UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO
UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO
CURSO DE DIREITO
XXXXX XXXXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX
SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO NA PANDEMIA:
Estudo das Aplicações Práticas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda da Lei 14.020/2020
São Leopoldo/RS 2021
XXXXX XXXXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX
SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO NA PANDEMIA:
Estudo das Aplicações Práticas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda da Lei 14.020/2020
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pelo Curso de Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS
Orientador: Prof. Dr. Xxxxxxxxx Xxxxxx
São Leopoldo/RS 2021
Dedico este trabalho à Libia, minha mãe, por me mostrar que tudo que fazemos com amor demonstra resultado, independente do que for.
À Xxxxxxxx e Xxxxxxx, minhas irmãs, que sempre foram exemplos e acolheram meus anseios.
À Xxxxxx, meu companheiro, que me incentivou a sempre demonstrar o melhor de mim, evidenciando minha capacidade.
À Dinah, a gata, por ser minha fiel companheira nos momentos de escrita.
Por fim, ao Curso de Direito da Unisinos e ao Estágio que desfrutei na Defensoria Pública, e às pessoas com quem convivi nesses espaços ao longo desses anos. A experiência de uma produção compartilhada na comunhão com amigos foram a melhor experiência da minha formação acadêmica.
RESUMO
O presente trabalho destina-se ao estudo das aplicações práticas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, instituído em momento pandêmico pela Lei 14.020/2020, especificadamente, tem o intuito de entender como devem ser conduzidos os reflexos que a medida de suspensão do contrato de trabalho proporcionou, visto que geradora de discussões. Através do uso do método indutivo para a pesquisa, buscou tratar dos temas atuais de forma refletiva a fim de construir uma visão crítica sobre o assunto juntamente com os autores apresentados. A partir disso, analisa-se que a pandemia de COVID-19 oportunizou diversas modificações legislativas, necessárias frente ao contexto que se apresentaram. Principalmente a área mais afetada é o direito do trabalho, visto que o distanciamento social conduziu a paralisação de diversas atividades que não conseguiram migrar para o atendimento remoto. A criação do PEMER surge como mecanismo para desafogamento de empresas e alívio para empregados que temiam com o fechamento de postos de trabalho. Com intuito de preservar contratos trabalhistas e garantir a saúde econômica de estabelecimentos o programa possibilitou a redução de jornadas de trabalho e suspensão de contratos de trabalho, enquanto o trabalhador receberia auxílio custeado pelos cofres públicos. Percebe-se ao longo do trabalho que o programa atingiu seu objetivo, mas frente às omissões legislativas que comportava em relação aos reflexos da suspensão do contrato de trabalho, verifica-se necessária uma reforma legislativa a fim de que empregados e empregadores não sofram com incertezas.
Palavras-chave: Pandemia. Trabalho. Suspensão de contratos. Economia.
3
ABSTRACT
This current paperwork aims at the study of the practical applications of the Job and Income Maintenance Emergency Program, introduced in the pandemic moment by the law number 14.020/2020, specifying, it has the intention of understanding how the reflexes of the suspension action, that the employment contract provided, must be conducted, since it has become a discussion trigger. Through the inductive method for the research, it has been sought to deal with current topics on a reflective way so that a critical view was built about the subject along with the presented authors. Starting there, it was noticeable that the COVID-19 pandemic enabled several legislation modifications, needed, facing the presented context. Mainly, the most affected area was the labor law, since the social distance conducted to several activities shutdowns, the ones which were not able to migrate to remote service. The JIMEP creation came as a loosen movement to companies and a relief to employees who feared the shutting down of workstations. Aiming to maintain occupational contracts and assure economic health of establishments, the program allowed the reduction of working time and suspension of employment contracts, in the meantime, the employee would receive assistance funded by public coffers. Throughout the paperwork, it was noticed that the program reached its goal, but facing the legislation omissions held in relation to the reflexes of the suspension action of employment contracts, a legislation remodeling was checked as necessary so that employees and employers would not suffer with uncertainties.
Keywords: Pandemic. Labor. Contract suspension. Economy.
LISTA DE SIGLAS
ACAPS | Assessment Capacities Project |
BEm | Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda |
CAGED | Cadastro Geral de Empregados e Desempregados |
CF/88 | Constituição Federal Brasileira de 1988 |
CIDH | Comissão Interamericana de Direitos Humanos |
CLT | Consolidação das Leis do Trabalho |
FGTS | Fundo de Garantia por Tempo de Serviço |
FMI | Fundo Monetário Internacional |
IBGE | Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística |
ILO | International Labour Organization |
IMF | International Monetary Fund |
INSS | Instituto Nacional do Seguro Social |
ISTAT | Instituto Nazionale di Statistica |
MP | Medida Provisória |
OECD | Organisation for Economic Co-operation and Development |
OIT | Organização Internacional do Trabalho |
OMS | Organização Mundial da Saúde |
OPAS | Organização Pan-Americana da Saúde |
PEMER | Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda |
PIB | Produto Interno Bruto |
PRIORE | Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego |
REQUIO | Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva |
SSP | Statutory Sick Pay |
TCU | Tribunal de Contas da União |
SUMÁRIO
2 ASPECTOS CONCEITUAIS DO DIREITO DO TRABALHO E DA PANDEMIA DE COVID-19 10
2.1 Direitos fundamentais dos seres humanos frente ao cenário provocado pela Pandemia de COVID-19 10
2.2 A pandemia de COVID-19 no Brasil e nos países do continente europeu 21
2.3 Conceito de suspensão do contrato de trabalho 33
3 A PANDEMIA E A RELAÇÃO DE TRABALHO SOB UMA VISÃO ECONÔMICA
3.1 Reflexos da pandemia de COVID-19 no direito do trabalho e na economia 40
3.3 Principais modificações legislativas provocadas pela pandemia no Brasil no âmbito trabalhista 60
4 O PROGRAMA EMERGENCIAL DE MANUTENÇÃO DO EMPREGO E DA RENDA DA LEI 14.020/2020 72
4.1 Noções introdutórias, objetivos e alcances da Lei 14.020/2020 72
4.2 Reflexos da implementação da Lei 14.020/2020 na prática trabalhista 81
4.3 O PEMER como medida efetiva de proteção aos empregos comparado ao direito econômico 91
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 101
REFERÊNCIAS 106
1 INTRODUÇÃO
Esta monografia de conclusão de curso busca debruçar-se ao estudo das suspensões de contratos de trabalho ocorridas no período de pandemia da COVID-
19. Especificamente o presente trabalho tem como delimitação o estudo das aplicações práticas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (PEMER), que previu a concessão do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) aos trabalhadores que acordassem com os empregadores para proceder à suspensão ou redução da carga horária de seus contratos de trabalho regidos pela Consolidação de Leis do Trabalho (CLT).
Inicialmente normatizado pela Medida Provisória (MP) 936, o PEMER surgiu como uma medida eficaz e imediata para evitar o previsto desemprego em massa, visto que muitas empresas tiveram suas atividades interrompidas com intuito de barrar a propagação do vírus que atacava o Brasil e o mundo. Hoje o PEMER e BEm estão consolidados pela Lei 14.020/2020, foram remédios, tanto para empresas que estavam a ponto de decretar a falência, tanto para empregados que temiam pelo desligamento, pois permitiu a suspensão do pagamento salarial, enquanto vigesse o acordo, sem que o trabalhador deixasse de receber verbas, advindas por meio do benefício governamental.
O que ocorre, entretanto, é que, mesmo após a conversão da MP 936 na Lei 14.020/2020, houve manutenção do uso do termo “suspensão temporária do contrato de trabalho”, o que, de fato, causa controvérsias na aplicação prática. No direito do trabalho o conceito de suspensão do contrato de trabalho refere-se a uma pausa expressamente prevista em lei, sem haver pagamento de salário e prestação de serviços, também não ocorre o computo de tempo de serviço do período suspenso e não se faz necessário o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Apesar de preenchido os requisitos para a medida imposta pelo PEMER ser considerada como efetiva suspensão do contrato de trabalho, houve aplicadores do direito sustentando a necessidade do cômputo do período suspenso, e, com isso o pagamento integral de verbas como a gratificação natalina e para aquisição de férias, por exemplo, em razão de ser instituída em momento pandêmico. Indaga-se, portanto, o seguinte: de que forma deve ser encarada e aplicada a suspensão do contrato de trabalho prevista na Lei 14.020/2020?
Como hipóteses da monografia busca-se consolidar que há necessidade de revisão no texto legal, a fim de que se possa extrair com clareza comandos precisos. Isso porque um dos princípios norteadores do direito do trabalho, sugere fácil acesso e compreensão pelo trabalhador da norma legal.
Precipuamente, o objetivo geral desta monografia, é verificar a possibilidade de um equilíbrio com a pretensa revisão da Lei 14.020/2020, tendo em vista não prejudicar nenhum dos polos da relação trabalhista, pois ambos foram afetados pela pandemia de COVID-19.
Neste trabalho buscar-se-á sintetizar os direitos fundamentais dos seres humanos frente ao cenário provocado pela pandemia, bem como desmembrar a ideia de suspensão dos contratos trabalhistas, além de averiguar os efeitos da pandemia provocada pela disseminação do vírus COVID-19 no Brasil e em determinados países do continente europeu e seus reflexos no direito do trabalho. Ademais, há intuito de compreender o PEMER e o BEm, suas características, princípios e efeitos a fim de que resulte visão crítica acerca da suspensão do contrato de trabalho possibilitando refletir se deve ou não ser tratada como tal. Objetiva-se também proceder um levantamento de dados, a fim de contatar como o PEMER e o BEm foram interpretados por empregadores e empregados que aderiram aos acordos.
Sendo o tema atual e pertinente, em virtude das contradições causadas na seara trabalhista, a pesquisa tem intuito de esclarecer conceitos, não só para estudantes da área, como também para aplicadores do direito a partir de uma visão moderna e crítica baseada na igualdade. Isso porque, a pandemia como fenômeno recente ainda carece de conteúdos que estudem seus efeitos e reflexos especificadamente voltados para a seara trabalhista, além disso, o momento ficou marcado na história da humanidade, visto que afetou amplamente a sociedade.
Acrescenta-se que esta monografia tende a enriquecer a dialética jurídica, levantando dados pertinentes para contribuição do debate doutrinário, principalmente frente a pandemia de COVID-19 instaurada e as modificações legislativas advindas nesse período para suprir as necessidades da população, bem como as políticas públicas instauradas não só no Brasil, mas como em diversos países. Ademais, a Lei 14.020/2020 apresenta lacunas quanto sua condução prática em relação ao cômputo do período em que os contratos de trabalho restaram suspensos.
A busca pela humanização do direito é compromisso de todos, nesse sentido, imperioso que esse tipo de obscuridade não pode rodear a atividade laborativa do trabalhador. É necessário que esteja claro, tanto para o empregador quanto para o empregado os seus devidos diretos, a fim de que nada lhes seja suprido, pois o exercício de atividade laboral está intimamente ligado a rotina do cidadão e caracteriza-se inclusive como uma garantia primordial para vida digna, além de concretizar a efetivação dos direitos sociais.
Cumpre afirmar que os benefícios dessa pesquisa se encontram na garantia de efetivação de princípios como transparência e dignidade da pessoa humana, além de reportar-se a toda comunidade de trabalhadores, empregadores e estudiosos da área para compreender a fundo o PEMER e sua aplicação prática.
Esta monografia será desenvolvida pelo método indutivo1, isso porque não se limita a apenas exercer conclusões lógicas a partir do material analisado, tendo finalidade de construir visão crítica do assunto proposto e inclusive sugerir soluções possíveis ao problema enfrentado. Nesse sentido, há intuito de proceder diálogo com os autores apresentados, examinando e sintetizando o objeto estudado para que se proceda à redação da tese.
O trabalho utilizará como base a pesquisa bibliográfica e documental, tendo como materiais a legislação nacional vigente como a CLT, a Constituição Federal de 1988, a Lei 14.020/2020, entre outros que se mostrarem pertinentes, além de estudos jurídicos já existentes por meio de livros, artigos especializados publicados e textos acadêmicos disponibilizados na rede mundial de computadores, também se pretende a análise de decisões judiciais análogas ao objeto de estudo. Com isso será realizado um fichamento contendo o levantamento teórico acerca do assunto, envolvendo o estudo crítico do material pesquisado e apontando o modo como o assunto é visto atualmente.
1 “O método indutivo: é um raciocínio no qual, a partir de dados singulares ou parciais suficientemente enumerados, infere-se uma verdade universal. O argumento vai do particular para o geral, ao revés do método dedutivo. Por esse método, partindo do particular para o geral, estimula-se o cientista a identificar os princípios gerais e a conexão sistêmica dos institutos jurídicos e de seus antecedentes históricos. O propósito do raciocínio indutivo é chegar a conclusões mais amplas do que o conteúdo estabelecido pelas premissas nas quais está fundamentado” FINCATO, D. P.; XXXXXX, S. A. C. A Pesquisa Jurídica sem Mistérios: do projeto de pesquisa à banca. 3. Ed. Porto Alegre: Editora Fi, 2018. E-book. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxx.xxxxx.xx/xxxxxx/xxxxxxxxx/00000/00000/0/X_Xxxxxxxx_Xxxxxxxx_xxx_Xxxxxxxxx_X o_Projeto_de_Pesquisa_a_Banca.pdf. Acesso em 13 abr 2021.p. 43.
A presente monografia tem como finalidade a construção de aprendizado a partir da leitura obras utilizadas e da análise dos dados catalogados, e, como consequência a elaboração de uma tese crítica. Dessa forma, o presente trabalho será dividido em 3 capítulos, que se destinam a ampliar o debate acerca do tema proposto.
O primeiro capítulo tem o propósito de introduzir os conceitos básicos relacionados a relação de trabalho e da pandemia de COVID-19, para isso inicia-se apresentando o modo como os direitos fundamentais estão sendo tratados na era pandêmica, como também se expõe o cenário pandêmico que o Brasil e países do mundo enfrentam, além de conceitualizar o termo de suspensão do contrato de trabalho.
No segundo capítulo pretende-se uma análise do tema pandemia e relação de trabalho tendo como viés a econômica, com isso proceder-se-á um levantamento de dados acerca dos impactos provocados pelo surto pandêmico tanto no direito do trabalho como na econômica, o capítulo também se destinou não apenas a estudar esses impactos em território brasileiro, mas sim fazendo um estudo comparativo com países do continente europeu, visto que foram os primeiros a serem atingidos, quais sejam Espanha, Itália, Reino Unido, França e Portugal. Ainda, o capítulo também indicou as principais modificações legislativas no âmbito trabalhista advindas com a pandemia provocada pela COVID-19 no Brasil.
Por fim, o terceiro capítulo dedicou-se ao estudo especificadamente do PEMER, abordando seus principais objetivos, suas características e seu modo de aplicação. No capítulo também se faz uma crítica ao modo como a Lei 14.020/2020 fora redigida em razão de causar diversas discussões acerca de sua aplicação prática em relação à suspensão do contrato de trabalho. Evidenciou-se inclusive se o PEMER foi medida efetiva de proteção ao emprego relacionando com seu segundo objetivo que se destina a manutenção da economia após a crise proporcionada pela pandemia.
2 ASPECTOS CONCEITUAIS DO DIREITO DO TRABALHO E DA PANDEMIA DE COVID-19
Inicia-se o presente estudo relacionando a proteção aos direitos fundamentais dos indivíduos face às limitações impostas pela pandemia de COVID-19. Vislumbra- se o alcance e as dimensões da pandemia ocorrida no ano de 2020, seus impactos sanitários e medidas adotadas para proteção da saúde da sociedade, no Brasil e em determinados países do continente europeu. Por fim, estabelece-se de forma conceitual os institutos de suspensão e interrupção do contrato de trabalho, visto que a suspensão contratual na seara trabalhista foi instituída como política pública no combate a crise econômica prevista pela pandemia.
2.1 Direitos fundamentais dos seres humanos frente ao cenário provocado pela Pandemia de COVID-19
A pandemia provocada pelo vírus COVID-19 se alastrou de forma rápida e em seu estopim, ainda sem expectativas de vacinas, teve como recomendação mais eficaz para conter seu avanço medidas de isolamento sanitário. Muitos países fecharam fronteiras, empresas, escolas entre outros como método de restrição de circulação de pessoas.
Tais medidas confrontaram com alguns dos direitos fundamentais dos seres humanos, fazendo doutrinadores questionarem se sua adoção não obstaculizaria o exercício de direitos como liberdade de locomoção, liberdade de crença, consciência ou culto, liberdade de expressão, liberdade no exercício da profissão, além de atingir as garantias do ser humano como educação, trabalho, saúde, entre outros.
O tema inclusive foi pauta para a Resolução nº 01/20202, em 10 de abril de 2020 e para a Resolução nº 04/20203, em 27 de julho de 2020 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). A primeira contendo recomendações
2 “la pandemia supone desafíos aún mayores para los Estados de las Américas, tanto en términos de políticas y medidas sanitarias, como en capacidades económicas, que permitan poner en marcha medidas de atención y contención que resultan urgentes y necesarias para proteger efectivamente a sus poblaciones, acordes con el Derecho Internacional de los Derechos Humanos.” COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS (CIDH). Resolución 1/2020: Pandemia y
Derechos Humanos em las Américas. Washington, DC: XXXX, 0000. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx/xxxxxxxxxx/xxx/Xxxxxxxxxx-0-00-xx.xxx. Acesso em 3 ago 2021. p. 3 e 4.
3 COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS (CIDH). Resolución 4/2020:
Derechos Humanos de las Personan com COVID-19. Washington, DC: CIDH, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx/xxxxxxxxxx/xxx/Xxxxxxxxxx-0-00-xx.xxx. Acesso em 3 ago 2021.
para evitar o contágio através do isolamento entre outras medidas de combate ao vírus ponderadas com a necessidade de resguardar os direitos fundamentais, principalmente em países do continente americano que possuem capacidades econômicas, sanitárias e políticas mais restritas, assim dispondo:
[...] a pandemia apresenta desafios ainda maiores para os Estados das Américas, tanto em termos de políticas e medida de saúde, bem como capacidades econômicas, que permitem colocar em prática medidas de atenção e contenção que são urgentes e necessárias para proteger efetivamente suas populações, de acordo com o Direito Internacional dos Direitos Humanos. (Tradução nossa)
Inclusive o item nº 5 da Resolução nº 01/20204 da CIDH aponta como medida direcionada a garantia dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais a proteção de trabalhadores:
É importante levar medidas que garantam a renda econômica e os meios de subsistência de todos os trabalhadores, para que tenham iguais condições de cumprir as medidas de contenção e proteção durante a pandemia, bem como as condições de acesso a alimentação e outros direitos essenciais. As pessoas que devem prosseguir no desempenho de suas atividades laborais, devem ser protegidas dos riscos de contágio pelo vírus e, em geral, deve ser dada proteção a empregos, salários, liberdade sindicatos e negociações coletivas, pensões e outros direitos sociais relacionados com a esfera trabalhista e sindical. (Tradução nossa)
Já a Resolução nº 04/2020 da CIDH editada posteriormente, em momento que a pandemia estava consolidada, buscou regulamentar acerca dos direitos humanos das pessoas com COVID-19, visto que fatores como discriminação, pobreza, desigualdade, deficiência do sistema de saúde e entre outros, proporcionados pela falta de estabilidade política, dificultam as medidas para
4 “Es importante tomar medidas que velen por asegurar ingresos económicos y medios de subsistencia de todas las personas trabajadoras, de manera que tengan igualdad de condiciones para cumplir las medidas de contención y protección durante la pandemia, así como condiciones de acceso a la alimentación y otros derechos esenciales. Las personas que hayan de proseguir realizando sus actividades laborales, deben ser protegidas de los riesgos de contagio del virus y, en general, se debe dar adecuada protección a los trabajos, salarios, la libertad sindical y negociación colectiva, pensiones y demás derechos sociales interrelacionados con el ámbito laboral y sindical.” COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS (CIDH). Resolución 1/2020:
Pandemia y Derechos Humanos em las Américas. Washington, DC: XXXX, 0000. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx/xxxxxxxxxx/xxx/Xxxxxxxxxx-0-00-xx.xxx. Acesso em 3 ago 2021. p. 10.
combate à pandemia. Na esfera trabalhista, buscando a proteção das pessoas infectadas, previu na diretriz X, no item 425 o seguinte:
Pessoas com COVID-19 devem ser protegidas contra rescisão indevida, tanto na esfera pública quanto na privada, como garantia da estabilidade do emprego, que inclui medidas especiais destinadas a proteger os direitos e as condições delas decorrentes. Da mesma forma, recomenda-se que os Estados tomem medidas que incluam autorizações para doença relacionada a condições causadas por COVID-19, compensação para exercer funções de cuidado, bem como facilitar a participação ativa nos sindicatos e grupos de trabalhadores, entre outros aspectos. (Tradução nossa)
Por oportuno, cabe também ressaltar a Resolução mais recente aprovada em 6 de abril de 2021, nº 01/20216 da CIDH que visa apresentar diretrizes acerca das vacinas contra a COVID-19 no âmbito das obrigações interamericanas de direitos humanos, principalmente sua distribuição de forma humanitária e obedecendo aos critérios apresentados pelos órgãos da saúde.
Membros do poder executivo seguiram as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), bem como as orientações das Resoluções da CIDH, sendo a medida mais eficaz, enquanto não ocorria a chegada da vacina, o distanciamento e isolamento social, ocasionando a suspensão de diversas atividades. Situação essa implica diretamente os direitos fundamentais, entendidos por Xxxxxx e Soares7 como aqueles que “representam a materialidade dos direitos humanos, positivando o conteúdo enunciativo de tais direitos nas legislações dos países”.
5 “Las personas con COVID-19 deben ser protegidas contra el despido injustificado, tanto en el ámbito público como en el privado, como garantía de la estabilidad laboral, lo que incluye medidas especiales dirigidas a proteger los derechos y condiciones derivados de la misma. Del mismo modo, se recomienda que los Estados tomen medidas que incluyan permisos por enfermedad relacionados con padecimientos causados por COVID-19, compensaciones por ejercer funciones de cuidado, así como facilitar la participación activa en los sindicatos y agrupaciones de trabajadores y trabajadoras, entre otros aspectos.” COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS (CIDH).
Resolución 4/2020: Derechos Humanos de las Personan com COVID-19. Washington, DC: CIDH, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx/xxxxxxxxxx/xxx/Xxxxxxxxxx-0-00-xx.xxx. Acesso em 3 ago 2021. p. 11.
6 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Resolução 1/2021: As
vacinas contra a COVID-19 no âmbito das obrigações interamericanas de direitos Humanos. Washington, DC: CIDH, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx/xxxxxxxxxx/xxx/Xxxxxxxxxx-0-00-xx.xxx. Acesso em 3 ago 2021.
7 XXXXXX, X., X., X., X.; XXXXXX, X., X., X. Constituição e Restrição a Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia de COVID-19: um Breve Estudo do lockdown no Estado do Maranhão. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 4 ago 2021. p. 98.
Em decorrência dos esperados efeitos negativos da pandemia, muitos países optaram pela instauração do estado de calamidade pública, medida emergencial tomada quando o poder público não consegue por si próprio controlar. De forma didática, Lopes8 explica acerca do estado de calamidade pública relacionando-o com a atual situação pandêmica:
[...] a decretação do estado de calamidade tem como consequência mais efetiva a não necessidade de cumprimento da meta fiscal, assim possibilitando que o poder governante gaste mais recursos públicos para combater a situação anômala. No presente momento, tal decreto viabilizou que o Estado usasse mais numerário no enfretamento a pandemia do novo Coronavírus e desse suporte aos mais necessitados, por meio do auxílio emergencial.
Com a decretação de estado de calamidade, embora o Estado consiga destinar mais verbas para contenção da situação extraordinária, em decorrência das medidas que fica o governo autorizado a implementar para controlar o cenário, principalmente as adotadas para contenção da disseminação de um vírus, tais como a limitação de circulação, entende-se que os direitos fundamentais dos seres humanos podem ficar em discussão. As medidas adotadas sempre objetivam a batalha contra a crise sanitária, Xxxxxx e Soares9 destacam “o fundamento para a relativização dos direitos fundamentais no período de pandemia tem o intuito evitar o contágio desenfreado e diminuir o número de mortes”.
Salienta Lopes10 que apesar desses direitos serem irrenunciáveis e inalienáveis, não são absolutos por encontrar limites em outros direitos também contemplados na CF/88 ou no interesse público. Portanto, frente a situações anômalas, em que afloram a hierarquia entre os direitos no caso concreto, como a situação de contágio desenfreado por COVID-19, pode ocorrer a relativização de
8 XXXXX, X., X. A Flexibilização dos Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia: Nenhum direito é absoluto. Etic Encontro de Iniciação Científica, [s.l.], v.16, n. 16. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/XXXX/xxxxxxx/xxxx/0000. Acesso em 3 ago 2021. p. 4.
9 XXXXXX, X., X., X., X.; XXXXXX, X., X., X. Constituição e Restrição a Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia de COVID-19: um Breve Estudo do lockdown no Estado do Maranhão. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 4 ago 2021. p. 95.
10 XXXXX, X., X. A Flexibilização dos Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia: Nenhum direito é absoluto. Etic Encontro de Iniciação Científica, [s.l.], v.16, n. 16. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/XXXX/xxxxxxx/xxxx/0000. Acesso em 3 ago 2021. p. 4.
alguns direitos frente a outros, não é o que se espera, mas não deixa de ser uma hipótese.
A chave para a questão está na tentativa de formalizar certo equilíbrio entre um direito e outro verificada a colidência, considerando como núcleo a dignidade da pessoa humana, evitando que haja o exaurimento total de uma das garantias. Claro que, com a decretação do estado de calamidade tem-se a expectativa que o poder público priorize a manutenção das condições que permitem o cidadão de viver ao menos com o mínimo existencial e com isso pretende-se que o foco esteja na proteção dos direitos fundamentais e sociais.
Xxxxxx e Soares11 advertem que após cessar os efeitos da pandemia devem ser reestabelecidos a plena efetividade dos direitos fundamentais, e ressaltam:
[...] a conjuntura desta crise sanitária do coronavírus não pode oportunizar a construção de uma narrativa segundo o qual os tempos atuais exigiriam a adoção de uma “ Constituição de Emergência”, através de uma “ Jurisprudência de Crise”, a justificar a suspensão ou a restrição desproporcional dos direitos individuais, bem como a normalização de abusos por parte das autoridades públicas, como se a Constituição Federal de 1988 tivesse cessado a sua vigência e eficácia.
O vírus, de forma silenciosa, consegue atingir um grande número de pessoas sem essas tomarem por conta de forma célere, o que faz com que sua taxa de contágio seja elevada. No início desse período que marcou a história, não havia mecanismos farmacêuticos que pudessem controlá-lo, até hoje a doença não possui cura, cabendo as pessoas tomarem medidas de proteção individual enquanto a vacinação avança vagarosamente.
Efetivamente a medida mais certeira foi a aplicação do distanciamento e isolamento social, restringindo que as pessoas mantivessem contato entre si. Na tentativa de quebra do convívio social, as medidas tomadas pelo mundo impuseram o fechamento de diversos locais de trabalho.
As populações foram impedidas de laborar presencialmente ou tiveram que remanejar a forma da prestação de serviços, circunstância tal provocou diversas
11 XXXXXX, X., X., X., X.; XXXXXX, X., X., X. Constituição e Restrição a Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia de COVID-19: um Breve Estudo do lockdown no Estado do Maranhão. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 4 ago 2021. p. 105.
alterações sociais e econômicas em todos os países. O direito do trabalho, portanto, foi constantemente alterado para satisfazer as necessidades surgidas com a pandemia, além das preocupações com os impactos econômicos advindos. Xxxxxxx, Xxxxxxx e Rodrigues12 entendem que as medidas adotadas afetarão diversos direitos, em suas palavras:
Sabe-se que as referidas medidas visam à segurança e à proteção das pessoas, mas restringem alguns direitos dos cidadãos, os quais são garantidos pelas Constituições e Pactos Internacionais. Como a pandemia não afeta somente a saúde das pessoas, mas também interfere no âmbito social, ambiental e econômico, tais medidas geram discussões e dividem opiniões no mundo inteiro.
Quando se pensa no direito do trabalho, duas figuras mostram-se principais, a do empregado, pessoa física que presta serviço mediamente pagamento de salário, e a do empregador, pessoa física ou jurídica que admite, assalaria e dirige a prestação de serviço, conceitos extraídos da CLT, nos artigos 3º e 2º respectivamente. Notavelmente, percebe-se uma discrepância de hierarquia nessas relações, pois o empregador detém poder sobre o empregado, uma vez que controla a prestação de serviço. Verifica-se que não há igualdade entre as partes nos contratos trabalhistas.
