CONTRATO PSICOLÓGICO E COMPROMETIMENTO DOS PROFISSIONAIS QUE ATUAM EM ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR
CONTRATO PSICOLÓGICO E COMPROMETIMENTO DOS PROFISSIONAIS QUE ATUAM EM ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR
Aluna: Xxxxxx X. do Carmo Orientador: Xxxx Xxxxxxx Xxxxx xx Xxxxx
Introdução
O terceiro setor está conquistando notoriedade a cada dia, com o expressivo crescimento de organizações dessa área de atuação e o conseqüente aumento do número de contratações de profissionais para atuar no setor. Um levantamento feito pelo Instituto Superior de Estudos da Religião (Iser), concluiu que cerca de 1 milhão de pessoas são contratadas com a carteira assinada em entidades assistenciais1.
Segundo um estudo feito pela FASFIL (As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil) houve um crescimento de 157% no número de organizações sem fins lucrativos no Brasil no período de 1995 a 2002, alcançando o número de 276 mil organizações. 2
Outros dados mais recentes, divulgados no início de 2006 pelo estudo do programa de voluntários das Nações Unidas (UNV) em parceria com Johns Hopkins Center for Civil Society Studies, instituição norte-americana que estuda as organizações sem fins lucrativos no mundo, apontaram um crescimento de 71% do setor sem fins lucrativos no Brasil no período de 1995 a 2007, passando de 190 mil para 326 mil.3
O aumento encontrado pelas pesquisas reafirma a importância que essas organizações têm na sociedade, assim como o seu tamanho é representativo na economia do Brasil, seja pela geração de oportunidades de trabalho, devido ao presente desemprego no país, seja pelo trabalho filantrópico exercido em contrapartida ao enfraquecimento do Estado no papel de provedor de bem-estar social para a população (Landim, 1993). Além disso, o interesse das empresas privadas em investir em “boas ações” para se tornarem mais competitivas no mercado também vem impulsionando esse crescimento4.
Dentre os empregados desse “novo setor da economia”, pode-se encontrar profissionais vindos de empresas, o que levanta a hipótese de o terceiro setor estar oferecendo remunerações compatíveis com o setor privado. Porém esse é um fato ainda controverso, já que, segundo Xxxxx Xxxxxxxx (Uma nova profissão à vista – Marketing Social, revista Você S/A, 22/02/00) um diretor pode chegar a receber R$20 mil, enquanto Xxxxxx Xxxx e Xxxxx xx Xxxxx afirmam, em seu livro Marketing Social (Crescente Editorial), que o salário médio no setor para esse mesmo cargo seria de R$1.663. O fato é que existem profissionais que trocam seus cargos em grandes empresas com grandes salários por outros em organizações do terceiro setor, mesmo com a diminuição da remuneração5.
Os indivíduos estão buscando mais qualidade de vida, o que vai além dos altos salários. Atualmente, organizações que podem oferecer realização profissional e pessoal possuem um grande diferencial aos olhos dos profissionais. Segundo Xxxxxxxx Xxxx, filósofo e especialista em pesquisa e tecnologia e também um dos maiores pensadores do terceiro
1 Fonte: xxxx://xxxxxxxxxxxx.xxxxx.xxx/Xxxxxxx/Xxxxx/0,,XXX00000-0000,00.xxxx, em 21/2/2008
2 Fonte: xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxx_xxxx.xxx?xxxxx0x0&xxxxxxxxxxxx0-xxxxx0- campo4-campo3-&x=21&y=2&tamanhodetela=2&tipo=ie, acessado em 21/2/2008
3 Fonte: xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxx_xxxx.xxx?xxxxx0x0&xxxxxxxxxxxx0-xxxxx0- campo4-campo3-&x=21&y=2&tamanhodetela=2&tipo=ie, acessado em 21/2/2008
4 Fonte: xxxx://xxx0.xxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/xxxxx00/0000000000.xxx, acessado em 22/2/2008
5 Fonte: xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxx_xxxx.xxxxx?xxx0000, acessado em 21/2/2008
setor, para um indivíduo ser importante em uma sociedade não é necessário possuir apenas dinheiro. É necessário ir além, tendo muitos contratos sociais e pertencendo a muitas organizações úteis.6
Contudo, sabendo que existem variáveis influenciadoras no processo de decisão por uma carreira, é necessário identificar: Em que se baseia o comprometimento do profissional com a organização do terceiro setor? Quais expectativas pessoais e profissionais são criadas a respeito dessa organização? E como estes indivíduos constroem o seu contrato psicológico nessas organizações do terceiro setor?
Estas são algumas perguntas que podem ser feitas, dentre tantas outras, a respeito de tal assunto. Embora haja uma grande quantidade de estudos científicos voltados para o terceiro setor e a respeito do contrato psicológico e do comprometimento dos indivíduos com as organizações às quais pertencem, esses estudos, em sua grande maioria, se concentram em trabalhadores fora do terceiro setor. Este estudo traz uma análise relevante que poderá servir de referência para os gestores das organizações de terceiro setor, oferecendo informações importantes para o relacionamento com os seus funcionários e a análise das expectativas que esses mantêm sobre a relação de trabalho, auxiliando a adaptá-los ao contexto da organização.
O estudo se insere em uma linha de pesquisa desenvolvida no IAG/PUC-Rio, que tem como objetivo principal compreender a maneira como os profissionais vêem as alternativas de trabalho no atual contexto da sociedade brasileira. Na linha de pesquisa, outras formas de relações de trabalho já vêm sendo estudadas, tais como aqueles que envolvem empregados terceirizados, trabalhadores autônomos ou auto-empregados e teletrabalhadores. O estudo sobre os indivíduos que trabalham em organizações do terceiro setor, foco do projeto PIBIC/CNPq a que se refere este relatório, foi iniciado em janeiro de 2008.
