (Relator) Maria dos Prazeres Beleza Saxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de seguro Apólice de seguro
Interpretação da declaração negocial
I - O contrato de seguro no qual se consignou, quanto ao âmbito da cobertura, estar garantido o risco concernente “(…) à actividade de laboração de equipamentos de elevação, quando a res- ponsabilidade da operação e a respectiva manobra estiver exclusivamente a cargo do segurado (…)”, funcionando ainda a mesma apólice “(…) para garantir os danos directamente causados aos edifícios, estruturas ou equipamentos onde a peça movimentada se destinava”, acautela os danos causados às próprias partes contratantes da laboração.
II - Com efeito, o sentido que um declaratário normal capta de tal cláusula (art. 236.º, n.º 1, do CC) é o de que com ela pretendeu-se garantir os riscos próprios do funcionamento dos equipamen- tos de elevação, em que se incluem as gruas, quando os trabalhos desenvolvidos o são na sequência de contrato celebrado pela segurada e os danos são causados no edifício, estrutura ou equipamento a que se destina a peça movimentada.
24-01-2008
Revista n.º 4583/07 - 7.ª Secção Alxxxxx Xxxxxxxx (Relator) Maria dos Prazeres Beleza Saxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de empreitada Empreitada de obras públicas Junta de Freguesia
Tribunal competente Tribunal administrativo Tribunal comum
Os tribunais administrativos são os materialmente competentes para conhecer da acção fundada no incumprimento por uma Junta de Freguesia do contrato de empreitada de obras públicas que aquela celebrou com uma sociedade comercial que tem por objecto social a construção civil e obras públicas.
24-01-2008
Agravo n.º 4614/07 - 7.ª Secção Alxxxxx Xxxxxxxx (Relator) Maria dos Prazeres Bexxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx
Registo predial Presunções legais Acção de reivindicação Justificação notarial Ónus da prova
I - A identificação física dos prédios, nomeadamente confrontações, áreas e limites, não é abrangida pela presunção derivada do registo predial.
II - Na acção de reivindicação, não basta o autor estabelecer a nulidade da escritura de justificação outorgada pelo réu e respeitante à parcela reivindicada: ainda que fosse reconhecida como nula a dita escritura, despojando-se o réu da presunção derivada do registo predial nela fundado, continuava a ser necessário provar que o autor é que era o proprietário, por integrar-se esse ter- reno em seu prédio.
24-01-2008
Revista n.º 3911/07 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) Pexxxxx xx Xxxxx
Joxx Xxxxxxxx
Aluguer de longa duração
Aluguer de automóvel sem condutor Resolução
Indemnização
O art. 1045.º do CC não se aplica aos alugueres de longa duração de veículos automóveis.
24-01-2008
Revista n.º 4534/07 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) Pexxxxx xx Xxxxx
Joxx Xxxxxxxx
Contrato de concessão comercial Interesse contratual negativo
I - No caso de optar pela resolução do contrato, o contraente fiel apenas pode reclamar a indemniza- ção pelo interesse contratual negativo ou de confiança.
II - Para pode exigir indemnização pelo interesse contratual positivo, não poderá ele resolver o con- trato.
24-01-2008
Revista n.º 551/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Mota Miranda
Alxxxxx Xxxxxxxx
Contrato de empreitada Aceitação da obra Desistência
Dono da obra
I - A não aceitação da obra não se confunde com a desistência da obra.
II - É motivada e justificada a desistência da empreitada que radica na manifestação de incapacida- de do empreiteiro em cumprir rigorosamente as especificações do trabalho encomendado.
III - Perante a evidente relação de causa e efeito entre a desistência e a mencionada incapacidade do empreiteiro, num juízo prudencial assente na equidade, devem-se arredar algumas das conse- quências previstas no art. 1229.º do CC, nomeadamente as que respeitam ao direito do emprei- teiro de reclamar indemnização pelo proveito que poderia retirar da obra.
24-01-2008
Revista n.º 4256/07 - 2.ª Secção Duxxxx Xxxxxx (Relator) Bettencourt de Faria
Saxxxx Xxxxxxxxxx
Acidente de viação Acidente de trabalho Dano morte
Cálculo da indemnização Danos não patrimoniais Juros de mora
I - O bem vida não pode ser avaliado em função de quaisquer circunstâncias pessoais, físicas - de saúde ou de doença, de idade -, sociais ou económicas.
II - Sendo absoluto, o bem vida tem um valor transcendental igual para todos, insusceptível de gra- dações independentemente da qualidade de vida de cada um e da maior ou menor expectativa da sua duração.
III - É ajustada a quantia de 50.000,00 € destinada ao ressarcimento do dano morte.
IV - Os juros de mora relativos aos montantes devidos a título de danos não patrimoniais estão sujeitos às regras do art. 805.º do CC, a não ser que quaisquer circunstâncias, nomeadamente a fixação do respectivo valor actualizando-o, no momento da prolação da sentença, recomendem outra solução.
V - No acidente de viação, simultaneamente de trabalho, não é o responsável pela indemnização civil que pode invocar a duplicação de indemnizações para o efeito de se opor ao pagamento daquilo que resulta da sua responsabilidade.
VI - Será antes o responsável laboral que terá legitimidade para invocar o pagamento da indemniza- ção civil se não tiver já satisfeito a sua responsabilidade no âmbito laboral.
24-01-2008
Revista n.º 4500/07 - 2.ª Secção Duxxxx Xxxxxx (Relator)
Saxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxx xx Xxxxx
Partilha dos bens do casal Escritura pública Documento autêntico Força probatória
Tornas
I - A escritura pública de partilha dos bens comuns do casal constitui um documento autêntico, por se revestir das características estabelecidas nos arts. 363.º, n.º 2, e 369.º do CC.
II - Como documento autêntico, a mesma só faz prova plena dos factos praticados pelo documenta- dor e daqueles que são atestados com base nas suas percepções (art. 371.º, n.º 1, do CC); ou seja, provam simplesmente que os outorgantes declararam o que nele lhes é atribuído, mas não que isso seja verdadeiro.
III - Decorrentemente, é admissível a prova por qualquer meio, designadamente, por escrito particu- lar, da invalidade ou ineficácia dos factos atestados pelo documentador.
IV - Como tal, a concreta escritura de partilha não garante, nem pode garantir, a veracidade das declarações prestadas quanto ao valor dos bens aí considerados, em particular, que o valor atri- buído corresponda ao valor real dos bens.
V - A afirmação documentada na escritura relativamente ao recebimento das tornas pelo réu, não pode ser tida como uma confissão, pois não é inequívoca, já que não se mostra demonstrado que as tornas repostas se refiram aos valores reais e correntes dos bens partilhados.
24-01-2008
Revista n.º 4595/07 - 7.ª Secção Fexxxxxx xx Xxxxx (Relator) Arxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Legitimidade processual Conhecimento no saneador Caso julgado formal
Acção de reivindicação Acessão industrial Benfeitorias
Indemnização
I - Tendo sido conhecida e decidida, com trânsito, no despacho saneador a questão da invocada ilegitimidade da ré, a qual foi considerada parte legítima na relação material controvertida, não pode a mesma ser de novo suscitada e reanalisada, face ao caso julgado formado (arts. 510.º, n.º 3, e 672.º do CPC).
II - Tendo a autora logrado demonstrar (como lhe incumbia) que é a proprietária do prédio rústico reivindicado, ocupado pela ré, e não tendo esta feito prova de qualquer facto impeditivo ou extintivo do direito exercitado, impõe-se a procedência do correspondente pedido, abrangendo a restituição, para além do prédio rústico, as construções nele existentes, entretanto realizadas pela ré e que, sendo consideradas benfeitorias e não podendo ser levantadas, dão lugar ao res- sarcimento da demandada.
24-01-2008
Revista n.º 4661/07 - 7.ª Secção Fexxxxxx xx Xxxxx (Relator) Arxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contestação Prescrição Réplica
Alteração da causa de pedir Conhecimento no saneador Matéria de facto
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I - Invocando o réu na contestação a excepção peremptória da prescrição do direito indemnizatório, pode o autor na réplica alegar factos tendentes a prejudicar o efeito pretendido com tal excep- ção e, bem assim, aproveitar para alterar ou ampliar a causa de pedir (arts. 502.º, n.º 1, 503.º, n.º 1, e 273.º do CPC).
II - A suficiência ou insuficiência de factos para se julgar de mérito no despacho saneador integra questão de facto da exclusiva competência das instâncias, estando o STJ impedido de exercer censura sobre a decisão da Relação que determinou o prosseguimento dos autos para fixação da matéria de facto relevante (art. 510.º, n.º 4, do CPC).
24-01-2008
Revista n.º 4691/07 - 7.ª Secção Fexxxxxx xx Xxxxx (Relator) Arxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Interpretação da vontade Matéria de facto
Matéria de direito Confissão judicial Força probatória plena Perícia
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Cláusula penal
Incumprimento parcial Redução
Equidade
I - A interpretação dos contratos é matéria de facto na medida em que se trata de averiguar o que as partes quiseram dizer; será matéria de direito, sujeita à fiscalização do tribunal de revista, quando se trate de averiguar se as instâncias fizeram correcta interpretação e aplicação dos cri- térios legais cabíveis, como os constantes do art. 236.º do CC.
II - A confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente (art. 358.º, n.º 1, do CC).
III - Tendo o réu confessado que a concreta cláusula penal tinha um âmbito mais lato do que aquele que a Relação lhe deu, pode o Supremo invadir a decisão factual das instâncias (art. 722.º, n.º 2, do CC).
IV - Não viola o princípio da aquisição processual a decisão das instâncias que afastou a relevância do relatório pericial na parte em que o mesmo se pronunciou sobre questões que excederam o objecto da perícia (arts. 577.º, 578.º e 586.º do CPC).
V - Abrangendo a concreta cláusula penal todas as obrigações emergentes do contrato, tal não signi- fica que não releve se o incumprimento for meramente parcial (até porque o art. 812.º, n.º 2, do CC afasta entendimento contrário).
VI - Porém, nestes casos de incumprimento apenas parcial, impõe-se ao tribunal a redução da cláu- sula penal, em termos equitativos.
24-01-2008
Revista n.º 3916/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Caso julgado
Limites do caso julgado
I - O preenchimento dos requisitos previstos nos arts. 497.º e 498.º do CPC não determina automati- camente a verificação do caso julgado, havendo que considerar ainda o disposto no art. 673.º do CPC: a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.
II - É a resposta dada na sentença à pretensão do autor, delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende que seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado.
III - Os limites dentro dos quais opera a força do caso julgado material são traçados pelos elementos identificativos da acção em que foi proferida a sentença, ou melhor, pelos elementos identifi- cadores da relação ou situação jurídica substancial definida pela sentença.
IV - Esta necessidade de se atentar no conteúdo da sentença perde frequentemente relevância por naquela peça processual se conhecer, em princípio, precisamente do ou dos pedidos tendo em conta a causa de pedir. A coincidência afasta, para estes efeitos, a importância do aresto.
V - Mas, se por qualquer motivo, a coincidência não tiver lugar, então há que indagar os termos da decisão judicial e aferir por aí, ainda que atendendo previamente aos limites do caso julgado.
24-01-2008
Agravo n.º 4260/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Servidão de passagem Usucapião
Extinção
I - As servidões adquiridas por usucapião (assim como as legais) podem ser extintas por desneces- sidade (art. 1569.º, n.ºs 2 e 3, do CC), a requerimento do proprietário do prédio serviente.
II - Para tanto, é necessário que a concreta servidão de passagem se mostre sem interesse, recaindo sobre o autor o ónus da prova da desnecessidade (art. 342.º, n.º 1, do CC).
III - A desnecessidade tem de ser objectiva, não devendo ser aferida subjectivamente pelo interesse ou conveniência do seu titular e resultar de mudança ocorrida no prédio dominante em termos que se possa afirmar que essa servidão deixou actualmente de ter utilidade para aquele.
IV - O facto de se obter uma outra passagem de acesso a caminho público só por si não acarreta forçosamente a desnecessidade ou inutilidade da servidão, pois o prédio dominante pode ter interesse atendível na manutenção daquela: basta que a nova passagem não satisfaça as utilida- des que para o prédio dominante são concedidas com a passagem pelo prédio serviente.
24-01-2008
Revista n.º 781/07 - 7.ª Secção Mota Miranda (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Erro de julgamento Nulidade de acórdão Acção de demarcação Prédio confinante
I - O erro de julgamento não constitui uma nulidade de sentença.
II - A demarcação consiste na operação material de colocação de marcos ou sinais permanentes e visíveis que assinalem a linha divisória entre dois prédios contíguos.
III - Tem como pressuposto essencial a contiguidade dos prédios e a incerteza ou dúvida sobre a linha divisória daqueles.
IV - Estando os prédios do autor e do réu separados por um caminho cuja propriedade não se apu- rou, deve concluir-se que aqueles não são contíguos e, consequentemente, não pode ser deter- minada a demarcação.
24-01-2008
Revista n.º 4122/07 - 7.ª Secção Mota Miranda (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Livrança Aval Avalista
Pacto de preenchimento Preenchimento abusivo
I - A função do aval é uma função de garantia, inserida ao lado da obrigação de um certo subscritor cambiário, a cobri-la ou caucioná-la.
II - A obrigação do avalista vive e subsiste independentemente da obrigação do avalizado, manten- do-se mesmo que seja nula a obrigação garantida, salvo se a nulidade desta provier de vício de forma.
III - Atenta esta autonomia, o avalista não pode defender-se com as excepções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento.
IV - É indiferente que o avalista tenha dado ou não o seu consentimento ao preenchimento da livrança.
V - Mas mesmo que o avalista pudesse opor ao portador (estando o título no âmbito das relações imediatas) a excepção do preenchimento abusivo, sempre seria de exigir que ele tivesse subs- crito o acordo de preenchimento.
24-01-2008
Revista n.º 3433/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Serra Baptista
Contrato de arrendamento Senhorio
Obras de conservação ordinária Reparações urgentes
Mora Interpelação
I - É obrigação do senhorio assegurar ao arrendatário o gozo da coisa para os fins a que esta se des- tina.
II - A reparação dos telhados do prédio de modo a evitar, durante os períodos do ano de mais chuva, que chovesse copiosamente dentro do mesmo, traduzem-se em obras de conservação ordinária.
III - As obras de conservação ordinária são da conta do senhorio, salvo o disposto no art. 1043.º do CC, 4.º (deteriorações lícitas) e 120.º (convenção nos arrendamentos para comércio e indústria) do RAU - art. 12.º.
IV - Se as obras não são urgentes, o arrendatário pode participar à Câmara ou propor acção judicial contra o senhorio, pedindo que este seja condenado a realizá-las, seguindo-se, se for caso disso, a execução para prestação de facto.
V - Sendo urgentes, e não consentindo qualquer dilação, o arrendatário, independentemente da mora do senhorio, pode fazer as reparações ou despesas, com direito a reembolso, mas tem de o avisar ao mesmo tempo de que as vai realizar, valendo este aviso como interpelação.
VI - Se não consentem as delongas do processo judicial e o senhorio está em mora, por ter havido prévia interpelação, o arrendatário tem a possibilidade de as fazer extrajudicialmente, com direito ao reembolso, sendo certo que não há mora sem interpelação para cumprir (art. 805.º, n.º 1, do CC), com fixação do respectivo prazo e decurso deste - art. 804.º, n.º 2, parte final.