O trabalho ocupa boa parte do dia de muitas pessoas, independente da forma como é conduzido, é a partir dele que essas pessoas promovem suas vidas de forma digna, visto que as verbas salariais têm destino a manutenção do lar, compra de alimentos e demais gastos para sustento da família e da própria pessoa. Inevitável, portanto, ao pensar em direito do trabalho, que tenha-se em mente os direitos fundamentais das pessoas humanas, como sua garantia a dignidade, núcleo de todo ordenamento jurídico brasileiro, consubstanciado no art. 1º da Constituição Federal de 1988 (CF/88).
Assim, provocam Xxxxxxx e Araújo13:
12 XXXXXXX, X., X.; XXXXXXX, E., X.; XXXXXXXXX, S., M., B. Repercussões sobre a legislação e o exercício dos direitos fundamentais individuais na pandemia por COVID-19. Diálogos Interdisciplinares, [s.l.], v. 9, n. 3. 2020. Disponível em:
xxxxx://xxxxxxxx.xxxxxxxxx.xx/xxxxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em 4 ago 2021. p. 175.
13 XXXXXXX, X.; XXXXXX, F.C. 80 anos da Justiça do Trabalho: Uma História de Proteção dos Direitos Sociais. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, v. 87, n. 2. 2021. Disponível em: file:///C:/Users/dud_f/Downloads/2021_rev_tst_v0087_n0002%20(1).pdf. Acesso em 02 ago 2021. p. 22.
[...] trabalho é um direito que compõe a dignidade da pessoa humana, bem como dele deriva demais direitos constitucionalmente, como a habitação e o lazer; afinal, como custear a habitação e o lazer senão por meio do trabalho? Pode-se dizer, com toda certeza, que o direito ao trabalho é o mais importante entre todos os direitos, equiparando-se, inclusive, aos direitos à vida e à saúde. Relativismos à parte, retirar do ser humano o direito ao trabalho não é menos gravoso que lhe suprimir a própria vida ou sua saúde, na medida em que o trabalho envolve não apenas o auferimento de renda, mas o convívio em sociedade, o sentimento de utilidade, o exercício do sustento do lar, o ato de proporcionar felicidade à família e a si próprio, bem como a própria inserção dentro do contexto democrático capitalista.
Por esse motivo, o direito do trabalho precipuamente encontra viés na proteção ao direito do trabalhador. Busca reger os contratos de trabalho, procurando manter certo equilíbrio nessas relações, de modo que o trabalhador não seja prejudicado e assegure ileso sua dignidade humana. Concluem os autores Xxxxxxx e Araújo14, afirmando que o Direito do Trabalho é encarado na CF/88 como um direito social, e assim sendo, deve ser respeitado como direito fundamental, pois sua natureza operacionaliza o encaixe do cidadão na sociedade, tornando-o assim digno.
Assim como a saúde, a educação, a moradia e entre outros, o trabalho também é enquadrado como direito social, fundamentais para que o ser humano alcance a consagrada dignidade da pessoa humana. Os direitos sociais são classificados por Nunes15 como um subsistema dos direitos fundamentais, que acolhem uma classe economicamente vulnerável e pretendem, através da atribuição de direitos prestacionais, da uniformização das relações econômicas ou pela instituição de garantias, estender a todos benefícios para a vida em comunidade.
Resta claro que a proteção ao trabalho é direito fundamental, consagrado na CF/88, o que não se pode esquecer é que além da proteção ao trabalhador, o direito do trabalho hoje é um elemento de que o Estado dispõe para controle na geração de
14 XXXXXXX, X.; XXXXXX, F.C. 80 anos da Justiça do Trabalho: Uma História de Proteção dos Direitos Sociais. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: v. 87, n. 2. 2021. Disponível em: file:///C:/Users/dud_f/Downloads/2021_rev_tst_v0087_n0002%20(1).pdf. Acesso em 02 ago 2021. p. 23.
15 XXXXX, X., X. apud ATHIAS, A. B. C.; XXXXXXX, J.R. Política Pública Emergencial e o Novo Mecanismo Transdisciplinar. Revista de Direitos Sociais e Políticas Públicas, v. 6, n. 2. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 06 Maio 2021. p. 62.
riqueza, de modo a melhorar sua distribuição. Pensando nisso, Leite16 lembra dos princípios básicos da CF/88 aplicado a este ramo do direito:
É importante destacar que os objetivos da República Federativa do Brasil também encampam princípios fundamentais, como o princípio da solidariedade ou fraternidade (CF, art. 3º, I). A solidariedade entre os indivíduos, ou grupos sociais, é fundamental para a aplicação dos ideários humanistas. Não há justiça verdadeira onde as pessoas vivem em condições extremamente desiguais. Se quisermos um mundo mais justo, podemos optar pela luta em prol dos direitos humanos, a fim de levar a todos a consciência de que o homem não é um ser isolado. A vida ganha sentido quando compartilhamos com o próximo e nos importamos com o seu sucesso e com a sua felicidade.
E quando se depara frente a situações que o homem comum não tem agilidade para controle, como os acontecimentos provocados pela pandemia de COVID-19? A alteração do cenário provocada pela decretação de estado de calamidade pública foi tão repentina que muitas empresas, classificadas como serviços não essenciais, foram conduzidas à paralisação de seu funcionamento por ordens governamentais para que diminuísse a circulação de pessoas e evitar a propagação do vírus. A medida, mesmo que louvável pela sua finalidade precípua, previa desemprego em massa e preocupou as diversas esferas governamentais.
Nessa situação, Xxxxxx e Barbosa17 entendem ser dever do Estado a manutenção dos direitos sociais, e, para isso, deve tomar medidas capazes de manter a dignidade da pessoa humana considerando o princípio do mínimo existencial, pois em suas palavras:
[...]emprego e renda não são relações exclusivamente privada, uma vez que cabe ao Estado garantir, por meio de prestações positivas, a parcela mínima para que cada um viva de forma digna e que atenda às necessidades classe trabalhadora.
Ou seja, são necessárias políticas públicas eficientes preocupadas em garantir o mínimo existencial, principalmente em situações tão excepcionais como a
16 XXXXX, X.X. X. Curso De Direito Do Trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021. E-book (não paginado). Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em: 28 Abr 2021.
17 XXXXXX, A. B. C.; XXXXXXX, J.R. Política Pública Emergencial e o Novo Mecanismo Transdisciplinar. Revista de Direitos Sociais e Políticas Públicas, v. 6, n. 2. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 06 Maio 2021. p. 61 e 64.
provocada pela COVID-19, pois a renda advinda com o trabalho é o núcleo que permite ao cidadão subsistência e atinja uma vida digna. Além disso, necessita o trabalhador ter garantia de continuidade com o emprego, não podendo sofrer com a insegurança do possível fechamento de postos de trabalho.
Frente ao princípio da solidariedade, como bem explicou o autor Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, verifica-se oportuno pautar-se na ideia de proteção a todos que foram atingidos pelos cenários provocados pela COVID-19. Em busca da perfectibilização do equilíbrio, muitos direitos trabalhistas foram flexibilizados para atender as essas demandas, os autores Xxxxx e Santos18, assim descrevem acerca das mudanças provocadas em virtude da pandemia:
Nesse cenário disruptivo, com profundas mudanças nos paradigmas estruturantes das normas trabalhistas, que o Brasil foi atingido pela pandemia mundial da Covid-19. Governo, empregadores, empregados, sindicatos, associações de classe, juristas, todos se depararam com as incertezas e angústias provocadas pela inexistência de costumes, ausência de jurisprudência e falta de previsão doutrinária. Restaram as tentativas de projeções de possíveis cenários a partir do que ocorrera poucos meses antes em países europeus – especialmente Itália, Portugal e Espanha – que enfrentaram uma primeira onda pandêmica antes do Brasil.
Diante desse cenário, busca-se, como em qualquer relação interpessoal, procurar a efetivação de equilíbrio. Somente com a junção de dois critérios, quais sejam, prover o mínimo existencial e garantir o funcionamento das empresas, será possível assegurar que o direito fundamental dos trabalhadores está garantido em situações excepcionais, afinal uma coisa nutre a outra.
Foi com esse intuito que houve a criação de programas, iniciativas emergenciais, como o PEMER, que objetivaram a manutenção do emprego e da renda, visto que muitas empresas, com seus fechamentos impostos por medidas sanitárias, não teriam condições de custear a manutenção de empregados sem a devida prestação laborativa, pois não estavam auferindo lucros, assim, portanto, buscavam evitar a elevação dos índices de desemprego.
18 YUNIS. J.E.D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região, São Paulo: n. 25, p. 92-102, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxxxxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/00000 6789/13987. Acesso em 28 Abr 2021. p.94.
O papel de políticas públicas, como o PEMER, se mostra bastantes adequados em situações análogas. Cunha19 afirma que para a concretização do chamado Estado Social é imprescindível a implementação de políticas públicas, assim conceituadas em suas palavras:
[...]a política pública não é uma norma ou um ato específico, já que engloba esses dois conceitos e se caracteriza como uma atividade tendente à realização de um objetivo que, sobretudo, se consubstancia em uma prática estatal com o intuito de dar efetividade aos direitos fundamentais e assim viabilizar o viés de justiça social que se apresenta no Estado Social, já que pouco vale o mero reconhecimento formal de direitos se não existem os instrumentos que os efetivem.
Dessa forma, as políticas públicas por possuírem viés garantidor, nutrem ligação entre os conceitos de direito fundamental e social, dignidade da pessoa humana e mínimo existencial. Na medida que visam a manutenção de um Estado Democrático de Direito, não apenas garantem a efetivação dos direitos fundamentais direcionados as pessoas, mas inclusive podem garantir a manutenção de meios indiretos que proporcionem conservação desses direitos, como programas de incentivo a empresas.
Não basta ao Estado manter em sua legislação escrita os direitos fundamentais dos serem humanos se não colocados em prática. A forma como está sendo conduzida as relações de trabalho em era pandêmica afetarão significativamente o equilíbrio na relação trabalhista, além de impactarem positiva ou negativamente na manutenção dos contratos de trabalho.
Os direitos fundamentais individuais e sociais podem ser atingidos com qualidade por um Estado que consegue planejar-se para enfrentar situações como as dispostas pela pandemia. A tarefa de combate a um vírus demanda práticas voltadas a conscientização social e preparo por parte do Estado, ou seja, união entre o cidadão e o Estado, sempre sendo preservados os direitos fundamentais, mesmo que de forma mínima.
Cumpre estabelecer conceito do mínimo existencial, que pode ser entendido como a representação de condições mínimas de dignidade humana que uma pessoa
19 XXXXX, X., X. Direito Fundamentais: da constituição às políticas públicas. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília: v. 1, n. 1, 2011. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxx.xxxxxxx.xx/XXXX/xxxxxxx/xxxx/0000. Acesso em 2 ago 2021. p. 70 e 71.
necessita para viver. O objetivo maior do Estado é promover a dignidade da pessoa humana, sendo esse o motivo pelo qual há tributação que visa possibilitar a atuação positiva estatal no implemento das políticas públicas.
As modificações provocadas pela pandemia e as medidas adotadas a partir das limitações impostas, primeiro, devem preservar o mínimo existencial, pois relacionados intimamente as necessidades básicas do ser humano. Mesmo que os contratos trabalhistas guardem natureza privada, acabam por impactar em uma série de direitos sociais, tendo alta relevância jurídica, econômica e pública, conforme bem elucidam Athias e Barbosa20, e ainda:
Destaca-se, assim, a importância de políticas públicas que entendam a interrelação social de direitos fundamentais e apliquem, visando o equilíbrio capital, trabalho e economia, com intuito de assegurar o mínimo para a dignidade da pessoa humana.
Por mais que a tarefa de sobrepesar direitos pareça clara e objetiva e seja papel do Estado promover políticas públicas, a realidade diverge da teoria. Muitos programas adotados por diversos países no mundo foram questionados por doutrinadores, que ponderavam acerca da fundamentabilidade das medidas frente ao princípio máximo de dignidade da pessoa humana.
Fato é que a pandemia alterou paradigmas e causou diversas modificações legislativas, não se nega que algumas dessas modificações limitam o alcance aos direitos fundamentais da forma como foram concebidos, entretanto, situações excepcionalíssimas apontam para medidas diversificadas.
Espera-se que cada ente cumpra seu papel para garantia dos direitos de cada pessoa e, o que se verifica atualmente são Estados buscando priorizar o mínimo existencial em prol da conservação da dignidade da pessoa humana sem destruir de forma fatal a econômica do país, tendo em vista que tal circunstância também afetaria a qualidade de vida dos cidadãos. Isso ocorre porque, afinal, tudo está coligado em uma rede, como num ecossistema o que ocorre negativamente para uma esfera pode afetar todas as outras indiretamente ligadas.
20 XXXXXX, A. B. C.; XXXXXXX, J.R. Política Pública Emergencial e o Novo Mecanismo Transdisciplinar. Revista de Direitos Sociais e Políticas Públicas, v. 6, n. 2. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 06 Maio 2021. p. 64 e 65.
2.2 A pandemia de COVID-19 no Brasil e nos países do continente europeu
A COVID-19 é uma doença infecciosa causada pelo novo Coronavírus, cientificamente denominado de SARS-CoV-2, que foi recentemente descoberta na China. Em 30 de janeiro de 2020, Tedros Adhanom Ghebreyesus21, Diretor-Geral da OMS sobre o Comitê de Emergência do RSI, declarou situação de emergência de saúde pública de preocupação internacional com o surto global do novo coronavírus, já imaginando os danos que países com sistemas de saúde mais fracos poderiam ter. Na época de sua declaração havia apenas 7.834 casos confirmados sendo a maioria na China e 170 mortes em razão do vírus todas também da China.
De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)22, uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional é um dos alertas de nível alto da OMS, previsto no Regulamento Sanitário Internacional, quando declarada requer resposta internacional imediata, sendo instituída em outros momentos históricos:
É a sexta vez na história que uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional é declarada. As outras foram: 25 de abril de 2009: pandemia de H1N1; 5 de maio de 2014: disseminação internacional de poliovírus; 8 agosto de 2014: surto de Ebola na África Ocidental; 1 de fevereiro de 2016: vírus zika e aumento de casos de microcefalia e outras malformações congênitas; 18 maio de 2018: surto de ebola na República Democrática do Congo.
A forma como a doença age varia de pessoa para pessoa, podendo em algumas situações passar despercebida em pessoas assintomáticas ou em outros casos gerar severas complicações, inclusive as sequelas da doença podem levar ao óbito. A OPAS23 em sua folha informativa sobre a COVID-19 contabiliza a forma como a doença atua:
21 XXXXXXXXXXX, X., X. Who Director-General’s’, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, on IHR Emergency Comittee on Novel Coronavirus (2019-nCoV), em 30 de janeiro de 2020. Genebra, World Health Organization (WHO), 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxxx- general/speeches/detail/who-director-general-s-statement-on-ihr-emergency-committee-on-novel- coronavirus-(2019-ncov). Acesso em 4 ago 2021.
22 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Histórico da pandemia de COVID-19.
Brasília: OPAS, [2021?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxx00/xxxxxxxxx-xx-xxxxxxxx- covid-19. Acesso em 7 ago 2021.
23 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Folha Informativa sobre COVID-19.
Brasília: OPAS, [2021?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxx00. Acesso em 4 ago 2021.
A maioria das pessoas (cerca de 80%) se recupera da doença sem precisar de tratamento hospitalar. Uma em cada seis pessoas infectadas por COVID-19 fica gravemente doente e desenvolve dificuldade de respirar. As pessoas idosas e as que têm outras condições de saúde como pressão alta, problemas cardíacos e do pulmão, diabetes ou câncer, têm maior risco de ficarem gravemente doentes. No entanto, qualquer pessoa pode pegar a COVID-19 e ficar gravemente doente.
Contraída a doença, muitas pessoas têm apenas sintomas leves, como dor de garanta, tosse e febre. A doença pode ser mais grave para algumas pessoas, causando pneumonia ou dificuldade para respirar, Xxxxxxx e Meyer24 observam:
Em pacientes sintomáticos, as manifestações clínicas da doença geralmente começam após menos de uma semana, consistindo em febre, tosse, congestão nasal, fadiga e outros sinais de infecções do trato respiratório superior. A infecção pode progredir para doença grave com dispneia e sintomas torácicos graves correspondentes a pneumonia em aproximadamente 75% dos pacientes [...]. (Tradução nossa)
Em casos mais raros, ela pode ser fatal. Idosos, pessoas com doenças cardiovasculares ou diabetes, imunossuprimidos e gestantes são mais vulneráveis a quadros graves.
A principal forma de contágio por essa doença é o contato com outra pessoa infectada, que transmite o vírus através de tosse, espirros, gotículas de saliva ou coriza. Em relação à forma de contágio a OPAS25 adverte:
As evidências disponíveis atualmente apontam que o vírus causador da COVID-19 pode se espalhar por meio do contato direto, indireto (através de superfícies ou objetos contaminados) ou próximo (na faixa de um metro) com pessoas infectadas através de secreções como saliva e secreções respiratórias ou de suas gotículas respiratórias, que são expelidas quando uma pessoa tosse, espirra, fala ou canta. As pessoas que estão em contato próximo (a menos de 1 metro) com uma pessoa infectada podem pegar a COVID-19 quando essas gotículas infecciosas entrarem na sua boca, nariz ou olhos.
24 “In symptomatic patients, the clinical manifestations of the disease usually start after less than a week, consisting of fever, cough, nasal congestion, fatigue and other signs of upper espiratory tract infections. The infection can progress to severe disease with dyspnoea and severe chest symptoms corresponding to pneumonia in approximately 75% of patients” VELAVAN, T. P.; XXXXX, C. G. The COVID‐19 epidemic. Tropical medicine & international health, [s.l.], v. 25, n. 3, p. 278, 2020.
Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xxx.xxx/xxx/xxxxxxxx/XXX0000000/xxx/XXX-00-000.xxx. Acesso em 5 maio 2021. p. 278.
25 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Folha Informativa sobre COVID-19.
Brasília: OPAS, [2021?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxx00. Acesso em 4 ago 2021.
É inegável que a pandemia provocada pela COVID-19 alterou paradigmas, forçando a população a lançar-se em novas rotinas e adaptar-se a situações imprevistas, impondo o distanciamento, a higienização constante e a paralisação de algumas atividades como métodos para salvar vidas. Acerca da dimensão da COVID-19, explicam Xxxxxxx e Meyer26:
[...] O Coronavírus foi descrito pela primeira vez em 1966, por Xxxxxx e Xxxxx, que coletaram o vírus de pacientes com resfriados comum. [...] Existem quatro subfamílias, nomeadamente o vírus alfa, beta, gama e deltacoronavírus. Enquanto os coronavírus alfa e beta aparentemente se originam de mamíferos, em particular de morcegos, os vírus gama e delta se originam de porcos e pássaros. [...] Entre os sete subtipos de coronavírus que podem infectar humanos, os beta-coronavírus podem causar doenças graves e fatalidades, enquanto os alfa-coronavírus causam infecções assintomáticas ou levemente sintomáticas. [...] Investigações recentes de 425 casos confirmados demonstram que a epidemia atual pode dobrar o número de afetados a cada sete dias e que cada paciente propaga a infecção para outros 2,2 indivíduos em média. (Tradução nossa).
Perceptível, portanto, que o vírus teria disseminação célere e com alto risco para a saúde, principalmente para pessoas mais vulneráveis como idosos, o que efetivamente ocorreu. Primeiramente, causou pânico na população, sentimento que teve justificativa, pois a COVID-19 foi capaz de ceifar a vida de milhões de pessoas. Até 5 de maio de 2021, o site da OMS27 registrou mundialmente 3.221.052 milhões de mortes, sendo 408.622 mil do Brasil, e 1.092.527 milhão dos países do continente europeu (primeiros a serem afetados devido ao grande índice de turismo da região).
26 “Coronaviruses were first described in 1966 by Xxxxxx and Xxxxx, who cultivated the viroses from patients with common colds. [...] Four subfamilies, namely alpha-, beta-, gamma- and deltacoronaviruses exist. While alpha- and beta-coronaviruses apparently originate from mammals, in particular from bats, gamma- and delta-viruses originate from pigs and birds. [...] Among the seven subtypes of coronaviruses that can infect humans, the beta-coronaviruses may cause severe disease and fatalities, whereas alpha-coronaviruses cause asymptomatic or mildly symptomatic infections. [...] Recent investigations of 425 confirmed cases demonstrate that the current epidemic may double in the number of affected individuals every seven days and that each patient spreads infection to 2.2 other individuals on average.” XXXXXXX, T. P.; XXXXX, C. G. The COVID‐19 epidemic. Tropical medicine & international health, [s.l.], v. 25, n. 3, p. 278, 2020.
Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xxx.xxx/xxx/xxxxxxxx/XXX0000000/xxx/XXX-00-000.xxx. Acesso em 5 maio 2021. p. 278 e 279.
27 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard. [s.l.]:
OMS, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxx.xxx/ acesso em 05 maio 2021.
Em um recente estudo acerca da gravidade da mortalidade por COVID-19 no Brasil, ressalta Xxxxxxx et al28:
A primeira morte, segundo o Ministério da Saúde, ocorreu em São Paulo no dia 17 de março, 20 dias após o primeiro caso confirmado no Brasil. A pandemia evoluiu e alcançou o pico da primeira onda epidemiológica da doença em 29 de julho de 2020, registrando o total de 1590 óbitos em um único dia. Seja pelo recrudescimento da pandemia ou o advento de uma mutação do SARS-CoV24, uma segunda onda do número de casos e óbitos assolou o país, iniciando no mês de novembro de 2020 e mantendo sua tendência de crescimento até o começo de março com o registro de 2286 óbitos em 24 horas. É notório que ocorreram o agravamento simultâneo do aumento do número de casos e óbitos com a sobrecarga de hospitais.
Com o passar dos meses os casos confirmados estão aumentando, até 4 de agosto de 2021 o site da OMS29 somou 199.466.211 milhões de casos confirmados de COVID-19 mundialmente, sendo que desse número 19.953.501 milhões foram registrados somente no Brasil, enquanto a Europa registra 60.566.865 milhões de casos confirmados da doença. O aumento do contágio era esperado, pois conforme verificado há grande facilidade de contrair o vírus, isso porque diversas pessoas podem estar compartilhando a doença sem nem mesmo possuir sintomas dela.
Estas estatísticas verificadas dos dados de mortalidade e contágio do vírus no país e no mundo servem de ferramenta para tomada de decisões importantes para condução da população, de acordo com Xxxxxxxx et al.30, a decretação de estado de calamidade no Brasil, com o Decreto Legislativo n.º 6, de 20 de março de 202031, por diversas vezes originou a ideia de confinamento geral, situação aplicada em demais
28 XXXXXXX, X.; et al. Mortalidade por COVID-19 no Brasil: uma análise do Registro Civil de óbitos de janeiro de 2020 a fevereiro de 2021. [s.l.], 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxx/00000/00000/0/XXXXXXXX_XxxxxxxxxxxXXXXX-00Xxxxxx.xxx acesso em 5 Maio 2021. p. 5.
29 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard. [s.l]:
OMS, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxx.xxx/ acesso em 4 ago 2021.
30 XXXXXXXX, X. X. X. et al. Excesso de mortes durante a pandemia de COVID-19: subnotificação e desigualdade regionais no Brasil. Cadernos de Saúde Pública, [s.l.], v 37. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxx/xxx/0000.x00x0/x00000000/xx. Acesso em 5 Maio 2021. p. 2.
31 BRASIL. Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Reconhece a ocorrência de calamidade pública em razão da pandemia de COVID-19. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxxx/XXX0-0000.xxx. Acesso em 06 Maio 2021.
países, mas que não agradou os cidadãos brasileiros que temiam pela quebra da economia nacional, asseveram Freitas, Xxxxxxx e Rodrigues32:
Em decorrência da COVID-19, diversos Estados e Municípios do país estipularam, através de Decretos, uma série de restrições principalmente em relação à abertura de algumas atividades comerciais, como bares e restaurantes, mas também restrições quanto à livre circulação dos cidadãos em diversas áreas do território nacional. [...] alguns estados adotaram a aplicação de multas a quem descumprir as medidas adotadas para a prevenção da COVID-19, entre elas, o isolamento social.
Cumpre ressaltar que no Brasil há um sistema constitucional de crises previsto nos artigos 136 a 141 da CF/88 que permitem a adoção de regimes jurídicos excepcionais, quais sejam o estado de defesa e o estado de sítio, tais sistemas visam assegurar a democracia em períodos emergenciais. Xxxxxx e Soares33 explicam acerca dos regimes:
No que se refere ao estado de defesa, com base no art. 136, o Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. [...] No tocante ao estado de sítio, com base no art. 137, o Presidente República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de: comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
Tais institutos permitem a adoção de medidas temporárias objetivando a resolução da situação excepcional. Em tese o estado de sítio permite a suspensão do poder legislativo e judiciário em razão de estado de guerra ou comoção grave de repercussão nacional, enquanto o estado de defesa se encaixa quando da
32 XXXXXXX, X., X.; XXXXXXX, E., X.; XXXXXXXXX, S., M., B. Repercussões sobre a legislação e o exercício dos direitos fundamentais individuais na pandemia por COVID-19. Diálogos Interdisciplinares, [s.l.], v. 9, n. 3. 2020. Disponível em:
xxxxx://xxxxxxxx.xxxxxxxxx.xx/xxxxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em 4 ago 2021. p. 176 e
177.
33 XXXXXX, X., X., X., X.; XXXXXX, X., X., X. Constituição e Restrição a Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia de COVID-19: um Breve Estudo do lockdown no Estado do Maranhão. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 4 ago 2021. p. 101 e 102.
ocorrência de ameaça e instabilidade institucional ou uma vasta calamidade. Frente a isso, Xxxxxx e Soares34 enquadram a pandemia de COVID-19 como situação de calamidade pública, “que legitima a instauração de mecanismos emergenciais para contenção da contaminação pelo novo vírus”.
Considerando não haver tratamento para a cura do vírus, pois morfologicamente não existem medicamentos que combatam vírus, assim como quando ocorreu a infecção de influenza, existem algumas medidas que podem ser adotadas de modo a evitar o contágio. Essas medidas, todas preventivas, consistem em atos de higiene pessoal, uso de máscaras e principalmente distanciamento de pessoas, evitando a organização de festas, cultos, restringindo número de pessoas para atendimento em mercados, lojas, farmácias e outros estabelecimentos, além de isolamento das pessoas que possuem resultado positivo para o vírus. Sobretudo, as medidas preventivas buscam incentivar a população acerca da necessidade de se evitar aglomerações, a OPAS35 assim recomenda:
Para evitar o contato com essas gotículas, é importante manter-se a pelo menos 1 metro de distância das outras pessoas, lavar as mãos com frequência e cobrir a boca com um lenço de papel ou cotovelo dobrado ao espirrar ou tossir. Quando o distanciamento físico (a um metro ou mais de distância) não é possível, o uso de uma máscara de tecido também é uma medida importante para proteger os outros.
Hoje a medida mais eficaz para combate a grandes pandemias provocadas por vírus são as vacinas, segundo a OMS36. A gravidade da pandemia de COVID-19 repercutiu em uma conjuntura de esforços para, em um período curto, desenvolver vacinas capazes de desenfrear a curva de contágio.
Países que conseguiram realizar a vacinação em massa para toda população ou adotaram medidas extremamente restritivas como o lockdown quando do diagnóstico dos primeiros casos, hoje já estão permitindo o retorno de atividades
34 XXXXXX, X., X., X., X.; XXXXXX, X., X., X. Constituição e Restrição a Direitos Fundamentais em Tempos de Pandemia de COVID-19: um Breve Estudo do lockdown no Estado do Maranhão. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 4 ago 2021. p. 103.
35 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Folha Informativa sobre COVID-19.
Brasília: OPAS, [2021?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxx00. Acesso em 4 ago 2021.
36 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Como funcionam as vacinas. [s.l]: OMS, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xx/xxxx-xxxx/xxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxx/xxx-xx-xxxxxxxx-xxxx.
Acesso em 4 ago 2021.
com aglomerações sociais, inclusive festas. A população de países como os Estado Unidos já não fazem mais uso de máscaras ou possuem medidas tão restritivas quanto no início da pandemia, isso porque tiveram uma célere distribuição de vacinas, conforme verifica Senhoras37. Também adverte o mesmo autor que a vacinação ocorre de acordo com as condições econômicas do país:
Os resultados da corrida pela vacina indicam uma clara assimetria na vacinação por país no mundo, uma vez que a consolidação de uma lógica mercadológica pouco fundamentada na cooperação e claramente assentada na competição gerou uma curva de Knutz na qual a vacinação é diretamente proporcional à renda. Por um lado, nos países com maior renda per capita há um percentual maior de população vacinada. Por outro lado, nos países com menor renda, a vacinação é inexistente ou mesmo baixa.
A OMS38 indica que até 4 de agosto de 2021 foram administradas 3.946.458.313 bilhões de doses de vacinas para controle da COVID-19, sendo que dessas 133.729.193 são brasileiras. Há discrepância também quanto a data de início de vacinação dos países, sendo que no Brasil, a primeira vacina foi aplicada em 17 de janeiro de 2021, enquanto os países da Europa iniciaram a vacinação em dezembro de 2020.