O presente relatório apresenta os primeiros resultados consolidados da revisão de literatura e da pesquisa de campo já realizada.
Objetivos
Este estudo tem como objetivo analisar o contrato psicológico dos indivíduos que optam pela carreira no terceiro setor, assim como qual é a relação de comprometimento com as organizações que pertencem. A relevância desta pesquisa se deve principalmente ao fato de serem ainda escassos os estudos que focalizam os aspectos que influenciam as relações de trabalho no terceiro setor, se comparados ao volume de conhecimento produzido sobre o contexto do trabalho no setor público e nas empresas industriais e comerciais.
O Terceiro Setor
O terceiro setor é a denominação dada a organizações de iniciativa privada que visam à produção de bens e serviços públicos, fazendo referência ao Estado e ao Mercado (o primeiro e segundo setor respectivamente) através da negação de “nem governamental, nem lucrativo”. Dessa forma, visa “um conjunto de organizações e iniciativas privadas que visam a produção de bens e serviços públicos” (Xxxxxxxxx, 1994, p.21).
Logo, as organizações do terceiro setor agem em prol de benefícios coletivos (papel também desempenhado pelo Governo), mas a partir de indivíduos que acreditam que são necessárias mudanças e que podem tomar a iniciativa para que mudanças sociais aconteçam, mesmo não fazendo parte do Estado ou visando lucro como as organizações privadas.
O terceiro setor poderia ser reconhecido por quatro segmentos: formas tradicionais de ajuda mútua, que inclui creches e hospitais; movimentos sociais e das ações civis, que defendem e reinvidicam causas junto à sociedade e ao estado; organizações não-
6 Fonte:
xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxx.xx?XXX_XXXXx00&XXX_XXXXXXXx000&XX L_RETORNO=xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/x0000000.xxxx, acessado em 22/2/2008
governamentais - ONGs; e filantropia empresarial (Fernandes, 1994). Porém, esse termo (terceiro setor), para algumas, pessoas “envolve todo o conjunto de ONGs, movimentos sociais e outros grupos associados que passaram a construir um setor econômico denominado ‘economia social’ e se propõem a pôr em prática ações sociais/públicas sem fins lucrativos” (Matos, 2005, p.40).
A existência de diversas denominações que podem ser encontradas para tal termo pode ser justificada pela imprecisão conceitual surgida da dificuldade de agrupar as diferentes organizações em um mesmo grupo segundo características comuns (Coelho, 2000).
“É um tipo de ‘Frankenstein’: grande, heterogêneo, construído de pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas. É contraditório, pois inclui tanto entidades progressistas como conservadoras. Abrange projetos e programas sociais que objetivam tanto a emancipação dos setores populares e a construção de programas meramente assistenciais, compensatórios, estruturados segundo ações estratégico-racionais, pautadas pela lógica do mercado. Um ponto em comum: todos falam em nome da cidadania... O novo associativismo do terceiro setor tem estabelecido relações contraditórias com o ‘antigo’ associativismo advindo dos movimentos sociais populares (na maioria urbanos) dos anos 70 e 80“. (Gohn, 2000, p.60, apud Matos, 2005)
Relação de trabalho no terceiro setor
Xxxxxxx Xxxxxxx (2004), as organizações do terceiro setor, principalmente as de médio ou grande porte, estão cada vez gerando mais cargos a serem ocupados e criando diferentes relações de trabalho. As relações mais presentes que podem ser citadas são:
a) Trabalho autônomo, caracterizado pela ausência de subordinação e capacidade de autodeterminação do trabalhador quanto à suas atividades, que no terceiro setor significa horários flexíveis que adaptam o trabalhador às necessidades da entidade e a definição de limites de forma mais livre;
b) Trabalho voluntário, que, no terceiro setor é caracterizado como o trabalho voluntário contratual, uma pessoa física presta serviço não-remunerado e vincula-se a instituição através de um “Termo de Adesão”, que constitui em um instrumento informal de contrato;
c) Trabalho celetista, quando o indivíduo estabelece relação de emprego com a instituição e apresenta a Carteira de Trabalho e Previdência Social assinada segundo a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT);
d) Estagiário, que é a relação do indivíduo com a instituição com o objetivo de complementar o ensino desenvolvendo atividades adaptadas ao currículo escolar e tem a intervenção obrigatória da instituição de ensino.
Comprometimento
Comprometimento Organizacional pode ser definido como o grau com que um funcionário se identifica com determinada organização e seus objetivos, desejando manter-se como parte dela (Robbins, 2005). Ou seja, representa a atitude do funcionário ante o trabalho, observada através de fatores pessoais de seu comportamento.
Xxxxx e Xxxxx (1997, apud XxXxxxxx e Xxxxx 1999) apontam que pessoas que estão comprometidas com a instituição a que pertencem empenham-se mais nas suas atividades e na busca dos objetivos organizacionais, sendo capazes de ir além do exigido em sua função para atingi-los e reforçar seus valores. Esses indivíduos adotam comportamentos como sentimento de responsabilidade, adesão, e trabalho suplementar, como resultado do investimento que está sendo aplicado à organização.
Segundo Xxxxx e Xxxxx (1997, apud XxXxxxxx e Xxxxx 1999), o comprometimento organizacional pode ser classificado em três tipos: afetivo, de continuação e normativo. Isso porque conforme os autores, a natureza do compromisso psicológico entre o funcionário e a organização pode ser distinta e todos os funcionários têm, inevitavelmente, algum vínculo com a organização, mas esses vínculos diferem conforme eles são desenvolvidos e se mantêm no ambiente organizacional.