24-01-2008
Revista n.º 4584/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Serra Baptista
Contrato de compra e venda Venda de coisa defeituosa Direitos do consumidor Direito à indemnização
I - Na hipótese de compra e venda de coisa defeituosa, os direitos à reparação ou à substituição, contemplados nos arts. 914.º do CC e 12.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96, de 31-07 (redacção anterior), não constituem paradigma de concorrência electiva de pretensões, não absoluta, embora, por acontecer eticização da escolha do comprador através do princípio da boa fé, antes tais díspares meios jurídicos facultados a quem compra, no caso predito, não podendo ser exercidos em alternativa, por subordinados, antes, estarem a uma espécie de sequência lógica : o vendedor,
em primeiro lugar, está adstrito a eliminar o defeito, tão só ficando obrigado à substituição, a antolhar-se como não possível, ou demasiado onerosa, a reparação.
II - O art. 12.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96 (redacção do DL n.º 67/03, de 08-04) não contempla hipótese de responsabilidade objectiva, o direito à indemnização repousante no em tal normativo vazado só tendo lugar se o (re)vendedor final não provar que o incumprimento perfeito da obrigação não procede de culpa sua (art. 799.º do CC).
24-01-2008
Revista n.º 4302/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Contrato de trabalho Jogador profissional Procuração
Representação sem poderes Ineficácia do negócio
I - A subscrição de um acordo em nome de outrem, para ser válida e eficaz, exige que o representa- do tenha atribuído poderes de representação ao representante para a celebração e assinatura do mesmo - art. 262.º, n.º 1 do CC - ou, se assim não acontecer, que o representado venha poste- riormente ratificar o acordo - art. 268.º do CC.
II - Havendo actuação fora dos limites dos poderes de representação (embora com procuração) ou ausência total deles (por inexistir instrumento de procuração ou haver uma procuração nula), está-se no âmbito da representação sem poderes prevista no art. 268.º do CC, ficando a valida- de do negócio dependente de ratificação.
III - Sendo ineficaz em relação ao autor o contrato de trabalho desportivo celebrado por represen- tante deste sem poderes, por falta de ratificação constante de documento escrito, inexiste nexo de causalidade entre a destruição do original daquele contrato e os eventuais danos sofridos pelo autor ao não ter conseguido demonstrar a sua existência na acção que moveu contra a sociedade desportiva interveniente no negócio.
24-01-2008
Revista n.º 714/07 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) Custódio Montes
Mota Miranda
Contrato de seguro Seguro de vida Nulidade Anulabilidade Declaração inexacta Boa fé
Ónus da prova
I - Toda a declaração inexacta, assim como toda a reticência de factos ou circunstâncias conhecidas pelo segurado ou por quem fez o seguro, e que teriam podido influir sobre a existência ou con- dições do contrato, tornam o seguro anulável (art. 429.º do CCom).
II - Cabe à seguradora o ónus da prova da falsidade, inexactidão ou reticência da declaração do segurado.
III - Revelando os factos provados que o marido da autora (e pai dos autores), então com 37 anos de idade, 1,73 metros de altura, 97 quilos de peso e uma tensão arterial máxima de 13 e mínima de 9, dirigiu-se a uma seguradora para fazer um seguro do ramo vida e preencheu e assinalou no impresso/formulário/questionário clínico que lhe foi apresentado que não gozava de boa saúde, sendo essas as primeiras declarações que fez e que - provadamente - foram as únicas que ele próprio preencheu e assinalou, e não se tendo apurado no que mais consta do preen- chimento do formulário em apreço que tenha sido assinalado ou preenchido por ele próprio, deve concluir-se que se ficou sem a prova de que as sucessivas cruzes com que o questionário médico foi sendo preenchido (depois da declaração inicial de que não gozava de boa saúde) traduzem ou não uma falsidade ou inexactidão ou uma reticência, porque tudo depende natu- ralmente das perguntas formuladas e do modo como essas perguntas foram feitas e da interpre- tação das respostas que foram dadas a tais perguntas por parte de quem recebeu essas respostas e teve a incumbência de as traduzir em cruzes nos espaços em branco do questionário impres- so.
IV - O questionário médico não deixa de ser um instrumento do qual, no âmbito contratual, a segu- radora se serve para o seu interesse negocial próprio e, portanto, se esta lhe aufere as vantagens deve suportar-lhe os inconvenientes.
V - Se a seguradora se cuida perante o proponente, submetendo-o a um questionário com o qual pretende apurar a verdade das suas declarações (e eventualmente submetê-lo a um exame médico sem o qual não celebrará o contrato), não pode depois esconder-se atrás da insuficiên- cia ou inexactidão do questionário que elaborou e das respostas que recolheu para invocar a anulabilidade do contrato ao abrigo do disposto no art. 429.º do CCom.
VI - Se a seguradora, perante uma declaração do candidato ao seguro de que não goza de boa saúde reage passivamente às “cruzes” subsequentes que não indicam qualquer doença indutora dessa ausência de boa saúde para receber ao longo do tempo os prémios de seguro quando nada acontece, e vem reagir activamente logo que o risco se verifica, não se pode dizer que ela tenha cumprido os ditames de lealdade e transparência que a boa fé exige.
VII - No âmbito da aplicação da norma do art. 429.º do CCom deve entender-se que a seguradora está vinculada a certos deveres, designadamente o de controlar a exactidão das respostas do tomador do seguro.
24-01-2008
Revista n.º 835/07 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) Custódio Montes
Mota Miranda
Acção de reivindicação Causa de pedir Registo predial
A causa de pedir na lide reivindicatória é complexa, compreendendo o facto jurídico de que deriva o direito de propriedade, que deve consistir na alegação de uma das formas originárias de adquirir, podendo contudo bastar-se com a existência de uma presunção registral, exigindo-se alegação e prova da ocupação abusiva e da coincidência entre a coisa reivindicada e a detida pelo demandado.
24-01-2008
Revista n.º 1713/07 - 2.ª Secção Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx (Relator) Xxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Recurso de apelação Reapreciação da prova Matéria de facto Omissão de pronúncia Nulidade de acórdão
Baixa do processo ao tribunal recorrido
I - É nulo, por omissão de pronúncia (art. 668.º, n.º 1, al. d), 2.ª parte, do CPC), o acórdão da Rela- ção que, perante o recurso da matéria de facto no qual o recorrente indicou os pontos de facto que pretendia ver alterados e transcreveu os depoimentos em que suportava essa sua pretensão, limita-se a referir que “(…) in casu, é por demais evidente que o recorrente não logrou demonstrar a existência de qualquer vício na formação da convicção do tribunal que justifique alterar o julgamento de facto. Acresce que - e decisivamente - a lei não se basta com a mera invocação de depoimentos, com base nos quais se julgaria de forma diferente; exige-se a demonstração de que o tribunal violou os limites impostos pela lei, pelos conhecimentos cientí- ficos ou pelas regras da experiência”.
II - Na verdade, deveria a Relação ter analisado em concreto os depoimentos (ou parte deles) que o recorrente referiu e confrontá-los com os outros elementos probatórios indicados para, depois, concluir pela alteração (ou não) pretendida.
24-01-2008
Revista n.º 4402/07 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx (Relator) Xxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Acidente de viação Danos patrimoniais Culpa do lesado Matéria de facto
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Obrigação de indemnizar
Privação do uso de veículo Abuso do direito
I - Tendo as instâncias concluído que a paralisação do veículo do autor, durante certo período tem- poral, lhe é imputável em exclusivo, porque consequência da denegação de autorização para a reparação do veículo, que aquele só veio a conceder posteriormente, e que, por isso, o autor contribuiu culposamente para o alargamento da extensão temporal do dano da privação de uti- lização do dito veículo e para o agravamento deste dano, tal conclusão situa-se no âmbito da matéria de facto, escapando à censura do STJ.
II - Assente a culpa do autor no agravamento, por período temporal determinado, do dano próprio da privação do uso do veículo, a não consideração desse período no cômputo da indemnização por tal dano mostra-se conforme com o disposto no art. 570.º, n.º 1, do CC.
III - O fim da obrigação de indemnizar é pôr a cargo do lesante a prática de certos actos, cuja finali- dade comum é criar uma situação que se aproxime o mais possível daquela em que o lesado provavelmente estaria, daquela situação que provavelmente seria a existente, de acordo com a sucessão normal dos factos, no momento em que é julgada a acção de responsabilidade, se não tivesse tido lugar o facto que lhe deu causa.
IV - O ressarcimento do dano da privação do uso do veículo, imobilizado para reparação dos estra- gos sofridos em consequência do acidente, alcança-se facultando ao lesado um veículo de subs- tituição, ou indemnizando-o pelas despesas por ele suportadas em consequência da privação do veículo.
V - O princípio da restauração in natura impõe, no que concerne ao veículo de substituição, que o lesante (ou a sua seguradora) disponibilize ao lesado um veículo da mesma gama ou semelhan- te, com características idênticas às do danificado, ou assuma a obrigação do pagamento do alu- guer de um tal veículo.
VI - Provado que o autor - um industrial de renome no País, dono de uma das maiores empresas nacionais do ramo têxtil, que tem de manter uma imagem profissional de sucesso e pujança económica - ficou privado da utilização do seu veículo, um Porsche Carrera que adquirira trin- ta dias antes, em consequência dos danos por este sofridos em acidente de viação devido a cul- pa exclusiva do segurado da ré, tem ele direito a uma viatura de substituição de características idênticas, da mesma ou de outra marca.
VII - Não lhe tendo a seguradora da ré disponibilizado tal viatura de substituição, deve indemnizar o autor pelas despesas que este suportou com o aluguer de um outro veículo, da mesma marca e da mesma categoria do sinistrado, não podendo tais despesas ser tidas como voluptuárias ou sumptuárias.
VIII - A reclamação, pelo autor, das quantias despendidas no aluguer desse veículo não envolve abuso do direito.
24-01-2008
Revista n.º 3557/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Contrato-promessa de compra e venda Incumprimento definitivo
Hipoteca Penhora
Nulidade de acórdão Falta de fundamentação
I - O vício que a lei pune na al. b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC é a ausência completa de fundamen- tação, a falta absoluta de justificação.
II - Clausulado, no contrato-promessa, que o prédio seria vendido livre de ónus ou encargos, e não tendo os promitentes vendedores removido o encargo (hipoteca) que sobre ele impendia já ao tempo da celebração do contrato-promessa, nem obstado, posteriormente a tal celebração, à penhora do prédio, não tendo dado conhecimento à contraparte da incidência das aludidas hipoteca e penhora, verificou-se o incumprimento, por aqueles, do contrato-promessa.
III - O incumprimento não resulta da impossibilidade da prestação dos promitentes vendedores, mas antes da tácita, mas inequívoca, desvinculação das obrigações decorrentes do contrato- promessa, deixando os promitentes vendedores patente que, da sua parte, o contrato não era para cumprir, de nada passando a interessar a interpelação para o cumprimento.
IV - A penhora, implicando a transferência para o tribunal dos poderes de gozo que integravam o direito dos promitentes vendedores sobre o prédio, e, consequentemente, a transferência da posse, que passa a ser detida pelo tribunal, e por ele exercida através do depositário, sempre impediria a promitente vendedora de realizar, no prédio, quaisquer obras que se tivesse obriga- do a efectuar.
24-01-2008
Revista n.º 3813/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de concessão comercial Pacto de jurisdição Competência internacional
I - Tendo as partes, no contrato de concessão comercial que celebraram, expressamente acordado que “todos os litígios aos quais o presente contrato poderá dar lugar, e, em particular, a sua validade, a sua interpretação, a sua execução ou a sua resolução, serão da competência dos tri- bunais de Lyon” deverá esta cláusula ser interpretada no sentido da aplicabilidade deste pacto de jurisdição a situações decorrentes do negócio, ainda que apenas surjam após a sua cessação.
I - Daí que sejam os tribunais de Lyon (França) os competentes para o julgamento do presente lití- gio que se pode considerar fundado nas consequências resultantes da resolução do contrato de concessão comercial e na “relação de liquidação” do mesmo negócio, uma vez que respeita ao cumprimento das condições (alegadamente) acordadas entre as partes quanto à reaquisição e ao pagamento de produtos em stock e de produtos devolvidos pelos clientes.
29-01-2008
Revista n.º 4365/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxxx
Contrato de prestação de serviços Retribuição
Condenação em quantia a liquidar
I - A retribuição não é um elemento essencial do contrato inominado de prestação de serviços.
II - Provando-se que houve entre as partes um acordo contratual para a elaboração de projectos pela Autora, mas não se provando que esse acordo abarcasse o concreto esquema de retribuição apresentado pela Autora, não se provando, portanto, o acordo quanto ao montante e modo de pagamento da retribuição dos serviços, impõe-se condenar a Ré a pagar à Autora até ao limite peticionado o que se vier a apurar no incidente próprio de liquidação (a que aludem os arts. 378.º a 380.º do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 38/03) como retribuição dos serviços pres- tados no âmbito do contrato em apreço nos autos.
29-01-2008
Revista n.º 4163/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Acidente de viação Nexo de causalidade Dano morte
Danos futuros
Danos não patrimoniais Litigância de má fé
I - Tendo a vítima, marido e pai dos Autores, sofrido, como consequência directa e necessária do acidente, ocorrido no dia 06-07-1999, diversas lesões corporais, nomeadamente fractura dos ossos da face, fractura exposta do fémur direito, em diversos locais, escoriações e hematomas espalhados pelo corpo todo, tendo por causa das lesões sido submetido a duas intervenções cirúrgicas, com anestesia geral (uma no própria dia do acidente e outra em 16-08-1999), e a transfusões de sangue, sofrendo, no dia 11-07-1999, paragem do sistema respiratório, ficado
ligado a um ventilador, situação que se manteve durante 4 dias, recebendo alta hospitalar em 21-08-1999, estando combalido e fraco, tendo no dia 01-10-1999 sido novamente afectado de uma crise de falta de ar, com aceleração do ritmo cardíaco e dificuldades respiratórias, ficando internado até ao dia 06-10-1999, data em que veio a falecer, estando provado (resposta ao que- sito 49.º) que faleceu como consequência directa e necessária do acidente, não há que questio- nar a verificação do nexo de causalidade adequada entre o acidente e a morte da vítima.
II - Considerando que o falecido era empresário titular de dois estabelecimentos comerciais e sus- tentáculo exclusivo de uma família constituída por mulher e dois filhos jovens, um ainda menor a prosseguir os estudos, aos quais dedicava grande afecto e carinho, é adequado atribuir os valores de 15.000 € e 50.000 € pelos danos morais da vítima e pela perda do direito à vida, tendo os Autores peticionado na moeda antiga os montantes de 5.000.000$00 e 7.500.000$00, respectivamente.
III - Outrossim se afigura adequado com os padrões jurisprudenciais fixar pelo desgosto da perda do marido e pai, a título de danos não patrimoniais próprios, as verbas de 17.000 € (para a viúva) e 15.000 € (para cada um dos filhos).
IV - No cálculo da indemnização pelos danos patrimoniais futuros, as declarações de IRC juntas aos autos, embora pudessem responsabilizar o seu autor em caso de omitirem rendimentos tributa- dos, não obstavam a que os Autores lograssem provar - como aconteceu - por testemunhas a desconformidade das mesmas com a realidade, sendo pois tais documentos passíveis de livre apreciação pelo tribunal de 1.ª instância.
