OBRIGAÇÕES PRÉ-CONTRATUAIS EM SHOPPING CENTERS À LUZ DAS CLÁUSULAS GERAIS DOS CONTRATOS
OBRIGAÇÕES PRÉ-CONTRATUAIS EM SHOPPING CENTERS À LUZ DAS CLÁUSULAS GERAIS DOS CONTRATOS
Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxx0 Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx0
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx0
1 INTRODUÇÃO
Os contratos de locação celebrados entre lojistas e empreendedores de shopping center refletem uma complexidade que vem desde as próprias especificidades do empreendimento, visto que um shopping representa um ambiente muito específico no varejo, que envolve integração entre lazer e comércio.
O amparo jurídico para a relação contratual entre lojistas e empreendedores é a Lei do Inquilinato, a qual versa acerca da locação de imóveis urbanos. Embora a referente lei cite o contrato de shopping center, a mesma não traz maiores esclarecimentos, doravante deixando as especificidades das cláusulas contratuais em função das “condições livremente pactuadas” entre as partes, ainda que destaque a limitação imposta pela supremacia do ordenamento jurídico à essa autonomia (BRASIL, 1991).
É nesse sentido que os princípios da boa-fé nas promessas pré-contratuais ganham destaque, tendo em vista que tais promessas configuram responsabilidades assumidas pelas partes, especialmente pelo empreendedor, deste as negociações iniciais.
Para que haja a responsabilização por acordos não cumpridos posteriormente ao contrato, é essencial que o locatário esteja previamente a par de todas as condições e atribuições do imóvel a ser locado, bem como seus aspectos jurídicos, valores de alugueis e encargos, bem como do regimento interno. Além disso, todas as informações repassadas ao lojista pelo empreendedor devem estar devidamente registradas.
Nesse âmbito, faz-se pertinente uma análise do processo de negociação das cláusulas contratuais entre o locador e locatário (empreendedor e lojista, respectivamente), com o intuito de explanar quais são as cláusulas mais usuais nos contratos de shopping center bem como as obrigações que as partes assumem a partir das negociações pré-contratuais.
1 Professor do Programa de Mestrado e Doutorado do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba). Curitiba –PR. E-mail: xxxxxx@xxxxxxxxxxx.xxx.xx
2 Professora e Diretora do Mestrado em Solicitadoria dos Contratos e Empresarial do IPCA – Portugal. ORCID: xxxxx://xxxxx.xxx/0000-0000-0000-0000.
3 Mestrando em Direito pela Faculdade de Direito do Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA. E-mail: xxxxxxx@xxxxxxxx.xxx.xx.
Além disso, busca-se também tratar da responsabilidade civil em decorrência da hipótese de não cumprimento destas obrigações.
2 NEGOCIAÇÕES INICIAIS ENTRE EMPREENDEDORES E LOJISTAS DE SHOPPING CENTERS
A Associação Brasileira de Shopping Centers - Abrasce considera:
[...] shopping center os empreendimentos com Área Bruta Locável (ABL), normalmente, superior a 5 mil m², formados por diversas unidades comerciais, com administração única e centralizada, que pratica aluguel fixo e percentual. Na maioria das vezes, dispõe de lojas âncoras e vagas de estacionamento compatível com a legislação da região onde está instalado4.
Posto deste modo, entende-se que a dinâmica dos shopping centers muitas vezes diverge da realidade de outros empreendimentos comerciais, necessitando assim de adequações específicas no que tange o seu funcionamento e empreendimento.
Acerca da organização básica do shopping center, destaca-se a figura do empreendedor dentro da fundação de um shopping center. Geralmente cabe a este empresário o planejamento inicial acerca do mercado, localização e público pretendido pelo estabelecimento. Conforme destacam Xxxxxxxx e Xx Xxxxx (2014, p. 5), cabe ao empreendedor “planejar, executar e manter a exploração do Shopping center”.
Xxxxxxx (2015) coloca o empreendedor como o grande idealizador do shopping e responsável pela continuidade do mesmo. Importante salientar que em alguns casos o empreendedor também pode contratar um administrador para dar continuidade à organização e manutenção do empreendimento.