O comprometimento afetivo acontece quando há apego, envolvimento, uma identificação do indivíduo com a organização. Nesses casos, os funcionários permanecem nas empresas porque assim desejam, e os indivíduos aceitam a influência da organização porque as atitudes demonstradas da organização são coerentes com seus próprios valores. Segundo os autores, esse tipo de comprometimento será induzido por experiências anteriores, em especial aquelas que satisfizeram as necessidades dos empregados. Indivíduos afetivamente mais comprometidos tendem a se sentir mais motivados e a participar mais ativamente na organização.
O comprometimento de continuação está relacionado aos custos percebidos em deixar a organização. Nesse caso, a necessidade de se manter trabalhando para a organização é o que os mantêm nela. As atitudes e os comportamentos dos indivíduos são norteados por recompensas específicas, e não pela congruência de crenças e atitudes. Quando esse tipo de comprometimento torna-se predominante, a relação com a motivação é negativamente afetada, assim como o desempenho e a satisfação.
O comprometimento normativo está relacionado com um alto nível de comprometimento com a organização, com o sentimento de obrigação moral de permanecer na organização. Os indivíduos permanecem nas organizações porque se sentem obrigados a isso. Essa obrigação moral pode ser desencadeada por experiências vividas pelos empregados durante o processo de socialização organizacional, como a criação de ambiente 'familiar' entre os funcionários.
O comprometimento criado em relação ao trabalho pode ser construído de mais de uma das fontes de envolvimento descritas. Quando existe mais de um tipo, provavelmente o vínculo criado entre as partes torna-se mais forte.
Segundo Xxxxx (2001), o trabalho representa um papel importante na sociedade, não apenas pelo valor material recebido, o que revela que compensações materiais nem sempre são suficientes para a satisfação do funcionário. Para certos indivíduos, existem outros fatores mais importantes que podem sobrepor ao item remuneração no ambiente organizacional. O relacionamento com outras pessoas no ambiente de trabalho, a ocupação com algo e o trabalho como caminho para um objetivo de vida são mais importantes que a conquista apenas de bens materiais, assim como recompensas sociais e psicológicas como elogios, incentivos e parceria tornam os indivíduos mais comprometidos com a empresa e dispostos a cumprir seus objetivos dentro dela.
“A maneira como os indivíduos trabalham e o que eles produzem têm um impacto sobre o que pensam e na maneira como percebem sua liberdade e sua independência. O processo de trabalho, assim como o seu fruto, ajuda o indivíduo a descobrir e formar sua identidade” (Xxxxx, 2001, p.16)
Contrato Psicológico
De acordo com Xxxx Xxxxxxx (1995), a idéia de contrato surgiu conforme as leis romanas e tratava-se de um acordo feito por duas partes que se divide em quatro tipos: (1) Contractus re, que envolve um desempenho real; (2) contractus litteris, que é o acordo escrito; (3) contactus verbus, que é um acordo explícito oral; (4) contractus consensus , que envolve um acordo tácito, como a aceitação de um benefício.
Xxxxx (1821, apud Mumford 1995) separa os contratos, sejam eles formais ou informais, em contratos de doação e contrato de câmbio ou troca, onde se enquadram os contratos de trabalho. O contrato pressupõe que as partes contratantes reconhecem-se como proprietárias de algo de valor para ambas, e que cada um está disposto a dar ao outro o que é necessário para que a atividade seja desenvolvida.
A teoria do contrato psicológico é vista por Xxxxxx Xxxxxxxx (1995) como o que o indivíduo percebe de reciprocidade entre ele e a organização, de acordo com as promessas feitas de forma explícita ou implicitamente (através de expressão de comprometimento e intenção futura, por exemplo) nesse relacionamento.
Os funcionários de uma organização recebem mensagens dos empregadores através de palavras, ações ou sinais e as interpretam como promessas, mesmo não sendo essa a intenção da mensagem.
A autora ressalta que os contratos psicológicos são acordos não escritos baseados em promessas e que resultam na crença individual, moldando o comportamento e as atitudes de um indivíduo dentro da organização a que está ligado. São modelos mentais que, por serem baseados em promessas e dependerem de fatores como confiança, percepção e aceitação, podem ser entendidos pelas pessoas de formas diferentes.
As mensagens recebidas pelo indivíduo são interpretadas por cada um de uma forma, conforme a sua predisposição individual. Isso porque as pessoas têm limites cognitivos e diferentes quadros de referência e são julgadas de acordo com normas sociais para, então, construir-se o contrato psicológico.
Xxxxxxxx et al. (1962, apud Xxxxxxxxx e Xxxxxxxx,1997) definem o conceito de contrato psicológico como as expectativas acerca das obrigações recíprocas do empregado e da organização, ou seja, o conjunto de crenças sobre o que cada parte tem a obrigação de dar e o direito a receber em troca de contribuições da outra parte. Esses autores afirmaram que o contrato psicológico é dinâmico, logo, eles evoluem com o passar do tempo e se adaptam ou alteram-se conforme as necessidades do empregado e do empregador.
O estudo do contrato psicológico dos indivíduos de uma organização propicia melhor compreensão do comportamento de cada um como membro da empresa a que pertence, podendo explorar as expectativas por ele criadas, o que ajuda a relacionar as necessidades individuais com as organizacionais.