V - Não existindo gravação da prova, não era sequer possível a sua impugnação, sendo, pois, insin- dicável por este Supremo a decisão proferida quanto à resposta ao quesito atinente ao montante do rendimento líquido médio auferido pelo falecido.
VI - Considerando que esse rendimento médio era de cerca de 4.000 €/mês, que a morte da vítima levou ao encerramento de um dos seus estabelecimentos e ao menor rendimento do outro (em face da falta de experiência da Autora), o que se traduziu numa perda de rendimento mensal à volta de 2.500 €, correspondendo a cada dos filhos o montante de 500 € e à viúva 1.000 €, jul- gamos adequado, sem necessidade de nos socorrermos de quaisquer tabelas e com uso da equi- dade, baixar os valores atribuídos pelos danos patrimoniais futuros, por perda de alimentos, para 27.500 € para o filho mais velho e 50.000 € para o mais novo.
VII - No que respeita ao cálculo da indemnização atribuída à viúva, há que aumentar o montante achado pela Relação, pois com a independência económica de ambos os filhos, remanesceria em princípio para ela e como contributo para respectivo sustento ainda que em parte, as verbas que antes àqueles estavam afectados, donde entendermos, com recurso à equidade, fixar o valor dos seus danos patrimoniais futuros em 221.000 €, correspondente ao montante peticio- nado.
VIII - Tendo em conta a enorme malha de questões suscitadas pela recorrente seguradora, é certo que parte delas já levantadas no anterior recurso de apelação subordinado, não vemos, posto que não merecendo atendimento senão no montante dos danos patrimoniais, que isso seja sinó- nimo de uma actuação processual censurável em termos de a fazer incorrer nas sanções previs- tas no art. 456.º do CPC, designadamente pelo uso indevido e injustificado da via recursória.
IX - Embora algumas questões levantadas não caibam nos limites da intervenção deste Supremo Tribunal na definição da matéria de facto, daqui não pode sem mais concluir-se que o recurso teve por escopo prolongar o pleito e evitar o trânsito em julgado da decisão, tanto mais que a seguradora já estava penalizada com os juros de mora.
29-01-2008
Revista n.º 4172/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Acidente de viação
Dano morte Danos futuros
Reparação do dano Concorrência de culpas Culpa da vítima Capacete de protecção Excesso de velocidade Mudança de direcção Presunções judiciais Nexo de causalidade
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Indemnização
Cabeça de casal
I - Provando-se que o condutor do motociclo, falecido marido da Autora, circulava a mais de 100 km/hora num local onde apenas podia circular a 50 km, quando se deparou, na sua faixa de rodagem, com a “intrusão” do veículo segurado na Ré, que circulava em sentido contrário e efectuava a mudança de direcção à esquerda, sinalizando a manobra e estando prestes a con- sumá-la, mas não se tendo provado se, atento o campo visual de 111 metros de que o condutor deste último dispunha até à curva de onde surgiu o motociclo, atentou no trânsito que circulava em sentido contrário, consideramos que se está perante culpas concorrentes, sendo de atribuir 60% ao condutor do veículo segurado na Ré e 40% ao condutor do motociclo.
II - As presunções judiciais são ilações que o julgador tira de um facto conhecido (facto base da presunção) para afirmar um facto desconhecido (facto presumido), segundo as regras da expe- riência da vida, da normalidade, dos conhecimentos das várias disciplinas científicas, ou da lógica.
III - O STJ não pode sindicar o juízo de facto formulado pela Relação para operar a ilação a que a lei se reporta, salvo se ocorrer a situação prevista na última parte do n.º 2 do art. 722.º do CPC (arts. 729.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 26.º da LOFTJ). Mas é questão de direito, da competência do STJ, a da admissibilidade ou não das ilações, face ao disposto no art. 351.º do CC, podendo o Supremo sindicar a indevida consideração da prova por presunção usada pela Relação, desig- nadamente quando viole normas de experiência comum, ou partindo de factos provados os deles inferidos exorbitem o seu âmbito.
IV - Tendo a Relação, no âmbito da sua competência, socorrendo-se de regras de experiência - pre- sunções judiciais -, concluído que, como as lesões traumáticas do condutor do motociclo ocor- reram na cabeça, a falta de capacete agravou as mesmas, sendo esse agravamento de imputar ao malogrado condutor do motociclo, pode o STJ conhecer desta matéria, já que aqui se “cal- deou” o uso de presunções judiciais com a questão do nexo de causalidade.
V - Com efeito, é impossível saber em que medida, das duas lesões graves (crâneo-encefálicas e torácicas) que causaram a morte, qual delas em maior ou menor grau foi determinante para o decesso; esta questão é de nexo de causalidade e com ela se relaciona a questão de saber se a falta de capacete contribuiu de maneira invencível para a morte.
VI - Daí que, ante a dificuldade de apurar qual a medida do agravamento da responsabilidade do condutor vítima letal, que sofreu lesões na cabeça e conduzia sem capacete de protecção, a questão não deva ser resolvida mediante um aleatório agravamento percentual do seu grau de culpa, devendo esse facto omissivo ser considerado na fixação da indemnização, segundo o cri- tério do art. 494.º do CC. Por isso, mantendo a proporção indicada em I, ante a culpa concor- rente dos protagonistas do acidente (art. 570.º do CC) será na indemnização a fixar que se repercutirá a “sanção” para o comportamento omissivo da vítima condutor do motociclo.
VII - O motociclo que ficou parcialmente destruído pertence agora à herança indivisa aberta por óbito da vítima, com quem a Autora foi casada e, por isso, a exigência da condenação da Ré a pagar o valor de 4.419,20€, respeitante ao conserto do veículo, terá que se aferir à luz das competências legalmente atribuídas à cabeça-de-casal. Mesmo entendendo que se trata de uma
dívida para com a herança, ela só poderá ser exigida por todos os herdeiros (art. 2091.º do CC) ou pela cabeça-de-casal “quando a cobrança possa perigar com a demora” (art. 2089.º do CC. Como a Autora não alegou este último requisito e não se vislumbra que a Ré - uma seguradora
- não seja uma entidade solvível, ainda que haja demora, o crédito da herança não perigará.
VIII - O facto de a Autora à data da morte ser casada com a vítima e esta ter um salário que, por força do regime matrimonial do casamento, é bem comum, a respectiva privação constitui a perda de um ganho futuro; ademais, por força do dever matrimonial de assistência - art. 1675.º, n.º 1, do CPC - tem de concluir-se que, mesmo que a relação conjugal estivesse em crise, a pri- vação dos rendimentos salariais do falecido marido constitui a perda de um ganho futuro. O facto de não se saber qual a exacta medida da contribuição do salário auferido para a vida familiar não impede que se fixe a indemnização por dano patrimonial, com base na equidade - art 566.º, n.º 3, do CC.
IX - Considerando que, à data do acidente, o marido da Xxxxxx tinha 21 anos de idade e auferia o vencimento mensal de 548,68 €, que o período de vida laboral activa se prolongaria até aos 65 anos, mais 44 anos, tendo em conta a idade da vítima, e que durante ele seria expectável a con- tribuição para as despesas da economia do casal, sendo usual em termos de equidade, fixar-se essa contribuição em 2/3 dos réditos auferidos, considerando a provável actualização do salário durante o tempo de vida activa, consideramos equitativo fixar em 74.819,68 € os danos futuros (perda de rendimentos) do casal.
X - Ascendendo a indemnização total a 139.819,60€, deverá, tendo em conta o grau de culpa antes fixado de 60% para o condutor do veículo segurado (pelo qual responderá a Ré) e de 40% para a vítima, ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 83,891,80 €.
29-01-2008
Revista n.º 3014/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator)
Xxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Embargos de terceiro Caso julgado formal Penhora
I - A prova a fazer na fase introdutória dos embargos de terceiro é uma prova sumária, perfunctória, cujo grau de exigência é menor, em relação à prova estruturada num contexto de contraditorie- dade.
II - O despacho de recebimento apenas evidencia um juízo de viabilidade ou plausibilidade depois da fase do despacho liminar mas, nem por isso faz caso julgado formal em termos de vincular o Tribunal, a final, após, sobretudo, ter-se estabelecido o contraditório com a notificação das “partes primitivas” para contestar (art. 375.º, n.º 1, do CPC).
III - Assim sendo, o facto de no despacho que recebeu os embargos, o embargante ter sido conside- rado terceiro (por não ser parte no processo onde foi praticado o acto alegadamente ofensivo do seu direito) - um dos requisitos para a dedução de tal oposição nos termos do art. 351.º, n.º 1, do CPC - não impede o Tribunal de considerar os embargos improcedentes, já que a quali- dade de terceiro mais não é do que uma questão de legitimidade.
IV - Porque à data da apreensão do bem (na sequência do arresto que veio a ser convertido em penhora), o embargante não era possuidor, nem titular do direito de propriedade do bem, que só adquiriu por via do contrato de compra e venda após tal apreensão, e, uma vez que não são oponíveis ao requerente do arresto e aos credores garantidos por penhora os actos de disposi- ção do bem pelo executado, não pode o embargante ver protegido, pelos presentes embargos, o direito de propriedade que adquiriu (em venda ineficaz em relação ao requerente do arresto).
29-01-2008
Revista n.º 4489/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator)
Xxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
Respostas aos quesitos Acidente de viação
I - Os tribunais de instância podem dar respostas explicativas aos quesitos, com base em factos (ins- trumentais) que resultem da discussão da causa e que se destinem a fazer melhor compreender o circunstancialismo que rodeou a infracção causal do acidente (art. 264.º, n.º 2, do CPC).
II - Perguntando-se no quesito se o “embate se deu sensivelmente a meio da faixa de rodagem tran- sitável”, constitui resposta explicativa, que este Supremo Tribunal, não pode alterar, a afirma- ção seguinte: “o embate ocorreu na metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta o sen- tido de marcha do automóvel”.
29-01-2008
Revista n.º 4519/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator)
Xxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Insolvência
Contrato-promessa de compra e venda
I - Não resultando da matéria de facto alegada o pretendido direito de crédito dos requerentes (fun- dado no alegado incumprimento pelo requerido do contrato-promessa de compra e venda de uma moradia que este se obrigou a construir, pelo preço de 28.000.000$00, dos quais já paga- ram 12.000.000$00) no presente processo especial de insolvência, improcede a sua pretensão de ver declarada a insolvência do requerido, por falta do pressuposto de legitimação previsto no n.º 1 do art. 20.º do CIRE.
II - Ainda que os requerentes pretendam que se conclua pelo incumprimento do contrato-promessa pelo requerido, constata-se que o cumprimento do contrato - com a construção e venda da moradia - não carece necessariamente de património avultado por parte do mesmo, pois este pode recorrer ao crédito para o efeito, além de que nos termos do contrato-promessa ainda tinha a receber 16.000.000$00 do preço total, importância essa a ser paga em prestações e que poderia dar para custear grande parte da construção prometida.
29-01-2008
Revista n.º 4706/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxx Xxx Xxxxxxxx
Acidente de viação Danos não patrimoniais Indemnização
I - A indemnização por danos não patrimoniais, visa compensar realmente o lesado pelo mal causa- do, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance significativo e não ser meramente simbólico, para assim se intentar compensar a lesão sofrida, proporcionando ao
ofendido os meios económicos capazes de fazer esquecer, ou pelos menos mitigar, o abalo moral suportado.
II - Ponderando na gravidade elevada dos danos sofridos pelo lesado, no valor actual da moeda, na ausência de culpa no evento do ofendido, na situação económica da R. Seguradora, uma indemnização de 60.000 € revela-se adequada.
29-01-2008
Revista n.º 4492/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Anulação do julgamento
Baixa do processo ao tribunal recorrido Matéria de facto
Documento autêntico
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I - Resultando o teor de determinado facto de documento autêntico (certidão da Conservatória do Registo Predial) não arguido de falsidade (art. 371.º do CC), deverá o mesmo ficar a constar da matéria de facto, pois tal documento tem força probatória plena quanto ao teor dos seus dize- res.
II - Se isso não aconteceu, tem o STJ poderes para alterar a matéria de facto considerada assente pelas instâncias, uma vez que ocorre violação do direito probatório material (art. 356.º, n.º 1, do CC).
III - Se a situação indicada no documento é matéria controvertida, sendo questionada a sua corres- pondência com a realidade fáctica, sendo necessário para que se possa tomar uma decisão conscienciosa a produção de prova a esse respeito, impõe-se, ao abrigo do disposto no art. 729.º, n.º 3, do CPC, a anulação do julgamento e a ampliação da matéria de facto, aditando novos quesitos à base instrutória, onde se questionem os factos relevantes, indicando o STJ a formulação dos pertinentes quesitos.
IV - Nesse caso, há que anular o acórdão recorrido e a sentença que este confirmou, ordenando-se a baixa dos autos directamente à 1.ª instância para que se proceda a novo julgamento da causa (art. 730.º do CPC), agora já com as alterações e aditamentos decididos, se possível com os mesmo Juízes que intervieram no primeiro julgamento.
V - Deverá a 1.ª instância respeitar a parte da matéria de facto já decidida que não se mostre vicia- da, podendo no entanto o Tribunal ampliar esse julgamento a outras matérias de facto ou repe- tindo o julgamento anterior sobre concretas matérias já objecto de indagação, com o fim exclu- sivo de, com os novos elementos, se evitarem contradições na decisão (art. 712.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, por analogia).
VI - As custas ficam a cargo da parte vencida a final.
29-01-2008
Revista n.º 4030/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Testamento
Legado em lugar da legítima
Ao aceitar legados em substituição das legítimas, os interessados perdem o direito à legítima, mas conservam a sua posição de herdeiros legítimos, concorrendo à herança para partilha do rema- nescente dos bens, em conformidade com as regras gerais da sucessão legítima.
29-01-2008
Revista n.º 3131/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Acção de preferência Contrato de arrendamento Propriedade horizontal
Tendo o Autor, arrendatário de duas fracções autónomas de prédio com 11 fracções autónomas, que foram vendidas em conjunto pelo preço global de 500.000 €, perante a comunicação que lhe foi feita para exercer, querendo, o direito de preferência relativamente à pretendida alienação, por contrato de compra e venda, de todo o prédio, optado pelo silêncio, não procurando sequer suscitar a possibilidade de preferir em relação às fracções de que era (e é) arrendatário, e demonstrando-se que a venda unitária de cada uma das fracções causaria um apreciável prejuí- zo aos 1.ºs Réus, seus proprietários, pois não conseguiriam encontrar compradores para algu- mas dessas fracções ou só o conseguiriam por preços muito reduzidos, obtendo um valor muito inferior ao indicado preço, não pode proceder a sua pretensão de preferir na compra e venda das duas fracções arrendadas.
29-01-2008
Revista n.º 4600/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Reclamação para a conferência Recurso de agravo na segunda instância Erro
I - No nosso sistema processual os recursos de agravo em 2.ª instância só têm cabimento no que toca a decisões do colectivo de juízes (decisões colegiais), e não do juiz relator; quanto a estas, e com ressalva do disposto no art. 688.º, que disciplina outro tipo de reclamações - para o Pre- sidente do tribunal que seria competente para conhecer do recurso retido ou indeferido - o modo adequado de reagir é a reclamação para a conferência, sempre que a parte se sinta preju- dicada - art. 700.º, n.º 3, do CPC.