Mesmo assim, antes da chegada das vacinas, diversas empresas e comércios, classificadas como serviços não essenciais, foram direcionadas ao fechamento, para evitar a circulação de pessoas na tentativa de diminuir o contágio do vírus, visto que a saúde estava em estado de emergência e a doença não tem cura medicamentosa. A situação atingiu diversos ramos da sociedade, o modo de vida das pessoas e utilização de diversos serviços, nesse sentido Cruz et al.39:
A COVID-19 avança em todos os continentes, em diferentes culturas e nacionalidades. Impõe necessidades de contenção e isolamento de comunidades e pessoas para minimizar o crescimento exponencial do número de pessoas infectadas. Assistimos aos esforços de governos, profissionais de diferentes especialidades, empresas e um conjunto de pessoas genuinamente interessadas em contribuir na
37 XXXXXXXX, X., X. O campo de poder das vacinas na pandemia de COVID-19. Boletim de Conjuntura (BOCA), v. 6, n. 18. 2021. Disponível em:
xxxx://xxxxxxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000 Acesso em 4 ago 2021. p. 113.
38 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard. [s.l]:
OMS, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxx.xxx/ acesso em 4 ago 2021.
39 XXXX, X.X. xx al. COVID-19: emergência e impactos na saúde e no trabalho. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, Brasília, DF, v. 20, n. 2. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxx.xxxxxxx.xxx/xxx/xxxx/x00x0/x00x0x00.xxx. Acesso em 05 Maio 2021. p.1.
assistência, segurança e provimento de recursos necessários à redução da velocidade de difusão da doença e na mitigação de seus resultados na saúde das pessoas. [...] Vivemos uma situação de crise e emergência, com reflexos sociais, econômicos e na saúde física e mental das populações, especialmente as mais vulneráveis. As políticas e ações governamentais dedicam-se às possibilidades de contenção e mitigação dos efeitos biológicos e letais da doença.
Em 6 de fevereiro de 2020 o Brasil editou a Lei nº 13.97940 para dispor sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus. Dentre suas disposições, há forte incentivo para o isolamento social, devendo os infectados permanecer em quarentena, além de estimular que atividades com educação ou trabalho fossem desenvolvidas de forma remota dentro das possibilidades.
Com a chegada de vacinas confiáveis nos mercados o número de mortes se estabeleceu, sendo que até dia 4 de agosto de 2021 foram registradas um total de
4.244.541 milhões de mortes mundialmente conforme o site da OMS41. No Brasil, onde a vacinação ainda está em processo, entre maio de 2021 a agosto de 2021 foram registradas 148.601 mil novas mortes enquanto no continente europeu foram registradas 131.870 mil novas mortes.
Considerando que muitos países da Europa possuem um índice de população vacinada mais elevada que o Brasil, percebe-se a eficácia desse mecanismo preventivo e abre esperança para que logo se possa retomar a rotina, não da forma como antes do surgimento do vírus, mas com certeza com mais segurança para o convívio social, assim como está acontecendo em alguns países como os Estados Unidos.
A situação mais parecida com a pandemia de COVID-19 já vivenciada pela humanidade foi a pandemia de influenza em meados de 2009, inclusive o Plano de Influenza Pandêmica elaborado pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos serviu inicialmente de apoio para a criação de medidas para controle da atual pandemia, já que ambos os vírus são respiratórios e apresentam
40 BRASIL. Lei nº 13.979, 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/x00000.xxx. Acesso em 4 ago 2021.
41 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard. [s.l]:
OMS, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxx.xxx/ acesso em 4 ago 2021.
quadros clínicos semelhantes, de acordo com Xxxxxxx, Napimonga e Donalisio42. Claro que a contaminação por influenza não tomou as proporções da contaminação por COVID-19, abalando de forma pouco significativa as atividades desenvolvidas nos países.
A mais grave pandemia provocada pelo vírus influenza foi em 1918 a 1920 com a Gripe Espanhola, mas, mesmo assim, as mortes provocadas por COVID-19 dobraram as ocorridas nesse período, inclusive Xxxxx e Merchan-Hamann43, comparam as pandemias de influenza e evidencia que a provocada em 2009 foi de menor impacto:
[...] constata-se que a mais grave pandemia de influenza, a Gripe Espanhola, marcou na história um número de óbitos estimado entre 20 a 50 milhões de pessoas no mundo todo – mais que o dobro de mortes em quatro anos da Primeira Guerra Mundial, e um terço das decorrentes da peste em seis séculos33. A estimativa global de óbitos para a pandemia de 2009 foi menor: entre 151.700 e 575.400 mortes.
Pandemias e epidemias causadas por doenças infectocontagiosas tornam-se possíveis por alguns fatores como crescimento urbano acelerado, crises sanitárias, desigualdade social e pobreza, sendo que seus efeitos podem ser intensificados frente a problemas da sociedade, de acordo com Xxxxxxx e Lopes44.
Países do continente europeu, como Itália, França, Espanha, Portugal, geralmente são os primeiros a manifestar casos com a doença, devido ao alto índice de turismo da região, fazendo com que sejam grandes centros de concentração de pessoas de diversos países, e, por vezes, quando essas pessoas voltam de suas viagens, acabam por carregar os vírus ou bactérias para seus países de origem. No Brasil o primeiro caso identificado foi exatamente nessas condições um turista acabara de voltar de viagem da Europa.
42 XXXXXXX, X., R., X., XXXXXXXX, M., XXXXXXXXX, M., R. Análise da gravidade da pandemia de Covid-19. Epidemiologia e serviços de saúde, Brasília/DF, v. 29. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xx/x/xxxx/x/XxxxxXxXx00XxX0Xxxx00xx/?xxxxxxxxxx&xxxxxxx. Acesso em 4 ago 2021.
43 XXXXX, X., M., C., D.; XXXXXXX-XXXXXX, X. Pandemias de influenza e a estrutura sanitária brasileira: breve histórico e caracterização dos cenários. Revista Pan-Amazônica de Saúde, Pará: v.7, n.1, 2016. Disponível em: xxxx://xxxxxxx.xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxx.xxx/xxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em 5 ago 2021. p.14.
44 XXXXXXX, X., X., X.; XXXXX, X., X., X. Brasil República: uma história de surtos, pandemia e epidemias. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista: v. 5, n. 14. 2021. Disponível em: xxxx://xxxxxxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em 5 ago 2021. p. 71.
O problema das pandemias são quando afetam países de baixa renda, pois geralmente possuem sistema de saúde mais fracos e tendem a sofrer de forma mais intensa os efeitos da contaminação de doenças, inclusive pendem a manter a doença por anos enquanto outros países já a eximiram, sendo sempre um risco de seu retorno de forma mundial. Isso se justifica, pois países de baixa renda muitas vezes não possuem controle sanitário da população, locais que não possuem saneamento básico e com desigualdade social acentuada, demonstrando a precariedade do sistema. Xxxxxxx e Meyer45 sustentam que doenças como a COVID-19 necessitam de intenso apoio as estruturas de saúde e ressaltam acerca das consequências da manifestação coletiva de uma doença em países com fraco sistema de saúde:
Dados os frágeis sistemas de saúde na maioria dos países da África Subsaariana, surtos de doenças novas e reemergentes, como a atual epidemia de COVID-19, podem paralisar os sistemas de saúde às custas dos requisitos de saúde primária. O impacto da epidemia de Ebola na economia e nas estruturas de saúde ainda é sentido cinco anos depois nos países afetados. Respostas eficazes a surtos e preparação durante emergências de tal magnitude são um desafio na África e em outros países de renda média baixa. Tais situações só podem ser parcialmente mitigadas com o apoio às estruturas de saúde regionais e subsaarianas existentes. (Tradução nossa)
Pode-se dizer que um dos marcos mais importantes no Brasil em relação às doenças, e nesse sentido concordam Xxxxxxx e Lopes46, ocorreu no século XX quando o país era assolado por recorrentes epidemias, momento que o então presidente Xxxxxxxxx Xxxxx assumiu uma forte campanha de imunização da população através de vacinas, o período também ficou reconhecido como “A Revolta das Vacinas”. Desde muito cedo a vacinação é a melhor forma de prevenir o
45 “Given the fragile health systems in most sub-Saharan African countries, new and re-emerging disease outbreaks such as the current COVID-19 epidemic can potentially paralyse health systems at the expense of primary healthcare requirements. The impact of the Ebola epidemic on the economy and healthcare structures is still felt five years later in those countries which were affected. Effective outbreak responses and preparedness during emergencies of such magnitude are challenging across African and other lower-middle-income countries. Such situations can partly only be mitigated by supporting existing regional and sub-Saharan African health structures.” VELAVAN,
T. P.; XXXXX, C. G. The COVID‐19 epidemic. Tropical medicine & international health, [s.l.] x. 00, x. 0, x. 000, 0000. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xxx.xxx/xxx/xxxxxxxx/XXX0000000/xxx/XXX-00-000.xxx. Acesso em 5 maio 2021. p. 279.
46 XXXXXXX, X., D., X.; XXXXX, X., X., X. Brasil República: uma história de surtos, pandemia e epidemias. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista: v. 5, n. 14. 2021. Disponível em: xxxx://xxxxxxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em 5 ago 2021. p. 73.
contágio de doenças originadas por vírus, na pandemia de COVID-19 não está sendo diferente, visto que o número de contaminados somente começou a ceder após o início da aplicação das vacinas.
Ocorre que, como toda doença nova, um mecanismo farmacêutico efetivo necessitou ser elaborado e testado, enquanto isso não ocorria os governos preocuparam-se com a coletividade. No âmbito do trabalho e econômico, o governo federal buscou incentivar empresas para que não ocorresse o encerramento de suas atividades e remunerar trabalhadores que estavam impossibilitados de laborar devido às regras de contingência, além de disponibilizar renda (de valor mínimo) para auxiliar trabalhadores autônomos e em situação de vulnerabilidade.
Boa parte do agravamento da contaminação ocorrida no Brasil ocorreu pela falta e conscientização da população que descumpria as normas reiteradamente, deixando de lado o senso de comunidade. Isso porque os Estados buscaram a adoção de medidas como a quarentena, a exemplo o Estado de São Paulo que instaurou a medida através do Decreto nº 64.88147 em 22 de março de 2020, tendo sua eficácia estendida até hoje. O Estado do Rio Grande do Sul, por meio do Decreto nº 55.11548, de 12 de março de 2020 também procedeu à suspensão imediata de algumas atividades que envolviam aglomerações, e, posteriormente, publicou vários decretos para recomendações de combate a pandemia.
Outros países também tomaram frente na adoção de mecanismos, sendo que surtiram efeitos positivos na contenção da pandemia, como, por exemplo, o lockdown, restrição de movimento, distanciamento social, medidas socioeconômicas e de governança e medidas de saúde pública. Xxxxxxxxx, Xxxxx e Silveira49, analisando dados compilados pela Assessment Capacities Project (ACAPS)
47 BRASIL. Decreto nº 64.881, de 22 de março de 2020. Decreta quarentena no Estado de São Paulo, no contexto da pandemia do COVID-19 (Novo Coronavirus), e dá providências complementares. São Paulo, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xx.xx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxxxx/xxxxxxx/0000/xxxxxxx-00000-00.00.0000.xxxx. Acesso em 5 ago 2021.
48 BRASIL. Decreto nº 55.115, de 12 de março de 2020. Dispõe sobre medidas temporárias de prevenção ao contágio pelo COVID-19 (novo coronavírus) no âmbito do Estado. Xxxxx Xxxxxx, 0000. Disponível vem: xxxxx://xxxxx-xxxxx.xx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxxxxx/000000/00000000-00-000-00.xxx.
Acesso em 5 ago 2021. p. 24 e 25.
49 XXXXXXXXX, X., M.; XXXXXX, X., P., D.; XXXXXXXX, M., F., D. Medidas de contenção de tipo lockdown para prevenção e controle da COVID-19: estudo ecológico descritivo, com dados da África do Sul, Alemanha, Brasil, Espanha, Estados Unidos, Itália e Nova Zelândia, de fevereiro a agosto de 2020. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, DF: v. 30, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xx/x/xxxx/x/xxXXXxx0X0XXXXXXXxX000X/?xxxxxxx#. Acesso em 5 ago 2021. p. 4.
identificaram as principais medidas adotadas por países do continente europeu, em relação à Alemanha relatam:
A Alemanha registrou o primeiro caso em 28 de janeiro. As medidas de distanciamento social foram recomendadas a partir do dia 10 de março, quando tinham sido registrados 1.139 casos. Em 22 de março (taxa de incidência de 37,5/1 milhão hab.), foi aplicado lockdown parcial no país inteiro, com previsão de duração até 15 de abril. [...] Apenas em 30 de maio, quando o país registrou uma taxa de incidência de 8,8/1 milhão hab., passaram a ser permitidas cerimônias religiosas, funcionamento de academias e prática de esportes ao ar livre. Dia 24 de junho (taxa de incidência de 7,0/1 milhão hab.), foi decretado lockdown parcial em dois distritos da Renânia do Norte-Vestfália, após um surto de COVID-19, com duração até 6 de julho (taxa de incidência de 2,6/1 milhão hab.). Após essa data, a maior taxa de incidência foi registrada no dia 21 de agosto (27,8/1 milhão hab.), sem novas medidas reportadas.
Já na Espanha os casos começaram a aparecer em fevereiro de 2020, os autores Houvèssou, Xxxxx e Silveira50 retratam que quando o país registrou 5.958 casos confirmados foi implementado o lockdown em algumas localidades, sendo que no dia 16 de março de 2020 a medida acabou por ser imposta em todo o território, sendo conduzido, nas palavras dos autores, da seguinte forma “o lockdown parcial foi implementado em todo o país, permitindo a um cidadão espanhol sair de sua residência desde que cumprisse as medidas preventivas básicas: higienização das mãos e uso de máscaras”, após, em 28 de março de 2020 houve a implementação do lockdown total.
A Itália, por sua vez, registrou os primeiros casos em 31 de janeiro, nas palavras de Xxxxxxxxx, Xxxxx e Silveira51:
Medidas de distanciamento social e políticas de Saúde Pública foram recomendadas em 21 de fevereiro, quando o país registrava quatro casos. Ainda assim, observou-se aumento da incidência diária. Em 8
50 XXXXXXXXX, X., M.; XXXXXX, T., P., D.; XXXXXXXX, M., F., D. Medidas de contenção de tipo lockdown para prevenção e controle da COVID-19: estudo ecológico descritivo, com dados da África do Sul, Alemanha, Brasil, Espanha, Estados Unidos, Itália e Nova Zelândia, de fevereiro a agosto de 2020. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, DF: v. 30, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xx/x/xxxx/x/xxXXXxx0X0XXXXXXXxX000X/?xxxxxxx#. Acesso em 5 ago 2021. p. 6.
51 XXXXXXXXX, X., M.; XXXXXX, X., P., D.; XXXXXXXX, M., F., D. Medidas de contenção de tipo lockdown para prevenção e controle da COVID-19: estudo ecológico descritivo, com dados da África do Sul, Alemanha, Brasil, Espanha, Estados Unidos, Itália e Nova Zelândia, de fevereiro a agosto de 2020. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, DF: v. 30, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xx/x/xxxx/x/xxXXXxx0X0XXXXXXXxX000X/?xxxxxxx#. Acesso em 5 ago 2021. p. 7.
de março, quando foi implementado lockdown parcial, o país registrava 20,6 casos por milhão de habitantes. No mesmo dia, as regiões da Lombardia e do Vêneto foram bloqueadas. A incidência continuou a aumentar, e em 20 de março, à medida de confinamento parcial foram adicionadas restrições, com os habitantes obrigados a justificar qualquer saída de suas residências. Em 23 de março, foi implementado o confinamento total (incidência diária de 92,0/1 milhão hab.), encerrando totalmente a atividade econômica – exceto os serviços essenciais. [...] Uma vez controlada a propagação do vírus, no dia 4 de maio, o país declarou o relaxamento do confinamento total.
Como se pode perceber, os efeitos da COVID-19 impactaram o planeta de forma tal a modificar padrões, se antes incentivava-se a população a manter vínculos sociais de forma presencial e desligar os eletrônicos, durante os momentos mais críticos desse marco histórico incentiva-se o contato virtual. Ocorre que muitos locais de trabalho não puderam migrar sua prestação de serviços para a rede como indústrias metalúrgicas, creches, comércios, bares e entre outros, gradualmente foram regressando com as atividades presenciais tomando os cuidados sanitários vigentes, mas muitos locais não suportaram cumprir com o isolamento ou até mesmo com as restrições, acabando por fecharem as portas.
2.3 Conceito de suspensão do contrato de trabalho
No direito do trabalho vigora o princípio da continuidade da prestação laborativa, tal princípio tem como objetivo a manutenção, sempre que possível, do vínculo empregatício, assim em relação ao tempo do contrato de trabalho, quando não especificado pelas partes, sempre será considerado por tempo indeterminado. Tendo isso em mente, há situações em que o contrato de trabalho precisa ser sustado pelas partes, mas frente ao princípio da continuidade da prestação laborativa, busca-se manter o vínculo contratual.
Essas situações são denominadas de suspensão do contrato de trabalho e interrupção da prestação laborativa. Leite52 delimita de forma clara:
[...] um dos princípios peculiares do direito do trabalho é o da continuidade da relação de emprego. É exatamente por isso que somente em situações especiais poderá haver paralisações
52 XXXXX, X.X. X. Curso De Direito Do Trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021. E-book (não paginado). Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em: 28 Abr 2021.
provisórias, totais ou parciais, na execução do contrato de trabalho, ou melhor, na prestação do serviço.
Surge a necessidade de esclarecer esses conceitos que neste trabalho ainda serão abordados. Isso porque, como bem apontado por Xxxx et al53, dadas as medidas sanitárias impostas, muitos trabalhadores tiveram seus contratos de trabalhos suspensos por medidas instituídas por políticas públicas, como o PEMER.
O PEMER pode ser classificado como uma das medidas socioeconômicas e governamental adotada com objetivo de reduzir os impactos econômicos da pandemia de COVID-19, prevendo a manutenção de empregos e rendas. O programa será objeto de estudo detalhadamente em capítulo próprio, mas em suma permitiu que muitos trabalhadores continuassem a perceber renda enquanto a empresa se mantinha fechada ou atendendo a algumas restrições impostas em prol da contenção da pandemia sem que essa tivesse a responsabilidade de arcar com os salários.
Martinez54 pondera acerca do tema recente:
Pressionado por uma crise econômica sem precedentes, fruto da pandemia do Coronavírus, o governo brasileiro valeu-se da Medida Provisória n. 936, de 1º de abril de 2020, posteriormente convertida na Lei n. 14.020, de 6 de julho de 2020, para instituir o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda aplicável durante o estado de calamidade pública com os objetivos expressos de preservar o emprego e a renda; garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; e reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública.
Para tanto o programa se utilizou de dois métodos, quais sejam, a redução da carga horária ou a suspensão temporária do contrato de trabalho, momento em que os trabalhadores receberam parte ou todo seu salário através do BEm proporcionalmente ao período suspenso ou a carga horária reduzida.
Assim, torna-se pertinente o esclarecimento de dois conceitos do direito do trabalho, cujos quais são chamados de suspensão do contrato de trabalho e interrupção da prestação laborativa. Esses dois institutos marcam uma pausa na
53 XXXX, X.X. xx al. COVID-19: emergência e impactos na saúde e no trabalho. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, Brasília, DF, v. 20, n. 2. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxx.xxxxxxx.xxx/xxx/xxxx/x00x0/x00x0x00.xxx. Acesso em 05 Maio 2021. p.1.
54 XXXXXXXX, X. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Saraiva Educação, 12. ed. 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em 5 ago 2021. Livro Eletrônico não paginado.
prestação laborativa, entretanto possuem características fundamentais que os diferenciam, sendo de suma importância sua compreensão, mesmo não estando conceituados na legislação coube a doutrina a sua definição.
Cabe salientar primeiramente que a suspensão ou a interrupção são institutos que não tratam literalmente do contrato de trabalho em si, mas sim atingem os efeitos desse instrumento.
De acordo com Delgado55 na suspensão do contrato de trabalho a execução do objeto do contrato fica suspensa, ou seja, o empregado susta suas atividades e o empregador suas obrigações durante certo período, assim refere:
A suspensão contratual é a sustação temporária dos principais efeitos do contrato de trabalho no tocante às partes, em virtude de um fato juridicamente relevante, sem ruptura, contudo, do vínculo contratual formado. É a sustação ampliada e recíproca de efeitos contratuais, preservado, porém, o vínculo entre as partes. [...] durante a suspensão: não se presta serviço, não se paga salário, não se computa tempo de serviço, não se produzem recolhimentos vinculados ao contrato, etc. No período suspensivo, empregado e empregador têm, desse modo, a ampla maioria de suas respectivas prestações contratuais sem eficácia.
Enquanto o contrato de trabalho está suspenso, não produz os efeitos inerentes ao tipo, assim o empregador fica desobrigado ao pagamento das verbas salariais e recolhimento de FGTS, enquanto o empregado não presta a atividade laborativa e não tem seu tempo de serviço contado para qualquer fim. Na mesma linha conceitua Bernardes56, indicando que a suspensão do contrato de trabalho é a cessação temporária dos efeitos primordiais da relação, em suas palavras explica: “O vínculo empregatício de mantém, porém empregador e empregado não se submetem às principais obrigações contratuais (pagamento de salário e prestação de serviço), enquanto durar a suspensão.”
Para fixar bem a matéria ainda podemos citar Leite57, que conceitua a suspensão do contrato de trabalhando enfatizando que o período suspenso não contabiliza para os efeitos legais, em suas palavras:
55 XXXXXXX, X. X. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019. P.1262 e 1266.
56 XXXXXXXXX, X., X. Direito do Trabalho. [s.l.]: Editora Jus Podivm, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxx/x000x00x000x0x0x00000000x0000xxx.xxx. Acesso em 5 ago 2021. p. 221.
57 XXXXX, X.X. X. Curso De Direito Do Trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021. E-book (não paginado). Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em: 28 Abr 2021.
Dá-se a suspensão (ou suspensão total) quando inexistir obrigatoriedade da prestação de serviço e pagamento de salário, sendo certo que o tempo de serviço, em regra, não é computado para os efeitos legais. Na suspensão, portanto, empregado e empregador ficam dispensados, transitoriamente, do cumprimento das suas obrigações ínsitas ao contrato de trabalho.
Nítido, portanto, que a doutrina é unanime no conceito desse instituto. Ainda vale mencionar que as hipóteses de suspensão do contrato de trabalho, entretanto, são taxativas, todas devem estar previstas em lei. Algumas hipóteses de suspensão do contrato de trabalho ocorrem em situações de greve, licença maternidade, para realizações de cursos de aperfeiçoamento, entre outros.
Diferentemente da suspensão, a interrupção refere-se a uma pausa no trabalho em que apenas o empregado susta sua obrigação de trabalhar, mas continua percebendo as verbas salariais e tendo seu período interrompido computado como tempo de serviço. Assim explica Delgado58:
[...] a interrupção contratual é a sustação temporária da principal obrigação do empregado no contrato de trabalho (prestação de trabalho e disponibilidade perante o empregador), em virtude de um fato juridicamente relevante, mantidas em vigor todas as demais cláusulas contratuais. [...] Insista-se que a sustação provisória atinge apenas a cláusula de prestação obreira de serviços [...] não se presta trabalho (nem se fica à disposição), mas se computa o tempo de serviço e paga-se o salário.
Exemplos de interrupção do contrato de trabalho são vislumbrados nas hipóteses de ausências legais, descanso semanal remunerado, aviso prévio indenizado, férias, intervalos intrajornadas, entre outros. Nas palavras de Leite59, a interrupção do contrato de trabalho ocorre da seguinte forma:
Na interrupção, também chamada de suspensão parcial, o empregado fica desobrigado de prestar serviço, mas continua a receber salários, sendo que o tempo de serviço é sempre computado para todos os efeitos contratuais e legais. Durante a interrupção, o empregado terá direito a todas vantagens de ordem pessoal, como adicional por tempo de serviço, licença-prêmio, adicionais que vinham sendo pagos etc.
58 XXXXXXX, X. X. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019. p. 1262 e 1.267.
59 XXXXX, X.X. X. Curso De Direito Do Trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021. E-book (não paginado). Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em: 28 Abr 2021.
Didaticamente Bernardes60 disciplina que ocorre a interrupção quando há “cessação temporária da prestação de serviços pelo empregado, mantendo-se, entretanto, as obrigações patronais (em especial, o pagamento de salário)”. Percebemos, portanto, que o conceito de interrupção do contrato de trabalho também é bem definido pela doutrina.
Ainda é possível materializar um terceiro instituto que enquadra hipóteses híbridas, ou seja, carregam consigo características de suspensão e de interrupção, situações que ora devem ser classificadas de uma forma e ora de outra. Tal circunstância pode ser verificada, por exemplo, no afastamento por motivo de acidente de trabalho ou doença, em que os primeiros quinze dias de afastamento o empregador ainda possui o ônus salarial, configurando uma interrupção do contrato de trabalho, mas a partir do décimo sexto dia de afastamento essa responsabilidade se transmite ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Nessa hipótese, o empregado não recebe salário, mas computa-se como tempo de serviço, inclusive para fins de indenização e estabilidade, para Leite61 a hipótese configura suspensão dos efeitos do contrato a contar do décimo sexto dia de afastamento, explica:
[...] o afastamento do empregado por motivo de doença ou acidente do trabalho configura suspensão dos efeitos do contrato individual do trabalho, na medida em que o empregado passa a perceber, a partir do 16º dia de afastamento, benefício previdenciário, e não salário do seu empregador. O fato de o tempo de afastamento ser contado para fins de indenização (CLT, art. 4º) e o FGTS continuar sendo recolhido não excepcionam o critério básico de distinção entre as duas figuras: a) na suspensão não há trabalho, nem salário; b) na interrupção não há trabalho, mas o empregador continua obrigado a pagar salário.
Apesar de institutos semelhantes, guardam entre si diferenças que, na prática, possuem reflexos bastante distintos, já que a suspensão não implica no cômputo do período não trabalhado, enquanto a interrupção sim, o que traz reflexos nas verbas percebidas pelos trabalhadores.
60 XXXXXXXXX, X., X. Direito do Trabalho. [s.l.]: Editora Jus Podivm, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxx/x000x00x000x0x0x00000000x0000xxx.xxx. Acesso em 5 ago 2021. p. 221
61 XXXXX, X.X. X. Curso De Direito Do Trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021. E-book (não paginado). Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em: 28 Abr 2021.
As consequências da aplicação de um instituto ou outro podem ser percebidas, principalmente nas verbas que o empregado recebe. Isso porque, na suspensão como não há computo do período suspenso, não há como concluir o período aquisitivo para férias, por exemplo. O mesmo se aplica nas verbas de 13º salário, pois são pagas proporcionalmente aos meses trabalhados no ano, logo se algum período foi suspenso, não sendo contabilizado para os efeitos legais, o empregado não receberá a gratificação referente a esse período, percebendo apenas daqueles em que houve a prestação laborativa. Além disso, na suspensão o empregador se exonera com a responsabilidade do pagamento de salários, isso não implica que o empregador não receberá verbas, mas que apenas não serão providas por parte da empresa, podendo advir do seguro social.
De forma diversa da suspensão, na interrupção não há modificação do responsável pelo pagamento dos salários, que continua sendo o empregador, além disso, o tempo de serviço do período interrompido é contabilizado para fins legais não modificando as verbas percebidas pelo empregado no caso de 13º salário. Apesar disso, as faltas justificadas, que configuram interrupção do contrato de trabalho nos termos do artigo 473 da CLT, podem impactar na proporção de dias de férias concedidos, conforme indica o artigo 130 da CLT62, in verbis:
Art. 130. Após cada período de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte proporção:
I – 30 (trinta) dias corridos, quando não houver faltado ao serviço mais de 5 (cinco) vezes;
II – 24 (vinte e quatro) dias corridos, quando houver tido 6 (seis) a 14 (quatorze) faltas;
III – 18 (dezoito) dias corridos, quando houver tido de 15 (quinze) a 23 (vinte e três) faltas;
IV – 12 (doze) dias corridos, quando houver tido de 24 (vinte e quatro) a 32 (trinta e duas) faltas.
§1º É vedado descontar, do período de férias, as faltas do empregado ao serviço.
§2º O período das férias será computado, para todos os efeitos, como tempo de serviço.
Há de se verificar que os dois conceitos são bem definidos pela doutrina, não restando dúvidas quanto a sua conceituação. As dúvidas surgem quando do
62 BRASIL. Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. Brasília, DF: Previdência da República, 1943. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxx- lei/del5452.htm. Acesso em 28 Abr 2021.
enquadramento de novidades legislativas, principalmente as advindas com a pandemia, como no caso do PEMER que ainda se percorre dúvidas se deve ser classificado como suspensão, interrupção ou, ainda, como hipótese híbrida.