Posteriormente, o empreendedor haverá de atrair lojistas adequados ao local, bem como os clientes que darão sentido ao investimento realizado. Xxxxxxxxxx Xxxxxxxx e Xx Xxxxx (2014) acerca da função dos lojistas:
[...] cabe a função de compor a gama de serviços oferecidos pelo Shopping, ficando submetidos às normas contidas nas normas gerais e no regime interno. Estarão também obrigados a pagar uma quantia mensal relativa a seu faturamento bruto, atendo-se a um valor mínimo, e a serem solidários ao fundo de promoções e de despesas do Shopping (OLIVEIRA; DE ABREU, 2014, p. 6).
4 ABRASCE: Definições e convenções. Disponível em: xxxxx://xxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxxxxxx-x-xxxxxxxxxx/. Acesso em: 20 nov. 2020.
Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.
Assim, o desempenho do shopping depende em grande parte da capacidade de gestão do empreendedor (ou do administrador contratado por ele), embora caiba aos lojistas grande contribuição e colaboração para o sucesso do empreendimento.
Xxxxxxx (2015) assevera que, ao tratar dos shopping centers, trata-se também da busca soberana pelo lucro, tanto por parte dos lojistas, que encontram no shopping um centro seguro e confiável onde há um intenso fluxo de potenciais clientes, e o empreendedor que, ao oferecer esse ambiente interessante espera retornos financeiros por parte dos lojistas em forma de aluguel e outras formas de rendimentos.
Assim, nesse caso, identifica-se uma relação que ocorre entre empresários, ocorrendo uma equiparação jurídica entre eles, ao menos em tese. Posto deste modo, a legislação garante a liberdade de negociação pré-contratual entre as partes, de modo que ambas estabeleçam o que é ou não é conveniente a cada, tanto que se destaca que o Código de Defesa do Consumidor não se aplica em tais contratos (CASTRO, 2017).
Para Diniz (2010), o contrato tipifica-se em um:
[...] acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial (DINIZ, 2010, p.12).
Posto isso, os contratos, independentemente de suas naturezas ou fins, estão fundamentados nas obrigações estabelecidas através deles. Embora os contratos sejam previstos em lei, os mesmos devem ser firmados sobre aspectos legais, conforme previamente estabelecidos.
Embora anteriormente tais obrigações estivessem estritamente relacionadas às vontades das partes que estabelecem o contrato, no âmago da liberdade privada, novas linhas estabelecem o chamado estado social, o qual tem a função de intervir nas relações sociais e privadas de modo a garantir a “primazia de direitos fundamentais em detrimento do livre arbítrio das partes” (ELEUTERIO, 2018, p. 4).
Apesar de o estado intervir nas relações privadas em prol dos direitos fundamentais, há de se salientar que esse fato não anula ao todo a autonomia dos contratos firmados entre as partes, sejam físicas ou jurídicas, embora, conforme xxxxxx Xxxxxxxxx (2018), sejam tais contratos sempre regidos pelas limitações da lei.
A respeito dos princípios fundamentais do direito contratual, tem-se inicialmente a autonomia supracitada, representada pelo princípio da autonomia da vontade das partes.
A respeito de tal princípio, Diniz (2008) pontua:
O princípio da autonomia da vontade se funda na liberdade contratual dos contratantes, consistindo no poder de estipular livremente, como melhor convier, mediante acordo de
vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica (DINIZ, 2008, p. 23).
Tal como pontuado anteriormente, a autonomia das partes é limitada pelos aspectos da lei que lhes diz respeito. O princípio da autonomia da vontade no âmbito contratual também é abordado no Código Civil Brasileiro, em seu artigo 421, in verbis: “A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato” (BRASIL, 2002).
A referida função social do contrato trata-se justamente das restrições impostas pelo ordenamento jurídico à liberdade das partes em criarem normas individuais mutuamente interessantes, em detrimento da parte menos favorecida econômica e socialmente na relação contratual (CASTRO, 2017).
Outro princípio abordado no âmbito contratual é o chamado pacta sunt servanda (os pactos devem ser cumpridos). Tal como sugere a tradução da expressão latina, a mesma versa acerca da obrigatoriedade da efetivação das obrigações firmadas perante um contrato – ou pacto.
O pacta sunt servanda parte do pressuposto de que as obrigações estabelecidas em um contrato entre as partes relacionadas refletem a livre iniciativa e autonomia das mesmas, pautadas em seus próprios interesses. Posto deste modo, resta apenas o irrevogável cumprimento do que e como foi pactuado, visto que ao contrato associa-se a validade jurídica e não somente promessas ou vagas intenções (ELEUTERIO, 2018).