II - Tendo a parte, em lugar de pedir a submissão do despacho do relator à conferência, agravado do mesmo, trata-se de um simples erro sobre o procedimento de impugnação do despacho do rela- tor, sendo de ordenar que o requerimento de interposição de recurso prossiga os trâmites legais da reclamação para a conferência a que alude o art. 700.º, n.º 3, do CPC.
III - Com efeito, não se vê que exista diferença substancial entre o caso previsto no art. 688.º, n.º 5, do CPC e o caso em análise, pois ali, em lugar de se reclamar para o presidente do tribunal ad quem, recorre-se, e aqui, em lugar de se reclamar para a conferência de juízes, recorre-se tam- bém.
IV - Essa norma pode ser aplicada analogicamente, pois não é excepcional (cfr. art. 11.º do CC), mas a mera concretização de um princípio geral, que aflora noutros preceitos da lei adjectiva, como é o caso do art. 199.º, n.º 1, e o dos arts. 687.º, n.º 3, 2.ª parte, e 702.º, do CPC.
V - O princípio geral que subjaz a estes textos legais é o da prevalência do fundo sobre a forma, nas várias dimensões que comporta, nomeadamente a de evitar que por razões de puro procedimen- to (meramente formais) se negue à parte que inequivocamente manifestou vontade de ver rea- preciado o mérito duma decisão judicial que a prejudica o direito de a ver sindicada por uma entidade diversa da que a proferiu, quando estejam reunidos todos os outros pressupostos legais para o efeito, assim dando simultaneamente efectiva consistência prática ao direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva que se consagra no art. 20.º da CRP.
29-01-2008
Agravo n.º 4443/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Habilitação do adquirente Cessão
Direito litigioso Procuração Caducidade
I - Não constando da procuração usada pela mandatária, ora recorrente, ao outorgar a escritura pública de cessão de direitos litigiosos, que a mesma lhe tenha sido conferida também no seu interesse, e não resultando dessa procuração, nem dessa escritura, nem sequer do requerimento de habilitação como cessionária de direito litigioso, qual a relação jurídica que se encontra na base do mandato, não se pode considerar que este tenha sido conferido também no interesse da mandatária.
II - Logo, tal mandato caduca com a morte da mandante, produzindo essa caducidade os seus efei- tos a partir do momento em que a morte seja conhecida da mandatária.
III - Resultando da matéria factual assente que a mandatária, ora recorrente, aquando da celebração da escritura de cessão de direitos litigiosos, tinha conhecimento da morte da mandante, daqui decorre que já não tinha poderes representativos que lhe permitissem outorgar tal escritura como procuradora da falecida, o que acarreta a ineficácia do negócio jurídico celebrado relati- vamente a esta representada, não podendo, consequentemente, proceder a requerida habilita- ção.
29-01-2008
Agravo n.º 4071/07 - 6.ª Secção Xxx Xxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de compra e venda Imóvel destinado a longa duração Defeitos
Caducidade
I - Embora o art. 917.º do CC se refira apenas à acção de anulação, justifica-se a sua aplicação extensiva às acções em que, baseadas em defeitos da coisa, se façam valer outras pretensões, designadamente de redução do preço, de reparação ou substituição da coisa, de resolução do contrato e de indemnização.
II - Na hipótese de o vendedor não ser construtor do prédio, a acção em que se pretende a condena- ção do vendedor de imóvel destinado a longa duração por defeitos de construção que esta se
recusa a reparar - deve ser intentada no prazo de 6 meses a contar da data da denúncia, sob pena de caducidade.
III - Mas quando o vendedor do prédio tenha sido o seu construtor, não obstante inexistir empreita- da entre ele e o comprador, aos defeitos do prédio é aplicável o regime do art. 1225.º e não o dos arts. 916.º e 917.º do CC.
IV - Não se pode considerar verificada a caducidade, ainda que o prédio já se encontre construído à data da venda e o vendedor não tenha sido expressamente indicado como construtor do prédio na petição inicial, quando dos termos desta resulta a invocação dessa qualidade do réu, uma vez que consta do contrato-promessa, cujo teor o autor declarou dar por reproduzido na sua peça inicial, que este prometeu comprar ao réu, que lho prometeu vender, o dito prédio então em construção, facto que tinha, aliás, sido alegado no art. 1.º da petição inicial e não impugna- do pelo réu na contestação, resultando igualmente da cópia do alvará de licença de construção junta aos autos e não impugnada que o alvará tinha sido emitido a favor do réu.
29-01-2008
Revista n.º 4592/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Embargos de terceiro Cônjuge
Separação de meações Arresto
Bens comuns do casal
I - A penhora de bens comuns do casal, em execução instaurada contra um só dos cônjuges, não depende, actualmente, de requerimento do exequente, feito logo no requerimento executivo, de citação do cônjuge não executado para requerer a separação de bens, nos termos do art. 825.º do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 38/03, de 08-03, tanto mais que os elementos que esse requerimento executivo deve conter não abrangem tal requerimento de citação, como resulta do disposto no art. 810.º do CPC.
II - Logo, feita a penhora desses bens comuns, não há fundamento para que seja levantada se tal requerimento anterior não existir ou se a citação do cônjuge não executado não tiver sido feita antes dela, podendo, consequentemente, o aludido requerimento de citação ser feito, quer antes, quer depois da penhora.
III - Sendo assim, não se justificaria também a obrigatoriedade de apresentação de requerimento de citação do cônjuge do executado, no requerimento inicial do arresto, nem sequer no decurso dos autos desse procedimento cautelar, sempre anterior à penhora em que o arresto virá, em princípio, a ser convertido. Portanto, quando o arresto de bens comuns do casal seja requerido apenas contra um dos cônjuges, não é necessário que o arrestante requeira logo no requerimen- to inicial do arresto a citação do cônjuge do arrestado para requerer a separação de bens.
IV - O referido art. 825.º não é aplicável à hipótese de arresto, apesar do disposto no art. 406.º, n.º 2, do CPC, pois na parte final deste se exclui precisamente tudo o que contrarie o estatuído nos dispositivos que integram a respectiva subsecção, sendo que na subsecção reguladora do arres- to não são estabelecidos outros termos a seguir após a sua concretização e que pudessem ficar suspensos (como resultaria da aplicação do n.º 7 do art. 825.º), uma vez que a finalidade do arresto - conservar a garantia patrimonial do direito do credor (art. 619.º, n.º 1, do CC) -, fica atingida com a sua concretização.
V - Como para pedir o levantamento do arresto a embargante apenas invocou a falta de requerimen- to, na petição inicial do arresto, da sua citação para requerer a separação de bens, os presentes embargos de terceiro terão de improceder.
29-01-2008
Revista n.º 4658/07 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Poderes da Relação
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
I - Não tendo sido impugnada a matéria de facto fixada pela 1.ª instância, não pode, em princípio, a Relação alterá-la oficiosamente.
II - Ao fazê-lo, a Relação usa mal os poderes conferidos pelo art. 712.º do CPC, facto que legitima a intervenção do Supremo no sentido de revogar o indevidamente alterado.
29-01-2008
Revista n.º 4675/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxx (Relator) *
Xxxxx Xx Xxxxx Xxxx
Acidente de viação Menor
Morte
Danos patrimoniais Danos futuros
Os pais do menor falecido na sequência de um acidente de viação não têm o direito de pedir o res- sarcimento dos danos patrimoniais futuros correspondentes à perda dos rendimentos que previ- sivelmente o seu filho receberia ao longo da sua vida.
29-01-2008
Revista n.º 4397/07 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) * Xxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Liquidação em execução de sentença Condenação em quantia a liquidar Pedido genérico
I - Aquilo que pode ficar para liquidação é unicamente o quantum indemnizatório, o valor dos pre- juízos; estes, contudo, devem ficar assentes, quanto à sua materialidade, na sentença condena- tória - art. 661.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 565.º do CC.
II - Tal condenação ilíquida, por não poder fixar as quantidades, só é “genérica” em relação a estas quantidades, mas tem de ser específica em relação à definição dos danos indemnizáveis.
III - Aliás, um pedido indemnizatório genérico, que é legal, não isenta o demandante de especificar os prejuízos, para que possa ser provada a sua existência.
29-01-2008
Revista n.º 4504/07 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Falência Remuneração Massa falida Penhora
I - A parte dos rendimentos do trabalho - isto é, a parte do 1/3 dos rendimentos - que se revele indispensável à sobrevivência do falido permanece intocável.
II - A parte que a exceda integrará a massa falida, competindo ao juiz, em cada caso concreto, determinar de acordo com um critério de equidade o quantum que ficará sujeito à penhora.
29-01-2008
Agravo n.º 600/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Mota Miranda
Pires da Rosa (vencido)
Testamento cerrado Revogação do testamento
I - Apesar do testamento cerrado não se encontrar “feito em pedaços”, mesmo assim se deve consi- derar revogado se estiver rasgado e lhe faltar algum bocado, compreendendo-se, deste modo, a utilização do termo “dilacerado” por contraposição a “feito em pedaços”.
II - No caso, resulta que o corte feito no testamento é corte central, mantendo-se a inteireza do texto e do seu suporte, não faltando qualquer pedaço ao testamento, mantendo-se unidas todas as páginas, apesar do corte, e com inteira legibilidade.
III - Logo, o testamento não se encontra “dilacerado ou feito em pedaços”, pelo que se não encontra “revogado” ou “inutilizado”.
IV - Sendo assim, não há que averiguar se se verificam as excepções da 2.ª parte do art. 2315.º, n.º 1, do CC, nem aludir à presunção do n.º 2, questões que apenas se impõem debater quando se considere o testamento revogado por estar “dilacerado ou feito em pedaços”.
29-01-2008
Revista n.º 63/08 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) Mota Miranda
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Contrato de compra e venda Venda de coisa defeituosa Redução do preço
Ónus da prova Ónus de alegação Denúncia
Venda de bens onerados
I - O comprador que se quiser fazer valer da redução do preço por cumprimento defeituoso há-de alegar e demonstrar o defeito e a sua denúncia junto do vendedor.
II - Já impende, contudo, sobre este a alegação e demonstração que o defeito resultou antes de má utilização da coisa por parte daquele.
III - No domínio da redução do preço inexiste regime específico relativo à venda de coisas defeituo- sas, sendo de aplicar, por remissão, o reportado à venda de bens onerados.
29-01-2008
Revista n.º 4540/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Acção de divisão de coisa comum Compropriedade
Prédio indiviso Usucapião
Partilha da herança Inversão do título
I - É condição de procedência de uma acção de divisão de coisa comum a existência de uma situa- ção de compropriedade.
II - Se, quando a acção foi proposta, a compropriedade já tinha cessado por se ter verificado a aqui- sição, por usucapião, do direito de propriedade singular de parte determinada do prédio, o pedido de divisão tem de improceder.
III - Se, por escritura pública de partilha de uma herança, foi adjudicada metade de um prédio indi- viso a cada um de dois dos herdeiros, que já se encontravam, cada um, na posse de parte determinada do prédio desde que fora celebrado o contrato-promessa correspondente, exercen- do sobre ela em exclusivo os poderes próprios do direito de propriedade singular, é desde essa data que se conta o prazo necessário à aquisição, por usucapião, desse direito.
IV - Não tendo chegado a possuir o prédio como comproprietários, não é condição de aquisição daquele direito, por usucapião, a inversão do título da posse.
29-01-2008
Revista n.º 2373/07 - 7.ª Secção
Xxxxx xxx Xxxxxxxx Xxxxxx (Relatora) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxx
Alegações de recurso Conclusões
Princípio da adequação
Apesar de as conclusões não se mostrarem resumidas, o não conhecimento do objecto do recurso só deve ocorrer se delas se não conseguir depreender quais os fundamentos invocados para a modificação da decisão, ou seja, quando as conclusões se revelam deficientes, obscuras ou complexas, sob pena de se dar prevalência à forma em detrimento do mérito, desrespeitando o princípio da adequação formal estabelecido no art. 265.º-A do CPC, pelo qual a decisão do mérito e o exercício dos direitos não deve ser impedido ou dificultado, sem fundamento sério, por razões meramente formais, porquanto a forma deve estar ao serviço da realização do direi- to.
29-01-2008
Agravo n.º 4264/07 - 7.ª Secção Xxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça
Admissibilidade de recurso Fixação judicial do prazo Servidão
I - Incidindo a presente revista apenas sobre a decisão, na parte relativa aos pressupostos legais do processo de fixação judicial de prazo, ou seja, sobre uma decisão proferida com base em crité- rios legais, é admissível recurso para este STJ, o que já não seria admissível se incidisse sobre a decisão na parte em que fixou o prazo, uma vez que aqui, sendo utilizado um critério de oportunidade ou discricionariedade, tal não seria admissível, face ao disposto no n.º 2 do art. 1411.º do CPC.
II - Resulta da conjugação do disposto no art. 1456.º do CPC e no n.º 2 do art. 777.º do CC que a finalidade do processo de fixação judicial de prazo consiste na fixação de um prazo quando, nas obrigações a prazo, o credor e o devedor não chegarem a acordo quanto a esse ponto.
III - Não está aqui em causa indagar profundamente sobre o direito para cujo exercício se torna necessário o estabelecimento de um prazo; o credor tem apenas que justificar sumariamente esse direito, que apenas deve ser objecto de um juízo de verosimilhança.
IV - No caso, a ré obrigou-se a outorgar num contrato visando a constituição de uma servidão a favor de um prédio da autora, contrato este que seria formalizado quando a ré adquirisse e registasse o prédio serviente a seu favor; aquisição esta futura, mas não incerta; só que não ficou determinado um prazo para a conclusão, o que agora a autora pediu para ser fixado pelo tribunal - e este fixou, tudo de acordo com os normativos atrás referidos.
29-01-2008
Revista n.º 4586/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxx
Acção executiva Junta de Freguesia Prazo de caducidade
Compensação de créditos Suspensão da execução
I - O prazo - de caducidade - para a execução da sentença a que se refere o n.º 2 do art. 170.º do CPTA apenas respeita às sentenças proferidas nos tribunais administrativos; ora, a sentença dada à execução no caso concreto - em que foi a ré Junta de Freguesia condenada a pagar determinada quantia em dinheiro - não foi proferida por um tribunal administrativo, mas sim por um tribunal comum.
II - Uma vez que no direito civil não está previsto qualquer prazo para a instauração da acção exe- cutiva em causa, não podia ser considerado qualquer prazo de caducidade.
III - A compensação era defesa que a executada podia e devia, sob pena de preclusão, deduzir na acção declarativa e que, por isso mesmo, a al. g) do art. 813.º do CPC rejeita ao exigir a super- veniência do fundamento de oposição arguido.
IV - A superveniência a que alude o referido normativo afere-se em relação ao momento em que existe ou ocorre situação em que a compensação pode ser efectivada e não em relação àquele em que é emitida a declaração prescrita pelo n.º 1 do art. 848.º do CC.
V - A execução não é propriamente uma causa a decidir, mas antes um direito já efectivamente declarado, não havendo, portanto, qualquer nexo de prejudicialidade; assim, temos que, com base numa relação de prejudicialidade, nunca uma execução pode ser suspensa.
29-01-2008
Revista n.º 4682/07 - 2.ª Secção
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxx
Acção executiva Título executivo Escritura pública
Reconhecimento da dívida Benefício da excussão prévia Renúncia
I - O embargante comprometeu-se a entrar com um montante de 214.483,10 € para a sociedade X, igual ao que entraria o embargado; solicitou ao embargado que adiantasse à referida sociedade a aludida quantia, que mais tarde lhe pagaria; o embargado entrou com a referida quantia para a citada sociedade; para pagamento desta quantia, o embargante concordou na celebração da escritura pública em que se confessava devedor do embargado da mesma; a quantia em dívida seria paga no prazo de um ano, o qual poderia ser renovado por prazos iguais.