Feita análise das proporções da pandemia e levantado dados das principais medidas adotadas para seu enfretamento, bem como as implicações dessas medidas nos direitos fundamentais dos seres humanos, que ora foram flexibilizados para atender um bem maior, e, por fim, verificado o conceito de termos importantes remetidos ao objeto do presente estudo, demonstra-se necessário um estudo comparativo dos impactos da pandemia de COVID-19 no Brasil e em determinados países do continente europeu, para além do campo sanitário como também econômico e trabalhista o que se pretende a seguir.
3 A PANDEMIA E A RELAÇÃO DE TRABALHO SOB UMA VISÃO ECONÔMICA
Na sequência, pretende-se com o presente capítulo efetivar-se um estudo acerca dos impactos da pandemia de COVID-19 no Brasil e em determinados países do continente europeu tendo por objetivo escalonar dados atinentes à economia desses países, além de apresentar as principais modificações trabalhistas adotadas para contenção da crise sanitária e econômica apresentada. Principalmente, objetiva-se demonstrar a relação de interdependência do trabalho com a economia.
3.1 Reflexos da pandemia de COVID-19 no direito do trabalho e na economia
As medidas sanitárias instauradas para contenção do novo vírus revolucionaram diversas áreas como a tecnologia, a ciência, a vida social, a comunicação, a política e inclusive a cultura fazendo a sociedade modificar condutas e adicionar hábitos, possível ainda dizer que tal marco histórico modificou pensamentos fazendo com que muitas pessoas evoluíssem como seres humanos. Frente a essa dimensão, Feliciello e Gava63 resumem os assuntos mais pertinentes advindos com a instauração da pandemia:
[...] algumas questões têm aflorado com grandes reflexos no embate público, através dos meios de comunicação e nas redes sociais, dentre as quais ressaltam: o conhecimento sobre o coronavírus, suas características, formas de transmissão e combate; as principais ações de prevenção e controle da epidemia pelos governos e gestores da saúde; a organização dos serviços de atenção à saúde considerando a evolução da doença nos vários grupos populacionais; as opções mais efetivas de tratamento e de reabilitação.
Mas sem dúvidas, dois campos foram extremamente abalados pela chegada da COVID-19, e, mesmo com a diminuição dos riscos de contaminação com a
63 XXXXXXXXXX, X.; GAVA. G., B. Economia e pandemia: lockdown, flexibilização e defesa da vida. Cadernos de Pesquisa NEEP, São Paulo: n. 89, 2020. Disponível em: xxxxx://x0xxxxxx0xxxx0.xxxxxxxxxx.xxx/00000000/XXXXXXX_XXXX_XXXX_Xx00_0000-xxxx-xxxxx- page-v2.pdf?Expires=1628302601&Signature=FAMkoyxNm- DRjde6KoWZWGkqXncHPyrGgbkdXizLJHQ4ErWM7W7zO5n5d9KHWBB0c0blITi- DazbQXXGd~Sdk6aN- R5oN45X5WBAZ3QxFrYJMYzNGSl6Fq6C4GqtXFLGtA7cUCk~AtH4fZDKUMSSKiIZ282xQtP1XKm34
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chegada das vacinas, seus efeitos ainda são percebidos, esses campos referem-se a economia e ao trabalho. É inegável que entre essas duas áreas há uma linha tênue que as divide, afinal a economia consegue manter seu ciclo, pois há pessoas assalariadas girando sua roda. Ou seja, o trabalho nutre a economia, o contrário também é verdadeiro, quando verificamos desequilíbrio nessa relação o país sofre, assim também entendem os autores Xxxxx e Santos64, quando estabelecem:
[...] se de um lado as empresas cumprem relevante função social, geram empregos e garantem a movimentação da economia, de outro os empregados representam a fonte motora que permite às empresas cumprir seu mister. Diante disso, podemos asseverar que, à luz da Constituição brasileira, empresas e empregados são interdependentes.
Quanto aos reflexos da pandemia no direito do trabalho e na economia, é necessário recordar que a alteração do cenário provocada pela decretação do estado de calamidade pública foi tão repentina que muitas empresas, classificadas como serviços não essenciais, foram conduzidas à paralisação de seu funcionamento por ordens governamentais de modo a diminuir a circulação de pessoas e evitar a propagação do vírus. A medida, mesmo que louvável pela sua finalidade precípua, previa desemprego em massa e preocupou as diversas esferas governamentais.
Apontam Feliciello e Gava65, a partir de um estudo realizado em 24 países, que 83% das nações assumiram o lockdown e 13% adotaram o isolamento vertical para contenção de circulação de pessoas, destacam os autores que as ações mais frequentes foram:
64 YUNIS. J.E.D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região, São Paulo: n. 25, p. 92-102, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxxxxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/000000 789/13987. Acesso em 28 Abr 2021. p. 96.
65 XXXXXXXXXX, X.; GAVA. G., B. Economia e pandemia: lockdown, flexibilização e defesa da vida. Cadernos de Pesquisa NEEP, São Paulo: n. 89, 2020. Disponível em: xxxxx://x0xxxxxx0xxxx0.xxxxxxxxxx.xxx/00000000/XXXXXXX_XXXX_XXXX_Xx00_0000-xxxx-xxxxx- page-v2.pdf?Expires=1628898483&Signature=XKGtDbQpq80swAn9g73UOXXN~8cT8wp51lV9T7h- v9ied5h1NbL5z0VeVqAhAI0P4ks72GetVeQK8IImXheZ3a6EZO2hVuyAzSt~Tlq83UhMiXC~lRZk87m H9KDpGdXbIxsPgPacyMOQAJp6H4CCbhOQzQzxgPT5OX7ETHS5sfTyo~DEfOkFaeFrfyNfuQs46Yiu jNKbOsLe1Y1YC4C1H7WJFvxRw6XkbV7xJImirNoTA0lfNqYX0zXY60rjpuOLGH~I- Sfb~nIly5okj3kFf3tfe24evUrjtkIpI4BuJla6-nqDo4PMg52v-
~fbg51xGdPAtkGBFrFK7BJrUkT05Q &Key-Pair-Id=APKAJLOHF5GGSLRBV4ZA. Acesso em 7 ago 2021. p. 5.
[...] alocação de recursos públicos em atividades de pesquisa científica ou produção de bens e serviços, voltados ao enfrentamento da COVID-19 (92%), medidas de carácter econômico visando a manutenção da capacidade financeira das empresas (96%); e auxílio em dinheiro aos trabalhadores e necessitados (86%).
Países em que o maior faturamento vem do turismo tiveram bastantes efeitos negativos com as regras de contenção, especificadamente, pois atividades como viagens, comercio varejista, de entretenimento como cinema, teatros, casa de festas e demais atividades que dependem do contato pessoal foram totalmente paralisadas. A Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD)66 estima que o obstáculo para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) dependerá de fatores como a duração das paralisações e da velocidade do alcance de políticas públicas implementadas, a organização adverte que grande parte dos países terá sua econômica afetada, sejam países que dependem do turismo como países agrícolas ou de mineração:
Muitos países nos quais o turismo é relativamente importante podem ser potencialmente afetados de forma mais severa por paralisações e limitações de viagens. No outro extremo, os países com setores agrícolas e de mineração relativamente consideráveis, incluindo a produção de petróleo, podem experimentar efeitos iniciais menores das medidas de contenção, embora a produção seja subsequentemente afetada pela redução da demanda global por commodities. (Tradução nossa)
Especificadamente em relação a alguns países da União Europeia, como a Itália, bastante atingida pelos efeitos da pandemia de COVID-19 e grande centro de turismo, registrou diversos programas de incentivo a economia, como exemplos desses projetos podemos citar o “Cure a Itália” instituído por meio do Decreto-Legge nº 1867, de 17 de março de 2020 e o Decreto-Legge nº 2368, de 8 de abril de 2020,
66 Many countries in which tourism is relatively important could potentially be affected more severely by shutdowns and limitations on travel. At the other extreme, countries with relatively sizeable agricultural and mining sectors, including oil production, may experience smaller initial effects from containment measures, although output will be subsequently hit by reduced global commodity demand.” ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD). Evaluating the
initial impact of COVID-19 containment measures on economic activity. Paris: OCDE, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxx-xxxxxxxxx/xxxxxxxxxx-xxx-xxxxxxx-xxxxxx-xx- covid-19-containment-measures-on-economic-activity-b1f6b68b/. Acesso em 7 ago 2021.
67 ITALIA. Decreto-Legge nº18, 17 marzo 2020. Misure di potenziamento del Servizio sanitario nazionale e di sostegno economico per famiglie, lavoratori e imprese connesse all'emergenza epidemiologica da COVID-19. Roma: Il Presidente dellla Repubblica, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxx.xx/xxx/xx/0000/00/00/00X00000/xx. Acesso em 7 ago 2021.
apelidado de “Decreto de Liquidez”, que previram a suspensão da obrigação do pagamento de impostos e contribuições, disponibilizaram acesso a créditos para empresas, além de priorizar gastos com as necessidades de saúde. A Itália tomou medidas mais severas após um grande abalo gerado pela COVID-19, restringido a livre circulação. Tendo diversas empresas com atividades suspensas implementou pacotes financeiros e fiscais sem precedentes para apoiar trabalhadores e empresas em prol da economia.
O Reino Unido, país cujos programas adotados tornaram-se modelo para criação das medidas socioeconômicas dos demais países, adotou projetos para redução de impostos do comércio varejista em 50% e dispensou do pagamento de impostos empresas cuja atividade principal se destinava ao lazer e hospitalidade, pequenas empresas também obtiveram auxílio financeiro, através do programa Business Rates Reliefs69. Amitrano, Xxxxxxxxx e Xxxxx 70 asseveram que as medidas inicialmente tomadas não foram suficientes para conter a crise e entre diversas críticas realizadas, o governo promoveu novos instrumentos, cujos quais dois merecem destaque, em suas palavras:
O primeiro é o Covid Corporate Financing Facility (CCFF). Lançado em uma parceria entre o Tesouro britânico e o Banco da Inglaterra, seu objetivo consiste em prover financiamento às empresas por meio da aquisição de comercial papers com vencimento de até um ano. O instrumento visa atenuar problemas de fluxo de caixa das empresas, auxiliando no pagamento de salários e fornecedores. [...] O segundo instrumento relevante diz respeito à ampliação e desmembramento do Coronavirus Business Interruption Loan Scheme (CBILS), que continuou a ter foco nas pequenas e médias empresas. As firmas com faturamento anual de até £ 45 milhões poderão acessar empréstimos, fazer saques a descoberto, financiar faturas e ativos no valor aumentado de até £ 5 milhões por até seis anos.
A Espanha apresentou uma curva de crescimento acentuada de casos e mortes por COVID-19 entre março e abril de 2020, em razão de crises passadas o
68 ITALIA. Decreto-Legge nº23, 8 aprile 2020. Misure urgenti in materia di accesso al credito e di adempimenti fiscali per le imprese, di poteri speciali nei settori strategici, nonche' interventi in materia di salute e lavoro, di proroga di termini amministrativi e processuali.. Roma: Il Presidente dellla Repubblica, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxx.xx/xxx/xx/0000/00/00/00X00000/xx.
Acesso em 7 ago 2021.
69 UNITED KINGDOM. Business rates relief. Londres: [2020?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxx-xxx-xxxxxxxx-xxxx-xxxxxx. Acesso em 7 ago 2021.
70 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXXX, L., C., G., D.; XXXXX, M., S. Medidas de Enfrentamento dos efeitos econômicos da pandemia de COVID-19: panorama internacional e análise dos casos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Espanha. Repositório de Conhecimento do IPEA. Brasília, DF: 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/00000/0000. Acesso em 7 ago 2021. p. 45 e 46.
governo necessitou flexibilizar regras para produzir políticas pública efetivas. Como forma de controle da disseminação do vírus, adotou o isolamento social, fazendo com que muitas atividades econômicas não essenciais fossem paralisadas. Frente a isso, conforme divulgado pelo Ministério de Asuntos Económicos y Transformarción Digital71 da Espanha, como remédio à situação buscou formas de proteção e apoio ao sistema sanitário, as famílias e ao setor empresarial, para isso concedeu crédito às empresas, flexibilidade no pagamento de impostos, permitiu o ajuste na forma da prestação de trabalho visando a manutenção dos empregos e buscou alcançar auxílio financeiro aos trabalhadores autônomos e às famílias com filhos em idade escolar.
Demais países como França e Portugal, também com muitas atividades paralisadas em razão das normas de contenção à COVID-19, seguiram a mesma linha para auxílio à economia, disponibilizando linhas de crédito para que empresas pudessem se manter durante a pandemia, além de isentar, reduzir ou flexibilizar a responsabilidade pelo pagamento de impostos e contribuições.
Segundo a International Labour Organization, tradução Organização Internacional do Trabalho (OIT)72, a França especificamente instituiu o teletrabalho como obrigatório para todos os cargos em que fosse possível sua realização e para aqueles que não conseguissem migrar a forma de prestação de serviço, deveriam preservar a saúde e a segurança dos trabalhadores, enquanto Portugal adotou um sistema de suspensão/redução dos contratos de trabalhos, semelhante ao Brasil, que permitiu às empresas adimplirem com apenas 30% do salário de cada empregado, ficando 70% do montante a cargo da segurança social.
Em suma, Amitrano, Magalhães e Silva73 contabilizam que 69,1% dos recursos de países como Alemanha, Espanha, Estados Unidos, França, Reino Unido
71 ESPAÑA. Ministerio de Asuntos Económicos y Transformación Digital. Medidas Económicas Adoptadas por el Gobierno De España Frente a la Pandemia del Covid-19. Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/0000/00000000_xxxxxxx_xxxxxxxxx s_COVID19.pdf. Acesso em 7 ago 2021.
72 INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION (ILO). COVID-19 and the world of work: Country policy responses. Genebra: ILO, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxxx/xxxx-- en/index.htm#FR e xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxxx- responses/lang--en/index.htm#PT. Acesso em 7 ago 2021.
73 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXXX, L., C., G., D.; XXXXX, M., S. Medidas de Enfrentamento dos efeitos econômicos da pandemia de COVID-19: panorama internacional e análise dos casos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Espanha. Repositório de Conhecimento do IPEA. Brasília, DF: 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/00000/0000. Acesso em 7 ago 2021. p. 17.
e outros da União Europeia, estão destinados aos programas de incentivo e manutenção de empresas, tendo como objetivo a “preservação do tecido produtivo de cada país e apresenta, como consequência direta, a manutenção, pelo menos em parte, dos níveis de emprego e renda” nas palavras dos autores.
No Brasil o direito econômico também foi e está sendo amplamente afetado, fazendo com que várias empresas sintam dificuldade em operar e inclusive optem pelo encerramento de suas atividades. Pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)74, apontam que na segunda quinzena de agosto de 2020, 33,5% das empresas em funcionamento reportam que a pandemia teve um efeito negativo sobre a empresa, número ainda maior na primeira quinzena de 2020, em que 70% das empresas apontavam efeitos negativos decorrentes da pandemia. Ainda, na primeira quinzena de julho de 2020, 34,6% das empresas apontaram redução do número de funcionários.
Nery75 sinaliza que a pandemia foi responsável pelo fechamento de 4 em cada 10 empresas no Brasil:
Entre 1,3 milhão de empresas que na primeira quinzena de junho estavam com atividades encerradas temporária ou definitivamente, 39,4% apontaram como causa as restrições impostas pela pandemia do novo coronavírus. Esse impacto no encerramento de companhias foi disseminado em todos os setores da economia, chegando a 40,9% entre as empresas do comércio, 39,4% dos serviços, 37,0% da construção e 35,1% da indústria.
Verifica-se, portanto, que a pandemia teve e continua gerando diversos impactos na economia dos países, situação que implica diretamente a classe trabalhadora. Guy Ryder76, diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho já previa o abalo que a pandemia provocaria, por isso enfatizava:
74 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Indicadores de
Empresas. Rio de Janeiro: IBGE, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxxx.xxx.xx/xxxxx-xxxxxxx/. Acesso em 11 maio 2021.
75 XXXX, X. Pandemia foi responsável pelo fechamento de 4 em cada 10 empresas com atividades encerradas. Agência IBGE Notícias, Rio de Janeiro, 16 jul. 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxx-xxxxxxxx/0000-xxxxxxx-xx-xxxxxxxx/xxxxxxxx/00000- pandemia-foi-responsavel-pelo-fechamento-de-4-em-cada-10-empresas-com-atividades-encerradas. Acesso em 11 Maio 2021.
76 XXXXX, X. A COVID-19 pôs em evidência a fragilidade de nossas economias. Organização Internacional do Trabalho, Brasília, DF, Mar. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/XXXX_000000/xxxx--xx/xxxxx.xxx. Acesso em 13 Maio 2021.
Políticas fiscais e monetárias expansionistas sem precedentes são essenciais para impedir que a atual queda acentuada se converta em uma recessão prolongada. Devemos garantir que as pessoas tenham dinheiro suficiente no bolso para chegar ao fim do mês. Para isso, temos de assegurar que as empresas, fonte de renda para milhões de trabalhadores, possam permanecer à tona durante a forte crise e estejam em condições de voltar a funcionar assim que as condições permitirem.
Em relação à prestação laborativa, para algumas categorias de serviços, o teletrabalho, também denominado de home officie, permitiu a manutenção do funcionamento e atendimento por algumas empresas, situações regulamentadas de forma emergencial pela MP 927/202077 que será abordada com maiores detalhes em momento oportuno, já para outras que dependiam do trabalho físico de seus colaborares apenas tiveram suspendidas suas atividades. A pandemia atingiu diretamente os trabalhadores, conforme defende Xxxxx, Xxxxx e Santos78:
[...] a pandemia que se instaurou com proporções globais, embora apresente consequências universais na perspectiva biológica, teve um caráter discriminatório na perspectiva social: tanto os impactos sanitários quanto econômicos atingem principalmente a classe trabalhadora.
Um dos parâmetros para dimensionar a proporção da pandemia é o aumento do nível de desemprego que observamos do ano de 2019 para o ano de 2020. Segundo o IBGE79, no 4º trimestre de 2019 (meses de outubro, novembro e dezembro), a marca de desemprego de pessoas acima de 14 anos foi de 11.632 milhões de pessoas, com uma taxa de desocupação em 11,0%. Já no 1º trimestre de 2020 (meses de janeiro, fevereiro e março), observamos um aumento desse índice, marcando 12.850 milhões de pessoas desempregadas, uma taxa de 12,2% de desemprego. Nos trimestres seguintes o aumento continua, atingindo no 3º trimestre de 2020 (meses de julho, agosto e setembro) a marca de 14.092 milhões
77 BRASIL. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para xxxxxxxxxxxxx xx xxxxxx xx xxxxxxxxxx xxxxxxx. Xxxxxxxx, XX: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/xxx000.xxx. Acesso em 15 Maio 2021.
78 XXXXX, X.X.X.X.; XXXXX, M. H.; XXXXXX, M. L. Condições de trabalho em casa durante a pandemia: uma análise do discurso do sujeito coletivo dos trabalhadores do setor de agências de turismo.
Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo (RBTUR), São Paulo, v.15. n. 1. 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/0000. Acesso em 5 Maio 2021. p. 8 e 9.
79 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Desemprego. Rio
de Janeiro: IBGE, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx#xxxxxxxxxx e xxxxx://xxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/0000#xxxxxxxxx. Acesso em 11 Maio 2021.
de pessoas desempregadas, uma taxa de desocupação de 14,6%, o 4º trimestre de 2020 obteve aumento de pessoas empregadas, entretanto pouco significativo, mantendo um número de 13.925 milhões de pessoas desempregadas, uma taxa de 13,9% de desocupação.
Esses números nos mostram que em 1 ano, do 4º trimestre de 2019 para o 4º semestre de 2020, período de maior incidência dos efeitos da pandemia, houve um aumento significativo de desempregados. Explica Costa80 acerca das consequências da pandemia:
[...] além da crise sanitária, uma das consequências da pandemia é o aumento do desemprego e, portanto, a elevação da informalização do trabalho, dos terceirizados, dos subcontratados, dos flexibilizados, dos trabalhadores em tempo parcial e do subproletariado. Essa população precisará ser assistida com políticas voltadas a protegê-la da fome e da pobreza, ou seja, necessitará ser inserida numa rede de proteção social.
Resta clara a relação entre o aumento do nível de desemprego com o fechamento das empresas, dado que são esses empreendimentos que geram empregos e fazem a manutenção da renda dos cidadãos.
Na tentativa de desenfrear o crescimento dos desempregos e do número de empresas fechadas o Brasil tomou algumas medidas tendo como fonte de inspiração os programas adotados por alguns dos países já mencionados. Como reflexo da vigência do estado de calamidade pública, foi instituída a Emenda Constitucional nº 10681, de 7 de maio de 2020 por meio da qual a União adotou regime extraordinário fiscal para atender as necessidades da pandemia. Segundo Xxxxx e Silva82, instituições bancárias como a Caixa Econômica Federal comunicaram aberturas de linha de crédito para micro e pequenas empresas e microempreendedores
80 COSTA, S. D. S. Pandemia e desemprego no Brasil. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 4. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xx/xxx/xxx/x00x0/0000-0000-xxx-00-00-
969.pdf. Acesso em 11 Maio 2021. p. 972.
81 BRASIL. Emenda Constitucional nº106, de 7 de maio de 2020. Institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para xxxxxxxxxxxxx xx xxxxxxxxxx xxxxxxx xxxxxxxx xxxxxxxxxx xx xxxxxxxx. Xxxxxxxx, XX: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxx/xxx000.xxx. Acesso em 7 ago 2021.
82 XXXXX, X., X., X.; XXXXX, X., X. Economia Brasileira Pré, Durante e Pós-Pandemia do COVID-19: impactos e reflexões. Xxxxxxxxxxxx Xxxxxxxxxxxxxx xx XXXXX-XXXXXXX, Xxx Xxxxxx xx Xxx, 0000. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xx/xxx/xxxxxxx/xxxxx/000/0000/00/Xxxxxx-xxxx- Discuss%C3%A3o-07-Economia-Brasileira-Pr%C3%A9-Durante-e-P%C3%B3s-Pandemia.pdf.
Acesso em 7 ago 2021. p. 4 e 5.
individuais, enquanto o Banco Central do Brasil facilitou o acesso ao crédito com a redução de juros e taxas básicas.
A população brasileira testemunhou diversas modificações legislativas que tinham o propósito de manter a economia estável durante a pandemia. Dentre elas podemos citar a MP nº 944, de 3 de abril de 2020, hoje convertida na Lei 14.04383, de 19 de agosto de 2020, tal medida teve como intuito a criação do Programa Emergencial de Suporte a Empregos, permitindo que empresas com receita bruta anual superior a R$360.000,00 e igual ou inferior a R$50.000.000,00, realizassem operações de crédito com objetivo no pagamento da folha salarial de seus empregados ou outras verbas trabalhistas. Tal medida previu a possibilidade de o crédito alcançar até 100% da folha de pagamento da empresa contratante pelo período de 4 meses, desde que os salários fossem limitados ao valor de até 2 salários-mínimos, não inclusos nenhumas verbas indenizatórias.
Outra criação legislativa foi a instituição da MP nº 946, de 7 de abril de 202084, hoje já fora de vigência e não sendo confirmada por nenhuma lei, tal medida teve como intuito disponibilizar até 31 de dezembro de 2020 o saque de recursos do FGTS até o limite de R$1.045,00 em razão do estado de calamidade frente a pandemia de COVID-19, tal situação vem prevista no artigo 6º do diploma legal.
Cabe também mencionar a criação da MP nº 963, atualmente convertida na Lei nº 14.05185, de 8 de setembro de 2020, que abriu crédito extraordinário em favor de Operações Oficiais de Crédito para atender a programas voltados ao turismo como “Hora do Turismo” e “Financiamento da Infraestrutura Turística Nacional”, pela lei foram liberados o valor de 5 bilhões de reais para atender a programação.
Por fim, uma das mais significativas criações legislativas esteve voltada ao auxílio de trabalhadores autônomos, microempreendedores individuais, trabalhadores informais e desempregados que não estavam alcançando nenhuma
83 BRASIL. Lei nº 14.043, de 19 de agosto de 2020. Institui o Programa Emergencial de Suporte a Empregos; altera as Leis nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, e 13.999, de 18 de maio de 2020; e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_Xxx0000-0000/0000/Xxx/X00000.xxx. Acesso em 7 ago 2021.
84 BRASIL. Medida Provisória nº 946, de 7 de abril de 2020. Extingue o Fundo PIS-Pasep, instituído pela Lei Complementar nº 26, de 11 de setembro de 1975, transfere o seu patrimônio para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/xxx000.xxx.
Acesso em 7 ago 2021.
85 BRASIL. Lei nº 14.051, de 8 de setembro de 2020. Abre crédito extraordinário em favor de Operações Oficiais de Crédito, no valor de R$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais), para o fim que especifica. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_Xxx0000-0000/0000/Xxx/X00000.xxx. Acesso em 7 ago 2021.
renda. Denominado Auxílio Emergencial, instituído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 202086, disciplinado a partir do artigo 2º da referida lei, estabeleceu a dispensação pelo período inicial de 3 meses do valor de R$600,00 ao trabalhador que cumprisse os requisitos determinados na lei.
Segundo o Ministério da Economia87, em nota informativa emitida em 29 de janeiro de 2021 “apesar da redução na atividade econômica, as perspectivas para o PIB em 2020 fora melhorando ao longo do segundo semestre do ano passado”, ressalta o referido órgão que o objetivo principal do governo foi “salvar vidas e atenuar impactos negativos sobre a economia, buscando a preservação dos empregos e a sobrevivência das empresas”. Percebemos, portanto, que as medidas tomadas em prol da economia surtiram efeitos positivos, o que demonstra a necessidade de uma sociedade por políticas públicas efetivas capazes de reverter uma crise pandêmica.
3.2 Programas adotados na Itália, Reino Unido, Espanha, França e Portugal no âmbito trabalhista para combate aos efeitos da pandemia
Diversos países foram afetados pela pandemia provocada pela COVID-19, tomando medidas que buscassem proteger a saúde de seus cidadãos e reduzir os impactos econômicos, conforme já estudado. As formas de preservação e controle de transmissão do vírus que impuseram medidas de distanciamento e isolamento social envolveram riscos de crise econômica e a classe mais afetada foi a de trabalhadores.
Neste trabalho tratar-se-á de alguns países situados no continente europeu, como Itália, Reino Unido, Espanha, França e Portugal, isso porque, apesar de o estopim da pandemia ter ocorrido na China, os países que logo foram afetados situavam no continente europeu, isso devido ao intenso turismo. Portanto, tornaram-
86 BRASIL. Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para dispor sobre parâmetros adicionais de caracterização da situação de vulnerabilidade social para fins de elegibilidade ao benefício de prestação continuada (BPC), e estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19) responsável pelo surto de 2019, a que se refere a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000- 2022/2020/lei/l13982.htm. Acesso em 7 ago 2021.
87 BRASIL. Ministério da Economia. Nota informativa – Projeções de crescimento econômico e medidas fiscais. Brasília, DF: 2021. Disponível em xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xx-xx/xxxxxxxx-xx- conteudo/publicacoes/notas-informativas/2021/ni-projecoes-de-crescimento-economico-e-medidas- fiscais.pdf/view. Acesso em 7 ago 2021.
se os países cujos quais as demais nações tomaram como espelho para enfrentamento do vírus, não é por nada que o Brasil possui programas de incentivo a economia e a renda tão parecidos com os implementados por esses países.
Além disso, apesar de bastantes afetados pela disseminação da COVID-19, em 2021 esses países demonstram evolução e desempenho positivo da economia. Segundo o Instituto Nazionale di Statistica (ISTAT)88, os países da Europa apresentam um crescimento econômico significativo, a Itália, por exemplo, registrou no segundo semestre de 2021 um aumento do PIB em 2,7%, enquanto a Espanha registrou um aumento de 2,7%, já a França apresentou aumentos menores representando mais 0,9%. O instituto também adverte acerca do nível de desemprego e das perspectivas dos países:
[...] a taxa de desemprego caiu de 7,9% para 7,7%, com queda espalhada por todas as principais economias. [...] As perspectivas para a área continuam muito favoráveis, conforme confirmado pelo Indicador de Sentimento Econômico (RSE) de Comissão Europeia, que em julho atingiu um novo recorde histórico [...] (Tradução nossa)
A International Monetary Fund (IMF)89, em português denominado Fundo Monetário Internacional (FMI) compilando dados acerca do crescimento real do PIB mundialmente demonstra que o Reino Unido em 2020 apresentou declínio no índice para -9,9, enquanto em 2021 o país mantém o índice em 5.3. Ainda segundo a IMF90, Portugal também apresentou melhora do índice de 2020 para 2021, sendo que no ano de maior incidência da COVID-19 o país registrou índice de -7,6 e no ano seguinte observou o crescimento para 3.9.