Conforme Xxxxxxxxx (2018), a supremacia do que é acordado por meio do contrato entre as partes apenas pode ser dissolvido em função do que estabelece o artigo 393, do Código Civil, a respeito da inadimplência das obrigações contratuais:
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir (BRASIL, 2002).
Além da ocorrência de casos fortuitos ou de força maior durante a vigência contratual, o que fora pactuado pode também ser desconsiderado nos casos em que há desigualdade entre as partes.
No aspecto contratual, tem-se também o princípio rebus sic standibus, o qual pode ser traduzido como “estando as coisas assim" ou "enquanto as coisas estão assim”5.
5 Supremo Tribunal Federal: Vocabulário Jurídico. Disponível em: xxxx://xxx.xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxXxxxxxx.xxx?xxxXxxxxxxxXxxxxxXXXXX%00XXX%00XXXXXXXXX. Acesso em: 20 nov. 2020.
Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.
De maneira divergente do pacta sunt servanda, o princípio rebus sic standibus versa acerca da intervenção do Estado no âmbito das relações contratuais privadas, nos casos em que tais relações demonstram ser excessivamente onerosas para alguma das partes envolvidas.
O Código Civil brasileiro aborda o princípio rebus sic standibus sob a premissa da onerosidade excessiva dos contratos, in verbis:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação (BRASIL, 2002).
E pelo artigo 317:
Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação (BRASIL, 2002).
Ou seja, em vista do equilíbrio contratual, o judiciário pode intervir no contrato privado, não com o princípio intuito de torna-lo nulo, mas inicialmente de garantir a diligência equilibrada das cláusulas do mesmo. Deste modo, conforme xxxxxx Xxxxx (2017), o princípio rebus sic standibus vem a constituir uma exceção ao princípio pacta sunt servanda.
Tem-se também, enquanto princípios do direito contratual a boa-fé e a função social dos contratos. O primeiro caso traz duas acepções distintas: o da boa-fé objetiva e a subjetiva. Todavia, para o âmbito contratual cabe ênfase a boa-fé objetiva (ELEUTERIO, 2018).
O princípio da boa-fé objetiva trata-se de um dos fundamentos mais relevantes nas relações de consumo, sendo prevista pelo artigo 422 do Código Civil6 e pelo § 3º, artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor7.
Tal princípio parte do comportamento em si do agente, não atendo-se a meras intenções do mesmo. Assim, tal como ensinam Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 101), a boa-fé objetiva, enquanto princípio jurídico, “consiste em uma verdadeira regra de comportamento, de fundo ético e exigibilidade jurídica”.
6 Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (BRASIL, 2002).
7 Harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica, sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores (BRASIL, 1990).
Estabelecidos tais aspectos e princípios norteadores do direito contratual, cabe pontuar que a locação de espaços em shopping centers é regida pela Lei Nº 8.245 de 1991, chamada também de Lei do Inquilinato.
De modo específico, a referida lei traz aponta:
Art. 54. Nas relações entre lojistas e empreendedores de shopping center, prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei (BRASIL, 1991).
Nesse sentido, a lei determina a prevalência do princípio da autonomia da vontade e pacta sunt servanda, abordados anteriormente.
Assim, observada a legislação vigente, sabe-se que prevalecem as cláusulas previamente negociadas entre locador e locatário. Posto deste modo, cabe versar brevemente acerca dessas negociações pré-contratuais a serem realizadas entre o empreendedor/administrador e o lojista.
Acerca da fase pré-contratual entre lojistas e empreendedores, xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (2017):
[...] durante as negociações, as partes procuram formar uma ideia sobre o conteúdo do contrato que estão a estipular, de maneira a controlar a existência de correspondência entre o resultado que esperam conseguir e aquele que se realizaria se concluíssem determinado negócio. Quando se convencem, com base na ideia amadurecida durante as negociações, de que o futuro contrato se apresenta como instrumento idôneo para atingir o fim perseguido, declaram-se prontos a estipulá-lo (XXXXXXXX XXXXX, 2017, p. 22).
Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.