Xxxxxxxx (1995) afirma que a classificação do contrato psicológico pode dar-se das seguintes formas: contrato transacional ou transicional (em relações de curto prazo), e contrato relacional ou balanceado (em relações de longo prazo).
Segundo a autora, os contratos transacionais são mais baseados em fatores monetários de curto prazo de duração, nos quais o envolvimento com a organização é baixo. Nos contratos transicionais, além de baixo envolvimento, não há comprometimento da organização para com o empregado e vice-versa, por tratar-se de uma situação de curta duração. Os contratos relacionais caracterizam-se pelo envolvimento, investimento e compreensão de ambas as partes envolvidas, além da expectativa de longo prazo da organização. Os contratos balanceados seguem os contratos relacionais, porém há o compromisso de desenvolvimento contínuo por parte do indivíduo para incentivar o crescimento organizacional.
Qualquer dos tipos de contratos psicológicos irá envolver elementos de relações de curto e longo prazo. O que irá diferenciá-los será a proporção que cada um terá. Entretanto, assim como em grande parte dos contratos existentes, o contrato psicológico se faz mais ativo quando passa a influenciar o comportamento dos indivíduos. Isso se dá, principalmente, quando o contrato é violado, ou seja, o contrato não é entendido da mesma forma por ambas as partes.
Xxxxxxx Xxxxxxx (2002) faz um paralelo ao que Xxxxxxxx afirma e propõem o modelo three-tier. Neste modelo em forma de pirâmide, a base estaria relacionada ao contrato transacional proposto por Xxxxxxxx (1995). Nela os empregados comprometer-se-iam com razoáveis níveis de responsabilidade, que incluiriam a dedicação com a empresa, controle da carga de trabalho e autonomia, enquanto os empregadores contribuiriam através de níveis apropriados de recompensas, como pagamento, condições de trabalho e oportunidade de demonstrar competência.
Entre o topo e a base da pirâmide estaria o nível de contrato associado ao contrato balanceado. Nele estariam os aspectos de carreira e os empregados devem contribuir com o trabalho, com o departamento a que pertencem, sendo esperado que seus empregadores possibilitem o desenvolvimento de suas carreira e comprometam-se com a educação para aumentar a empregabilidade.
No topo da pirâmide, estariam os aspectos relacionais, baseados na lealdade e confiança na gerência por parte do empregados, e esperando dos empregadores uma gerência competente e sentimento de pertencimento.
A releitura feita por Xxxxxxx apresenta como o indivíduo pode comprometer-se com a sua carreira, seu ambiente de trabalho e o trabalho em si, assim como com sua equipe, demonstrando que existem elementos com os quais o indivíduo pode se identificar, mesmo que não esteja envolvido com a instituição a que pertence.
Xxxxxxx (1995) afirma que cada indivíduo possui sua própria visão acerca do que ele espera da organização ou então um diferente grau de influência sobre os objetivos que ele espera que sejam alcançados. Segundo ele, os indivíduos podem reagir de maneiras diferentes, bem como apresentar maior grau de satisfação com objetivos de longo prazo ou de curto prazo.
O autor ainda apresenta a questão da satisfação no trabalho, de como ela acontece, observando quais são as expectativas criadas pelos indivíduos e o que está realmente acontecendo naquele ambiente. As expectativas seriam, então, avaliadas de acordo com as atitudes, as normas, a conduta e o nível de reconhecimento das empresas, principalmente quando voltadas para o resultado, ou seja, se o resultado é avaliado apenas quantitativamente ou se o esforço despendido pelo funcionário também é valorizado. Essas expectativas poderiam ser agrupadas e resumidas de forma a criar um grupo de contratos que poderiam ser identificados na relação entre empregado e empregador.
No contrato psicológico, a empresa estaria à procura de indivíduos que estejam motivados para cuidar bem dos interesses da empresa e os empregados estariam à espera de reconhecimento, status, tempo para a família e segurança. Além disso, o ambiente motivador deveria ser constante, exigindo muito de ambas as partes, baseado em honestidade e clareza, por exemplo.
Segundo Xxxxxxxxx (1997), a crescente utilização do conceito de contrato psicológico como ferramenta de análise nas relações de trabalho fez com que ele fosse muitas vezes associado a uma forma de manipulação dos indivíduos, contrariando a idéia de compreensão das relações humanas nas organizações. O autor salienta que os contratos são expressos através das ações das pessoas. E o processo de formação do contrato começa desde o momento da seleção do indivíduo para a ocupação (Rosseau, 1995).
Xxxxxxxx e Xxxxx (2003) mencionam que, apesar de diversos pesquisadores utilizarem o conceito de contrato psicológico de formas diferentes, todas as definições apresentadas incluem quatro itens.
O primeiro é a incorporação de crenças, valores, expectativas e aspirações do empregado e do empregador, inclusive crenças implícitas de promessas e obrigações, na medida em que esses vão sendo percebidos na relação.
O segundo item é a observação de que as expectativas não são necessariamente explícitas. Portanto, o relacionamento entre empregado e empregador deve basear-se em confiança nos termos do relacionamento, lealdade e boa-fé.
Outro aspecto importante é que o contrato psicológico pode ser continuamente renegociado, causando mudanças no indivíduo, na organização, nas expectativas. Dessa forma, torna-se visível a característica dinâmica e mutável do contrato psicológico, apesar de grande parte das pesquisas fornecer apenas uma visão instantânea de uma etapa do processo.
Por fim, por ser baseado em percepções individuais, indivíduos de uma mesma organização podem apresentar contratos psicológicos diferentes, que, por sua vez, influenciam as formas como cada um deles percebe os eventos organizacionais.