Ademais, é possível comparar os índices de desemprego dos países estudados, segundo a Eurostat91, a Espanha iniciou o período pandêmico em janeiro
88 “e il tasso di disoccupazione è sceso a 7,7% da 7,9%, con una diminuzione diffusa a tutte le principali economie [...] Le prospettive per l’area restano molto favorevoli come confermato dall’Economic Sentiment Indicator (ESI) della Commissione europea che a luglio ha toccato un nuovo massimo storico [...]” INSTITUTO NAZIONALE DI STATISTICA (ISTAT). Nota Mensile: sull’andamento dell’ economia italiana. [s.l.]: ISTAT, n. 7, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxx.xx/xx/xxxxx//0000/00/xxxxxxxxxxx_-xxx_0000.xxx. Acesso em 9 ago 2021. P. 2.
89 INTERNACIONAL MONETARY FUND (IMF). Portugal Datasets: world economic outlook. Washington, D.C.: IMF, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxxxxx/xxxxxxx/XXX. Acesso em 9 ago 2021.
90 INTERNACIONAL MONETARY FUND (IMF). United Kingdom Datasets: world economic outlook. Washington, D.C.: IMF, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxxx/xxxxxxxxxx/xxxxxxx/XXX. Acesso em 9 ago 2021.
91 EUROSTAT. Unemployment by sex and age: monthly data. Luxemburgo: 2021. Disponível em: xxxxx://xx.xxxxxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxx/XXX_XX_X custom_626904/bookmark/table?lang= en&bookmarkId=176a6845-7803-40ba-aad4-34544e87b5dc. Acesso em 9 ago 2021.
de 2020 com um índice de 13.9% de desemprego, em agosto de 2020 chegou a atingir um percentual de 16.6%, em dezembro do mesmo ano já demonstrou regressão do índice atingindo o percentual de 16.2% de desemprego no país. Ainda de acordo com a instituição, a França também demonstrou diminuição do índice de desemprego que em janeiro de 2020 atingia o índice de 8.2%, em agosto de 2020 agravou a situação para 9% de desempregados, mas em dezembro de 2020 regrediu para o percentual de 7.8% da população desempregada. Itália, no que lhe concerne, em janeiro de 2020 atingia o índice de 9.7% da população desempregada, atingindo em agosto do mesmo ano o percentual de 10% de desemprego, enquanto em dezembro de 2020 o índice diminuiu para 9.9%. Portugal iniciou e finalizou ano de 2020 com o percentual de 6.9% de desemprego, sendo que atingiu em agosto de 2020 o índice de 8.2% da população desemprega. Por fim, o Reino Unido conseguiu manter seu índice de desemprego baixo, tendo variações que não ultrapassaram 4.9% da população desempregada no ano de 2020.
Enquanto a retomada do trabalho presencial era insegura para a saúde de empregados, esses países tomaram medidas sem precedentes de modo a contornar a crise sobre a saúde, a economia, a sociedade e o mercado de trabalho. Este crescimento acelerado após a insurgência de um momento histórico de crise sanitária, demonstra o sucesso das políticas públicas adotadas nos referidos países, por isso merece destaque uma análise dos programados adotados nessas nações que visaram alcançar amparo ao trabalho e à renda. Em relação a alguns programas adotados por países europeus, Cadó e Borsari92 destacam as principais medidas de amparo a trabalhadores:
No que se refere às políticas que tocam intimamente na questão do trabalho, esses países procuram, de modo geral, amparar os trabalhadores que necessitam se ausentar por conta da doença, os que não possuem vínculo de emprego formal, os que perderam o emprego por conta da crise, os que estão em situação de desemprego e pobreza e, por fim, a manutenção do fluxo de caixa de pequenas e médias empresas com vistas a manter os vínculos de empregatícios. A Espanha, França, Reino Unido e Portugal tem apresentado pacotes bastante exemplares nesse sentido.
92 CADÓ, I.; XXXXXXX, X. Medidas de amparo ao trabalho e à renda frente à pandemia do coronavírus: comparativo internacional. CESIT Unicamp Textos para discussão, v.1, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/Xxxxx-xxxxxx-x-xxx-x-xxxx-xxxxx-0-0.xxx. Acesso em 9 ago 2021. p. 2.
Em Portugal, a primeira medida adotada visou equiparar a contaminação por COVID-19 com o internamento hospitalar, devido à alta contaminação do vírus, assim definido no Despacho nº 2875-A/202093. Em 13 de março de 2020, houve a publicação da Resolução do Conselho de Ministros nº 10-A/202094 que recomendou o teletrabalho e a instituição de férias aos trabalhadores que não pudessem migrar para o ambiente virtual, visando a manutenção dos postos de trabalho, em seus próprios termos:
Cometer à Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social a promoção de um apoio extraordinário à manutenção dos contratos de trabalho em empresa em situação de crise empresarial com direito a uma compensação retributiva análoga a um regime de lay off simplificado, caso haja suspensão da atividade relacionada com o surto de COVID -19 e caso haja interrupção das cadeias de abastecimento globais ou quebra abrupta e acentuada de 40 % das vendas, com referência ao período homólogo de três meses.
A partir disso, o governo português instituiu programa, denominado de “Layoff Simplicado”, como medida de apoio às empresas que comprovassem o baixo faturamento provocado pelos reflexos da pandemia e que estivessem na eminência do encerramento, essas podendo receber apoio financeiro com finalidade na manutenção dos contratos de trabalhos, conforme as determinações do Decreto-Lei n.º 10G/202095 de Portugal. Tal legislação permitiu a transferência da responsabilidade pelo pagamento de 70% dos salários dos empregados para a Seguridade Social, o artigo 6º da referida legislação traz consigo “Em situação de crise empresarial, o empregador pode reduzir temporariamente os períodos normais de trabalho ou suspender os contratos de trabalho”, também refere que na suspensão ou redução do contrato de trabalho todos os direitos, garantias e deveres
93 PORTUGAL. Despacho nº 2875-A/2020. Adota medidas para acautelar a proteção social dos beneficiários que se encontrem impedidos, temporariamente, do exercício da sua atividade profissional por ordem da autoridade de saúde, devido a perigo de contágio pelo COVID-19. Lisboa: Governo da República Portuguesa, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx/000000000. Acesso em 9 ago 2021.
94 PORTUGAL. Resolução do Conselho de Ministros nº 10-A/2020. Aprova um conjunto de medidas relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus — COVID 19. Lisboa: Presidência do Conselho de Ministros, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx/000000000. Acesso em 9 ago 2021. p. 15.
95 PORTUGAL. Decreto-Lei n.º 10G/2020. Estabelece uma medida excecional e temporária de proteção dos postos de trabalho, no âmbito da pandemia COVID-19. Lisboa: Governo da República Portuguesa, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xx/xxx/xxxxx/xxxxxxxxxx-xxxxxxxxxxx/-
/lc/130791179/202003280000/73801536/diploma/indice?jp=true. Acesso em 14 Maio 2021.
das partes devem ser mantidos. O artigo 13 do Decreto-Lei nº 10G/2020 proíbe a rescisão contratual durante a medida e nos 60 dias seguintes ao seu cessamento.
Além disso, Xxxxxx e Santos96 afirmam que empresas de Portugal puderam transferir a responsabilidade de parte do pagamento dos salários mesmo sem reduzir ou suspender contrato, sendo que outros países tomaram condutas semelhantes:
[...] A suspensão temporária do contrato pôde ser parcial (mantendo- se algumas horas) ou total (sem qualquer prestação de serviço), contudo, diversos Estados exigiram que as empresas que optassem pelo lay off comprovassem a queda em seu faturamento. [...] Em Portugal, por exemplo, houve autorização para corte de um terço do salário bruto sem a necessidade de suspensão do contrato de trabalho desde que a empresa, independentemente do setor, comprovasse a queda de 40% no faturamento médio dentro de um período de três meses.
Na França, o governo além de adotar diversos programas de incentivo fiscal e de disponibilização de crédito para empresas, também buscou formas de garantir emprego a população mais jovem. Para isso, destinou 6,5 bilhões de euros ao programa “L’emploi des Jeunes”, tradução “Emprego Jovem”, que bonificou empresas com £4.000 para a cada contratação de um jovem de menos de 26 anos pelo período mínimo de 3 meses segundo a ILO97, dessa forma buscou incentivar a contratação de jovens aprendizes para empresas.
Em 30 de julho de 2020 a França instituiu um mecanismo que permite empresas com limitação de suas atividades reduzir a carga horária de seus trabalhadores, sendo que as mais afetadas poderiam transferir a responsabilidade pelo pagamento de parte do salário para o Estado, além do ente público disponibilizar cursos de formação profissional.
O Décret nº 2020-131698 foi o que tornou definitiva a possibilidade da atividade parcial, tal medida que permite o labor de forma parcial, visando manter a
96 YUNIS. J. E. D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região, São Paulo: n. 25, p. 92-102, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/000000000/00000. Acesso em 28 Abr 2021. p. 94.
97 INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION (ILO). COVID-19 and the world of work: Country policy responses - France. Genebra: ILO, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxxx/xxxx-- en/index.htm#FR. Acesso em 7 ago 2021.
98 “Art. 1º, [...] 2º: Le I de l’article R. 5122-9 est remplacé par les dispositions suivantes: I. – Une autorisation d’activité partielle peut être accordée pour une durée maximum de trois mois. Elle peut
remuneração dos empregados e incentivando a manutenção do funcionamento das empresas que tivessem redução em suas atividades:
Art. 1º, [...] 2º: I do artigo R. 5122-9 passa a ter a seguinte redação: I.
– A autorização parcial de atividade pode ser concedida pelo prazo máximo de três meses. Pode ser renovada nas condições fixadas no ponto II e no prazo de seis meses, consecutivos ou não, por um período de referência de doze meses consecutivos. < Em derrogação do disposto no número anterior, quando o empregador colocar os seus empregados em situação de atividade parcial em aplicação do 3º ponto do artigo R. 5122-1, a autorização de atividade parcial pode ser concedida por um período máximo de tempo de seis meses. (Tradução nossa).
Ainda cabe mencionar que por força do Décret 2020-113199, em setembro na França o coronavírus foi caracterizado como doença ocupacional. A ILO, tradução OIT100 apresenta que em 27 de janeiro de 2021 na França cerca de 470.000 mil funcionários aderiram ao labor de forma parcial, além disso, a instituição também sinaliza que desde 1º de maio de 2020 trabalhadores considerados vulneráveis ou que residem com pessoas em tais condições deveriam ser colocadas em atividade reduzida, caso não fosse possível a alocação para o teletrabalho. Em 31 de março de 2021 o governo francês obrigou todas as empresas a desenvolverem planos de trabalho remoto para redução dos tempos de serviço presencial dos funcionários, devido às medidas reforçadas adotadas.
O Reino Unido, no que se refere a seara trabalhista, inicialmente destinou recursos para custear licenças remuneradas estatutárias, chamadas de Statutory Sick Pay (SSP), para indivíduos que necessitassem do isolamento ou que estavam
être renouvelée dans les conditions fixées au II et dans la limite de six mois, consécutifs ou non, sur une période de référence de douze mois consécutifs. « Par dérogation à l’alinéa précédent, lorsque l’employeur place ses salariés en position d’activité partielle em application du 3o de l’article R.5122- 1, l’autorisation d’activité partielle peut être accordée pour une durée maximum de six mois.” FRANCE. Décret nº 2020-1316 du 30 octobre 2020. Relatif à l'activité partielle et au dispositif d'activité partielle spécifique en cas de réduction d'activité durable. Paris: Journal officiel de la République Française, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxx.xxxx.xx/xxxxxxxx/xxx?xxxXxXx0xXXX00XxxXxXX0xx0x0XXX0Xx0xX0xXx00 cWt4=. Acesso em 14 Maio 2021.
99 FRANCE. Décret nº 2020-1131 du 14 septembre 2020. Relatif à la reconnaissance en maladies professionnelles des pathologies liées à une infection au SARS-CoV2. Paris: Journal officiel de la République Française, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxx.xxxx.xx/xxxxxxxx/xxx?xxxXXxx0xxxXXxxXXxx0Xx0X0xX0XX0xXxX- KtqKaYgx6E=. Acesso em 10 ago 2021.
100 INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION (ILO). COVID-19 and the world of work: Country policy responses - France. Genebra: ILO, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxxx/xxxx-- en/index.htm#FR. Acesso em 7 ago 2021.
prestando auxílio a pessoas isoladas em razão de contaminação da COVID-19. Por essa licença, segundo o site do Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxx000, é possível receber
£96,35 por semana, pago por até 28 semanas ao trabalhador enfermo ou com contato direto com contaminados pelo vírus. Esse sistema de licença já existia antes da pandemia, porém somente podia ser requerido após o 4º dia de afastamento, com a COVID-19, o recurso foi disponibilizado a partir do 1º dia de afastamento.
Entretanto, de acordo com Xxxxxxxx, Magalhães e Xxxxx 102, as medidas adotadas pelo governo, até mesmo as de incentivo fiscal e de disponibilização de créditos para as empresas foram criticadas pela sua baixa eficiência em razão do aumento do número de contaminados e óbitos registrados no país.
Assim o governo instituiu um novo pacote de medidas, e entre elas o programa “Coronavirus Job Retention Scheme”103, tradução “Esquema de Retenção de Emprego de Coronavírus” em que previu o pagamento de 80% do salário dos trabalhadores das empresas que tiveram suas operações afetadas pela pandemia, até o limite de £2.500 por salário, por três meses, esquema esse que segue em vigor até setembro de 2021.
Pope, Xxxxxx e Tetlow104, evidenciam que o esquema atingiu seu objetivo no país em referência:
Mais de dois terços dos funcionários que foram apoiados pelo CJRS deixaram o esquema e voltaram ao trabalho. Esta é a evidência de que a política atingiu seu objetivo: manter vínculos empregador- empregado durante o pior da crise, permitindo que as empresas trouxessem trabalhadores de volta com relativa facilidade conforme as condições econômicas melhorassem. (tradução nossa).
101 UNITED KINGDOM. Statutory Sick Pay (SSP). Londres: [2020?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxxx-xxxx-xxx. Acesso em 11 ago 2021.
102 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXXX, L., C., G., D.; XXXXX, M., S. Medidas de Enfrentamento dos efeitos econômicos da pandemia de COVID-19: panorama internacional e análise dos casos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Espanha. Repositório de Conhecimento do IPEA. Brasília, DF: 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/00000/0000. Acesso em 7 ago 2021. P. 43.
103 “Over two-thirds of employees who have been supported by the CJRS have now left the scheme and returned to work. This is evidence that the policy achieved its intent: maintaining employer-employee links through the worst of the crisis, allowing businesses to bring workers back relatively easily as economic conditions improved.” UNITED KINGDOM. Check if your employer can use the Coronavirus Job Retention Scheme. Londres: [2020?]. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxx-xx-xxx-xxxxx-xx-xxxxxxx-xx-xxx-xxxxxxxxxxx-xxx-xxxxxxxxx-xxxxxx. Acesso em 14 Maio 2021.
104 POPE, T.; XXXXXX, G.; XXXXXX, X. The Coronavirus Job Retention Scheme. Institute for government, London. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx/xxxxxxx/xxxxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxxxxxx-xxx-xxxxxxxxx- scheme_0.pdf. Acesso em 14 Maio 2021. p. 2.
Outra medida adotada pelo Reino Unido foi voltada para o trabalhador autônomo, por meio do programa “Self-employed Income Support Scheme”105, tradução “Esquema de Apoio à Renda do Trabalhador Autônomo”, apoiando todo o trabalhador autônomo que teve o lucro de sua atividade interferido pelos efeitos da pandemia, desde que tenham apresentado declaração de impostos de renda entre o período de 2019 - 2021, com lucros não superiores a £50.000. Por meio desse esquema, autônomos que tiveram 30% ou mais do seu lucro abalado, poderiam receber 80% dos lucros médios de suas negociações referentes a 3 meses, sendo o valor máximo a ser concedido de £7.500, já para os trabalhadores autônomos com menos de 30% de prejuízo em sua atividade, poderiam alcançar 30% dos lucros médios das suas negociações referentes a 3 meses, limitado ao valor de £2.850.
Frente as medidas adotadas pelo Reino Unido, os autores Amitrano, Xxxxxxxxx e Xxxxx 106 dissertam acerca da prioridade estabelecida conforme as estratégias adotadas, destacam que o ente busca atender de forma eficaz a manutenção das empresas:
[...] Vale notar ainda, que a maior parte dos recursos (78,2%) serão alocados sob a fora de empréstimos, garantias governamentais e aquisições patrimoniais de empresas pelo Estado britânico, distribuídos de forma relativamente equânime entre pequenas e médias (40,2%) e grandes empresas (38,7%). Por fim, os recursos diretos destinados aos empregados e trabalhadores autônomos parecem bastante modestos, sugerindo que a estratégia de garantia de emprego e renda será viabilizada, sobretudo, por meio do apoio às empresas.
Segundo a ILO, tradução OIT107, a Itália institui modalidades severas para contenção do contágio da COVID-19, para tanto restringiu a mobilidade de funcionários que laboravam em atividades não essenciais, enquanto os que prestavam serviços essenciais, para poderem locomover-se nas cidades, necessitavam preencher um formulário e entregar as autoridades em caso de
105 UNITED KINGDOM. Check if you can claim a grant through the Self-Employment Income Support Scheme. Londres: [2020?]. Disponível em xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxx-x-xxxxx- through-the-coronavirus-covid-19-self-employment-income-support-scheme. Acesso em 11 ago 2021.
106 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXXX, L., C., G., D.; XXXXX, M., S. Medidas de Enfrentamento dos efeitos econômicos da pandemia de COVID-19: panorama internacional e análise dos casos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Espanha. Repositório de Conhecimento do IPEA. Brasília, DF: 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/00000/0000. Acesso em 7 ago 2021. p. 49.
107 INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION (ILO). Measures adopted in Italy to support workers, families and enterprises during the COVID-19 emergency. Genebra: ILO, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxx0/xxxxxx/xxxxxx/---xxxxxx/---xx-xxxxxx/---xxx- rome/documents/genericdocument/wcms_740211.pdf. Acesso em 11 ago 2021.
verificação. Em razão disso, o teletrabalho foi bastante incentivado, sendo que 8 milhões de pessoas migraram a forma de prestação de serviço para o modelo virtual, além da implementação das medidas governamentais já mencionadas para prestar auxílio a trabalhadores que foram impedidos de laborar, assim evidente que as políticas públicas voltadas a manutenção do emprego e a renda tornavam-se essenciais.
Por isso no país foram adotados sistemas parecidos com os adotados no Reino Unido, tendo os empregados o salário garantido mesmo em períodos de interrupção temporária das atividades empresariais devido às dificuldades econômicas, estendendo a medida para todos os setores, independente do porte da empresa, somente não sendo aplicado ao trabalho doméstico.
Podemos visualizar a materialização desses instrumentos no Decreto-Legge nº 18108, de 17 de março de 2020, que durante os períodos de suspensão das atividades, oportunizou que empregados recebessem 80% dos seus rendimentos, com limite de até £1.200. Tal decreto também proibiu que empresas efetuassem demissões individuais por motivos econômicos enquanto perdurasse a crise pandêmica, após o Decreto-Legge nº 73109, de 25 de maio de 2021, institui essa proibição apenas para empresas que aderissem aos programas de auxílio para pagamento da folha de pagamento dos funcionários.
Outros mecanismos para manutenção das verbas salariais foram instituídos, como no Decreto-Legge nº 104110, de 14 de agosto de 2020, em que as empresas
108 ITALIA. Decreto-Legge nº 18, 17 março 2020. Misure di potenziamento del Servizio sanitario nazionale e di sostegno economico per famiglie, lavoratori e imprese connesse all'emergenza epidemiologica da COVID-19. Roma: Il Presidente Della Repubblica Italiana, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxx.xx/xxx/xx/0000/00/00/00X00000/xx. Acesso em 11 Ago 2021.
109 ITALIA. Decreto-Legge nº 73, 25 maio 2021. Misure urgenti connesse all'emergenza da COVID-19, per le imprese, il lavoro, i giovani, la salute e i servizi territoriali. Roma: Il Presidente Della Repubblica Italiana, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxx.xx/xxx/xx/0000/00/00/00X00000/xx. Acesso em 11 Ago 2021.
110 “2. Le ulteriori nove settimane di trattamenti, di cui al comma 1, sono riconosciute esclusivamente ai datori di lavoro ai quali sai stato gia' interamente autorizzato il precedente periodo di nove settimane, decorso il periodo autorizzato. I datori di lavoro che presentano domanda per periodi di integrazione relative alle ulteriori nove settimane di cui al comma 1 versano un contributo addizionale determinato sulla base del raffronto tra il fatturato aziendale del primo semestre 2020 e quello del correspondente semestre 2019, pari: a) al 9 per cento della retribuzione globale che sarebbe spettata al lavoratore per le ore di lavoro non prestate durante la sospensione o riduzione dell'attivita' lavorativa, per i datori di lavoro che hanno avuto una riduzione del fatturato inferiore al venti per cento; b) al 18 per cento della retribuzione globale che sarebbe spettata al lavoratore per le ore di lavoro non prestate durante la sospensione o riduzione dell'attivita' lavorativa, per i datori di lavoro che non hanno avuto alcuna riduzione del fatturato.” ITALIA. Decreto-Legge nº 104, 14 agosto 2020. Misure urgenti per il sostegno e il rilancio dell'economia. Roma: Il Presidente Della Repubblica Italiana, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxx.xx/xxx/xx/0000/00/00/00X00000/xx. Acesso em 11 Ago 2021.
que tiveram suas atividades suspensas receberam auxílio para pagamento das verbas salariais, como forma de complemento salarial, desde que comprovassem a redução do volume de negócios. O auxílio foi repassado proporcionalmente à abrangência da redução, nos termos do parágrafo segundo da referida legislação:
2. As nove semanas adicionais de tratamentos, a que se refere o n.º 1, são reconhecidas exclusivamente aos empregadores para os quais o período das nove semanas anteriores já tenha sido integralmente autorizado, depois de decorrido o prazo autorizado. Os empregadores que se candidatam a períodos de integração relativos às nove semanas adicionais referidas no n.º 1 pagam uma contribuição adicional determinada com base na comparação entre o volume de negócios da empresa no primeiro semestre de 2020 e o do semestre correspondente de 2019, igual a : a) 9 por cento da remuneração total que teria sido devida ao trabalhador pelas horas não trabalhadas durante a suspensão ou redução da atividade laboral, para os empregadores que tiveram redução do volume de negócios inferior a vinte por cento; b) 18 por cento do total da remuneração que teria sido devida ao trabalhador pelas horas não trabalhadas durante a suspensão ou redução da atividade laboral, para os empregadores que não tiveram redução do volume de negócios. (Tradução nossa)
Em tese, a maioria das medidas adotadas pela Itália buscaram apoiar a manutenção de empresas durante a crise econômica proporcionada pela pandemia de COVID-19, permitindo a dispensação de créditos e auxílios, Cadó e Borsari111 definem de forma resumida as condutas adotadas pelo país:
Entra as medidas, estão a suspensão do pagamento de hipotecas, proibição de despedidas por dois meses, extensão licença parental, auxílio direto de 500 euros aos trabalhadores por conta própria, facilitação das condições de crédito para as empresas mais afetadas, suporte financeiro para famílias com filhos em casa e trabalhadores que continuam a trabalhar para prover serviços essenciais (taxistas, correios, etc.)
Na Espanha, por fim, o Ministerio de Asuntos Económicos y Transformación Digital112 anunciou uma postura de modo a garantir reforço ao sistema de saúde,
111 CADÓ, I.; XXXXXXX, X. Medidas de amparo ao trabalho e à renda frente à pandemia do coronavírus: comparativo internacional. CESIT Unicamp Textos para discussão, v.1, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/Xxxxx-xxxxxx-x-xxx-x-xxxx-xxxxx-0-0.xxx. Acesso em 9 ago 2021. p. 5.
112 ESPAÑA. Ministerio de Asuntos Económicos y Transformación Digital. Medidas Económicas Adoptadas por el Gobierno De España Frente a la Pandemia del Covid-19. Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/0000/00000000_xxxxxxx_xxxxxxxxx s_COVID19.pdf. Acesso em 7 ago 2021.
além de apoiar famílias, trabalhadores, pessoas em situação vulnerável e o setor empresarial. O país incentivou o teletrabalho como a principal forma de prestação de serviços durante a pandemia, assim estabelecido no artigo 5º do Real Decreto-ley nº 8113, de 17 de março de 2020, que prioriza sua aplicação em relação à suspensão temporária ou redução da atividade. De outra monta, o artigo 11º do Real Decreto- ley nº 7114, de 12 de março de 2020, considerou a contágio por COVID-19 como um acidente de trabalho, permitindo que os empregados se socorressem do subsídio de invalidez temporária.
Ainda, o Real Decreto-ley nº 8115, em seus artigos 22º a 28º, instituiu medidas que flexibilizaram o contrato de trabalho, permitindo sua suspensão ou a redução da jornada de trabalho para aquelas atividades afetadas pela COVID-19 com o objetivo de evitar a demissão em massa. Para tanto, aos trabalhadores abrangidos por tal flexibilização, seriam beneficiados com uma espécie de seguro-desemprego, financiado pela Segurança Social do país e não teriam o período em questão contabilizado como tempo de serviço, assim preconiza o artigo 25º:
Artigo 25.º Medidas extraordinárias relativas à proteção no desemprego em aplicação dos procedimentos a que se referem os artigos 22.º e 23.º. 1. Nos casos em que a empresa decida suspender os contratos ou reduzir temporariamente a jornada de trabalho pelas causas previstas no artigo 47º do texto revisto do Estatuto do Trabalhador, com base nas circunstâncias extraordinárias reguladas neste decreto-lei real, o Serviço Público Estadual de Emprego e, quando for o caso, o Instituto Social da Marinha, adotarão as seguintes medidas:
113 ESPAÑA. Real Decreto-Ley nº8, de 17 de marzo de 2020. Medidas urgentes extraordinarias para hacer frente al impacto económico y social del COVID-19. Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxx.xxx?xxxXXX-X-0000-0000. Acesso em 12 ago 2021.
114 ESPAÑA. Real Decreto-Ley nº7, de 12 de marzo de 2020. por el que se adoptan medidas urgentes para responder al impacto económico del COVID-19. Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxx.xxx?xxxXXX-X-0000-0000. Acesso em 12 ago 2021.
115 “Artículo 25. Medidas extraordinarias en materia de protección por desempleo en aplicación de los procedimientos referidos en los artículos 22 y 23. 1. En los supuestos en que la empresa decida la suspensión de contratos o la reducción temporal de la jornada de trabajo por las causas previstas en el artículo 47 del texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores, con base en las circunstancias extraordinarias reguladas en este real decreto-ley, el Servicio Público de Empleo Estatal y, en su caso, el Instituto Social de la Marina, adoptarán las siguientes medidas: a) El reconocimiento del derecho a la prestación contributiva por desempleo, regulada en el título III del texto refundido de la Ley General de la Seguridad Social, aprobado por el Real Decreto Legislativo 8/2015, de 30 de octubre, a las personas trabajadoras afectadas, aunque carezcan del período de ocupación cotizada mínimo necesario para ello.b) No computar el tiempo en que se perciba la prestación por desempleo de nivel contributivo que traiga su causa inmediata de las citadas circunstancias extraordinarias, a los efectos de consumir los períodos máximos de percepción establecidos.” ESPAÑA. Real Decreto-Ley nº8, de 17 de março de 2020. Medidas urgentes extraordinarias para hacer frente al impacto económico y social del COVID-19. Madrid: 2020.
Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxx/xxx.xxx?xxxXXX-X-0000-0000. Acesso em 12 ago 2021.
a) O reconhecimento do direito ao subsídio de desemprego contributivo, regulado no título III do texto consolidado da Lei Geral da Segurança Social, aprovado pelo Real Decreto Legislativo n.º 8/2015, de 30 de outubro, aos trabalhadores afetados, mesmo que estes não os tenham o período mínimo de ocupação cotado necessário para isso.
b) Não computar o tempo em que é recebido o subsídio de desemprego contributivo que dá origem imediata às referidas circunstâncias extraordinárias, de forma a consumir os períodos máximos de percepção estabelecidos. (Tradução nossa).
Além dessa flexibilização, o governo tomou a cautela de impedir que empresas efetuassem demissões durante a crise, situação fixada pelo Real Decreto- ley nº 10116, de 29 de março de 2020. Cabe mencionar, para finalizar, que trabalhadores autônomos que tiveram diminuição da produção de sua atividade em 75%, também foram beneficiados com auxílio de no mínimo £661 por mês, trabalhadoras domésticas também foram beneficiadas com auxílio de 70% da base de contribuição, tendo limite em um salário-mínimo, conforme a regulamentação do Real Decreto-ley nº 11117, de 31 de março de 2020.