Destacando-se o dever da observância da lealdade e da boa-fé nas negociações, é imprescindível que o lojista que irá locar o espaço em um shopping tenha acesso a todas as informações relacionadas ao estabelecimento, sendo pertinente ressaltar a necessidade inicial de uma vistoria no imóvel, observando aspectos arquitetônicos e de estrutura física.
Rouchou (2019) destaca outros aspectos a serem observados na fase pré-contratual:
Viabilidade jurídica: abrange a realização das pesquisas de praxe e análise dos documentos respectivos. Exemplos: CRI - Certidão do Cartório de Imóveis, “Habite-se”, Zoneamento e Legislação Local.
Custo de ocupação: para verificar o valor total do custo de ocupação do imóvel, entenda-se aluguel + encargos. Este custo deve ser compatível com o faturamento projetado da unidade franqueada.
Índice de reajuste do aluguel: apesar de não ser uma obrigação prevista em lei, é praxe os contratos de locação determinarem que os aluguéis sejam reajustados por meio de indexador e data-base definida.
Luvas ou Res Sperata: as chamadas “luvas” ou Res Sperata, também conhecidas por outras denominações, são legais e dependem de negociação entre as partes [...]
Carência: compete ao locatário negociar a carência no pagamento do aluguel e encargos para o período de reforma no imóvel, como é usual no mercado (ROUCHOU, 2019, p. 7-8).
Além desses, devem ser abordadas as benfeitorias, previstas nos art. 35 e 36 da Lei do Inquilinato. As mesmas, se não abordadas de outro modo e previamente negociadas pelas partes, serão “indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção” (ROUCHOU, 2019, p. 8), embora seja prática comum haver, por parte do locador, a exigência de cláusulas contratuais que sejam opostas a indenização e retenção das benfeitorias.
O locador também poderá vir a negociar garantias em seu favor com o locatário. Essas garantias geralmente referem-se a um fundo monetário depositado pelo lojista para o locador, o qual representa uma segurança em caso de problemas com o pagamento de aluguel e outros encargos (caução em dinheiro) (XXXXXXX, 2019).
Por conseguinte, ainda cabe negociações e análises prévias sobre a cláusula de vigência do futuro contrato, podendo ser inclusa neste pacto, assegurando o cumprimento do mesmo ainda que o imóvel seja vendido pelo locador ou alienado.
Outros pontos que devem ser discutidos e analisados previamente são: encargos, aluguel mínimo (maior e pago fixo e periodicamente), aluguel percentual (que varia conforme o faturamento da loja), aluguel dos meses de dezembro (que geralmente sofre reajuste por conta do maior faturamento no período), rescisões e penalidades, entre outros que podem variar conforme o ramo de atuação, público, faturamento, etc.
Seja como for, na fase pré-contratual é de fundamental importância que o locatário tenha a assessoria de advogados para que eles possam analisar os instrumentos e cláusulas que o empreendedor busca colocar no contrato, de modo que não haja discrepâncias e prejuízos ao locatário posteriormente.
3 OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NAS PROMESSAS PRÉ-CONTRATUAIS
A partir das negociações pré-contratuais, são estabelecidos uma série de “promessas” ou obrigações entre o empreendedor e o lojista, no que diz respeito ao shopping como um todo, seu funcionamento, público, localização, expectativas, valores de locação, encargos, entre outros aspectos (XXXXXXX, 2015).
No caso em que essas negociações ocorrem antes da efetivação do empreendimento, a realidade do imóvel alugado pelo lojista ainda é uma promessa, baseada nas características repassadas pelo empreendedor e o projeto elaborado do que virá a ser o empreendimento futuro (XXXXXXX, 2015).
Nesse caso, deve-se estabelecer com muita clareza as obrigações que o empreendedor assume junto ao lojista, de modo que todas as responsabilidades assumidas sejam efetivadas satisfatoriamente e dentro do que fora previamente acordado, estando sujeito às penalidades em caso de desacordo (XXXXXXXX XXXXX, 2017).
Caso tais expectativas não sejam atingidas, ocorre a contrariedade da res sperata (coisa esperada), a qual configura-se quando o empresário promete um empreendimento com características e condições determinadas na fase pré-contratual e após isso o que fora prometido não se cumpre conforme prometido (DA GAMA, 2002).