Metodologia
A presente pesquisa busca contribuir na compreensão do contrato psicológico construído no ambiente organizacional do terceiro setor, assim como o comprometimento envolvido. Optou-se pela abordagem qualitativa dos dados, por meio da análise de entrevistas realizadas com profissionais que atuam em organizações do terceiro setor.
O foco mais amplo do projeto de pesquisa original se propõe a identificar elementos constituintes e característicos do contrato psicológico e do comprometimento de indivíduos que atuam em diferentes organizações do terceiro setor, com formações e vínculos de trabalho diversos. Uma vez que a pesquisa foi iniciada em janeiro de 2008, apresentam-se, neste artigo os resultados de quatro entrevistas já realizadas e analisadas. Em termos da linha de pesquisa, considera-se que estes resultados possuem, então, um caráter parcial.
Em termos da classificação do tipo de pesquisa, utilizou-se a tipologia adotada por Xxxxxxx (2004), que categoriza os estudos quanto aos fins e quanto aos meios. Quanto aos fins, trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva. Quanto aos meios, pode-se classificar como pesquisa de campo e bibliográfica.
A seleção de sujeitos para as entrevistas deu-se pelo critério de acessibilidade, tendo sido utilizados canais de contato pessoal da autora do estudo e do seu orientador, para a localização e o acesso aos indivíduos. O Quadro 1 apresenta os perfis dos entrevistados. Por razões éticas acordadas nas entrevistas, optou-se pela não divulgação dos nomes dos entrevistados e das organizações a que estão vinculados.
Quadro 1 – Perfil dos participantes
Entrevistados | Organização | Função na Organização | Formação | Tipo de vínculo com a organização | Tempo de atuação na organização |
Entrevistado 1 | Organização A | Diretor Executivo | Administração | Trabalho celetista | 2 anos e 8 meses |
Entrevistado 2 | Organização A | Coordenador de Marketing | Administração | Trabalho celetista | 1 ano e 6 meses |
Entrevistado 3 | Organização A | Coordenador de Projetos | Ciências Sociais | Trabalho celetista | 2 anos e 6 meses |
Entrevistado 4 | Organização B | Presidente e fundador | Economia | Trabalho autônomo | 5 anos |
No Quadro 1, observa-se que três entrevistados atuam na mesma organização. Os quatro entrevistados revelaram possuir em seu currículo profissional experiências como
empregados em empresas comerciais ou industriais, anteriores ao seu trabalho no terceiro setor. Hoje, todos trabalham apenas nas organizações indicadas no quadro.
Organização A é uma organização não-governamental, que apóia projetos como creches, comunidades de baixa renda e casas de assistência a deficientes no Rio de Janeiro e São Paulo. Essa organização é composta por trabalhadores voluntários, celetistas e estagiários. Foi fundada em 1997 e atualmente assiste oito obras sociais.
Organização B, por sua vez é uma organização não-governamental que desenvolve trabalhos assistenciais com os moradores de uma comunidade carente do Rio de Janeiro. Foi fundada em 2003 e é composta de trabalhadores autônomos e voluntários.
As entrevistas foram realizadas no mês de maio de 2008. A duração média de cada uma foi de 30 minutos. Todas as entrevistas foram realizadas no local de trabalho dos indivíduos, ou seja, nas sedes das ONGs. Todas foram gravadas em meio digital e foram integralmente transcritas pela própria autora do estudo.
O conteúdo das entrevistas foi apoiado por roteiro semi-estruturado composto das seguintes questões:
a) O que significa, para você, trabalhar nessa organização?
b) Você se identifica com a organização? O que mais influencia nessa identificação?
c) Como é o seu ambiente de trabalho e as relações com os outros funcionários?
d) Xxxxx foram as principais razões de você ter vindo trabalhar nessa organização?
e) Que diferença você vê entre trabalhar em uma organização do terceiro setor e uma empresa tradicional? Quais são as diferenças, as vantagens e desvantagens percebidas?
f) O que você espera da organização? E o que você acredita que a organização espera de você?
g) Quais obrigações você considera ter com a organização?
h) Você se sente valorizado? Por quê?
i) Quais são seus planos de carreira profissional? Como pretende atingi-los? Você se vê fazendo carreira no terceiro setor?
j) Como você acredita que o mercado de trabalho vê a experiência profissional de um indivíduo que atua no terceiro setor?
O conteúdo das respostas dos entrevistados foi analisado, buscando-se a identificação de categorias de análise. Do resultado deste trabalho de leitura e interpretação dos dados, emergiram sete categorias, a saber: expectativas criadas pelos empregados; espectativa de continuidade; interpretações particulares baseadas nas percepções individuais, identificação do indivíduo com a organização; ambiente organizacional, motivação e valorização; remuneração.
Essas categorias foram utilizadas para a apresentação dos resultados, no tópico a
seguir.
Análise de dados
Neste estudo buscamos entrevistar profissionais atuantes no terceiro setor, procurando entender as diversas naturezas da relação de trabalho existente entre os entrevistados e a instituição que atuam. Da mesma forma, está sendo buscada diversidade de organizações para que o resultado possa ter maior amplitude.
A análise das entrevistas revelou categorias que ajudaram a analisar o comprometimento e o contrato psicológico dos entrevistados.
a) Expectativas criadas pelos empregados
Ao tratarmos das expectativas desenvolvidas pelos entrevistados, perguntou-se o que cada um acreditava que a instituição a qual pertence esperava dele. Pode-se observar que os indivíduos criam uma expectativa muito voltada para a equipe, quando o que é esperado de si
é o mesmo para os demais integrantes, independente das diferentes obrigações explícitas nos contratos formais. De forma geral, cria-se a expectativa de continuidade com a instituição, de desenvolvimento profissional em forma de parceria com a instituição e com os outros funcionários.