3.3 Principais modificações legislativas provocadas pela pandemia no Brasil no âmbito trabalhista
Como se verificou, em diversos países a pandemia de COVID-19 estimava um grande alcance de seus efeitos negativos, fazendo com que várias nações tomassem partido para evitar abalos em proporções exuberadas. No Brasil não seria diferente, tanto que alguns autores, como Meireles118, criticam severamente determinadas medidas adotadas no período de calamidade, justificando que algumas normas colidem com o disposto na CF/88, ferindo assim a manutenção de direitos fundamentais dos trabalhadores, assim reflete o doutrinador:
116 ESPAÑA. Real Decreto-Ley nº10, de 29 de marzo de 2020. Regula un permiso retribuido recuperable para las personas trabajadoras por cuenta ajena que no presten servicios esenciales, con el fin de reducir la movilidad de la población en el contexto de la lucha contra el COVID-19.
Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxx_xxx/xxx.xxx?xxxXXX-X-0000-0000. Acesso em 12 ago 2021.
117 ESPAÑA. Real Decreto-Ley nº11, de 31 de marzo de 2020. Adoptan medidas urgentes complementarias en el ámbito social y económico para hacer frente al COVID-19. Madrid: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxx_xxx/xxx.xxx?xxxXXX-X-0000-0000. Acesso em 12 ago 2021.
118 XXXXXXXX, X. Direitos Fundamentais Trabalhistas na Pandemia e o Não Retrocesso Social. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- 2.pdf#page=92. Acesso em 13 ago 2021. p. 209.
Ora, o que o legislador constitucional estabeleceu, no art. 7º, foi uma série mínima e fundamental de direitos social-trabalhistas, preceituando, ainda, que outros direitos podem ser concedidos aos trabalhadores, desde que “visem à melhoria de sua condição social”. Daí se tem que não se pode admitir norma constitucional derivada (emenda) ou norma infraconstitucional que tenda a não gerar uma melhoria na condição social do trabalhador. Ela seria inconstitucional por justamente não preencher esse requisito constitucional da melhoria da condição social do trabalhador.
É certo que o Brasil, especificadamente, passou recentemente por modificações legislativas nos diplomas trabalhistas, o que impactaram diretamente na prestação laborativa, é o caso da nomeada Reforma Trabalhista ocorrida em 2017, pela Lei nº 13.467/17119. Xxxxxx e Santos120 estabelecem o cenário de modificações realizadas no Brasil:
O Brasil já experimentava desde 2017 a flexibilização das relações de trabalho. Logo após o último processo de impeachment presidencial, um movimento neoliberal trouxe à lume a Lei 13.429/17, que reformulou e ampliou significativamente a terceirização da prestação de serviços, permitindo-a inclusive nas atividades fins dos contratantes desde que por prazo determinado. Na sequência adveio a reforma trabalhista implementada pela Lei 13.467/17, que atingiu mais de uma centena de dispositivos da consolidação laboral, alterando-os, revogando-os e flexibilizando-os. Pouco tempo depois, sob a égide da “liberdade econômica” garantida pelo art. 170 da Constituição brasileira, o Congresso aprovou a Medida Provisória 881/2019, convertendo-a na Lei 13.874/2019. Flexibilizando-se assim, entre outros pontos, a relevância de controle diário do horário de trabalho.
Diante desse panorama de modificações, o Brasil entra em situação pandêmica. O que é possível apurar, entretanto, das ações tomadas por diversos países no mundo, é uma tentativa de manutenção da economia, pois como já mencionado uma economia fortalecida é consequência de pessoas empregadas e com renda. Visivelmente as condutas tomadas durante esse momento histórico não tiveram o objetivo de retirar direitos já consolidados, obviamente ocorreram em
119 BRASIL. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis n º 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Brasília, DF: Presidência da República, 2017. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/x00000.xxx. Acesso em 14 ago 2021.
120 YUNIS. J. E. D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região, São Paulo: n. 25, p. 92-102, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/000000000/00000. Acesso em 28 Abr 2021. p. 93.
determinados momentos flexibilizações que se justificam pela forma como os efeitos de uma pandemia se propagaram.
Ainda assim, percebemos que tais flexibilizações sempre mantiveram duas facetas, por exemplo, se por um lado reduziam-se ou suspendiam-se os contratos de trabalhado, por outro tentava-se manter a renda desses trabalhadores através de benefícios governamentais na expectativa de manter ativo os contratos de trabalho. Portanto, tais condutas não ferem a condição social do trabalhador, e, podemos inclusive dizer que pretendem a perfectibilização do princípio da continuidade do contrato de trabalho.
No Brasil houve alterações juslaborativas significativas, conforme exposto no banco de dados da ILO, tradução OIT121, foram emitidas MPs de emergência para atender as necessidades provocadas pela pandemia, tanto para proteção da renda, emprego e regulação do teletrabalho, quanto para apoio financeiro através de financiamentos para empresas. Segundo o IBGE122, 21,4% das empresas em funcionamento, na segunda quinzena de agosto de 2020, adotaram pelo menos uma medida com apoio do governo. Inclusive, dados também fornecidos pelo IBGE, estimam que 61,6% das empresas conseguiram uma linha de crédito emergencial para pagamento da folha salarial com apoio do governo.
Considerando uma linha histórica, a primeira legislação que atingiu empregados e empregadores foi a Lei nº 13.979/2020123, que no artigo 2º definiu o conceito de quarentena, se referindo ao distanciamento de pessoas suspeitas de contaminação, e, de isolamento, que se destina aos enfermos contaminados pela COVID-19, além de prever sua adoção tornando as faltas ao trabalho como justificadas, nos termos do artigo 3º, §3º da referida lei. Advertem os autores Pamplona Filho e Fernandez124 quanto ao enquadramento das faltas justificadas:
121 INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION (ILO). COVID-19 and the world of work: Country policy responses. Genebra: ILO, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxxx/xxxx-- en/index.htm#BR. Acesso em 15 Maio 2021.
122 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Indicadores de
Empresas. Rio de Janeiro: IBGE, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx00.xxxx.xxx.xx/xxxxx-xxxxxxx/. Acesso em 11 Maio 2021.
123 BRASIL. Lei nº 13.979, 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/x00000.xxx. Acesso em 4 ago 2021.
124 PAMPLONA FILHO, X.; XXXXXXXXX, X. Panorama das Alterações Trabalhistas Durante a Pandemia da COVID-19. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020.
[...] não será o receio quanto a eventual possibilidade de contaminação o elemento autorizador da ausência ao serviço. A justificativa para a falta apenas estará presente no caso de encontrar-se o trabalhador sujeito a alguma das medidas arroladas no art. 3º da legislação em comento.
Além disso, o ato normativo impôs em seu artigo 3º-B que estabelecimentos em funcionamento deveriam fornecer gratuitamente a funcionários e colaboradores máscaras de proteção individual, bem como elencou no artigo 3º-J, §1º as profissões essenciais para manutenção da ordem pública, tais como as da área da saúde, da limpeza, da alimentação entre outros. Tal definição permitiu que muitas atividades, consideradas não essenciais tivessem uma paralisação em seu atendimento nos momentos mais críticos da pandemia de COVID-19.
Posteriormente, no âmbito trabalhista merecem destaque algumas legislações instituídas de forma emergencial, é o caso da MP nº 927 de 22 de março de 2020125, que previu mecanismos sem precedentes justificando-se encaixar em condutas de força maior, conforme estabelecido no artigo 501 da CLT. Já no artigo 2º da MP é perceptível que os acordos individuais realizados entre empregador e empregado no período de calamidade foram hierarquizados frente a legislação e as normas coletivas, assim determinou sua redação:
Art. 2º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.
Além disso, a medida instituiu a possibilidade de migração da forma da prestação de serviço presencial para o ambiente virtual através do teletrabalho para contenção da disseminação da COVID-19 e preservação dos empregos, conforme preconiza seu artigo 4º, dispensando o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho, que poderia ser realizado até 30 dia após a data de alteração do regime de trabalho. A alteração pode ser aplicada inclusive para aprendizes e estagiários, necessitando ser avisada apenas com 48 horas de antecedência.
Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx- coronavirus-2.pdf#page=92. Acesso em 13 ago 2021. p. 474.
125 BRASIL. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para xxxxxxxxxxxxx xx xxxxxx xx xxxxxxxxxx xxxxxxx. Xxxxxxxx, XX: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/xxx000.xxx. Acesso em 15 Maio 2021.
Outra disposição da medida regulamentou a antecipação das férias individuais, prevista em seus artigos 6º ao 10º, permitindo a comunicação de férias com antecedência de apenas 48 horas que deveriam ser concedidas pelo período mínimo de 5 dias corridos, podendo ser beneficiado mesmo aquele empregado que ainda não tivesse cumprido o período aquisitivo. Além disso, em relação à antecipação de férias, quanto ao pagamento pode ser realizado até o quinto dia útil do mês subsequente ao de início do gozo das férias, e, o terço constitucional podendo ser pago até dezembro de 2020 mesmo que as férias já tivessem sido usufruídas, modificando totalmente as normas existentes.
A MP nº 927/2020 também previu em suas disposições acerca da concessão de férias coletivas, instituindo em seus artigos 11 e 12 exceções às disposições da CLT, permitindo comunicação de férias com antecedência mínima de 48 horas e dispensando a comunicação prévia ao Ministério da Economia e ao sindicato da categoria profissional. Já no artigo 13, permitiu-se o aproveitamento e antecipação de feriados, ou seja, possibilitando ao empregador antecipar a fruição de feriados não religiosos, federais, estaduais, distritais e municipais. Ainda, conforme as disposições do artigo 14 da medida, permitiu-se a constituição de bancos de horas dos períodos de interrupção das atividades, podendo ser compensado no prazo de até 18 meses após o encerramento do estado de calamidade, desde que estabelecido por acordo individual.
Outras medidas implementadas pela MP ainda podem ser citadas como a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, diferimento de recolhimento do FGTS, sendo suspensos a exigibilidade de depósito nos meses de março a maio de 2020 e ampliando seu prazo para o pagamento, entre outros. De maneira geral, Santos126 evidencia os principais aspectos da norma, cujo objetivo precípuo foi permitir o teletrabalho através de acordos individuais entre empregado e empregador enquanto perdurasse o estado de calamidade pública, além de permitir que:
[...] empresas avançassem as férias individuais concedessem férias coletivas aos empregados, flexibilizassem as regras existentes,
126 XXXXXX, X. X. X. X. Reflexões da incidência da pandemia no direito do trabalho. Direito em Movimento, [S.l.], v. 18, n. 3. 2021. Disponível em: xxxx://xxxxx.xxx.xx/xxx/xxxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em: 15 maio 2021. p. 228 e 229.
antecipassem feriados não religiosos e usassem os bancos de horas para compensar o período de desligamento [...]
A medida foi duramente criticada, pois o empregador tinha liberdade para adotar uma série de medidas de forma unilateral, fazendo que com o esvaziamento do seu prazo de vigência em 19 de julho de 2020 não fosse convertida em lei, perdendo a validade. Inclusive o governo foi acusado de não estar preocupado eficientemente com a superação da crise, apenas aliviando o caixa econômico de empresas, como compõe a crítica emitida pelo XXXXXX000:
Em algumas iniciativas, como parece ser, infelizmente, o caso brasileiro, o Estado intervém principalmente como mediador de ações entre os atores sociais e com reduzido papel de protagonista na mobilização de fundos públicos para o enfrentamento da crise. O Ministério da Economia está mais preocupado, por exemplo, em fazer avançar nova (a terceira) reforma trabalhista, reduzindo ainda mais os salários e benefícios para aliviar o caixa das empresas, em vez de injetar recursos para tratar da anemia enfrentada pela economia brasileira nos últimos anos. Este foi o tom das primeiras medidas anunciadas, em 16 de março e persiste na recente Medida Provisória, de domingo, 22 de março (MP 927).
Sendo assim, rapidamente o governo brasileiro adotou outra medida buscando reverter a situação, resultando na criação da MP nº 936 de 1º de abril e 2020128, convertida na Lei 14.020/2020129, nas palavras de Xxxxx e Silva130, tendo como objetivo a preservação do emprego, da renda e da atividade econômica.
127 DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS
(DIEESE). Nota técnica nº 224: Medidas adotadas por vários países para conter os efeitos econômicos da pandemia do coronavírus. São Paulo: DIEESE, 2020. Disponível em: https://xxx.xxxxxx.xxx.xx/notatecnica/2020/notaTec224MedidasPaises.html#:~:text=DIEESE%20%2 D%20nota%20t%C3%A9cnica%20%2D%20NT%20n%C2%BA,pandemia%20do%20coronav%C3%A Drus%20%2D%20mar%C3%A7o%2F2020&text=sociais%20da%20crise%20gerada%20pela%20pan demia%20do%20Covid%2D19.&text=acr%C3%A9scimos%20com%20as%20medidas%20adotadas% 20por%20outros%20pa%C3%ADses.&text=para%20conter%20a%20crise%2C%20em%20sess%C3
%A3o%20espec%C3%ADfica%20no%20final%20do%20texto. Acesso em 14 ago 2021.
128 BRASIL. Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020. Institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para xxxxxxxxxxxxx xx xxxxxx xx xxxxxxxxxx xxxxxxx. Xxxxxxxx, XX: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/xxx000.xxx. Acesso em 15 Maio 2021.
129 BRASIL. Lei nº 14.020, de 6 de julho de 2020. Institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda; dispõe sobre medidas complementares para enfrentamento do estado de calamidade. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/xxx/X00000.xxx. Acesso em 15 Maio 2021.
130 XXXXX, X. X. X.; XXXXX, S. C. D. Covid-19 e Mudanças Trabalhistas: as implicações da pandemia nas relações de trabalho. Revista Processus de Políticas Públicas e Desenvolvimento Social, [S.l.], v. 2, n. 4. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/xxxx/xxxxxxx/xxxx/000/000.
Acesso em 15 Maio 2021. p. 122.
A referida lei, instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda possibilitando a suspensão temporária de contratos de trabalho e a redução proporcional de jornadas através de negociação entre empregado e empregador, este programa, objeto de estudo do presente trabalho, será devidamente detalhado em capítulo próprio. Pode-se dizer ainda que através desta legislação o governo brasileiro também institui o BEm para realizar o pagamento da folha dos empregados que tiveram seus contratos suspensos ou reduzidos, como apoio à manutenção das empresas, de forma semelhante aos programas instituídos em países do continente europeu.
Cronologicamente, outra medida legislativa adotada de forma emergencial foi a MP nº 945131 de 4 de abril de 2020, que hoje está convertida na Lei 14.047/2020132 com pequenas modificações do texto original, que regulamentou questões atinentes aos trabalhadores portuários. Com tendência a evitar a proliferação do vírus, a medida proibiu que portuários avulsos sintomáticos e aqueles pertencentes ao grupo de risco fossem escalados para trabalho, Pamplona Filho e Fernandez133 ressaltam que a medida provoca grandes consequências na remuneração desses trabalhadores, portanto o artigo 3º da Lei disponibiliza a indenização compensatória mensal no valor de 70% sobre a média mensal do empregado que foi proibido de escalação, por intermédio do Órgão Gestor de Mão de Obra. Ainda, a referida legislação autoriza a livre contratação de trabalhadores por período determinado na falta de funcionários devido ao afastamento obrigatório.
131 BRASIL. Medida Provisória nº 945, de 4 de abril de 2020. Dispõe sobre medidas temporárias em resposta à pandemia decorrente da covid-19 no âmbito do setor portuário e sobre a cessão de pátios sob administração militar. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/Xxx/xxx000.xxx. Acesso em 14 ago 2021.
132 BRASIL. Lei nº 14.047, de 24 de agosto de 2020. Dispõe sobre medidas temporárias para enfrentamento da pandemia da Covid-19 no âmbito do setor portuário, sobre a cessão de pátios da administração pública e sobre o custeio das despesas com serviços de estacionamento para a permanência de aeronaves de empresas nacionais de transporte aéreo regular de passageiros em pátios da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); e altera as Leis nºs 9.719, de 27 de novembro de 1998, 7.783, de 28 de junho de 1989, 12.815, de 5 de junho de 2013, 7.565, de
19 de dezembro de 1986, e 10.233, de 5 de junho de 2001. Brasília, Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/Xxx/X00000.xxx. Acesso em 14 ago 2021.
133 PAMPLONA FILHO, X.; XXXXXXXXX, X. Panorama das Alterações Trabalhistas Durante a Pandemia da COVID-19. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020.
Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx- coronavirus-2.pdf#page=92. Acesso em 13 ago 2021. p. 483.
Em resumo, as principais medidas adotadas na vigência do estado de calamidade foram a MP nº 927/2020 e a nº 936/2020, que nas palavras de Xxxxxxxx Xxxxx e Fernandez134:
A primeira veiculou uma série de providências que, como regra, podem ser adotadas unilateralmente pelo empregador, nomeadamente o teletrabalho, a antecipação de férias, a concessão de férias coletivas, a antecipação de feriados e uma peculiar configuração do banco de horas. A seu turno, a MP n.º 936/20 consagrou duas delicadas possibilidades: a redução proporcional de jornada e de salário e a suspensão contratual. Os impactos financeiros sofridos pelo trabalhador serão minorados em razão do pagamento do Benefício Emergencial pela União Federal.
Cabe ainda ressaltar que, apesar de o PEMER, constituído pela MP nº 936/2020 ser instituído com prazo de vigência que findou em 31 de dezembro de 2020, recentemente, devido ao avanço da doença no Brasil, houve a promulgação de uma nova medida que instituiu o “Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda”, a MP nº 1.045135 de 27 de abril de 2021, nos mesmos moldes da Lei nº 14.020, com previsões muito parecidas, mas com certos adicionais e modificações.
No que tange a renovação do PEMER, a medida foi bastante semelhante às disposições trazidas pela Lei 14.020/2020, ampliando o seu prazo de duração e trazendo disposições acerca da concessão do benefício para empregadas gestantes. Além disso, de forma divergente da originalmente pactuada a nova medida impede trabalhadores com contratos intermitentes de participarem do programa.
Entretanto, no dia 10 de agosto de 2021, a Câmara de Deputados aprovou sua versão final com emendas tanto polêmicas que instituem programas de primeiro emprego e qualificação profissional, mudanças na CLT e limitações no acesso à gratuidade de justiça no âmbito trabalhista. Tais alterações, entretanto ao serem
134 PAMPLONA FILHO, X.; XXXXXXXXX, X. Panorama das Alterações Trabalhistas Durante a Pandemia da COVID-19. In Direitos e Deveres Fundamentais em Tempo de Coronavirus org. Xxxxx Xxxx Xxxxxx Bahia e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Editora Iasp, v. 2, 2020.
Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/xxxxx-xxxxxxxx- coronavirus-2.pdf#page=92. Acesso em 13 ago 2021. p. 487.
135 BRASIL. Medida Provisória nº 1.045, de 27 de abril de 2021. Institui o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas complementares para enfrentamento da situação de emergência decorrente do coronavírus. Brasília, DF: Presidência da República, 2020. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/XXXXXX_00/_Xxx0000- 2022/2021/Mpv/mpv1045.htm. Acesso em 18 Maio 2021.
remetidos ao Senado Federal, resultaram na sua rejeição. A Agência Câmara de Notícias136 divulgou a pretensão de determinadas emendas:
Um dos temas incluídos na MP por Xxxxxxxxx Xxxxx é a limitação do acesso à Justiça gratuita apenas para aqueles que tenham renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal de até três salários mínimos. Se o texto virar lei, a declaração da pessoa não bastará, devendo o interessado provar essa condição por meio de comprovante de habilitação no CadÚnico do governo federal para programas sociais. [...] O texto-base do relator também cria o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), direcionado a jovens entre 18 e 29 anos, no caso de primeiro emprego com registro em carteira, e a pessoas com mais de 55 anos sem vínculo formal há mais de 12 meses. [...] A remuneração máxima será de até dois salários mínimos, e o empregador poderá compensar com o repasse devido ao Sistema S até o valor correspondente a 11 horas de trabalho semanais por trabalhador com base no valor horário do salário mínimo. No total, a empresa poderá descontar até 15% das contribuições devidas ao sistema de aprendizagem (Sesi, Senai, Senac e outros). Esse percentual vale para o bônus desse programa e também do programa de requalificação (Requip).
Embora o projeto não tenha sido aprovado pelo Senado, para ampliar o debate, mostra-se oportuno detalhar acerca de dois programas estipulados pelo texto aprovado pela Câmara de Deputados, o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (PRIORE) e Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (REQUIP).
De acordo com o Projeto de emendas à MP nº 1.045137, o PRIORE tinha como um dos objetivos reduzir a taxa de desocupação, principalmente de jovens com idade entre 18 e 29 anos e pessoas com mais de 55 anos que estivessem fora do mercado de trabalho há mais de 12 meses. As empresas poderiam contratar pessoas por meio do programa até 25% do total de empregados. O programa previu contratos de trabalho por prazo determinado, por até 24 meses, sendo automaticamente convertidos para prazo indeterminado quando ultrapassar o limite
136 AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS – CÂMARA DOS DEPUTADOS. Deputados aprovam texto-
base de MP sobre suspensão de contratos de trabalho. Brasília, DF: 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/000000-xxxxxxxxx-xxxxxxx-xxxxx-xxxx-xx-xx-xxxxx-xxxxxxxxx- de-contratos-de-trabalho/. Acesso em 14 ago 2021.
137 BRASIL. Parecer às Emendas de Plenário à MPV nº 1.045, de 2021. Instituiu o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas complementares para o enfrentamento das consequências da emergência de saúde pública de importância internacional xxxxxxxxxx xx xxxxxxxxxxx (xxxxx-00) xx xxxxxx xxx xxxxxxxx xx xxxxxxxx. Xxxxxxxx, XX: Câmara de Deputados, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxXxx/xxxx_xxxxxxxxxxxxxx?xxxxxxxx0000000&xxxxxxxxxXxxxxx r-MPV104521-10-08-2021. Acesso em 14 ago 2021.
imposto, nos termos o artigo 28 da proposta. Além disso, a proposta modificava o percentual a ser depositado em razão de FGTS variando conforme o porte da empresa contratante, sendo 2% para microempresas, 4% para empresas de pequeno porte e 6% para as demais empresas, de acordo com o artigo 30 da proposta. Garantia o projeto que trabalhadores contratados pelo programa deveriam ter resguardados os direitos constituídos na CF/88 e na CLT.
Já o REQUIP tinha como finalidade garantir emprego àqueles sem vínculo formal a mais de dois anos e jovens entre 18 e 29 anos beneficiários do Bolsa Família com renda familiar até 2 salários-mínimos, sendo oportunizado qualificação profissional. De acordo a Agência Câmara de Notícias138 “o programa prevê o pagamento de bônus pelo trabalho em jornadas semanais de até 22 horas (BIP) e de uma bolsa por participação em cursos de qualificação de 180 horas ao ano (BIQ).”, a adesão a esse programa não geraria vínculo empregatício de acordo com o artigo 45 do Projeto, o bônus percebido seria considerado indenização, portanto o período trabalhado não seria considerado para qualquer fim trabalhista.
Os programas sugeridos com as emendas da MP nº 1.045 geraram bastantes embates legislativos, que resultaram na sua rejeição.
Mais uma medida adotada refere-se a MP nº 1.046139 de 27 de abril de 2021, que teve vigência até 7 de setembro de 2021, não sendo confirmada após isso por nenhuma lei superveniente. Tal norma trouxe disposições semelhantes à MP nº 927, podendo ter suas medidas aplicadas por todas as empresas privadas, regulou o teletrabalho de maneira excepcional, a antecipação de férias individuais, a concessão de férias coletivas, o aproveitamento e antecipação de feriados e o banco de horas, além de permitir a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho e o diferimento do recolhimento do FGTS.
No que tange ao teletrabalho, a MP nº 1.046, enquanto vigente previu a possibilidade de alteração da forma de prestação de serviço do empregado de presencial para o teletrabalho independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos. Ademais, dispensou o registro prévio de alteração no
138 AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS – CÂMARA DOS DEPUTADOS. Deputados aprovam texto-
base de MP sobre suspensão de contratos de trabalho. Brasília, DF: 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/000000-xxxxxxxxx-xxxxxxx-xxxxx-xxxx-xx-xx-xxxxx-xxxxxxxxx- de-contratos-de-trabalho/. Acesso em 14 ago 2021.
139 BRASIL. Medida Provisória nº 1.046, de 27 de abril de 2021. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Brasília, DF: Presidência da República, 2021. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000-0000/0000/Xxx/xxx0000.xxx. Acesso em 07 out 2021.
contrato do empregado, desde que esse fosse comunicado com 48 horas de antecedência.
Em relação às férias, a medida permitiu a concessão de férias individuais e coletivas de maneira antecipada antes que o empregado completasse o período aquisitivo, permitindo o gozo de férias não inferiores a 5 dias corridos, ato formalizado através de acordo individual escrito, também priorizou que trabalhadores do grupo de risco da COVID-19 fossem contemplados com as férias. Ainda em relação às férias, modificou os prazos tradicionais para pagamentos das verbas, permitindo que fossem adimplidas após a concessão do período até o prazo em que fosse devida a gratificação natalina. No que se refere as férias coletivas, dispensou a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e sindicatos representativos da categoria profissional.
A norma também regulamentou a possibilidade de aproveitamento e antecipação de feriados federais, estaduais, distritais e municipais inclusive religiosos, sendo necessária a notificação da empresa com 48 horas de antecedência aos empregados. Quanto ao banco de horas, a medida permitiu sua realização por meio de acordo individual ou coletivo escrito para a compensação no prazo de até 18 meses após o fim da vigência da medida. Assim, os empregadores puderam definir a recuperação do tempo em que as atividades empresarias foram interrompidas por meio da prorrogação da jornada de trabalho dos funcionários em até 2 horas, não podendo exceder 10 horas diárias, também permitindo sua realização em finais de semana.
A partir dos programas indicados e adotados, percebe-se que o Brasil mantém como objetivo principal a manutenção ou reestabelecimento de empregos, buscando amenizar os impactos da pandemia de COVID-19 e diminuir as taxas de desocupação. Demonstra-se necessário atenção às mudanças, para que ocorra o diálogo sobre seus possíveis efeitos, pois mesmo que em prol da economia, não se deve permitir que se provoquem um retrocesso social capaz de mitigar por completo direitos trabalhistas já adquiridos, pois afetaria diretamente o Estado Democrático de Direito instituído pela CF/88.
Certo é que não se pode equivaler à sociedade de 1988 com a de agora e flexibilizações tendentes a garantir os direitos sociais sempre são bem-vindas, considerando os abalos produzidos pela pandemia não se pode esperar cenário diferente, mas o que se defende no presente trabalho é a manutenção de um
equilíbrio sem aniquilar os direitos fundamentais de dignidade da pessoa humana que serve como núcleo para tomada de decisões.
Ao longo do capítulo, verificou-se a forma de impactos gerados pela pandemia da COVID-19 em relação a economia e na seara trabalhista. Assim, foram elencados os programas adotados em países do continente europeu e a forma como se assemelham aos adotados no Brasil, também se analisou as modificações legislativas que a pandemia incentivou no Brasil tanto na área econômica quanto na área trabalhista. Por fim, far-se-á no último capítulo um estudo aprofundando do PEMER, com a explanação de seus objetivos e seus reflexos práticos, bem como uma reflexão quanto sua eficácia.
4 O PROGRAMA EMERGENCIAL DE MANUTENÇÃO DO EMPREGO E DA RENDA DA LEI 14.020/2020
No presente capítulo, estudar-se-á de forma específica as medidas adotadas pela Lei 14.020/2020, principalmente em relação à aplicação normativa do PEMER e do BEm e seus reflexos em casos concretos. Inicialmente estuda-se a legislação que instituiu o programa objetivando uma análise comparativa entre os diplomas legais que instituíram o programa e suas diferenças. Em seguida, parte-se para uma análise dos reflexos da implementação da medida excepcional na prática trabalhista verificando as omissões presentes na Lei. Por fim, reflete-se se os objetivos do programa restaram efetivados como protetor dos postos de trabalho e preservador da economia de empresas.
4.1 Noções introdutórias, objetivos e alcances da Lei 14.020/2020
O PEMER surge em abril de 2020, instituído pelo Ministério da Economia, como uma política pública do governo federal visando a manutenção dos empregos e rendas frente a crise sanitária que impôs a paralisação de determinadas atividades. Inicialmente foi disciplinado pela MP nº 936/2020 como uma medida de emergência, na tentativa de conter um previsto aumento desenfreado no índice de desemprego no país em razão dos efeitos da pandemia, pode-se dizer que foi uma das alterações legislativas em relação ao direito do trabalho mais significativa do período. Em 6 de julho de 2020, a MP foi convertida na Lei nº 14.020 tornando definitivo os efeitos do programa.
O programa prevê o pagamento de benefício aos empregados que através de acordo com seus empregadores tiverem seus contratos suspensos ou sua carga horária reduzida, conforme bem elucida Athias e Barbosa140. Tal benefício, dependendo do tipo de regime adotado entre empregador e empregado, pode ser financiado em até 100% do salário pelos recursos da União.