Xxxxxxx (2015) destaca algumas dessas possibilidades que caracterizam o não cumprimento das promessas pré-contratuais, no âmbito dos shopping centers:
(i) o atraso na entrega em plenas condições de uso do imóvel;
(ii) falhas na execução do projeto;
(iii) diferenças entre o que foi oferecido ao lojista e o que efetivamente se concretizou no empreendimento (CARIELO, 2015, p. 73).
Nestes casos, é valido reforçar o que destaca Xxxxxxxx Xxxxx (2017) acerca da existência de responsabilização sobre a parte que ocasionou o dano por ausência do princípio da boa-fé.
4 CLÁUSULAS GERAIS DOS CONTRATOS
De modo geral, os contratos de shopping centers estabelecidos entre o empreendedor e o lojista possuem algumas cláusulas usuais, a citar algumas delas:
Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.
a) Aluguel Percentual ou Faturamento: contraprestação pela cessão de uso da loja do empreendimento calculada sobre o faturamento bruto do lojista e devido sempre que superior ao aluguel mínimo fixado.
b) Aluguel Desempenho: pagamento periódico (geralmente semestral) de valor correspondente a um percentual (geralmente 75%) do aluguel mínimo reajustável, vigente à época do pagamento. [...]
d) 13º Aluguel: pagamento em duplicidade do aluguel referente ao mês de dezembro, em razão do aumento das vendas por ocasião do natal.
e) Proibição de cessão/modificação de atividade: visa impedir a desconfiguração do “mix” de lojas (“tenant mix”).
f) Res Sperata: pagamento de um preço especificado, preliminar à locação, para compensar o Locador pelos fatores básicos de alavancagem operacional do shopping center.
g) Fiscalização “boca de caixa”: possibilidade de o Locador fiscalizar vendas feitas pelo lojista para fins de apuração do aluguel percentual.
h) Cláusula Performance: limite mínimo de vendas fixada para cada lojista cujo descumprimento implica em infração contratual ou no pagamento de um valor adicional denominado aluguel de garantia de desempenho.
i) Cláusula de Xxxx: proibição ao lojista de abertura de outra loja de ramo similar ao explorado por ele dentro do shopping center, em um raio geográfico estipulado pelo shopping.
j) Adesão Compulsória: obrigatoriedade de adesão aos vários contratos que juntos formam o negócio jurídico do shopping Center (locação, normas gerais, convenção condominial, regimento interno). [...]
m) Aprovação Prévia (arquitetura, decoração, vitrine, etc.): geralmente constante nos regulamentos, normas gerais, e, até mesmo, no próprio contrato de locação, a estrutura interna, decoração, vitrines, enfim, toda a montagem da loja, fica sujeita às descrições e formas pré-estabelecidas nos referidos instrumentos (SEBRAE, s. d., p. 14-15).
Tal como observado anteriormente, as cláusulas podem ser negociadas e determinadas como melhor convier às partes anteriormente à elaboração final do contrato, com tanto que observada a legislação e as limitações impostas pelo Estado à autonomia de contratar (XXXXXXXX XXXXX, 2017).
Tais cláusulas, juntamente com outros documentos normativos, como o regimento interno e códigos de conduta do shopping, têm por intuito principal estabelecer uniformidade e harmonia no empreendimento como um todo, gerando uma visão agradável aos frequentadores e clientes, alcançando assim os objetivos almejados pelo negócio (XXXXXXX, 2015).
5 RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTES DAS PROMESSAS PRÉ- CONTRATUAIS NÃO CUMPRIDAS
As negociações da fase pré-contratual ainda não se configuram um contrato de fato, o que, por outro viés, não destitui as mesmas de certas obrigações adquiridas a partir das promessas realizadas entre as partes.
Conforme esclarece Chaves (1997, p. 208):
[...] há responsabilidade pré-contratual quando ocorre a ruptura arbitrária e intempestiva das negociações contrariando o consentimento dado na sua elaboração, de tal modo que a outra parte se soubesse que ocorria o risco de uma retirada repentina, não teria tomado as medidas que adotou (XXXXXX, 1997, p. 208).
Entende-se que este caso é caracterizado pela desfeita das obrigações assumidas na fase pré- contratual, ou seja, significa um rompimento sem causa legítima das negociações e, deste modo ocasiona dano devido ao dispêndio de valores, tempo e trabalho preparatório da parte prejudicada.