“Eu acho que a Organização A espera de cada um aqui dentro que a gente consiga implementar o plano de trabalho que a gente traçou em conjunto [...]. É a gente cumprir com o que a gente prometeu em conjunto” (Entrevistado 1).
“O que a Organização A espera de mim? Eu acho que ele espera que eu cresça com ele, né? Que eu faça a diferença e ajude ele a crescer” (Entrevistado 2).
Quando questionados sobre o que esperavam da instituição, embora alguns dos profissionais mencionassem que esperavam que a instituição em que trabalham fosse um lugar para se desenvolver profissionalmente, todos os entrevistados demonstraram mais expectativas acerca do desenvolvimento das próprias organizações.
“Eu espero que a Organização A tenha cada vez uma voz ativa na sociedade. Que cada vez seja um ícone mesmo de transformação, de que é possível ter algum envolvimento de mudança e que ela seja identificada por isso” (Entrevistado 2).
Essa preocupação com o desenvolvimento da organização denota uma forma de comprometimento que tem um forte componente afetivo. Vale ressaltar também que as organizações às quais os entrevistados estão vinculados possuem poucos anos de existência e os funcionários tendem a ser fortemente envolvidos no esforço de busca pela sustentabilidade e crescimento da instituição, o que pode ser um elemento de reforço ao seu comprometimento afetivo.
b) Expectativa de Continuidade
Percebeu-se também outra característica do comprometimento afetivo, quando se tratava da expectativa de permanência do indivíduo nas organizações. A maioria dos entrevistados demonstrou que a permanência é desejada por cada um, independente de outros fatores.
“Eu pretendo continuar no terceiro setor e em uma perspectiva coerente eu pretendo continuar dentro da Organização A” (Entrevistado 3).
Contudo, foi possível notar a presença de características do comprometimento normativo. Isso foi percebido quando os entrevistados relataram estar atuando em organizações onde pessoas próximas, ou o próprio entrevistado, estava à frente da instituição. De certa forma, fazer parte da construção da história da organização a que se está prestando serviço criou um sentimento de obrigação moral de permanência.
“Eu acompanhei esse processo desde o momento zero. Então, desde quando eles começaram a ter essa idéia, quando começaram a fazer os contatos para ver como ia funcionar, desde a primeira reunião pedagógica eu estava
presente. Quando eu vi, eu já estava trabalhando lá. [...] Foi só um processo que eu sempre fiz parte” (Entrevistado 3).
“Quando nós fundamos esse trabalho aqui na comunidade onde ele, que é professor universitário com mestrado e doutorado, nasceu e cresceu, foi para mostrar para as pessoas que é possível [...] E é meu dever mostrar que dá para mudar. Eu quero deixar a ONG com sustentabilidade para as pessoas da comunidade porque eu não pretendo continuar a frente para sempre” (Entrevistado 4).
Em outras palavras, observa-se que, pelo menos para alguns desses indivíduos a participação na organização vai além de uma simples relação contratual de trabalho, assumindo também conotação de um projeto de vida pessoal. Dessa forma, foi possível encontrar mais de uma fonte de comprometimento dos indivíduos nas organizações, reforçando que mais de uma fonte de envolvimento fortalece o vínculo com a instituição.
c) Interpretações particulares baseadas nas percepções individuais
Os entrevistados partilham à opinião de que o trabalho no terceiro setor é uma oportunidade de exercer uma profissão e agir como cidadãos melhores. A visão que os profissionais têm do terceiro setor também não é heterogênea. Todos os entrevistados citam que esse é um setor que está em fase de expansão, ganhando visibilidade no universo empresarial com a conscientização por um posicionamento mais sustentável e dando possibilidade a muitos profissionais, mesmo aqueles que estariam fora do mercado tradicional.
“Trabalhar no terceiro setor significa para mim uma oportunidade de, você que tem mais de trinta anos, trinta e cinco, o mercado para essa faixa etária já está abolido” (Entrevistado 4).
Quando questionados sobre as diferenças que conseguiam visualizar no terceiro setor dos demais, os profissionais citaram que o nível de profissionalismo no terceiro setor parece ainda ser menor; que no terceiro setor os números não são tão importantes quanto no setor de serviços; e que ele envolve muito mais o indivíduo com a tarefa, fazendo com que não haja somente a obrigação de realização da tarefa ‘dentro do escritório’.
Um ponto importante ressaltado por alguns dos entrevistados foi a necessidade de desempenhar diversos papéis, o que, segundo eles, transforma o profissional do terceiro setor em alguém diferenciado dos demais.
“Tem dia que eu estou revisando contrato, tem dia que eu to contratando gente [...] Então assim, você está lidando com uma diversidade muito maior de assuntos e de responsabilidades muito grandes” (Entrevistado 1).
d) Identificação do indivíduo com a organização
Entre os entrevistados, todos expuseram opiniões parecidas em relação ao significado do trabalho. Nota-se que há identificação por parte dos indivíduos em relação à organização em que trabalham. Segundo Xxxxx e Xxxxx (1997, apud XxXxxxxx e Xxxxxx 1999), o comprometimento afetivo acontece nessas circunstâncias, onde os valores do indivíduo e o da organização se assemelham.
“O trabalho em si significa conciliar muito do que eu acredito com o que eu sei fazer, com o que eu gosto de fazer” (Entrevistado 1).