II - Ao documento contendo as declarações aludidas em I assiste força executiva - art. 46.º, n.º 1, al. b), do CPC - uma vez que o reconhecimento pelo devedor de uma obrigação preexistente - integrador de título executivo extrajudicial ou negocial - pode consistir em confissão de acto (ou mero facto) que a constituiu.
III - Os embargantes declararam que se responsabilizavam como fiadores e principais pagadores por tudo quanto venha a ser devido ao credor relativamente à confissão de dívida; manifestaram, assim, expressamente, a sua vontade de renunciar ao benefício da excussão prévia.
29-01-2008
Revista n.º 4795/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxx
Contrato de seguro Seguro marítimo Navio
Barataria Falta náutica
Fortuna do mar
I - A “barataria do capitão” significa as faltas ligeiras ou graves, intencionais ou meramente culpo- sas, do capitão ou de algum membro da tripulação, enquanto as faltas náuticas se consubstan- ciam em simples erros ou falhas técnicas de navegação.
II - A “fortuna do mar” consubstancia-se nos acontecimentos ocorridos no mar que a maior prudên- cia e diligência do capitão e/ou dos outros membros da tripulação é insusceptível de prevenir ou evitar.
III - É caso de “barataria do capitão” a situação envolvida de culpa em que o mestre e o chefe de máquinas, no início do alagamento da casa das máquinas, não fecharam a porta desta e a de acesso daquela ao túnel do veio propulsor, do que derivou o alagamento do navio e o seu con- sequente afundamento.
IV - Excluída do contrato de seguro do ramo marítimo/casco a perda do navio derivada de “barata- ria do capitão”, afastada fica a obrigação da seguradora.
29-01-2008
Revista n.º 4805/07 - 7.ª Secção
Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Responsabilidade civil do Estado Prisão preventiva
Prisão ilegal Xxxx xxxxxxxxx
I - O erro significa o engano ou a falsa concepção acerca de um facto ou de uma coisa, distinguin- do-se da ignorância porque esta se traduz essencialmente na falta de conhecimento.
II - O erro grosseiro de facto e/ou de direito na apreciação judicial dos pressupostos de facto da prisão preventiva é o indesculpável ou inadmissível, porque o juiz podia e devia conscienciali- zar o engano que esteve na origem da sua decisão e que a determinou.
III - A circunstância de o recorrente ter sido absolvido a final por falta de prova do cometimento do crime por que foi pronunciado é insusceptível, só por si, de revelar o referido erro.
IV - Inverificado o facto ilícito da prisão preventiva, não incorre o Estado em responsabilidade civil extracontratual no confronto de quem a ela foi sujeito.
29-01-2008
Revista n.º 84/08 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Cooperativa Contrato de trabalho Assembleia Geral
I - A ré/recorrida é uma cooperativa de serviços: tem como objecto principal a prestação de serviços
- no caso, serviços de transportes.
II - Rege-se, pois, pelas disposições do DL n.º 323/81, de 14-12, e, nas suas omissões, pelas do Código Cooperativo.
III - O recorrente - que, pela via da transacção judicial, acorda com a recorrida, no processo laboral, pôr termo ao contrato de trabalho - não pode invocar esse mesmo contrato de trabalho, que voluntariamente quis extinguir, para obter um efeito que só poderia alcançar no caso de subsis- tência deste.
IV - Cessado o contrato, o recorrente deixou de ser trabalhador da recorrida, e, não detendo essa qualidade ou condição, não pode pretender a sua admissão como cooperador a coberto do n.º 2 do art. 8.º do DL n.º 323/81.
V - Por outro lado, o requerimento de admissão do recorrente não foi (ainda) objecto de deliberação da direcção da recorrida, não tendo ele usado dos meios legais ao seu dispor para vencer a inércia daquele órgão.
VI - Assim, só depois de tornada definitiva a deliberação da cooperativa, aqui recorrida, denegatória da admissão do ora recorrente - o que implicaria confirmação, pela assembleia geral, da deli- beração, naquele sentido, da direcção - é que se legitimaria o recurso aos tribunais, tal como flui do disposto no n.º 8 do art. 43.º do CCoop: só de tal deliberação poderia o tribunal dissecar o mérito.
29-01-2008
Revista n.º 4254/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Respostas aos quesitos
Matéria de facto Matéria de direito Cartão de crédito Contrato de seguro
Seguro de acidentes pessoais Cláusula contratual geral Interpretação da declaração negocial Morte
Litigância de má fé
I - Não podendo o STJ, em regra, alterar a matéria de facto fixada pelas instâncias, já, porém, se contém nos seus poderes o conhecimento da questão - que de questão de direito se trata - de saber se as respostas dadas pelo julgador da matéria de facto excedem o âmbito da alegação fáctica e dão como assente matéria de facto que não foi alegada pelas partes.
II - Se as respostas aos quesitos ultrapassarem as fronteiras da factualidade alegada e quesitada, têm elas de se considerar não escritas, por força do estatuído no art. 664.º, n.º 4, do CPC, aplicável por analogia.
III - Embora a interpretação das declarações negociais constitua matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias, não está o STJ impedido de exercer censura sobre a decisão res- pectiva quando esta contraria o disposto nos arts. 236.º, n.º 1, e 238.º do CC, pois, neste caso não se trata de fixar apenas factos, mas de aplicar um critério normativo, uma disposição legal
- ou seja, de interpretar as disposições legais com vista a fixar o seu sentido juridicamente relevante, o que constitui matéria de direito.
IV - Assiste-se, hoje em dia, a uma ligação e colaboração entre Bancos e Companhias de Seguros, dando lugar ao fenómeno designado por bancassurance, deixando a banca de estar confinada às actividades tradicionais de recolha de fundos e ao crédito ou financiamento, e interagindo com os seguros na distribuição de produtos financeiros, vendendo “produtos” de seguros atra- vés da sua rede de balcões.
V - A massificação das operações da Banca e dos Seguros levam os respectivos operadores a elabo- rar formulários ou impressos, contendo o clausulado que os clientes não estarão em condições de discutir, tendo apenas a alternativa de celebrar ou não o contrato, com o conjunto padroni- zado ou normalizado de cláusulas que este apresenta (cláusulas contratuais gerais).
VI - A lei impõe ao proponente um conjunto de deveres, com vista à tutela do contraente que as subscreve por mera adesão: o dever de comunicação integral, prévia e adequada aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, o dever de informação e esclarecimento, e o dever de clareza e precisão, isto é, a sua redacção clara e precisa.
VII - Em matéria de interpretação das cláusulas contratuais gerais são aplicáveis, por força do dis- posto no art. 10.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, as normas dos arts. 236.º a 238.º do CC.
VIII - O sentido da declaração negocial do proponente é, pois, (art. 236.º, n.º 1) o que corresponda à compreensão virtual de uma figura padronizada de declaratário: um declaratário medianamen- te instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante.
IX - Todavia, por força do disposto na parte final do art. 10.º do DL n.º 446/85, a interpretação das cláusulas contratuais gerais deve fazer-se sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam, tendo-se, assim, em conta que as circunstâncias concretas dos contratos singulares podem conduzir a resultados interpretativos diferentes dos que resultam da análise de cláusulas abstractas, tomadas em si e por si, e possibilitando-se uma justiça material mais apurada.
X - As cláusulas ambíguas valem com o sentido que lhes daria um aderente normal, colocado na posição do aderente real (art. 11.º do DL n.º 446/85), não valendo aqui uma ressalva semelhan- te à da parte final do art. 236.º, n.º 1, do CC. E, em caso de dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente.
XI - A cláusula - constante de contrato de seguro de acidentes pessoais em viagem agregado a um cartão do sistema VISA, celebrado entre o banco emitente do cartão e uma seguradora - que estabelece o pagamento de uma soma em dinheiro, em caso de morte do titular do cartão em acidente sofrido em viagem, se a viagem tiver sido comprada com utilização do cartão, e uma soma (menor) se a viagem for comprada sem utilização do cartão, deve, à luz dos princípios constantes dos números anteriores, ser interpretada no sentido de incluir, na primeira modali- dade, a utilização do cartão no pagamento da totalidade ou apenas de parte do preço da via- gem.
XII - A condenação como litigante de má fé assenta num juízo de censura incidente sobre um com- portamento inadequado à ideia de um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de Direito: não litiga de má fé a parte que não ultrapassa os limites da liti- giosidade séria, aquela “que dimana da incerteza”.
29-01-2008
Revista n.º 4422/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
Prova documental Documento particular Prova plena
Registo automóvel Presunção de propriedade Presunção juris tantum
I - A regra de que o STJ não exerce controlo sobre a matéria de facto nem revoga por erro no apu- ramento desta, e se limita a sindicar a aplicação do direito aos factos que as instâncias deram como provados, não é absoluta: o Supremo conhece de matéria de facto quando, na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, tenha havido ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou ofensa de disposi- tivo legal que fixe a força de determinado meio de prova.
II - A presunção registral que dimana do registo definitivo é ilidível - o registo, ainda que definitivo, constitui mera presunção juris tantum.
III - O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos arts. 374.º e 375.º do CC, faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, isto é, prova plenamente que o autor do documento fez as declarações que lhe são atribuídas.
IV - Os factos compreendidos na declaração e contrários aos interesses do declarante valem a favor da outra parte, nos termos da confissão, podendo, nessa medida, o documento ser invocado, como prova plena, pelo declaratário contra o declarante.
V - Mas, em relação a terceiros, tal declaração não tem eficácia plena, valendo apenas como ele- mento de prova a apreciar livremente pelo tribunal.
29-01-2008
Revista n.º 4528/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Fevereiro
Acidente de viação Contra-ordenação Presunção de culpa Xxxxx do lesado Danos futuros
Incapacidade permanente parcial Perda da capacidade de ganho Menor
I - A violação de normas da legislação estradal, nomeadamente as que fixam limites máximos de velocidade instantânea, implica, em regra, presunção juris tantum de culpa, em concreto do condutor autor da contra-ordenação;
II - A validade da regra ou princípio pressupõe, porém, que o comportamento contravencional objectivamente verificado seja enquadrável no espectro das condutas passíveis de causarem acidentes do tipo daqueles que a lei quer prevenir e evitar ao tipificá-las como infracções.
III - A “culpa do lesado” não interfere com a culpa do agente, designadamente diminuindo-a, limi- tando a sua intervenção aos efeitos indemnizatórios da responsabilidade do lesante, actuando apenas sobre o montante a ressarcir.
IV - Para que o evento deva considerar-se imputável ao lesado, não é necessário o concurso de um facto ilícito ou mesmo necessariamente culposo do lesado, censurável a título de culpa no sen- tido técnico-jurídico contido no art. 487.º CC, bastando que o facto (censurável/”culposo”), livre e consciente, deva ser “atribuível” a actuação do próprio lesado, em termos de auto- responsabilização.
V - Assente a responsabilidade do condutor criador imediato do perigo, o conhecimento da exposi- ção voluntária ao mesmo por um passageiro (assunção voluntária do risco), conjugada com a possibilidade de ocorrer o facto danoso, verificada que esteja a adequação causal entre esses pressupostos e o dano, pode configurar-se o concurso da “culpa”, a justificar a redução da indemnização prevista no art. 570.º.
VI - É de admitir como limite da vida activa, até ao qual deve ser compensada a perda da capacida- de de ganho, a idade de 70 anos.
VII - Estando em causa uma incapacidade do lesado - jovem de 16 anos de idade, aprendiz de calce- teiro -, na ordem do 60%, para a generalidade das profissões, está-se perante incapacidade de utilizar o corpo enquanto prestador de trabalho e produtor de rendimento e a possibilidade da sua utilização, em termos correspondente e progressivamente deficientes e penosos.
VIII - Esta incapacidade funcional, na medida em que a precede, tem, em princípio, uma abrangên- cia maior que a perda de capacidade de ganho e pode não coincidir com esta, tudo dependendo do tipo ou espécie de trabalho efectivamente exercido profissionalmente.
IX - Não se estando perante uma concreta profissão definitivamente adoptada, nem perante uma efectiva perda de ganho no seu exercício, deve considerar-se um salário médio previsível, con- frontando-o com a IPP geral, só assim se harmonizando os dois elementos, ambos referentes a qualquer profissão acessível ao lesado.
X - Em termos de normalidade e previsibilidade, o salário médio acessível a um jovem (operário), dotado de mediana capacidade e aptidão, após a fase de aprendizagem profissional, não deve situar-se abaixo de € 500,00 mensais.
07-02-2008
Revista n.º 4598/07 - 1.ª Secção
Xxxxx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Destituição de gerente Sociedade comercial Justa causa
Inquérito judicial
I - Tendo o Réu, ora recorrido, sido nomeado gerente da sociedade Ré em 10-09-2003, encontran- do-se então desorganizada a escrituração e faltando vários documentos para o encerramento das contas de 2001 a 2004, a falta de apresentação das contas dos respectivos exercícios sociais não reveste gravidade suficiente para justificar a sua destituição de gerente, embora possa ser requerido inquérito judicial por essa falta, nos termos do art. 67.º do CSC.
II - Demonstrando-se apenas que a sócia Autora, ora recorrente, esteve impedida de consultar os documentos da sociedade por omissão do recorrido que não deu as instruções necessárias ao gabinete de contabilidade para que àquela fosse permitido consultar tal documentação, não se pode considerar que a conduta do recorrido, embora constituindo uma violação do direito à informação da recorrente, se revista de gravidade suficiente para constituir “justa causa” de destituição.
07-02-2008
Revista n.º 4591/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxxx
Instituto de Segurança Social Insolvência
Legitimidade activa
I - Constitui um problema de legitimidade processual e não uma questão de fundo a de saber se o Instituto de Segurança Social, I.P., ao intentar o presente processo de insolvência, é ou não credor das contribuições em dívida, por parte da requerida, à segurança social.
II - Presentemente a legitimidade para requerer a insolvência na qualidade de credor por contribui- ções devidas à segurança social cabe, por expressa disposição legal, ao Instituto de Segurança Social, I.P. (DL n.º 214/2007, de 29-05), que integra além dos serviços centrais, os centros dis- tritais (arts. 1.º, 2.º e 28.º do seu novo estatuto aprovado pela Portaria n.º 238/2007).
III - Mas no quadro normativo regulador da missão e objectivos do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e do Instituto de Segurança Social vigente em 2006, aquando da proposi- tura da acção, ressalta a atribuição ao primeiro de poderes de decisão sobre os créditos contri- butivos, enquanto destinatário das contribuições e gestor das receitas por elas, em parte, pro- porcionadas.
IV - Deve, assim, entender-se caber ao IGFSS legitimidade para a propositura das acções especiais de declaração de insolvência dos contribuintes devedores, com a consequente absolvição da requerida da instância por falta de legitimidade (processual) do ISS.