Por outro lado, há também a responsabilidade por não cumprimento das promessas realizadas na fase pré-contratual. Isto é, por exemplo, se o empreendedor promete determinados aspectos arquitetônicos ou de lazer e, ao final do empreendimento não cumprir tais promessas, pode-se determinar a responsabilização e mesmo a indenização da parte prejudicada (XXXXXXXX XXXXX, 2017).
Xxxxxxxx Xxxxx (2017) complementa:
As negociações dessa fase deverão ser cumpridas integralmente, e tudo aquilo que for estipulado deverá constar do contrato a ser firmado, sob pena de ficar caracterizada a culpa ou o dolo, conforme o caso, daquele que romper unilateralmente o que foi combinado. Em ambos os casos a parte prejudicada deverá ser indenizada (XXXXXXXX XXXXX, 2017, p. 32).
Para o autor, no caso em que o lojista realiza pagamento prévio de valores referente à reserva de espaço no shopping – como sinal, ou a qualquer outro aspecto estrutural do empreendimento e o empreendedor não cumpre com suas promessas firmadas oficialmente, cabe ao lojista a requisição da devolução desses valores, por via judicial.
Em casos em que não há pagamento prévio, mas ainda assim o empreendedor não age com probidade e boa-fé no cumprimento de suas promessas, Xxxxxxxx Xxxxx (2017) explica que cabe ao lojista ações de perdas e danos, tendo em vista os dispêndios de tempo, dinheiro e trabalho durante as negociações e incongruências contratuais.
Por fim, Xxxxxxxx Xxxxx (2017) adverte:
Tanto o contratante que agiu de má-fé como aquele que prejudicou o outro, sem intenção, devem ser responsabilizados pelos danos causados, uma vez que na fase pré-contratual houve um longo dispêndio de tempo e gastos com correspondências e pesquisas, estudos e projetos que não podem ser desconsiderados em face do princípio do equilíbrio contratual, que deve nortear as relações entre as partes (CERVEIRA FILHO, 2017, p. 27).
Assim, denota-se que o princípio da boa-fé deve ser soberano nas negociações pré- contratuais, bem como durante e após sua vigência, de modo a resguardar os direitos das partes, evitando-se condutas questionáveis e legalmente inadequadas na relação contratual (XXXXXXX, 2015).
Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.
6 CONCLUSÃO
Os contratos de locação celebrados no contexto dos shopping centers levantam questões complexas e deveras polêmicas em alguns casos. Geralmente esse caráter específico decorre da própria atribuição de autonomia garantida pela Lei do Inquilinato às partes contratantes, tendo-se em vista que nessa relação encontram-se empresários em ambas as extremidades do contrato, ou seja, identifica-se uma relação interempresarial.
Por conta deste fator, o Código de defesa do Consumidos não se aplica a relação contratual realizada, sendo portanto realçada nesse caso a supremacia da boa-fé contratual entre empreendedor e o lojista, no âmago de cumprir com todos os instrumentos legais referentes e com as promessas assumidas na fase pré-contratual, haja vista que a Lei do Inquilinato determina que as cláusulas devem ser negociadas e acordadas como melhor convir a ambos os interessados.
Na ocorrência de não cumprimento de tais promessas e responsabilidades assumidas, havendo registro destas, a parte prejudicada deverá ser indenizada pelo dano material e moral sofrido. Ainda que ocorra apenas o rompimento das negociações pré-contratuais de forma repentina sem justificativas plausíveis para tal, pode ser caracterizada a responsabilidade pré-contratual, acarretando o direito à indenização da parte em prejuízo.
Seja como for, entende-se por fim que, desde a fase pré-contratual, todas as informações, especificidades e condições devem ser explanadas com clareza, analisadas cuidadosamente, negociadas e registradas entre as partes, como forma de garantir que as obrigações assumidas nessa etapa se configurem em algo concreto, na efetivação das promessas realizadas anteriormente.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991: Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes. Diário Oficial da União: Brasília, 1991.
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XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
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XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx; PAMPLONA FILHO, Xxxxxxx. Novo Curso de Direito Civil: Contratos – Teoria Geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
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Revista Jurídica: Direito e Cidadania na Sociedade Contemporânea, v. 5, n. 5, p. 181-192, 2021.