“O que mais me fascina aqui na Organização A é essa união de estar trabalhando na minha área e também na área social” (Entrevistado 2).
O comprometimento também se relaciona à aceitação dos objetivos da organização e à identificação dos valores partilhados. Quanto a isso, mais uma vez os entrevistados responderam de forma homogênea. Todos citaram o poder de ação, de construir diferença no ambiente social como objeto de identificação. Além disso, os funcionários da Organização A ainda citam que a identificação com a filosofia da instituição também contribui muito para a identificação individual com a tarefa que realizam.
e) Ambiente organizacional
Em relação aos aspectos organizacionais, quando tratado do ambiente de trabalho, os profissionais demonstraram que existe bastante adaptabilidade e informalidade. Ressaltaram que o ambiente proporciona um misto de relacionamento pessoal com profissional.
“É um relacionamento muito colaborativo, de crescimento conjunto, de fazer isso aqui crescer pra crescer junto” (Entrevistado 1).
Da mesma forma, expuseram o quanto o grupo, a equipe, e as atitudes de cada um são importantes para a construção da imagem desse ambiente.
"Tem uma liberdade de trabalho que é interessante. A gente tem espaço de colocar a proatividade da gente em atividade, em efetiva atividade. Isso é muito interessante, por que a gente dá muito a cara do que a gente é, da nossa bagagem para o trabalho da gente e assim a gente modifica um pouco a Organização A também. Tem essa abertura que é interessante" (Entrevistado 3).
Todo esse conjunto forma um ambiente agradável nas organizações, possibilitando que aqueles que nelas se encontram partilhem de características semelhantes, como disse o Entrevistado 2:
“A gente diz que é uma seleção natural, porque quem fica aqui realmente é porque tem uns objetivos iguais. [...] Então as pessoas que ficam aqui mais tempo é que geralmente tem mais ou menos a mesma filosofia de vida e isso é muito bom”.
A informalidade, presente em ambas as instituições também desperta a preocupação do cumprimento da tarefa. O fato de as equipes atuarem de forma dependente uma das outras é um dos principais motivos da cobrança e da pontuação de que, apesar de haver o envolvimento pessoal com a tarefa, há um objetivo a ser alcançado. Dessa forma, apesar do grau de informalidade presente, os profissionais cobram de si e dos outros a participação nos projetos e atividades.
f) Motivação e valorização
Ao analisar se os profissionais se sentem valorizados, foram encontradas diferentes descrições para a valorização individual. Segundo o Entrevistado 1, a valorização dá-se principalmente por já haver a identificação inicial. O Entrevistado 3 citou que as pequenas ações realizadas por cada um e que são reconhecidas geram grande valorização:
“Quando eu comecei organizar isso aqui eu lembro que eu mandei para um dos nossos diretores que é um dos que assinam o cheque, o Xxxxxx, um executivo super atarefado, e voltou o material todo com um bilhetinho ‘Muito boa organização! Excelente! Parabéns!’. Esse tipo de cuidado que eles têm com detalhes que passam despercebidos em empresas comerciais, essa motivação a cada passo é estimulante”.
Em contrapartida, o Entrevistado 4 demonstrou sentir-se pouco valorizado, dizendo que não espera que seu trabalho seja reconhecido por outras pessoas, pois essas não sabem reconhecer o verdadeiro valor do trabalho social.
Quanto ao fator motivacional, os entrevistados demonstraram posições semelhantes ao optarem atuar no terceiro setor. Eles relataram a importância de estar trabalhando em uma ambiente onde está exercendo sua profissão e, ao mesmo tempo, podendo expor seu lado solidário e humano sem repressão. Também disseram que, apesar de terem tido importantes oportunidades de atuação em outras organizações, a opção de trabalhar no terceiro setor foi considerada como a mais estimulante na hora da decidir onde atuar. Além disso, os entrevistados, mesmo sabendo que há a necessidade de multiplicidade de papeis, aceitam-nos como um desafio positivo e enriquecedor.
“Então de repente você está ‘jogando nas onze’ e desenvolvendo essa capacidade de aprender e eu acho que isso dá uma adaptabilidade tão grande que quem entra numa empresa e segue aquele itinerário fordista meio que não tem. Isso é tão bom! Dá vontade de aprender mais, de continuar” (Entrevistado 3).
g) Remuneração
A questão salarial abordada durante as entrevistas despertou pequenas diferenças entre os profissionais. Apesar de, para todos os empregados, o salário não ser o principal atrativo quando se trata do nível de satisfação, alguns entrevistados disseram não se sentirem valorizados financeiramente, como disse o Entrevistado 2:
“Financeiramente eu não me sinto valorizado. [...] eu trabalho para caramba, às vezes toda segunda feira a gente fica aqui até nove horas da noite, a gente faz evento sábado, domingo. A gente rala muito. Então, comparado ao trabalho e remuneração financeira, não, ainda não”.
Todos os entrevistados demonstraram que optar por trabalhar no terceiro setor foi uma escolha baseada no equilíbrio entre satisfação e remuneração.
“Tive sim que fazer um certo sacrifício do ponto de vista financeiro, né! Porque não tem como você fazer uma mudança como essa sem ter pelo menos no início uma noção assim 'ah, mas eu to investindo para o que eu quero fazer’”. Entrevistado 1
No caso do Entrevistado 4, que atua como trabalhador autônomo na ONG, a remuneração inexistente transforma-se em um tipo de frustração, por não poder fazer mais pela instituição. Segundo ele, a remuneração não influencia no seu sentimento pela ONG, mas
se ela existisse serviria como meio de fazer mais pela comunidade, já que poderia se dedicar mais plenamente ao trabalho na organização.