140 ATHIAS, A. B. C.; XXXXXXX, J.R. Política Pública Emergencial e o Novo Mecanismo Transdisciplinar. Revista de Direitos Sociais e Políticas Públicas, [s.l.], v. 6, n. 2, P. 58 a 75. 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 06 Maio 2021. p. 59.
Entre a MP nº 936/2020 e a Lei nº 14.020/2020 poucas mudanças podem ser elencadas, mantendo-se os mesmos objetivos, as mesmas medidas e as mesmas disposições acerca da forma de recebimento do BEm e funcionamento do PEMER. Em tese a Lei surgiu para inovar quanto aos prazos de duração do programa permitindo ao Poder Executivo prorrogar os seus prazos e ratificar os efeitos já produzidos pela MP.
A maior modificação percebida entre os dois dispositivos legais encontra-se na estipulação de quem pode ser beneficiado com o programa. Xxxxxxxxx e Maciel141, de maneira simplificada estipulam:
[...] a publicação da Lei 14.020 do dia 07 de julho de 2020, veio a manter basicamente os mesmos critérios de elaboração dos acordos escritos, individuais ou coletivo, com a principal novidade dos limites salariais da redução para a realização dos acordos individuais.
A matéria ficou disciplina nos artigos 12 de cada norma, enquanto a Lei busca trazer um dispositivo mais abrangente para regular a questão, limitando a negociação individual para determinados empregados de acordo com os salários percebidos por esses e o faturamento da empresa, impondo também a negociação coletiva, através de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para quem não se enquadrasse nas hipóteses para negociação individual, a MP permitiu a adesão do PEMER de forma mais facilitada, é o que se pode perceber na comparação dos dois dispositivos:
Art. 12 da MP nº 936/2020. As medidas de que trata o art. 3º serão implementadas por meio de acordo individual ou de negociação coletiva aos empregados:
I - com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil cento e trinta e cinco reais); ou
II - portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
Parágrafo único. Para os empregados não enquadrados no caput, as medidas previstas no art. 3º somente poderão ser estabelecidas por convenção ou acordo coletivo, ressalvada a redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e cinco por cento, prevista na alínea “a” do inciso III do caput do art. 7º, que poderá ser pactuada por acordo individual.
141 XXXXXXXXX, X., de S.; XXXXXX, L., P. A suspensão do contrato e a redução da jornada de trabalho em tempos de pandemia. ETIC – Encontro de Iniciação Científica, [s.l.], v. 16, N. 16, 2020.
Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/XXXX/xxxxxxx/xxxx/0000. Acesso em 20 ago 2021. p. 2.
Art. 12 da Lei nº 14.020/2020. As medidas de que trata o art. 3º desta Lei serão implementadas por meio de acordo individual escrito ou de negociação coletiva aos empregados:
I - com salário igual ou inferior a R$ 2.090,00 (dois mil e noventa reais), na hipótese de o empregador ter auferido, no ano-calendário de 2019, receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais);
II - com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil, cento e trinta e cinco reais), na hipótese de o empregador ter auferido, no ano- calendário de 2019, receita bruta igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais); ou
III - portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a 2 (duas) vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 1º Para os empregados não enquadrados no caput deste artigo, as medidas de que trata o art. 3º desta Lei somente poderão ser estabelecidas por convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, salvo nas seguintes hipóteses, nas quais se admite a pactuação por acordo individual escrito:
I - redução proporcional de jornada de trabalho e de salário de 25% (vinte e cinco por cento), prevista na alínea “a” do inciso III do caput do art. 7º desta Lei;
II - redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou suspensão temporária do contrato de trabalho quando do acordo não resultar diminuição do valor total recebido mensalmente pelo empregado, incluídos neste valor o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, a ajuda compensatória mensal e, em caso de redução da jornada, o salário pago pelo empregador em razão das horas de trabalho. [...]
É possível referir ainda que no mesmo artigo no §5º da Lei 14.020/2020 há regulamentação quanto a hierarquia entre os acordos individuais e coletivos quando existentes simultaneamente, definindo que em caso de normas conflitantes devem prevalecer as do acordo individual quando estabelecido antes da negociação coletiva e, em situação inversa, devem prevalecer as normas da negociação coletiva. Em qualquer caso, o §6º também menciona que devem ser aplicáveis as condições que forem mais benéficas ao empregado em caso de conflito entre o acordo individual e o acordo coletivo, respeitando assim o princípio da prevalência da norma mais favorável ao trabalhador.
Para finalizar o comparativo entre os dois dispositivos legais, também é viável mencionar que a MP é concluída em seu artigo 20, enquanto a Lei a contar de seu artigo 20 inicia a regulamentação de questões relacionadas às alíquotas das contribuições facultativas da previdência e seguridade social, a possibilidade da empregada gestante em aderir ao PEMER, a oportunidade de repactuação de
operações de empréstimos e a possibilidade de efetivar financiamentos para empregados que aderiram ao programa ou demonstrem contaminação pela COVID- 19, além de trazer modificações em outros dispositivos legais.
Quanto ao programa em si, o artigo 2º da Lei 14.020/2020 estabelece os objetivos do PEMER, que busca: “I - preservar o emprego e a renda; II - garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; e III - reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública.” Nítido, portanto, que o Estado se preocupou para além dos trabalhadores, buscando manter o funcionamento de empresas e, com isso, conservar o giro econômico, além de também demonstrar preocupação com a saúde dos cidadãos, nesses termos concordam Bomfim et al142, quando expressam comentários ao artigo:
A norma institui um programa de preservação do emprego e renda para assegurar a continuidade das atividades laborais e empresariais com preservação de emprego e renda e redução do impacto social decorrente da calamidade. Esse dispositivo demonstra a relação direta entre o caráter econômico e social, não sendo possível sua desvinculação, uma vez que o Direito do Trabalho, fruto do modo capitalista, decorre da força de trabalho em prol da riqueza acumulada inserida na sociedade.
Para tanto, o PEMER possibilitou que empresas formulassem acordos com seus funcionários de modo que pudessem reduzir a carga horária laboral ou suspender totalmente o contrato durante período determinado. Assim o artigo 3º da Lei estipulou o objeto do PEMER, definindo como medidas do programa “I. o pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda; II. a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário; e III. a suspensão temporária do contrato de trabalho”, no parágrafo único do mesmo artigo também é excluída a possibilidade de adesão ao programa por órgãos da Administração Pública Direta e Indireta, ou seja, o programa direcionou-se exclusivamente as empresas de cunho privado.
O artigo 5º da Lei institui o BEm, indicando que seria pago em caso de “I. redução proporcional de jornada de trabalho e de salário; e II. Suspensão temporária
142 XXXXXX, X. et al. Lei 14.020/2020 Comparada e Comentada. [s.l.], 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/Xxx-00000-0000-Xxxxxxxxx-x- Comentada-Volia-Bomfim-Dallegrave-Neto-Xxxxxx-Xxxxxxx-Xxxx-Xxxxxxxx.pdf. Acesso em 20 ago 2021.
p. 5.
do contrato de trabalho”, ficando claro em seu §1º que tal benefício seria custeado pelos recursos da União. Ainda, o referido artigo regulamenta no §2º a forma como o BEm será oferecido, sendo de prestação mensal devido a contar da redução da jornada de trabalho ou suspensão temporária do contrato de trabalho enquanto o acordo perdurar, tendo a primeira parcela, vencimento após 30 dias da data de celebração do acordo, estipula também que é responsabilidade do empregador informar o Ministério da Economia acerca da adesão ao programa de cada funcionário no prazo de 10 dias a contar da data de celebração do acordo. O §5º, por sua vez, indica que a concessão do BEm, apesar de ser baseada no valor do seguro-desemprego, não altera sua concessão futura se acaso requerida pelo funcionário.
A base de cálculo do BEm vem discriminada no artigo 6º da Lei, sendo fixado de acordo com o seguro-desemprego que o funcionário teria direito em situação de rescisão contratual, da seguinte forma:
I - na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário, será calculado aplicando-se sobre a base de cálculo o percentual da redução; e
II - na hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho, terá valor mensal:
a) equivalente a 100% (cem por cento) do valor do seguro- desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese prevista no caput do art. 8º desta Lei; ou
b) equivalente a 70% (setenta por cento) do valor do seguro- desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese prevista no
§ 5º do art. 8º desta Lei.
De forma explicativa, poder-se-ia indicar que no caso de redução da jornada de trabalho o benefício é pago de forma proporcional a redução, sendo de responsabilidade do empregador adimplir pelo período efetivamente trabalho pelo empregado. Enquanto para o caso de suspensão do contrato de trabalho, o percentual a ser pago varia conforme o faturamento da empresa, sendo de regra 100% do seguro-desemprego, exceto quando o faturamento do local é superior a R$4.800.000,00 ao ano em que o benefício cobrirá apenas 70% do seguro- desemprego sendo o restante (30%) devido pelo empregador como uma ajuda compensatória.
Ademais, foi garantida extensão do BEm independentemente de cumprimento de qualquer período aquisitivo, tempo de vínculo empregatício ou número de
salários recebidos, de acordo com o §1º do artigo 6º da Lei. Entretanto, o empregado que fosse servidor público, bem como esteja em gozo de benefício de prestação continuada do Regime Geral de Previdência Social ou dos regimes próprios de previdência social, do seguro-desemprego e de bolsa de qualificação profissional, não foi qualificado para o recebimento do BEm, isso não significou que esses empregados, exceto servidores públicos, ficaram impedidos de aderir ao PEMER, somente restringiu o recebimento do benefício. Isso porque o intuito do programa era não deixar empregados sem renda, ou seja, se possuíam alguma renda advinda de qualquer outro programa, não estariam aptos a solicitar o BEm.
É importante apontar que o §3º ainda do artigo 6º também não impede o recebimento cumulativo do BEm quando este possuir mais de um vínculo empregatício que implemente as medidas do PEMER, exceto se contratado pelo regime intermitente.
Especificadamente, a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário, vem prevista no artigo 7º da Lei 14.020/2020, enquanto a suspensão temporária do contrato de trabalho está prevista em seu artigo 8º.
A redução da jornada de trabalho conforme nota técnica do DIEESE nº 232143, pode perdurar por até 90 dias (prazo hoje já ampliado pela MP nº 1.045/2021 que instituiu o Novo PEMER com prazo de 120 dias), sendo possível uma redução de 25%, 50% ou 70% do salário e da carga horária do trabalhador, a empresa fica responsável pelo pagamento das horas efetivamente trabalhadas e a complementação fica a cargo do BEm. O valor do benefício, de forma exemplificativa pode ser definido nos termos da nota técnica:
[...] será calculado aplicando-se o percentual de redução do salário ao que o/a trabalhador/a teria direito se requeresse o seguro desemprego. Ou seja, se o trabalhador tiver a jornada e salário reduzidos em 50%, seu benefício será de 50% do valor do seguro desemprego ao qual teria direito, se tivesse sido dispensado.
A redução da jornada de trabalho pode ser aplicada tendo como requisito a manutenção do valor do salário-hora de trabalho, pactuada por meio de convenção
143 DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS
(DIEESE). Nota técnica nº 232: O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda diante dos impactos da Covid-19. São Paulo: DIEESE, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx/0000/xxxxXxx000XxxxxxxxXxxxxxxxxxxXxxxxxx.xxx. Acesso em 18 Maio 2021. p. 2 e 3.
coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito entre empregador e empregado, sendo que a proposta deve ser entregue ao empregado com antecedência de no mínimo 2 dias corridos. Quando pactuada por acordo ou negociação coletiva, permite-se estabelecer percentuais diversos do que os previstos em lei, e, nesse caso, o percentual do BEm também varia conforme os critérios e termos do artigo 11, §1º e §2º da Lei.
Já a suspensão temporária do contrato de trabalho foi inicialmente permitida por 60 dias fracionáveis em até 2 períodos de 30 dias, e, após agravamento dos efeitos negativos provocados pela pandemia, autorizada para vigorar por até 240 dias, segundo a nota técnica do DIEESE nº 256144. Nessa hipótese, há redução de 100% da carga horária e do salário dos empregados, ou seja, o funcionário tem a prestação de serviços totalmente interrompida, mas somente funcionários de empresas com receita brutal anual de até R$4.800.000,00 poderiam receber sua verba salarial exclusivamente pelo BEm, enquanto para empresas com receita bruta anual superior a esse valor têm de arcar com 30% do salário do empregado e o complemento fica a cargo do BEm conforme o seguro-desemprego que o empregado teria direito.
A suspensão temporária do contrato de trabalho também pode ser fixada por convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou por acordo individual escrito entre empregador e empregado, tendo o empregado de receber a proposta com antecedência de no mínimo 2 dias corridos antes do início do acordo. O §2º do artigo 8º da Lei 14.2020/2020 garante ao empregado que enquanto perdurar a suspensão de seu contrato de trabalho fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador, bem como fica autorizado a contribuir para o Regime Geral de Previdência Social como segurado facultativo.
Em razão dos objetivos sérios propostos pelo programa, tendo como finalidade garantir aos cidadãos a permanência no emprego, o §4º do artigo 8º da Lei reprimiu qualquer tentativa de fraude, estipulando que a suspensão do contrato de trabalho não deve manter a prestação de serviços por parte do empregado, ainda que parcialmente, e, em caso de ocorrência o empregador estaria sujeito:
144 DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS
(DIEESE). Nota técnica nº 256: Com atraso de quatro meses, governo relança o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. São Paulo: DIEESE, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx/0000/xxxxXxx000xxxxxxxxXxxXxxxxxx.xxx. Acesso em 18 Maio 2021. p. 2.
I. ao pagamento imediato da remuneração e dos encargos sociais e trabalhistas referentes a todo período; II. às penalidades previstas na legislação em vigor; e III. às sanções previstas em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
Tanto a redução da jornada de trabalho como a suspensão do contrato de trabalho podem ser realizadas de forma setorial, ou seja, não foi obrigatório que todos os empregados de uma determinada empresa aderissem ao programa. Didaticamente Bomfim et al145 explicam com suas palavras:
Essa possibilidade de ajuste setorial ou departamental legitima a aplicação de decisões diferentes a empregados da mesma empresa, não havendo falar, em princípio, em quebra de isonomia por aplicação diversa a funcionários da mesma empresa.
Ademais, previu o diploma legal nas duas hipóteses que a carga horária e o salário deveriam ser reestabelecidos no prazo de 2 dias corridos contados da data de cessação do estado de calamidade pública ou com o termo de encerramento do período pactuado, ou da data de comunicação acaso o acordo tivesse seu fim antecipado.
A contar do artigo 9º até 16 da Lei 14.020/2020 são elencadas disposições aplicáveis tanto a redução da carga horária, quanto a suspensão temporária do contrato de trabalho. Entre as principais determinações, podemos citar o que vem previsto no artigo 9º da Lei em relação às ajudas compensatórias que poderão ser cumuladas com o recebimento do BEm em decorrência da redução da jornada de trabalho ou da suspensão contratual (obrigatória para empresas que tiveram faturamento maior que R$4.800.000,00, no percentual de 30% e facultativa nas demais hipóteses), fixadas como verbas indenizatórias, não integrando a base de cálculo sobre imposto de renda, contribuições previdenciárias e nem de depósitos para FGTS.
O artigo 10 da Lei garante aos trabalhadores que aderiram o PEMER estabilidade pelo dobro de tempo que durar a medida perfectibilizada por acordo após o reestabelecimento da prestação de serviço tanto para a medida de redução quanto para a suspensão. No caso de gestante, a Lei afirma que o período de
145 XXXXXX, X. et al. Lei 14.020/2020 Comparada e Comentada. [s.l.], 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/Xxx-00000-0000-Xxxxxxxxx-x- Comentada-Volia-Bomfim-Dallegrave-Neto-Xxxxxx-Xxxxxxx-Xxxx-Xxxxxxxx.pdf. Acesso em 20 ago 2021.
p. 11.
garantia será contado a partir do término da licença maternidade. Em razão da estabilidade, o empregador fica impedido de efetivar demissões sem justa causa enquanto durar a garantia, assim somente demissões por justa causa e pedidos de demissão podem gerar a rescisão contratual para os beneficiados pelo PEMER, e, em caso de ocorrência de rescisão fora dessas hipóteses, impõe-se indenização com valores que variam de acordo com a medida aplicada, conforme o artigo:
I - 50% (cinquenta por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 25% (vinte e cinco por cento) e inferior a 50% (cinquenta por cento);
II - 75% (setenta e cinco por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 50% (cinquenta por cento) e inferior a 70% (setenta por cento); ou
III - 100% (cem por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e de salário em percentual igual ou superior a 70% (setenta por cento) ou de suspensão temporária do contrato de trabalho.
Entretanto, a Lei não especifica sobre o pagamento do período remanescente da garantia, somente sobre todo período da garantia explica Xxxxxx et al146 que reflete duas hipóteses sobre a intencionalidade da lei:
[...] Abrem-se duas possibilidades de interpretações: i) O percentual incide apenas sobre o período de garantia de emprego ainda não usufruído, o que sempre foi a praxe costumeira na legislação e jurisprudência, acrescentando-se que o dispositivo utiliza o verbo no futuro do pretérito (salário que “teria” direito), não remetendo ao passado. ii) O percentual incide sobre todo o período da garantia de emprego, mesmo que parte dele já tenha sido cumprido, ante a ausência de exclusão desse período pela legislação, cumprindo ressaltar que o tratamento dessa indenização não seguiu os costumes tradicionais, que apontariam para o pagamento integral do período de garantia não usufruído em detrimento de apenas um percentual. A adoção de apenas um percentual dos salários seria compensada com uma base de cálculo maior.
No que concerne aos empregados que já estão aposentados, como já referido, o PEMER pode ser aderido, entretanto, ficam restringidos do recebimento
146 XXXXXX, X. et al. Lei 14.020/2020 Comparada e Comentada. [s.l.], 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xx-xxxxxxx/xxxxxxx/0000/00/Xxx-00000-0000-Xxxxxxxxx-x- Comentada-Volia-Bomfim-Dallegrave-Neto-Xxxxxx-Xxxxxxx-Xxxx-Xxxxxxxx.pdf. Acesso em 20 ago 2021. p.18.
do BEm, em reparação o empregador fica obrigado a empregar ajuda compensatória com o valor mínimo do BEm que lhes seria devido, nos termos do artigo 12, §2º, incisos I e II, da Lei. O artigo 13 da Lei permite a adoção do PEMER também em empresas cujo serviço principal seja essencial, desde que resguardem o funcionamento das atividades essenciais. Conforme estabelece o artigo 14 da Lei, as irregularidades verificadas em relação aos acordos pode ser objeto de multa através da fiscalização pela Auditoria Fiscal. O artigo 15 da Lei permite a aplicação do PEMER também para aprendizes e para trabalhadores em período parcial. Ainda, o artigo 16 da Lei rege sobre os prazos para duração e aplicação do programa, permitindo prorrogação pelo Poder Executivo.
Nos artigos 17 até 39 da Lei estão localizadas as disposições finais, que objetivam a regulamentação de medidas complementares para enfrentamento do estado de calamidade, por exemplo, cita-se a possibilidade de realização de cursos ou programas de qualificação profissional no formato EAD, além disso, permite-se aos trabalhadores intermitentes o recebimento de benefício emergencial no valor de R$600,00 por 3 meses nos termos do artigo 18 da Lei, enquanto o artigo 20 da Lei definiu as alíquotas do INSS em caso de contribuição nos períodos de suspensão e redução proporcionalmente, entre outras disposições.
Pode-se dizer que o programa tende a proteção do emprego com a manutenção da renda de empregados e empresas que tiveram suas atividades afetadas. Muitos dispositivos trazidos pela Lei 14.020/2020 modificaram a forma como a própria CLT determina situações do tipo, a redução de prazos de comunicação, a ausência de obrigação de elaboração de convenção ou acordo coletivo de trabalho para suspensão temporária de contratos de trabalho e entre outros, demonstra que o PEMER surgiu como medida essencial de emergência para combate a COVID-19, em que condutas rápidas necessitam ser adotadas a fim de evitar um grande desgaste econômico causando o aumento do nível de desemprego.
4.2 Reflexos da implementação da Lei 14.020/2020 na prática trabalhista
Visto as vastas modificações implementadas pela medida de emergência, sendo confirmadas em lei, as implementações práticas do PEMER e do BEm geraram diversas discussões e inclusive dúvidas quanto a sua forma de execução,
principalmente, no que diz respeito a contagem do tempo de serviço em relação aos contratos que foram suspensos. Era esperado que programas adotados em emergências causassem impactos jurídicos, econômicos e sociais, portanto, faz-se necessário uma análise quanto aos reflexos da implementação da Lei 14.020/2020, na prática.
Para isso, primeiramente é necessário verificar os dados relacionados ao índice de desemprego, que já foram especificados em capítulo próprio, bem como os números de acordos realizados entre o período de maior incidência dos efeitos da pandemia para poder-se construir um cenário comparativo e validar se as políticas públicas instituídas surtiram os efeitos pretendidos. Segundo os dados já levantados do nível de desemprego, Xxxxx e Silva147 comentam com uma visão voltada a proteção dos direitos trabalhistas:
Mesmo com o aumento significativo de negociações para garantir a manutenção de empregos, o desemprego manteve em linha ascendente, conforme demonstra dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A despeito do aumento do desemprego, aumentava também a violação de direitos trabalhistas com precarização do trabalho. A procura pela Justiça do trabalho mostrou-se crescente durante a pandemia. Até junho de 2020 a Justiça do Trabalho acumulava 35.703 novos processos decorrente da pandemia, com valor estimado em R$ 1,99 bilhão de reais conforme dados noticiados pelo “Termômetro Covid-19 na Justiça do Trabalho”, do site DataLawyer.
Da análise dos dados obtidos pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED)148 quanto à rescisão de contratos de trabalho, em março de 2020, início da contaminação pelo vírus da COVID-19, foram registrados
1.736.444 milhões de desligamentos, já em maio de 2020, após a instituição do PEMER houve uma maior manutenção dos empregos, sendo registrados 1.128.053 milhões de desligamentos. O número de empregados desligados volta a crescer a contar de dezembro de 2020, quando foram registrados 1.392.829 milhões de rescisões e em março de 2021 somaram 1.423.867 milhões.
000 XXXXX, X. X. X.; XXXXX, S. C. D. Covid-19 e Mudanças Trabalhistas: as implicações da pandemia nas relações de trabalho. Revista Processus de Políticas Públicas e Desenvolvimento Social, [S.l.], v. 2, n. 4. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/xxxx/xxxxxxx/xxxx/000/000.
Acesso em 15 Maio 2021. p. 123.
148 CADASTRO GERAL DE EMPREGADOS E DESEMPREGADOS (CAGED). Novo CAGED – Xxxxx
xx 0000. Xxxxxxxx, XX: Ministério do Trabalho, 2021. Disponível em: xxxx://xxxx.xxx.xxx.xx/xxxx- caged?view=default. Acesso em 19 Maio 2021.
O principal objetivo do PEMER foi manter as relações de emprego durante a crise pandêmica, pois se previa que os efeitos negativos da pandemia poderiam impactar de forma significativa diversas empresas e ato contínuo ameaçava diversos empregos. Em contrapartida, ao aumento do nível de desemprego, em abril de 2020, o Ministério da Economia149 apontava que 3.511.599 milhões de contratos de trabalho já teriam sido preservados:
Deste total de benefícios, 59% (2.074.127) ocorreram a partir dos acordos entre trabalhadores e empresas com receita bruta anual menor que R$ 4,8 milhões, 34% (1.210.710) nos casos de empresas com receita bruta anual maior que este valor, e 6% (226.762) nos casos de empregados domésticos e de trabalhadores do Cadastro de Atividade Econômica da Pessoa Física (CAEPF).
Acordos relacionados à suspensão de contratos representavam 58,3% (2.045.799) do total. Nos casos de redução de jornada, 16% (562.599) eram para 50%, 12,1% (424.157) para 70%, e 8,9%
(311.975) para 25%. Nos casos dos trabalhadores intermitentes, os benefícios correspondiam a 4,8% (167.069).
O Tribunal de Contas da União (TCU)150, em dezembro de 2020, estimou que 9,4 milhões de pessoas foram beneficiadas pelos acordos provindos do PEMER, de modo que o BEm exerceu papel importante na preservação dos empregos. Cabe mencionar que o TCU continuou o acompanhamento do programa, lançando relatórios mensais durante sua aplicação, destaca que o benefício alcançou resultados efetivos e faz um comparativo entre os números alcançados pelos acordos instituídos a partir do PEMER e as solicitações de seguro-desemprego, termos fixados no Acórdão nº 855/2021 do Plenário151, conforme trecho:
8. Conclui-se deste trabalho que o Benefício Emergencial (BEm) alcançou resultados satisfatórios como resposta imediata do Governo Federal contra o aumento expressivo das demissões observado no início da pandemia, especialmente nos meses de março e abril de
149 BRASIL. Ministério da Economia. Número de empregos preservados pelo BEm já pode ser consultado online. Brasília, DF: Ministério da Economia, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xx-xx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/0000/xxxxx/xxxxxx-xx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx- pelo-bem-ja-pode-ser-consultado-online. Acesso em 19 Maio 2021.
150 TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). TCU analisa ações do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. Brasília, DF: TCU, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxx.xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/xxx-xxxxxxx-xxxxx-xx-xxxxxxxx-xxxxxxxxxxx-xx- manutencao-do-emprego-e-da-renda.htm. Acesso em 19 Maio 2021.
151 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acordão nº 855/2021. Relatório de Acompanhamento.
Relator: Xxxxx Xxxxxx, 14 de abril de 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxxx.xxx.xxx.xx/#/xxxxxxxxx/xxxxxxx- completo/Ac%25C3%25B3rd%25C3%25A3o%2520855%252F2021/%2520/DTRELEVANCIA%2520d
esc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/0/%2520. Acesso em 27 ago 2021.
2020. 9. De acordo com os dados consolidados no painel de acompanhamento das ações de preservação de emprego e renda publicado pelo TCU (xxx.xxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxxx-xxxxx) , entre 1º abril de 2020 e 21 de dezembro de 2020 foram registradas mais de 3,6 milhões de requisições de Seguro-Desemprego. 10. Em paralelo, foram processados no mesmo período 19,9 milhões de acordos de suspensão ou redução de jornada entre empregadores e empregados. [...] 12. A unidade instrutora conclui pela existência de um efeito positivo imediato do Benefício Emergencial na preservação de empregos, ao menos temporária, ressalvando que o Tribunal não analisou os efeitos da pandemia sobre o emprego após o encerramento da vigência do programa.
Importante destacar também acerca da proporção de tempo de duração dos acordos. O Programa Especial de Atuação no Enfrentamento à Crise da COVID-19 (COOPERA)152, do TCU, estima que até 31 de julho de 2020 a maioria dos acordos foi pactuado pelo período de 30 dias, somando um total de 7.616.180 milhões de termos firamos com essa duração, em segundo lugar seguem os termos fixados com duração de 60 dias contabilizando a quantidade de 6.150.999 milhões de acordos, os acordos fixados em 90 dias vêm em terceiro lugar, somando 1.913.535 milhões de termos firmados com essa duração.
Em 2021, até o mês de julho, com a renovação e ampliação do prazo para adoção do PEMER, o Ministério da Economia153 contabilizou a implementação de cerca de 3 milhões de acordos no presente ano, no total calcula que foram cerca de 2,5 milhões de empregadores e 615 mil de trabalhadores envolvidos, o órgão faz um apanhado das formas de acordos efetuados e os locais em que mais foram aplicados:
O BEm 2021 foi lançado por meio da Medida Provisória nº 1045. Desde então, o maior volume de operações foi para suspensão de contratos (1.255.330), seguido das reduções de jornada em 70% (746.195), 50% (566.220) e 25% (434.701) do tempo total. Dos mais de três milhões de acordos, 46,4% foram formalizados em estados na região Sudeste – São Paulo (810.367), Minas Gerais (298.003) e no Rio de Janeiro (288.716), com quase 1,4 milhão de operações. Na região Nordeste,
152 TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Programa especial de atuação no enfrentamento à crise da COVID-19 – Acompanhamento das ações de preservação de emprego e renda. Brasília, DF: TCU, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxx0.xxx.xxx.xx/XxXXXXXxx/xxxxxxx.xxx?xxxxxxxxxxxx0%0Xxxxxxx%00xxxxxxx%00x%00 renda.qvw&lang=pt-BR&host=QVS%40IAS1&anonymous=true. Acesso em 27 ago 2021.
153 BRASIL. Ministério da Economia. Benefício Emergencial alcança três milhões de acordos.
Brasília, DF: Ministério da Economia, 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xx- br/assuntos/noticias/2021/trabalho/julho/beneficio-emergencial-alcanca-tres-milhoes-de-acordos. Acesso em 27 ago 2021.