07-02-2008
Agravo n.º 4072/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Acidente de viação
Incapacidade permanente parcial Danos futuros
Perda da capacidade de ganho Montante da indemnização
Considerando que o Autor tinha à data do acidente 19 anos de idade, gozava de boa saúde e fre- quentava o 2.º ano de um curso médio profissional com a duração de 3 anos, que, por causa das sequelas, não conseguiu completar, visto ter faltado a muitas aulas por causa dos tratamentos, tornando-se difícil e incerto que o venha a completar, ficando com uma IPP de 45% (incapaci- dade geral para o trabalho) em consequência das lesões sofridas no acidente, em que avultam a irreversível perda de força no braço direito devida a lesão neurológica, e ponderando não ter ele em nada contribuído para o acidente, que se deveu a culpa exclusiva do condutor do veícu- lo seguro, justifica-se com base num juízo de equidade a fixação do valor da indemnização pelos danos futuros em 17.000.000$00 (84.795,66€), conforme pedido e aceite pelas instân- cias.
07-02-2008
Revista n.º 4521/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Contrato de compra e venda Escritura pública
Preço
Falta de pagamento Quitação
Dolo
Qualificação jurídica Procurador
Erro sobre o objecto do negócio Anulação da venda
I - Pretendendo a Autora a declaração de nulidade da sua declaração negocial no contrato de compra e venda do prédio titulado por escritura pública, invocando erro sobre elemento essencial do negócio, no tocante à sua declaração de quitação integral do preço, por ter recebido, no acto, um cheque que supôs válido (para pagamento do preço da venda ainda em falta), cheque esse que nunca foi substituído nem pago, verifica-se erro sobre o objecto do negócio.
II - O erro consiste em a Autora ter declarado vender o prédio e estar o preço pago, por supor que o cheque que lhe foi entregue na escritura era um cheque regular que tinha cobertura e de cuja cobrança resultaria o recebimento do referido preço, circunstâncias estas que se não verifica- ram dada a irregularidade do saque do cheque e da falta de provisão do mesmo.
III - Tratava-se de erro essencial para a Autora, pois provou-se que aquela nunca teria outorgado o contrato em causa se soubesse que não estava a receber um cheque de cuja cobrança resultaria o recebimento do preço em falta.
IV - Embora o Réu comprador se tenha feito representar no negócio através de procurador, também demandado na presente acção, basta que se tenha provado o conhecimento da essencialidade do erro apenas no tocante ao Réu procurador (art. 259.º, n.º 1, do CC).
V - Tendo a Autora alegado factos para obter a anulação do contrato, factos esses que qualificou como dolo, os quais ficaram provados na sua essência, mas que não podem ser qualificados como dolo (um erro qualificado ou provocado), antes configurando um erro-vício sobre o objecto do negócio (qualificação que se pode fazer ao abrigo do art. 664.º do CPC), que tem a
mesma consequência legal pretendida (a anulação do negócio), procede a pretensão da recor- rente, embora com fundamentação diversa.
VI - Assim, declara-se a anulabilidade do contrato de compra e venda em causa - escritura junta aos autos - e dos respectivos registos prediais efectuados com base naquela, anulando-se ainda o acto de constituição de hipoteca que os Réus compradores efectuaram como proprietários do referido prédio a favor da Ré instituição bancária.
07-02-2008
Revista n.º 4676/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxx Xxx Xxxxxxxx
Pensão de sobrevivência União de facto Inconstitucionalidade Princípio da igualdade
Caixa Geral de Aposentações Isenção de custas
I - Quem vive em união de facto com funcionário ou agente da Administração Pública não pode ser discriminado, relativamente a outra pessoa, em situação essencialmente idêntica, cujo “compa- nheiro” era contribuinte da Segurança Social.
II - Assim, a disposição do art. 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência (DL n.º 142/73 de 31-03) - na medida em que prevê a pensão de sobrevivência se vença apenas no dia 1 do mês seguinte ao do requerimento da mesma, enquanto o disposto no art. 6.º do Decreto Regu- lamentar n.º 1/94, de 18-01, para o regime geral da segurança social, prevê o vencimento daquela pensão no início do mês seguinte ao falecimento do beneficiário - é materialmente inconstitucional, por violar o princípio constitucional da igualdade previsto nos arts. 2.º e 13.º da CRP.
III - A Caixa Geral de Aposentações não beneficia de isenção de custas, nos processos a que se aplique o Código de Custas Judiciais, na versão aprovada pelo DL n.º 324/2003 de 27-12.
07-02-2008
Revista n.º 4789/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator) * Fonseca Ramos
Xxx Xxxxxxxx
Recurso de apelação Reapreciação da prova Gravação da prova Nulidade de acórdão
Impugnação da matéria de facto
I - Quando sejam pedidas cópias das gravações para impugnação da matéria de facto, deve a Secre- taria verificar se o registo destas foi efectuado com boas condições técnicas antes de entregar as respectivas cópias.
II - No caso de tal não ter sido feito e vier a ser impugnada a não audibilidade das gravações entre- gues, deve ordenar-se ao impugnante que as apresente de novo, e, no caso de se verificar que efectivamente não eram audíveis ou perceptíveis nos concretos pontos indicados, deve entre- gar-se-lhe novas cópias, havendo o cuidado prévio de se verificar que o respectivo registo ficou bem efectuado.
III - É nulo o acórdão que não se pronunciou sobre a necessidade de entrega de novas cópias da gravação e decidiu não conhecer da impugnação da matéria de facto impugnada baseado na audibilidade e perceptibilidade das gravações originais sem que tenha sido ordenada qualquer diligência destinada a verificar, antes ou depois, se as cópias entregues também eram audíveis e perceptíveis.
07-02-2008
Revista n.º 4011/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxx (Relator) *
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Contrato de empreitada
Imóvel destinado a longa duração Defeitos
Revogação Responsabilidade contratual
Responsabilidade extracontratual Danos não patrimoniais
I - Tendo as partes acordado pôr fim ao contrato de empreitada que celebraram, concordando a Autora que a Ré lhe entregasse as chaves e a Ré que a Autora nada mais lhe pagasse relativa- mente à parte que ainda faltava executar, não se está perante uma resolução do contrato, tão pouco se podendo considerar que houve incumprimento do mesmo - de que resultasse a obri- gação por parte da Ré de restituir à Autora a quantia de 1.935.000$00 que esta lhe pagara -, antes se tratando de uma revogação, que não produz efeitos ex tunc, mas tão só ex nunc.
II - Porém, sempre haverá que considerar que parte substancial das obras efectuadas pela Ré ainda antes da revogação do contrato foi efectuada com defeitos, sendo alguns deles aparentes e outros ocultos.
III - Quanto aos defeitos aparentes, a Autora nada pode reclamar da Xx, já que aceitara a extinção do acordo (revogação contratual), nas condições em que a obra se encontrava, e não fora ilidi- da pela Autora a presunção estabelecida nos arts. 1218.º, n.ºs 1 e 5, e 1219.º do CC.
IV - Mas quanto aos defeitos ocultos, não estava a Ré exonerada da obrigação de os reparar, atento o princípio da boa fé, o equilíbrio das prestações e a natureza sinalagmática do acordo para a cessação do contrato, pois a revogação operara-se no contexto das obras efectuadas, tal como as mesmas se apresentavam, tendo a Autora aceite as mesmas mas assente em tudo quanto elas se tornavam visíveis e aparentes - art. 406.º, n.º 1, e 1219.º do CC.
V - Como a Ré não se disponibilizou a reparar os defeitos ocultos, mesmo já depois de findo o con- trato, tem a Autora o direito de executar as obras por outros meios, imputando à Ré o respecti- vo custo - art. 1221.º.
VI - Por outro lado, tendo a Ré praticado alguns actos ilícitos no prédio da Autora, danificando culposamente bens desta, tornando totalmente imprestáveis o lava-loiças e o móvel inferior de suporte deste, bem como o fogão, os quais, por se terem tornado inaptos para as suas funções, tiveram de ser substituídos, mostra-se a Ré obrigada a pagar à Autora esse prejuízo, o qual nada tem a ver com a execução do contrato, antes se situando no domínio da responsabilidade civil extracontratual.
VII - Provando-se ainda que, por causa da realização das necessárias obras de reparação dos defei- tos ocultos, e também dos defeitos aparentes, e da efectivação das obras inconcluídas ou nem sequer começadas, a Autora passou por nervosismo, incómodos e sofrimento, tendo de perma- necer fora de casa, vivendo - a Autora e seu agregado familiar (o casal mais 3 crianças, uma das doente do foro neurológico) - em casa da mãe, numa habitação com apenas dois quartos, um escritório e uma sala, situação que se prolongou por vários meses, muito mais do que o previsto contratualmente para a realização das obras, e que era apenas de (30-45 dias), deverá a
Ré indemnizar a Autora pelos referidos danos não patrimoniais, afigurando-se adequado fixar o valor da compensação em 1.000 €.
07-02-2008
Revista n.º 4588/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxx (Relator)
Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx
Pensão de sobrevivência União de facto
Centro Nacional de Pensões
A efectivação do direito às prestações sociais por morte do beneficiário (em situações de união de facto juridicamente relevantes) ocorre no caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança e de reunião das restantes condições (cumulativas) previstas no art. 2020.º do CC.
07-02-2008
Revista n.º 4801/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Sociedade por quotas Exclusão de sócio Concorrência desleal
I - Provando-se que o requerido, sendo sócio (maioritário) e único gerente da sociedade comercial A, constituiu uma outra sociedade por quotas (B), na qual detém posição maioritária e da qual é o único gerente, com objecto idêntico ao da primeira, sendo a sede das duas sociedades no mesmo local, retirando o requerido das instalações da primeira (sociedade A) os sinais identifi- cadores da mesma sociedade, substituindo-as por outros que identificaram a nova empresa, estamos perante uma conduta desleal, bem como gravemente perturbadora do normal funcio- namento da primeira sociedade.
II - Tal comportamento é, por si só, altamente lesivo dos interesses da sociedade preterida e ameaça com toda a evidência a sua própria subsistência, além de ser susceptível de lhe provocar graves prejuízos, porque, com toda a probabilidade, lhe retira clientes em proveito da firma concorren- te, levando-a à extinção a breve prazo.
III - Consequentemente, estão presentes todos os requisitos necessários para a exclusão do requeri- do de sócio da sociedade A.
07-02-2008
Revista n.º 4495/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Sociedade comercial Sócio gerente Interdito
Contrato de compra e venda Escritura pública
Preço
Prejuízo considerável Anulação da venda Legitimidade substantiva
I - Estando demonstrado que o negócio anulando - a compra e venda de prédio pertencente a socie- dade comercial (a 1.ª Ré) da qual o interdito é sócio gerente - foi realizado depois de anunciada a acção de interdição mas antes do registo da sentença que decretou a interdição, a anulação pretendida na presente acção supõe que o negócio implique prejuízo para o interdito, cabendo à Autora (mulher e tutora do interdito) a alegação e prova desse prejuízo relevante.
II - O prejuízo em causa - a que se refere o art. 149.º do CC - há-de ser um prejuízo efectivo, real, reportado ao momento da conclusão do negócio, não interessando considerar eventuais danos futuros.
III - Não logrando a Autora provar que o preço convencionado, que consta da escritura pública como tendo sido pago, não o foi efectivamente, ou seja, que o preço constante da escritura não entrou no património da sociedade vendedora, a acção tem que improceder.
IV - Embora as Rés (sociedade comercial vendedora e sociedade comercial compradora) tenham alegado que pagaram a totalidade do preço e só tenham provado a entrega de metade desse valor, isso em nada altera a solução a dar ao caso, pois quem tinha de provar que o preço não foi integralmente pago era a Autora.
V - Por outro lado, o interdito, na qualidade de sócio da Ré vendedora, apenas tem direito a qui- nhoar nos lucros sociais, nos termos da lei e dos estatutos, não lhe pertencendo o património imobiliário, mobiliário ou monetário da sociedade.
VI - Provando-se ainda que metade ou mais de metade do preço da venda do imóvel lhe foi atribuí- do pela própria sociedade, de modo que integrou esse dinheiro no seu património particular, não terá ocorrido prejuízo efectivo algum para ele (mesmo que se tivesse provado que a parte restante do preço não foi entregue à vendedora).
VII - A situação regulada nos arts. 148.º, 149.º e 150.º do CC é a anulabilidade dos negócios jurídi- cos celebrados pelo incapaz. Trata-se, pois, de negócios em que o incapaz intervém em nome próprio, na gestão dos seus próprios interesses.
VIII - No caso, o interdito, representado pela Autora, não celebrou, ele próprio, o negócio anulando. Não é ele o dono desse negócio, visto que interveio nele, juntamente com outro sócio-gerente, em representação da 1.ª Ré-vendedora, sendo esta a verdadeira dona do negócio.
IX - A legitimidade substantiva para requerer a anulação de acto de interdito pertence à pessoa em cujo interesse a lei estabelece a anulabilidade, ou seja, no caso pertence ao próprio interdito (cessada que seja a interdição) ou ao seu representante. Todavia, esse interesse há-de ser um interesse directo, actual e efectivo, que, aliás, lhe advirá do facto de o negócio afectar directa- mente a sua esfera jurídico-patrimonial.
X - Como o negócio foi celebrado entre as duas sociedades Rés e o interdito apenas representou, como sócio-gerente, a compradora, o seu interesse na anulação da compra e venda é meramen- te reflexo e é até oposto do interesse dos contratantes que, como resulta das suas contestações, querem o negócio tal como foi efectuado. A situação não cabe, assim, quer na letra quer no espírito do art. 149.º do CC.
07-02-2008
Revista n.º 4593/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Regulação do poder paternal Exercício do poder paternal Entrega de menor a terceiro
I - O Tribunal, ao decidir (na sentença proferida na 1.ª instância e confirmada por acórdão da Rela- ção) confiar a guarda de uma menor a uma terceira pessoa, atribuindo a esta o exercício do poder paternal, e que, logo que o pai do menor - detido em cumprimento de pena - fosse resti- tuído à liberdade (mesmo em liberdade condicional), ficava automaticamente atribuído a este o exercício do poder paternal e a guarda do filho, mais não fez do que atribuir o exercício do poder paternal a uma terceira pessoa a título meramente transitório.
II - Ao decidir desta forma, o Tribunal não respeitou o regime normativo respeitante ao exercício do poder paternal (daí a admissibilidade do presente recurso), pois antecipou uma decisão que só poderia eventualmente ser tomada após serem analisadas as condições sociais, morais e eco- nómicas do requerente depois da sua restituição à liberdade.
III - O Tribunal tem de ver, a cada momento, qual a melhor solução para um menor e não antecipar cenários, como o fizeram as instâncias. Teria, pois, o Tribunal de decidir, após a libertação do pai, se havia circunstâncias supervenientes que permitissem alterar o regime de regulação do poder paternal. Só então poderia ponderar se a salvaguarda dos interesses da menor justificava que o seu pai passasse a exercer o poder paternal.
IV - Na regulação do poder paternal não existe na nossa lei uma qualquer idade mínima para a audição de um menor, pelo que, em cada caso, poderá verificar-se a necessidade e a possibili- dade de ouvir o menor, sopesando, nomeadamente, a idade e o grau de maturidade deste.
07-02-2008
Revista n.º 4666/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Acção de reivindicação Usucapião
Posse
Presunção de propriedade Herança
Legitimidade activa
I - Pretendendo-se na presente acção o reconhecimento de que o imóvel em causa pertence à heran- ça por ter sido adquirido, nomeadamente por usucapião, pela falecida avó dos Autores, identi- ficados na petição na petição inicial, de quem são herdeiros, têm os mesmos legitimidade pro- cessual para assumirem tal representação (arts. 2019.º, n.º 1, e 2133.º, n.º 1, al. a), do CC, e 26.º e 28.º, n.º 1, do CPC).