Conclusões
Esta pesquisa, com objetivo analisar o contrato psicológico dos indivíduos que optam pela carreira no terceiro setor, assim como qual é a relação de comprometimento com as organizações a que pertencem. As considerações que serão apresentadas possuem caráter parcial, já que outras entrevistas estão sendo agendadas para os próximos meses.
A respeito das expectativas desenvolvidas pelos indivíduos e de sua forma de engajamento, pode-se perceber uma predominância dos tipos de comprometimento afetivo e normativo, segundo o modelo de Xxxxx e Xxxxx.
Os indivíduos revelam expectativa de continuidade nas instituições, de desenvolvimento profissional em forma de parceria, esperando também que a organização se desenvolva junto com eles. Em parte, os profissionais se comprometem a continuar nas organizações por assim desejarem e, em parte, se sentem vinculados a elas por um sentimento de obrigação moral. Sentem-se orgulhosos de suas organizações e, ao mesmo tempo, entendem a responsabilidade que assumiram diante da sociedade quando escolheram trabalhar no terceiro setor. Em relação aos aspectos organizacionais, os profissionais consideram existir bastante adaptabilidade e informalidade.
Os entrevistados visualizam o terceiro setor como um setor em expansão, com grandes oportunidades, mas também ressaltam que ainda existem preconceitos com relação ao trabalho nesse setor. Eles partilham à opinião de que o trabalho no terceiro setor é uma oportunidade de exercer uma profissão e agir como cidadãos melhores. A questão salarial levantada revelou diferenças entre os entrevistados. Apesar de o fator monetário ter sido tratado como menos importante no processo de escolha pelo terceiro setor, alguns profissionais mostraram-se pouco valorizados em relação a isto.
De modo geral, a análise revelou a predominância de contratos psicológicos com foco relacional ou de longo prazo, diferenciando-se do foco mais transacional, ou de curto prazo que tem dominado as relações de trabalho no atual contexto do mercado de trabalho.
Um aspecto não abordado diretamente nas entrevistas, mas que parece ser influenciador das expectativas que os indivíduos desenvolvem sobre a relação de trabalho é o nível de formalização da gestão de seu contrato com a xxxxxxxxxxx.Xx continuidade da linha de pesquisa, espera-se abordar também a visão sobre esse lado da relação de trabalho.
Nos próximos meses, o estudo continuará a ser desenvolvido, por meio da realização de entrevistas com indivíduos que atuam em outras organizações do terceiro setor, além daquelas já abordadas até o momento. Isso possibilitará a confirmação ou complementação dos resultados apurados nessa primeira fase da pesquisa.
No futuro, pretende-se ainda, ampliar o foco da análise do estudo, de modo a se observar a influência de variáveis ainda não consideradas até este ponto e que podem afetar as expectativas dos indivíduos sobre a relação de trabalho com as organizações do terceiro setor. Entre elas, destacam-se, por exemplo, as questões de gênero, grau de formação escolar, idade e tipo de experiência profissional prévia dos indivíduos.
Referências
[1] XXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx. Terceiro Setor: Um estudo comparado entre Brasil e Estado Unidos. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2000.
[2] XXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Privado porém público: o terceiro setor na América Latina. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994.
[3] XXXXXX, Xxxxxx. Para além do mercado e do Estado? – Filantropia e cidadania no Brasil. Rio de Janeiro, ISER Núcleo de pesquisa, 1993.
[4] XXXXXXX, X. Psychological contracts: are they still relevant? Career Development International, v.7, n.3, p.167-180, 2002.
[5] XXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx de. Terceiro setor e gênero: trajetórias e perspectivas. São Paulo: Cultura Acadêmica: Instituto Presbiteriano Mackenzie, 2005.
[6] XXXXXXXX, D.J, XXXXX, P.J. The psychological contract, organizational commitment and job satisfaction of temporary staff. Leadership & Organizational Development Journal, v.21 n.2, p.84-91, 2002.
[7] XXXXX, X.X. Os sentidos do trabalho (Tradução: Xxxxxx Xxxxxx). Revista de Administração de Empresas, v.41 n.3, p.8-19, jul - set 2001.
[8] XXXXXXXXX, E. W. e XXXXXXXX, S. When employees feel betrayed: a model of how psychological contract violation develops. Academy of Management Review, v.22, n.1, p.226-256, 1997.
[9] XXXXXXX, X. Contracts, Complexity and Contradictions – The changing employment relationship. Personnel Review, v.24, n.8, p.54-70, 1995.
[10] XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx. Relação de trabalho no Terceiro Setor. Gênesis – Revista de Direito do Trabalho, nº. 137, p.683-688, maio – 2004.
[11] XXXX, X. Comprometimento Afetivo dos membros organizacionais: o papel das percepções de justiça. Revista de Administração Contemporânea, v.6 n.2, p.209-241, maio-agosto 2002.
[12] XXXXXXX, Xxxxxxx X. Comportamento Organizacional (Tradução: Xxxxxxxx Xxxxxxxxx). São Paulo: Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxx, 0000.
[13] XXXXXXXX, D.M. Psychological Contract on Organization: understanding written and unwritten agreements. Thousand Oaks: Sage, 1995.
[14] XXXXXXXX, X. e XXXXX, S. The Psychological Contract: a sloan work and family encyclopedia entry (2003). Disponível em:
<xxxx://xxxxxxxxx.xx.xxx/xxxxxxxxxxxx_xxxxx.xxx?xxx000&xxxxxXxx> Acessado em 12/05/08.
[15] XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas, 2004.