II - A presunção consagrada no n.º 2 do art. 1257.º do CC não pode ter aqui qualquer valia, pois, se aquele que inicia a posse falecer, não pode, por razões óbvias, presumir-se que continua a exercê-la depois da morte.
07-02-2008
Revista n.º 57/08 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Falência
Aplicação da lei no tempo Graduação de créditos Crédito laboral
Crédito hipotecário Crédito pignoratício
I - Declarada, com trânsito em julgado, a falência de uma sociedade, é a essa data que deve atender- se para definir a lei aplicável à graduação de créditos; e assim, porque o Código do Trabalho vigente entrou em vigor em 28-08-04, é inaplicável aos direitos de créditos laborais em causa no presente processo, constituídos, todos eles, em 06-05-1997, data da sentença que decretou a falência.
II - Não tendo ficado provado (em rigor, não foi sequer alegado) que os reclamantes exerceram a sua actividade laboral no imóvel apreendido, o que é um facto constitutivo do direito que o art. 377.º, n.º 1, al. b), do CT lhes atribuiu, recaindo sobre eles o respectivo ónus da prova (art. 342.º, n.º 1, do CC), não podem os créditos laborais em causa ficar graduados antes dos hipote- cários e pignoratícios.
07-02-2008
Revista n.º 4137/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Contrato de agência Agente
Representação sem poderes
Abuso de poderes de representação
I - Actuando o agente sem poderes de representação, a consequência é a ineficácia dos negócios em relação ao principal (a ora Ré e recorrida), nos termos do art. 22.º, n.º 1, do DL n.º 178/86, de 01-07.
II - Tendo o terceiro, ora Autor e recorrente, tido plena consciência do abuso de representação por parte do agente da recorrida, é patente a inexistência de boa fé da sua parte (cfr. art. 23.º, n.º 1, do mesmo diploma legal).
07-02-2008
Revista n.º 4392/07 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
Recurso subordinado
I - Está-se perante recurso subsidiário, abrangido na previsão do art. 684.º-A do CPC, no caso em que a recorrente concorda, em primeira linha, com a sentença recorrida e não pretende que o recurso por si interposto seja apreciado senão no caso de procedência do recurso principal (sem embargo de ter ficado parcialmente vencida, com o que se conformou), apenas pretendendo acautelar a situação de a Relação decidir absolver a Ré.
II - Tendo improcedido na totalidade o recurso principal, não há que conhecer do recurso subsidiá- rio.
07-02-2008
Revista n.º 3115/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx
Contrato-promessa de compra e venda
Prazo certo
Interpretação da declaração negocial Xxxx
Incumprimento definitivo Interpelação admonitória Resolução do negócio
I - Só o incumprimento definitivo e culposo do contrato-promessa dá lugar às cominações previstas no art. 442.º, n.º 2, do CC, não bastando, para o efeito, a simples mora, porquanto nada justifi- ca que se excepcione o contrato-promessa do regime geral aplicável à generalidade dos contra- tos.
II - O prazo fixado em contrato-promessa para a celebração do contrato prometido tanto pode ser absoluto (quando as partes fixarem um prazo para o cumprimento de determinada obrigação de modo a que a prestação seja efectuada dentro dele, sob pena de o negócio já não ter interesse para o credor), como relativo. Sendo absoluto, decorrido o prazo para a celebração do contrato prometido sem que este seja realizado, caduca o contrato-promessa. Sendo relativo, determina a simples constituição em mora, conferindo ao credor o direito a pedir o cumprimento, a sua resolução (verificados os demais pressupostos legais) ou a indemnização legal moratória.
III - A determinação da natureza do prazo depende da natureza do negócio ou da interpretação da vontade das partes, devendo, em caso de dúvida, ter-se como estabelecido um prazo absoluto, por ser de presumir que os outorgantes quiseram efectivamente vincular-se de harmonia com os termos do contrato.
IV - Estipulando-se no contrato-promessa o pagamento de sinal de 3.150.000$00, ficando a parte restante do preço, de 12.600.000$00, de ser paga com a celebração da escritura de compra e venda, e que a promitente-vendedora, ora Ré, faria a entrega da fracção prometida aos promi- tentes-compradores, ora Autores, no prazo de 20 meses, mostra-se correcto, à luz do disposto nos arts. 236.º e 238.º do CC, considerar que as partes quiseram fixar o prazo de 20 meses, após a assinatura do contrato-promessa para a celebração da escritura pública, cabendo o ónus da interpelação, para esse efeito, à Ré.
V - Ainda que se entendesse que o contrato não fixava prazo para a realização da escritura, podiam os Autores interpelar a Ré para a celebração do contrato prometido, num prazo razoável. O prazo é razoável se foi fixado segundo um critério que, atendendo à natureza e ao conhecido circunstancialismo e função do contrato, permite ao devedor cumprir o seu dever de prestar.
VI - Pode fixar-se o vencimento da obrigação através de interpelação directa feita pela parte interes- sada à contraparte, neste caso pelos Autores à Ré, por ter sido ultrapassado em muito o período de 20 meses que no contrato-promessa havia sido estipulado para a entrega da fracção objecto daquele, sendo suficiente para o efeito a notificação judicial que foi requerida pelos Autores, estabelecendo o prazo de 30 dias durante o qual a Ré devia designar data para a realização da escritura.
VI - Não tendo procedido à marcação da escritura, a Ré sempre estaria constituída em mora, se não desde o termo do prazo de 20 meses estabelecido no contrato, pelo menos a partir do termo do prazo de 30 dias indicado pelos Autores no âmbito da notificação judicial avulsa.
VII - Terminando este último prazo no dia 13-09-2002, e estando a fracção prometida sem condi- ções de habitabilidade, carecendo os Autores de habitação para acolher o agregado familiar e de recorrer ao “crédito bonificado”, podiam ter resolvido o contrato-promessa, face à sua perda de interesse na celebração do contrato prometido.
VIII - Tendo os Autores enviado à Ré carta datada de 23-09-2002 comunicando-lhe a resolução do contrato-promessa, a eficácia desse comunicação não é afectada pelo facto de a Ré ter enviado aos Autores, em 18-09-2002, carta comunicando-lhes a marcação da escritura para o dia 30-09- 2002, se os Autores apenas levantaram esta última carta na estação dos correios no dia 25-09- 2002, data em que é possível considerar que a carta enviada pela Ré entrou na esfera pessoal dos Autores.
IX - Ainda que assim não fosse, a mera marcação da escritura pela Ré não afastava a verificada perda de interesse, já que na fracção continuavam a faltar obras de acabamento, não sendo exi- gível aos Autores que se dispusessem a celebrar a escritura sem que a habitação reunisse as condições correspondentes ao fim a que se destinava e que era premente para os Autores face às condições precárias em que se encontrava instalado o seu agregado familiar.
07-02-2008
Revista n.º 4437/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx
Confiança judicial de menores Processo de jurisdição voluntária
Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça Admissibilidade de recurso
Norma de conflitos Lei aplicável
I - Em processo considerado de jurisdição voluntária - cfr. arts. 146.º, al. c), 150.º, 164.º e 165.º, todos da Organização Tutelar de Menores (OTM), aprovada pelo DL n.º 314/78, de 27-10 -, sendo-lhe aplicáveis as normas dos arts. 1409.º a 1411.º do CPC, a bondade do critério dos jul- gadores nas instâncias, a sua ponderação e bom senso na prolação da decisão que lhes parece mais equitativa no que concerne à requerida confiança judicial de menores são insindicáveis por este Supremo Tribunal.
II - Tendo os menores a nacionalidade guineense e o casal de requerentes da confiança judicial com vista a futura adopção a nacionalidade portuguesa, por força das normas de conflitos atinentes à constituição da filiação adoptiva, vertidas no art. 60.º do CC, ao caso sub judice é aplicável a lei portuguesa.
III - Na situação de menor filho de pais falecidos, não é legítima a confiança judicial desde que o menor se encontre a viver com ascendente, colateral até ao 3.º grau (portanto, irmãos ou tios) ou tutor e a seu cargo, excepto se estes puserem em perigo, de forma grave, o menor - cfr. n.º 3 do art. 1978.º do CC, e n.ºs 1 e 2 do art. 3.º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Peri- go, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 01-09, ou se o Tribunal concluir que a situação não é ade- quada a assegurar suficientemente o interesse do menor.
IV - Não se encontrando os menores a viver com os ora recorrentes (apesar destes, tios e irmão dos menores, terem manifestado essa vontade só não os tendo consigo em virtude da decisão judi- cial de entrega provisória dos menores à ora recorrida), estão preenchidos todos os pressupos- tos previstos no art. 1978.º do CC para o Tribunal decretar, como efectivamente decretou, a confiança judicial dos menores com vista a futura adopção, não tendo, pois, na verificação dos requisitos para o decretamento de uma tal medida sido violado qualquer preceito legal.
07-02-2008
Revista n.º 3439/07 - 6.ª Secção Xxx Xxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de sociedade Contrato atípico Qualificação jurídica
I - Constitui um contrato inominado e atípico aquele em que a Autora se obrigou a adiantar dinheiro para a beneficiação de um prédio da Ré, em empreitada a executar de comum acordo por um terceiro dentro do limite da prestação por aquela efectuada, e que compreende elementos de um mútuo para tal finalidade específica, e a Ré, por sua vez, se obrigou a vender o mesmo pré- dio logo depois de remodelado, restituindo àquela o montante destinado às obras e a sair do preço e em quota igual a parte representativa do lucro que viesse a obter calculado na base da soma do valor previamente fixado ao prédio e o entregue por aquela.
II - Não se pode considerar que esteja aqui em causa um acordo societário, sem observância da forma legal, uma vez que as partes não tinham em vista o exercício de qualquer actividade em comum, que pudesse constituir o seu “objecto social”. Antes se propunham apenas praticar um único acto, que consistia na venda com lucro de uma fracção predial propriedade da Ré depois de ser objecto de obras de remodelação, a pagar e efectivamente pagas pela Autora no montan- te ajustado.
07-02-2008
Revista n.º 3806/07 - 6.ª Secção Xxx Xxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de arrendamento Aplicação da lei no tempo Ruído
Obras
Abuso do direito
I - Nos presentes autos não é de aplicar o NRAU por estarem em causa normas de direito substanti- vo, respeitantes à realização de obras, antes se devendo considerar o regime em vigor à data da propositura da acção, uma vez que o que está aqui em causa é saber se, nessa data, os Autores tinham ou não o direito que se arrogam, por ser esse o momento relevante para determinar se os factos articulados têm eficácia constitutiva do direito invocado.
II - Pretendendo os Autores, arrendatários do rés-do-chão do prédio dos Réus, senhorios, que estes sejam condenados a efectuarem as obras necessárias e adequadas para a eliminação do ruído excessivo proveniente do estabelecimento comercial de café daqueles, que se faz sentir no 1.º andar do prédio, onde os Réus habitam, e consistindo essas obras na construção de uma laje maciça de betão com um tecto falso de gesso cartonado suspenso por “suspensores acústicos” e com uma manta de lã de vidro colocada no seu tardoz, não são estas obras da responsabilidade dos senhorios.
III - Desde logo, por não serem obras de conservação ordinária, designadamente obras impostas aos Réus pela Administração Pública com vista a conferir ao prédio as características apresentadas aquando da concessão da licença de utilização.
IV - As obras pretendidas são obras de beneficiação, que podem ser definidas como todas aquelas que não sejam de classificar como de conservação, isto é, aquelas que, não sendo necessárias para a conservação do prédio, o melhoram, permitindo uma melhor adequação do locado ao seu fim. Mas não ocorrem as condições constantes do art. 13.º do RAU que tornariam os Réus responsáveis pela sua realização.
V - Inexistindo incumprimento pelos Réus de qualquer obrigação sua - não articulando nomeada- mente os Autores, na sua petição inicial, que os Réus tenham deixado de executar obras de conservação no prédio dentro dos 8 anos referidos no art. 89.º do DL n.º 555/99, de 16-12, quando só podem ser atendidos os factos articulados (art. 664.º do CPC) -, nem tão pouco o exercício ilegítimo de direito pelos Réus, conclui-se que não recai sobre os mesmos qualquer obrigação de indemnização.
07-02-2008
Revista n.º 4524/07 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Litigância de má fé Admissibilidade de recurso
Atento o disposto no art. 456.º, n.º 3, do CPC, não é admissível recurso do acórdão da Relação que confirmou a condenação como litigante de má-fé, proferida em 1.ª instância.
07-02-2008
Revista n.º 4688/07 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Contrato de empreitada Contrato de compra e venda Imóvel destinado a longa duração Defeitos
Legitimidade substantiva Caso julgado formal Presunção de culpa
I - Não tendo sido posta em causa na contestação a legitimidade substantiva da Ré, empreiteira, ora recorrente, relativamente à presente acção - intentada pelo Condomínio do prédio pedindo a condenação desta na realização de obras destinadas a eliminar defeitos de construção -, mostra- se vedado, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 2.ª parte, 713.º, n.º 2, e 726.º do CPC, conhe- cer dessa questão, porque tal sindicação traduzir-se-ia numa violação, por via indirecta, do caso julgado entretanto formado.
II - Tendo-se provado que “alguns condóminos usaram as clarabóias para aceder ao telhado, nomeadamente para colocação e orientação de antenas e que algumas não foram conveniente- mente fechadas, provocando entrada de águas, e que ao caminharem sobre o telhado, os con- dóminos partiram telhas e desprenderam as caleiras dos rufos do beiral, provocando penetração de águas pluviais”, mas não estando provado que tais actos tenham contribuído exclusiva ou concorrencialmente para as deficiências que as instâncias consideraram verificadas como inte- grando os defeitos de construção de que padecia o edifício, não se pode considerar que tenha havido elisão da presunção de culpa da empreiteira (arts. 350.º, 570.º, n.º 1, e 799.º, n.º 1, do CC).
07-02-2008
Revista n.º 4330/07 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
Contrato de prestação de serviços Resolução
Justa causa
I - O contrato celebrado entre a Autora e o Instituto de Apoio à Emigração e às Comunidades Por- tuguesas (pessoa colectiva que hoje deixou de existir, passando para a Direcção Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas, na dependência da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, Ministério dos Negócios Estrangeiros) em que aquela assumiu a obrigação de ministrar aulas, teóricas e práticas, de confecção e modelagem a adultos, emi- grantes portugueses em França, assume a natureza de um contrato de prestação de serviços, cuja regulamentação se pauta pelas normas aplicáveis ao mandato - arts. 1154.º e 1156.º do CC.
II - A revogação unilateral do referido contrato, por parte do Réu, ora recorrente, colhe apoio legal no estatuído no art. 1170.º, n.º 1, do CC, assistindo ao mandatário, em caso de exercício pelo mandante de tal direito potestativo, o direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido, como resultante da tutela da confiança que se mostra então violada com a extinção do referido con- trato - art. 1172.º, al. c), do CC.
III - Havendo justa causa para a aludida revogação, a parte que, através da sua conduta, justifica que haja lugar para tal manifestação unilateral de vontade do mandante, não pode, sob pena de ofensa do princípio da boa fé - art. 762.º, n.º 2, do CC - ser indemnizada por uma situação que, em última análise, é da sua exclusiva responsabilidade.
IV - Apenas se tendo provado que houve críticas de alunos e que a Autora recorrida, em datas não apuradas, foi advertida para providenciar pela alteração do seu comportamento e modo de actuação, não se pode considerar verificado o aludido fundamento (justa causa) invocado pela Ré para a revogação do contrato.
07-02-2008
Revista n.º 4398/07 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
Acidente de viação Privação do uso de veículo Indemnização
I - Nos danos passíveis de ressarcimento e correlacionados com a impossibilidade de utilização pelo lesado do veículo de sua propriedade em consequência da verificação do sinistro englobam-se, desde logo, os danos emergentes, traduzidos estes nos quantitativos pecuniários corresponden- tes aos custos que o lesado teve de suportar em transportes alternativos, v.g. transportes públi- cos, táxis, aluguer de um veículo de substituição, bem como os lucros cessantes, consubstan- ciados estes nas perdas de rendimentos que a imobilização do veículo, durante o período de reparação, ocasionou à actividade lucrativa do seu respectivo proprietário - arts. 562.º e 564.º, n.º 1, do CC.
II - No contexto do direito de propriedade insere-se a atribuição ao respectivo titular dos direitos de uso e fruição exclusivos relativamente ao bem sobre o qual incide tal direito (art. 1305.º do CC) -, pelo que, em caso de privação ilícita do exercício da integralidade de tais poderes, ocor- reria uma situação de grave desvalor, se a acção do lesante quedasse impune, sob o ponto de visa indemnizatório.
III - Isto porque, a tal se verificar, haveria então lugar à institucionalização, por via directa, da atri- buição de um prémio, para o responsável que não providenciasse, com a celeridade minima- mente exigível, quer quanto à reparação dos danos sofridos pelo lesado, o que se consubstan- ciaria, na situação em presença, na colocação à disposição do mesmo da indemnização devida, correspondente à perda total do veículo, quer quanto à entrega àquele de um veículo de substi- tuição, enquanto tal pagamento não viesse a ter lugar, atendendo a que, as delongas na resolu- ção de tal situação, sempre redundariam em exclusivo benefício da entidade seguradora, pelos réditos económicos a que tais omissões conduzem.
IV - Portanto, a mera indisponibilidade de um veículo, independentemente de da mesma terem resultado para o lesado prejuízos económicos quantificados, é passível de indemnização, a cal- cular nos termos prescritos no art. 566.º, n.º 3, do CC.
V - Na situação dos autos, em que não vem provado, pois também não foi alegado, que o lesado, embora necessitando de utilizar o veículo para a sua vida profissional e pessoal, o que se veri- ficou durante 974 dias, tenha suportado, em consequência da privação da disponibilidade do uso de tal meio de locomoção, quaisquer custos relacionados com a referida ocorrência, uma vez que beneficiou da ajuda de amigos e familiares, deverá ser-lhe atribuída uma indemnização ressarcitória de tal privação do uso do veículo.
VI - Não vindo questionado o valor fixado pelas instâncias - 19.480 € -, não há que apreciar a juste- za do mesmo, sob o ponto de vista da equidade.
07-02-2008
Revista n.º 4505/07 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
Responsabilidade extracontratual Ónus da prova
Facto negativo
I - A prova dos factos constitutivos, sejam eles positivos ou negativos, incumbe à parte que invoca o direito.
II - Não é pelo facto de estarmos perante um “facto negativo” que se inverte o ónus da prova nem tão-pouco pela dificuldade que isso naturalmente representa.
07-02-2008
Revista n.º 4705/07 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxx (Relator) *
Xxxxx Xx Xxxxx Xxxx
Impugnação pauliana Falência
Direito de preferência Trespasse
Renúncia Má fé
I - Não se está perante um acto de natureza pessoal mas de conteúdo patrimonial, sendo certo que do não exercício pela recorrente/falida do direito legal de preferência no trespasse do estabele- cimento resultou uma diminuição da garantia patrimonial dos créditos, no valor de mercado do mesmo trespasse (art. 610.º do CC).
II - À data da renúncia já existiam todos os créditos, reconhecidos na falência, pelo que é patente a anterioridade destes relativamente àquela.
III - Derivou do acto da renúncia o agravamento da impossibilidade para os credores da falida de obterem o pagamento dos seus créditos, uma vez que acarretou a perda de um direito no valor patrimonial de, pelo menos, 36.000.000$00.
IV - Sendo a renúncia do direito à preferência um acto abdicativo, porque o seu titular unilateral- mente prescinde do direito, que se extingue por esse facto, resulta dessa renúncia um empo- brecimento patrimonial, sem contrapartida.
V - O acto de renúncia é, assim, de equiparar para efeitos de impugnação pauliana aos actos gratui- tos; daí que não seja necessário o requisito da má fé (art. 612.º, n.º 1, 2.ª parte, do CC).
VI - Mas ainda que fosse de sujeitar a renúncia ao regime dos actos realizados a título oneroso, provou-se que a renúncia da recorrente ao exercício do direito de preferência no trespasse “teve o único intuito de subtrair o imóvel ao alcance dos seus credores, diminuindo o valor do seu património, tal como as rés bem sabiam”.
XXX - Xxx sabia a recorrente que a sua situação era de falência irreversível e desse facto tinham conhecimento igualmente as demais intervenientes no negócio, as quais sabiam ainda que pre- judicavam os credores da recorrente.
VIII - Decorre do exposto a existência da má fé das rés, sendo que não logrou a recorrente ilidir a presunção legal de actuação nesse sentido (art. 612.º, n.º 1, 1.ª parte, do CC, e art. 158.º, n.º 1, al. a), do CPEREF).
IX - Assim, não merece reparo o acórdão recorrido ao manter a sentença que, na procedência da impugnação, condenou as rés a reconhecerem a ineficácia do referido acto de renúncia, com a consequência de o direito de preferência no trespasse do estabelecimento renascer no patrimó- nio da recorrente.
07-02-2008
Revista n.º 4806/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Abuso de liberdade de imprensa Liberdade de informação Liberdade de expressão Jornalista
Direito ao bom nome Direito à honra
Convenção Europeia dos Direitos do Homem Tribunal Europeu dos Direitos do Homem Abuso do direito
Responsabilidade extracontratual Xxxxx não patrimonais
I - No domínio do pensamento, da expressão e da informação, a regra é a liberdade. II - Esta ideia-base de liberdade encerra, porém, restrições.
III - Na concretização da fronteira entre aquela e estas, deve ser tido em conta o art. 10.º da Con- venção Europeia dos Direitos do Homem e, concomitantemente, deve ser acolhida a interpre- tação que dele faz o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
IV - Da jurisprudência que vem sendo firmada por este, resulta uma imposição no modo de pensar. Não se justifica que se pense, logo à partida, sobre se determinada peça jornalística ofende alguém. Deverá, antes, partir-se da liberdade de que gozam o ou os respectivos autores. Só depois, se deve indagar se se justifica - atentos os critérios referenciais do mesmo tribunal, com inclusão duma margem de apreciação própria por parte dos órgãos internos de cada um dos Estados signatários da Convenção - a ingerência restritiva no campo dessa mesma liberda- de e a consequente ida para as sanções legais.
V - O que não significa que os casos de ingerência restritiva não assumam intensa relevância, na perspectiva dos valores essenciais ao ser humano.
VI - Sendo de considerar, na margem de liberdade que assiste aos órgãos de cada um dos Estados signatários da Convenção e, dentro dela, aos órgãos portugueses, as normas interessantes do Direito Penal, o art. 484.º do CC e, bem assim, além do mais que ao caso couber, o constante do Estatuto dos Jornalistas.
VII - Neste quadro, é de considerar ainda situada no campo da liberdade, a referência, em semaná- rio, relativa a instituição que prossegue fins humanitários de luta contra uma doença, de que há irregularidades de gestão de cerca de 240 mil contos recebidos de dois ministérios, que relati- vamente aos donativos de particulares e empresas a situação é ainda mais complicada, que os donativos em espécie também são fonte geradora de polémica e que ainda hoje ninguém sabe do paradeiro de quadros doados à instituição, tudo numa altura em que se verificavam investi- gações das autoridades que colocaram diversas questões de procedimento e funcionamento da mesma instituição.
VIII - Mas já se situam no campo das restrições à mesma liberdade, no capítulo da ofensa à honra na modalidade do bom nome, as notícias inseridas em duas edições desse semanário, com mui- ta relevância e fotografia da directora de tal instituição, em que se imputou a esta vida luxuosa
- com referência pormenorizada a propriedades, viagens e desaparecimento de obras de arte - à custa do património da instituição e à sombra da luta contra a doença por esta prosseguida, nada se tendo provado a respeito de tal vida, ou de desvio de fundos ou, ainda, de apropriação de obras de arte.
IX - Na determinação do quantum indemnizatório respectivo, há que atender aos critérios do art. 494.º, por remissão do art. 496.º, n.º 3, ambos do CC, com ressalva do relativo à situação eco- nómica da lesada que é afastado pelo art. 13.º da CRP.
X - Sendo ainda de considerar os valores que vêm sendo atribuídos noutros casos, por este tribunal, havendo, outrossim, vantagem em reparar nos montantes que vêm sendo fixados pelos tribu- nais dos países com os quais temos mais estreitas afinidades.
XI - É, assim, adequado o montante compensatório de € 12.500 relativo ao referido em VIII.
XII - Se dos factos não resultar que o director da publicação teve conhecimento e não se opôs à publicação das notícias referidas em VIII, não deve ele ser condenado.
XIII - As suas funções poderiam levar a menor exigência de prova sobre o seu conhecimento prévio das notícias ou até levar a presunções judiciais que a tal conduzissem - estas, se não afastadas pela resposta negativa a pontos da base instrutória em que se perguntasse tal matéria e se tives- se respondido não provado - mas tudo isso é alheio aos poderes deste Supremo Tribunal em recurso de revista.
XIV - O abuso do direito, na modalidade da neutralização do direito, supressio ou Verwirkung tem os mesmos pressupostos do reportado ao venire contra factum proprium, substituindo-se o fac- to próprio pelo decurso do tempo.
XV - Não tem, então, lugar no caso de apenas se ter provado que a autora, até vir a juízo, quase esgotou o prazo de prescrição relativo ao seu direito.
XVI - Ainda que o autor principal das notícias não seja o autor dos títulos, subtítulos, textos e apo- sição das fotografias das primeiras páginas e títulos e subtítulos das páginas interiores, não deve deixar de ser responsabilizado pela totalidade da indemnização.
07-02-2008
Revista n.º 4403/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Acidente de viação
Incapacidade permanente parcial Danos futuros
Danos não patrimoniais Cálculo da indemnização
X - X autor nasceu em 22-03-1982; auferia como auxiliar médico a quantia mensal de 477,14 €; ficou afectado de uma IPP de 15% que é limitativa do exercício da sua actividade profissional.
II - Apesar da IPP de 15%, não se provou qualquer diminuição dos proventos auferidos pelo autor.
III - Fracturou costelas e o antebraço, teve luxação obturadora da anca, ferida na região da omopla- ta, contusão pulmonar e pneumotórax bilateral; teve dois internamentos hospitalares por vários dias cada, tendo sido submetido a tratamentos invasivos; ficou com cicatrizes no tórax, no ombro direito e no antebraço.
IV - Assim, a título de danos futuros e danos não patrimoniais, julgam-se adequados os montantes respectivos de 35.000,00 € e 20.000,00 €.
07-02-2008
Revista n.º 4704/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Contrato de franquia Regime aplicável Incumprimento do contrato
Erro sobre o objecto do negócio
I - As partes celebraram um contrato nos termos do qual a ré, mediante o pagamento do autor, con- cede a este licença limitada para prestar um serviço rápido de lavandaria a seco e comerciali- zação de produtos complementares, sob a sua marca e com o seu know-how, com o equipa- mento por si vendido, desfrutando, assim, o autor da notoriedade da marca, bem como do “saber-fazer” relativo à organização e metodologia inerentes ao negócio em causa.
II - Trata-se de um contrato de franquia e o seu regime jurídico é o determinado pelas estipulações das partes, no exercício da sua autonomia.
III - Em parte alguma é alegado pelo autor que a ré não reúna a capacidade ou conhecimentos para levar a cabo as tarefas inerentes ao negócio com base nas quais contratou; o que alega é incumprimento contratual (não provado) e não erro.
IV - O mesmo se passa relativamente ao objecto do negócio; nada se provou que possa implicar qualquer erro ou falsa representação sobre o que versa o contrato - actividade comercial de lavandaria rápida; o que o autor/recorrente questiona são os lucros que a ré lhe terá prometido (promessa que não se provou) e que não se verificaram; confirma-se, pois, a improcedência da acção.
07-02-2008
Revista n.º 4793/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Serra Baptista
Acidente de viação Culpa
Ónus da prova Despiste Transporte gratuito
I - Depois de passar no cruzamento da Avenida do Brasil com o Campo Grande, deparou-se ao réu, na sua frente, um conjunto de obras na estrada, sem que as mesmas estivessem sinalizadas; havia buracos no chão devido às obras de construção do túnel rodoviário do Campo Grande.
II - O local estava bem iluminado; o veículo era conduzido à velocidade de cerca de 50 km/h e o autor era transportado no veículo por mera amizade com o condutor do veículo.
III - A estrada estava cheia de areia devido às obras; o réu, para não cair nos buracos, tentou travar o carro e desviar-se para o lado esquerdo; devido à areia no chão, o carro fugiu-lhe, embatendo, então, contra uma árvore.
IV - Não se encontra materializado qualquer acto ilicíto, susceptível de ser imputado ao réu e que tivesse sido causa adequada do dano; e nem a circunstância de se encontrar apurado que o autor já tinha chamado várias vezes a atenção do réu no sentido de moderar o andamento da viatura significa, sem mais, que a sua postura fosse temerária, imprudente ou reveladora de grande imperícia.
V - Estando provado que o autor era transportado gratuitamente e indemonstrada que está a culpa do condutor do veículo e cujo ónus cabia ao autor, a acção teria, necessariamente, de improce- der.
VI - A nova redacção do art. 504.º do CC, introduzida pelo DL n.º 14/96, de 06-03, que teve por fim adequar o direito interno à Directiva 90/232/CEE, de 14-05-90, não é aplicável ao caso concre- to.
07-02-2008
Revista n.º 38/08 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Serra Baptista
Procedimentos cautelares Contrato de locação financeira Entrega judicial de bens
Ónus de alegação Ónus da prova
Na providência cautelar de entrega judicial e cancelamento de registo a que se reporta o art. 21.º do DL n.º 149/95, de 24-07, alterado pelo DL n.º 265/97, de 02-10, não se exige a alegação e pro- va de periculum in mora, este fluindo implícito da natureza do contrato de locação financeira e do expectável degradamento do bem locado na pendência da acção definitiva.
07-02-2008
Agravo n.º 4622/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Contrato de seguro Seguro de habitação Cláusula contratual geral Furto qualificado
Ónus da prova Inexistência jurídica
I - Não está afectada de ambiguidade ou nulidade a cláusula geral incluída em contrato de seguro multi-riscos habitação reportada ao conceito de furto qualificado densificado pela expressão “apropriação ilegítima de coisa alheia através de destruição ou rompimento de obstáculos, escalamento ou utilização de outras vias que não as destinadas a servir de entrada ao local onde ela se encontre, ou emprego de chave falsa, gazua ou instrumentos semelhantes que tenha deixado vestígios materiais inequívocos ou sido constatado por inquérito policial”.