Bahia (204.833), Ceará (173.955) e Pernambuco (143.765) somaram mais de meio milhão de acordos.
Perceptível da análise desses números que políticas públicas emanadas por entes públicos precisam ser aplicadas em momentos em que a economia e o trabalho ficam ameaçados. Muitas empresas testemunharam seus próprios fechamentos por não auferirem lucro nos momentos de paralisação para cumprir as normas de contingências estabelecidas durante a pandemia e, com isso, consequentemente muitos empregos foram destituídos, assim fica o questionamento de quantos empregos ainda seriam extintos acaso não fossem tomadas medidas eficazes para o combate ao aumento do nível de desemprego e proteção à economia.
O Brasil, assim como vários países, quebrou paradigmas de suas tradicionais legislações com intuito de atender o melhor interesse dos cidadãos e resguardar a população de uma possível crise financeira e sanitária. O âmbito trabalhista foi o mais afetado, pois a realização de trabalho consequentemente induz a momentos de maior concentração de pessoas, e, para evitar o aumento do contágio pela COVID- 19 foi necessário, inevitavelmente, o afastamento. Aqui não se debruça a refletir se as condutas adotadas para evitar o contágio foram corretas ou não, o pouco conhecimento que se tinha acerca da situação e a necessidade do agir rápido impulsionaram a adoção de medidas sem precedentes, buscar-se-á contribuir para a discussão de modo a amenizar os reflexos e efeitos negativos, respeitando de forma precípua a base de todo estado democrático, que se refere a dignidade da pessoa humana.
Certo é que as medidas adotadas fizeram surgir diversas opiniões conflitantes, ora para aplaudir as condutas, ora para criticá-las. Como exemplo, Xxxxx e Silva154 refletem de maneira crítica, alegam que apesar dos impactos acometidos pela pandemia de COVID-19, as medidas adotadas diminuíram a efetivação de direitos do trabalhador e não contribuíram com a manutenção de empregos visto ao aumento do nível de desemprego no Brasil:
154 XXXXX, X. X. X.; XXXXX, S. C. D. Covid-19 e Mudanças Trabalhistas: as implicações da pandemia nas relações de trabalho. Revista Processus de Políticas Públicas e Desenvolvimento Social, [S.l.], v. 2, n. 4. 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx.xxx/xxxx/xxxxxxx/xxxx/000/000.
Acesso em 15 Maio 2021. p. 124.
Todavia, resta claro que apesar da proteção ao empregador e diminuição notória dos direitos sociais do trabalhador o índice de desemprego não diminuiu, aumentando ainda mais a precarização do trabalho.
A regras estabelecidas pela Medida Provisória embora tenha sido editada com intuito de preservar a manutenção de empregos, diminuindo os impacto do desemprego, expôs o trabalhador a risco iminente de falta de subsistência, com diminuição exacerbada de direitos sociais, contrariando o fundamento da dignidade da pessoa humana previsto no art. 1º da nossa Constituição Federal.
Outra discussão diz respeito ao modo como a pandemia deveria ser encarada, alguns doutrinadores como Xxxxxxxx e Possídio155 defendem que a crise sanitária provocada pela COVID-19 poderia ter sido interpretada como evento de força maior, tendo possibilidade de ser aplicado o artigo 501 da CLT. Já Souza156, discorda “constata-se que o empregador não foi atingido substancialmente pelo Covid-19, com situação de força maior, não sendo legítimo, portanto, a utilização da fundamentação da força maior para dissolver os contratos dos trabalhadores.”
Quanto as modificações ao direito do trabalho, a Lei 14.020/2020, possibilitou a redução da jornada de trabalho, com isso alterou de forma direta os salários percebidos pelos funcionários adotantes do PEMER, tal previsão conflitou inicialmente com o princípio da irredutibilidade salarial, previsto no artigo 7º, VI, da CF/88. A CLT prevê em seu artigo 503 que em casos de força maior ou prejuízos devidamente comprovados é permitido a redução geral dos salários dos funcionários, mas não permite que tal redução seja superior a 25% e que o montante fique abaixo de um salário-mínimo, porém na situação pandêmica, cujos efeitos tentou se inibir com a Lei 14.020/2020, foi permitido reduções nos percentuais que chegassem até 70% no salário percebido por cada funcionário de acordo com o percentual de redução da sua jornada de trabalho, ou até maiores se fixados por meio de convenção coletiva.
Deve-se ter em mente, entretanto, que na situação prevista pela Lei, em primeiro ponto, objetivou-se a continuidade do contrato de trabalho, tendendo que
155 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXX, C. 2020 apud XXXXX, D. de S. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n.
2. 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 20 Maio 2021. p. 32
156 XXXXX, X. xx X. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n. 2. 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 20 Maio 2021. p.33
esses permanecessem ativos mesmo na hipótese de as empresas serem atingidas pelas normas de contingência da COVID-19. Mais do que isso, os funcionários não apenas tiveram seus salários reduzidos, como também foram beneficiados com auxílio emergencial proveniente do ente público, o que de certa forma não gerou tanto impacto quanto somente a redução salarial poderia causar, lembrando que empresas com faturamento bruto superior a R$4.800.000,00 no ano de 2019, tiveram de prestar ajuda compensatória no percentual de 30% do salário do funcionário durante o período fixado em acordo.
Medidas parecidas já foram adotadas no Brasil, segundo Xxxxxxxx e Possídio157, que serviram inclusive de espelho para criação do PEMER quanto a redução da jornada de trabalho e dos salários, de acordo com os autores:
[...] devido a grave crise econômica acometida ao Brasil, em 2015, por intermédio da Lei nº 13.189/2015, fora instituído tal medida com o intuito de facilitar a recuperação da economia, contribuindo para preservação dos empregos e recuperação econômico-financeira das empresas, permitindo a redução proporcional da jornada e do salário. Posteriormente, veio a Lei nº 13.456/2017, com o Programa de Seguro-Emprego, com a motivação igual ao do anterior. Destaca o autor que os sobreditos programas foram criados por circunstâncias econômico-financeiras, enquanto a atual crise se deve a uma crise sanitária sem precedência. Tais programas, na visão dele, serviram de lastro para a elaboração do vigente programa no combate ao Covid-19.
Nesse diapasão, a Lei permite que determinados setores de uma empresa possam ser abrangidos pelos acordos individuais enquanto outros poderiam continuar com a prestação de serviços, ou seja, determinadas pessoas com as mesmas funções poderiam ser atingidas pelo programa enquanto outras não, fato esse, sob certa visão, põe em xeque a conservação do princípio da equidade salarial.
Outro ponto bastante discutido, que foi inclusive objeto de Ação Direta de inconstitucionalidade refere-se à prevalência dos acordos individuais mesmo sem a anuência dos sindicatos da categoria. A Lei 14.020/2020, prevê em seu artigo 12,
§4º, apenas a necessidade de comunicação dos sindicatos no prazo de 10 dias após
157 XXXXXXXX, X.; XXXXXXXX, C. 2020 apud XXXXX, F. D. A D. S. D. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso
em 20 Maio 2021. p.25.
firmado o acordo individual para redução da jornada de trabalho ou suspensão do contrato e trabalho, tal previsão foi objeto de discussão no Superior Tribunal Federal, por meio da ADI nº 6.363/DF158, a qual firmou entendimento, em razão da situação de emergência, pela desnecessidade de anuência do acordo pelo sindicato da categoria, já que sua obrigatoriedade poderia causar insegurança jurídica para efetivação da medida, de acordo com o voto de Xxxxxxxxx xx Xxxxxx.
Tais medidas consideram-se excepcionais e exclusivamente para combate a pandemia de COVID-19, portanto suas durações têm viés temporário. Visando o objetivo precípuo das normas de emergência adotadas, mostram-se válidas tais tentativas em prol da manutenção do emprego e da renda. Tanto que o PEMER também conferiu estabilidade provisória pelo tempo em que o acordo tivesse sido fixado, a contar de seu termo final, mostrando ainda mais sua intenção de efetivar o princípio da continuidade da prestação laborativa. Xxxxxx e Barbosa159 entendem que o PEMER atende as recomendações da OIT, que referem:
[...] a OIT recomenda como política ativa para proteção dos empregos e da renda, a adoção de mecanismos de retenção de empregos, citando explicitamente a redução da jornada e as licenças remuneradas. Essa recomendação se insere em um conjunto maior que abrange a proteção dos trabalhadores nos locais de trabalho, bem como o estímulo econômico e sustentação da demanda.
O Programa Emergencial de Emprego e Renda não só corresponde esse tripé e a esse mecanismo como também incentiva, economicamente, a manutenção de postos de trabalho.
Quanto as suspensões contratuais, estas já eram existentes no ordenamento jurídico brasileiro, admitidas apenas quando expressamente previstas em lei. Portanto, a Lei 14.020/2020 inovou em uma nova possibilidade, ao determinar a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho na situação pandêmica, tendo como objetivo precípuo a manutenção dos contratos de trabalho. Nessa possibilidade, há sustação da prestação laborativa pelo empregado e ausência de responsabilidade do empregador com o adimplemento de verbas salariais e FGTS, além das demais características já tratadas neste trabalho.
158 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6363 DF. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Relator: Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, 24 de novembro de 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxx.xxx.xxx.xx/xxxxxxxxx/xxxxxxx.xxx?xxxxxxxxxx0000000. Acesso em 28 ago 2021.
159 XXXXXX, A. B. C.; XXXXXXX, J.R. Política Pública Emergencial e o Novo Mecanismo Transdisciplinar. Revista de Direitos Sociais e Políticas Públicas, [s.l.], v. 6, n. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 06 Maio 2021. p. 67
e 68.
Dentre outras formas previstas de suspensão do contrato do trabalho, na legislação trabalhista brasileira, a que mais se assemelha ao instituto criado pelo PEMER, de acordo com Santos160, é a suspensão do contrato de trabalho para atividades de qualificação processual, previsto no artigo 476-A da CLT, in verbis:
Art. 476-A. O contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, com duração equivalente à suspensão contratual, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, observado o disposto no art. 471 desta Consolidação.
O instituto da suspensão para a participação do empregado em cursos profissionalizantes se assemelha à suspensão instituída pelo PEMER em diversos aspectos, em ambos permite-se ao empregado a concessão de ajuda compensatório mensal por parte do empregador sem ser considerada de natureza salarial, o empregado faz jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador, há previsão de estabilidade para o funcionário, reprime-se qualquer tipo de tentativa de fraude e possuem prazos máximos fixados para sua adoção.
Um ponto bastante debatido ao final do ano de 2020 foi em relação ao cômputo do período suspenso para fins de cálculo da gratificação natalina (décimo terceiro salário) e férias, visto que a Lei 14.020/2020 é omissa nessa questão, situação que causou grande insegurança. Isso porque, em virtude de a lei utilizar o termo “suspensão”, conforme os entendimentos já elucidados, verifica-se estar diante de uma situação em que não há cômputo do tempo de serviço.
Martinez161 verificou que a Lei foi omissa quanto ao computo ou não do período suspenso e em suas palavras:
A lei, entretanto, não previu que esse período de suspensão contratual (sem salário), embora com ajuda compensatória mensal e outros benefícios, produzisse efeitos impositivos de manutenção de recolhimento de FGTS ou de pagamento de frações do décimo terceiro salário ou das férias. Apesar de inúmeras discussões terem
160 XXXXXX, X. X. X. X. Reflexões da incidência da pandemia no direito do trabalho. Direito em Movimento, [S.l.], v. 18, n. 3, 2021. Disponível em: xxxx://xxxxx.xxx.xx/xxx/xxxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/000. Acesso em: 15 maio 2021. p. 230.
161 XXXXXXXX, X. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Saraiva Educação, 12. ed. 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/#/xxxxx/0000000000000/. Acesso em 5 ago 2021. Livro Eletrônico não paginado.
sido produzidas, parece acertada, por bem da segurança jurídica, a conclusão segundo a qual os meses de suspensão contratual perfeita ou imperfeita não contarão para produzir reflexões sobre outras verbas trabalhistas.
Dada a discussão, o Ministério Público do Trabalho, emitiu a Nota Técnica GT COVID-19 nº 19/2020162, em 29 de outubro de 2020, assentando que os períodos de redução da carga horária e de suspensão deveriam integralizar o cálculo para aquisição de férias e concessão do décimo terceiro salário. Alguns juristas, como Trindade163, entendem que embora a lei não tenha tratado especificamente das consequências do período suspenso pelo PEMER, a hipótese deve ser considerada como uma suspensão hibrida, ou seja, esse tempo deve ser contabilizado, visto que a medida foi instituída em situação excepcional dada a pandemia, fato alheio a vontade do trabalhador.
Já o Ministério da Economia, previu de forma divergente ao emitir a Nota Técnica SEI nº 51520/2020/ME164, estipulando sobre o décimo terceiro salário que a suspensão do contrato de trabalho susta as obrigações entre as partes e não será contabilizado o tempo de serviço do mês em que o trabalhador não tenha atingido 15 dias de trabalho, para aquisição das férias a suspensão do contrato de trabalho tem o mesmo efeito, não sendo contabilizado o período suspenso. A nota técnica também estipulou que a redução proporcional da carga horária não implica nos cálculos para integralização da gratificação natalina e aquisição de férias.
Computar ou não o tempo de serviço alcança divergência em cálculos práticos necessários no direito do trabalho, por isso a importância de se entender como o programa deve ser interpretado. A situação não se aplica ao período de redução da jornada de trabalho, pois nesse caso houve efetivamente, mesmo que
162 BRASIL. Ministério Público da União e Ministério Público do Trabalho. Nota Técnica GT COVID-19 N.19/2020. Brasília, DF: Ministério Público da União e Ministério Público do Trabalho. 2020.
Disponível em: xxxxx://xxx.xx.xx/xxx/xxxxxxxx/xxxx-xxxxxxx-00-xxxxxxxxxxxxxxx_0000-0000_xxxxxx-xx- 23-10-2020-18h21min31s.pdf. Acesso em 19 Maio 2021.
163 XXXXXXXX, X. Como fica 13º e férias para quem teve contrato suspenso ou com redução salarial?
Revisão Trabalhista, [s.l.]. 18 nov 2020. Disponível em: xxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/0000/00/00/xxxx-xxxx-00x-x-xxxxxx-xxxx-xxxx-xxxx-xxxxxxxx-xxxxxxxx- ou-com-reducao- salarial/?fbclid=IwAR0vDtyGvD2I1e3MfNJR_RPswfnVQNEY5TRyHWDv_ROwrxmFQ4ADZfozi4g.
Acesso em 19 Maio 2021.
164 BRASIL. Ministério da Economia. Nota técnica SEI nº 51520/2020/ME. Brasília, DF: 2020. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xx/xxxxxxx-xxxxxxxxx-xxxxxxxxx-xxxxxxxx-00.xxx. Acesso em 19 Maio 2021.
parcialmente, prestação de serviço pelo empregado, e, em razão disso não há motivos que justifiquem a diminuição no cômputo do tempo de serviço.
Mas em relação exclusivamente a suspensão do contrato de trabalho, em que não houve nenhuma prestação de serviço, considerando os objetivos do PEMER, tende-se a interpretação pela ausência de cômputo do período suspenso. Isso porque é necessário considerar que a pandemia atingiu uma coletividade, tanto empregadores como empregados, seria injusto, frente ao caso concreto, conceder direito a apenas uma das partes, onerando ‘excessivamente’ a outra. Claro que na relação de trabalho, entende-se pela vulnerabilidade do trabalhador, portanto, tal argumento cairia por terra em situações normais, mas deve-se considerar que situações atípicas, necessitam de medidas atípicas de modo a resguardar equilíbrio em qualquer tipo de relação, e, frente a pandemia, permitir que postos de trabalho continuem disponibilizando vagas de emprego, de modo a rentabilizar os cidadãos permite que a economia consiga manter seu fluxo ideal para consequentemente proporcionar uma vida digna a uma coletividade.
4.3 O PEMER como medida efetiva de proteção aos empregos comparado ao direito econômico
O PEMER surgiu como um método de aliviar os efeitos negativos previstos pela pandemia de COVID-19, teve intuito de preservar contratos de trabalho e aliviar a esperada crise econômica que a paralisação de atividades decorrentes das medidas sanitárias impostas prometia, empregadores e empregados foram beneficiados pelo programa através da pactuação de acordos individuais, mesmo assim muitos postos de trabalho foram perdidos e muitas modificações legislativas foram instituídas de maneira excepcional. Souza165 polemiza:
Reconhece-se que as normas da MP e da Lei 14.020/20 estão longes de serem as ideais, mas são extremamente necessárias para o fôlego financeiro aos empregadores e para acalmar os ânimos dos trabalhadores temerosos por perderem o posto de trabalho. Manter o maior número de postos de trabalho é o intuito das MPs, mas seria isso o suficiente?
165 XXXXX, X., de A., D., S. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 20 Maio 2021. p.31.
O IBGE166 aponta que até novembro de 2020, 2,7 milhões de pessoas foram afastadas do trabalho devido ao distanciamento social e apenas 80.229 mil empregados não foram afastados, sendo que 879 mil dos trabalhadores afastados deixaram de receber remuneração.
Analisando o número referente ao desemprego, já verificado em capítulo próprio, consegue-se verificar que entre os dados colacionados quanto aos desligamentos e a adoção do PEMER há certa compatibilização, pois em meados de 2020 o número de desligamentos efetivamente diminuiu enquanto o número de acordos aumentava. A relação entre os dados aponta que a política pública foi aderida por empresas e empregados, e, de forma preliminar, apresentou-se efetiva, cumprindo o objetivo de preservar vínculos empregatícios.
Entretanto, a taxa de desemprego no Brasil não foi alvo de estabilidade contínua como o esperado, apesar de uma ligeira manutenção dos empregos logo da instituição do PEMER, o índice volta a aumentar a contar do terceiro trimestre de 2020. Em uma análise comparativa entre o terceiro trimestre de 2019 e de 2020 a taxa de desemprego subiu de 11,8% para 14,6%, segundo os dados apontados pelo IBGE167.
Em relação à manutenção de postos de trabalho, a pandemia provocou o fechamento de muitas empresas, mais do que verificados em anos passados. Conforme dados do IBGE168 coletados no ano de 2018, foram registrados o fechamento de 762,9 mil empresas no ano inteiro, uma queda de 17,4% das empresas totais, enquanto em 2020, até a primeira quinzena de julho, registrou-se o encerramento de 1,3 milhões de instituições empresárias. Embora entidades empresariais sejam regidas sob o aspecto da teoria do risco, que rege que os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador, frente a situação
166 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Trabalho:
Desocupação, renda, afastamentos, trabalho remoto e outros efeitos da pandemia no trabalho. Rio de Janeiro: IBGE, 2020. Disponível em xxxxx://xxxxx00.xxxx.xxx.xx/xxxx-xxxxx/xxxxxxxx.xxx.
Acesso em 4 set 2021.
167 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Desemprego. Rio
de Janeiro: IBGE, 2018. Disponível em: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx#xxxxxxxxxx. Acesso em 11 Maio 2021.
168 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Demografia das
Empresas e Estatísticas de Empreendedorismo. Rio de Janeiro: IBGE, 2018. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxx/xxx000000.xxx. Acesso em 20 Maio 2021. p. 24
gerada pela COVID-19 Silva169 verifica que empresas se encontraram em situações delicadas, obrigando-se a fazer escolhas entre a rescisão de diversos contratos ou o enforcamento econômico, o autor aponta que a atividade empresarial necessita de segurança para sua administração:
[...] empresas se veem diante da difícil escolha entre a demissão imediata de seus funcionários e o endividamento com consequências incertas. A atividade empreendedora exige planejamento. Uma situação é se endividar tendo uma projeção de retomada econômica a partir de um período de retração, como ocorre sazonalmente ou mesmo em outras crises econômicas que já enfrentamos. Outra completamente diferente é se endividar em um cenário de grande incerteza. Não se sabe quando as atividades retornarão, em qual ritmo ou mesmo se retornarão.
Em 2021 com a chegada ao Brasil de vacinas capazes de conter a contaminação do vírus da COVID-19, as empresas que se mantiveram ativas no mercado de trabalho retomaram o atendimento presencial, ainda seguindo diversos protocolos de higienização. Gradualmente a econômica do Brasil vem se reestabelecendo, podemos notar uma ligeira melhora no ano de 2021, isso se denota pelo aumento do PIB no país, conforme aponta o IBGE170:
O Produto Interno Bruto (PIB) apresentou estabilidade (-0,1%) no segundo trimestre de 2021 (comparado ao primeiro trimestre de 2021), na série com ajuste sazonal. Frente ao mesmo trimestre de 2020, o PIB cresceu 12,4%. No primeiro semestre, o PIB acumula alta de 6,4%. No acumulado nos quatro trimestres, terminados em junho de 2021, o PIB cresceu 1,8%.
Os números mostram um cenário de precarização da economia no ano de 2020, com perspectivas de ligeiras melhoras para o ano de 2021, principalmente, porque o referido ano iniciou com a adoção de medidas mais efetivas ao combate da COVID-19, qual seja a vacinação. Frente aos dados levantados, passa-se a reflexão da efetividade do PEMER como programa de política pública destinado ao combate da eminente crise econômica e como protetor dos postos de trabalho.
169 XXXXX, X., X., X. O Mundo do Trabalho e a Pandemia de COVID-19: um olhar sobre o setor informal.
Caderno de Administração. Maringá, v. 28, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxx.xxx/XxxXxx/xxxxxxx/xxxx/00000. Acesso em 06 set 2021. p.69.
170 FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). PIB fica em -0,1%
no 2º trimestre de 2021. Rio de Janeiro: IBGE, 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxx-xxxx-xx-xxxxxxxx/0000-xxxxxxx-xx- noticias/releases/31494-pib-fica-em-0-1-no-2-trimestre-de-2021. Acesso em 02 set 2021.
As medidas adotadas na pandemia poderiam ser encaradas como flexibilização dos direitos trabalhistas, certo é que essas flexibilizações vêm ocorrendo desde a Reforma Trabalhista em 2017 causando bastantes discussões ao longo do tempo. Com o cenário provocado pela pandemia, a criação de programas, como o PEMER, apesar do intuito de proteger a classe trabalhadora da eminente diminuição dos postos de trabalho, que elevaria consequentemente o nível de desemprego no país e implicaria em uma crise econômica, proporcionou a flexibilização de alguns direitos trabalhistas para instituição de normas temporárias capazes de contornar a situação.
Xxxxxx e Santos171 acreditam ser imperioso concluir que tais modificações legislativas, buscam cumprir com os objetivos do Estado Democrático de preservação de empregos, manutenção da paz social e respeito a dignidade da pessoa humana. Ademais, em relação às flexibilizações ocorridas na pandemia os autores verificaram que foram bastantes satisfatórias dado o momento, mas advertem:
Contudo, para que não haja precarização, toda flexibilização precisa ocorrer à luz do direito adquirido, da dignidade da pessoa humana e do princípio da proteção do empregado trazido desde o final dos anos 70 para a doutrina trabalhista pelo jurista Xxxxxxx Xxx Xxxxxxxxx (2015), sempre fixada a competência material na Justiça do Trabalho, apta a dirimir conflitos decorrentes das relações de trabalho, independentemente do avanço tecnológico.
Já era certo que a situação pandêmica geraria efeitos negativos tanto para economia tanto para trabalhadores e a política pública instituída pelo PEMER teve objetivos nobres, pois deve-se considerar que a legislação vigente no surgimento da pandemia não seria suficiente para prever e regular situações atípicas que o país e o mundo enfrentariam. Nessa linha, alude Souza172, enfatizando que a intervenção estatal foi necessária para tentar conter os avanços da pandemia:
171 YUNIS. J. E. D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região. São Paulo, n. 25, p. 92-102. 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/000000000/00000. Acesso em 28 Abr 2021. p. 98 e 100.
172 XXXXX, X., de A., D., S. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 20 Maio 2021. p.34.
Dúvidas não há de que a legislação existente antes da eclosão de tal momento não seria suficiente para conseguir resolver os conflitos decorrentes da pandemia. Verdade seja, nem a eclosão as novas leis e medidas podem ser taxadas de suficientes para tanto, mas, ao menos, exige-se atuação e intervenção estatal no sentido de regulamentar e buscar apaziguar eventuais questões tão importantes como é, por exemplo, o mundo do trabalho e as questões pertinentes ao Direito do Trabalho.
O PEMER configura-se como uma intervenção estatal na tentativa de amenizar os impactos gerados pela COVID-19. Sendo assim é possível discorrer acerca da suspensão contratual instituída pelo PEMER, que se demonstrou um instituto sem precedentes recentes, apenas assemelhado a algumas modalidades de suspensões contratuais já existentes cujas normas de aplicação são diversas. A suspensão contratual prevista na Lei 14.020/2020 causou insegurança jurídica quanto ao cálculo do período suspenso, ora visto que a própria legislação foi omissa no ponto em questão, o que implicou diretamente em verbas trabalhistas como o décimo terceiro salário e na aquisição de férias. Essa situação faz questionar se a Lei 14.020/2020 cumpriu seus objetivos e se foi uma medida suficiente para proteção de empregos e manutenção da economia de empresas.
Para alguns doutrinadores como Xxxxxxxx, Custodio e Hungaro173 as medidas instituídas pelo PEMER se tratam de uma precarização dos direitos trabalhistas, pois em suas palavras “a promessa de manutenção de emprego e renda não passa de um enunciado contraditado pela própria MP”, nessa linha os autores acreditam que a estabilidade no emprego prometida pela Lei 14.020/2020 é frágil, na medida em que o empregador ao descumprir tal estabilidade pode remediá-la com uma simples indenização, além disso, acreditam que os trabalhadores sofrerão prejuízos em relação a suas rendas, já que o BEm se baseia no valor do seguro-desemprego e não no que efetivamente o funcionário recebe podendo causar discrepâncias nas verbas percebidas. Enquanto Souza174 entende que as medidas indicadas pela Lei 14.020/2020 isoladamente podem ser mal interpretadas, mas junto a instituição do
173 XXXXXXXX, X., A., de; XXXXXXXX, M., L.; XXXXXXX, X., M. Disputar em torno do tempo e da vida (ou morte) do trabalhador brasileiro: contribuições para uma análise crítica das relações entre lazer, trabalho e pandemia. Revista do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer. Belo Horizonte, v.23, n.3, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxx.xxxx.xx/xxxxx.xxx/xxxxxx/xxxxxxx/xxxx/00000. Acesso em 6 set 2021. p. 232.
174 XXXXX, X., de A., D., S. Pandemia do Corona Vírus e as Medidas Adotadas no Mundo do Trabalho pelo Estado: A Lei 14.020/2020 e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Revista do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho. [s.l.], v. 6, n. 2, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxx/xxxxx.xxx/xxxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxx/0000/xxx. Acesso em 20 Maio 2021.p. 34.
BEm e com a garantia de estabilidade após a finalização do acordo, reputa-se mais benéfico do que se o Estado se mantivesse inerte.
Alude Silva175 que as medidas impostas pelo PEMER, bem como as demais adotadas de forma emergencial buscando conter os efeitos da pandemia e regular situações atípicas, foram importantes, mas não inibiram a diminuição da renda de trabalhadores, sendo que por se limitarem ao lapso pandêmico, causam insegurança quanto ao futuro, além de deixarem de considerar o modo como empresas e funcionários retornarão as atividades.
Apesar disso, o programa surgiu representando uma válvula de escape, permitiu que milhares de pessoas preservassem muito além de seus empregos, mas também suas vidas e suas saúdes. O retorno ao trabalho em alguns casos poderia representar um grande desgaste ao trabalhador, nesse sentido disserta Lhuilier176:
Resistir à morte social do confinamento sem data prevista de encerramento ou ao risco de perder o emprego e, portanto, regressar ao trabalho é expor-se mais do que habitualmente, frequentemente adaptando-se, de maneira furtiva, os meios, as condições, de uma atividade profissional compatível com as exigências de uma saúde fragilizada. Corre-se também, sem dúvida, o risco de se ver confrontado com uma redobrada intensificação do trabalho, devido ao número de colegas ausentes e às tentações, já bem identificadas, de “trabalhar mais para produzir mais”, a fim de compensar o “tempo perdido” e as perdas associadas.
É nítido que as condutas excepcionais adotadas na pandemia geraram opiniões conflitantes entre si na doutrina, até mesmo o PEMER possui apoiadores e críticos, o que permite a execução da dialética na sociedade e faz com que essa evolua cada vez mais, sempre com o objetivo de concretizar os direitos fundamentais dos seres humanos. A luz do direito constitucional e com viés na proteção dos direitos fundamentais, Xxxxx e Santos177 estabelecem que a crise sanitária causadora do estado de calamidade pública deve respeitar o que está contido no artigo 5º da LINDB, ou seja, que na aplicação da lei o juiz atenderá aos
175 XXXXX, X., H. I. O Mundo do Trabalho e a Pandemia de COVID-19: um olhar sobre o setor informal.
Caderno de Administração. Maringá, v. 28, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxx.xxx/XxxXxx/xxxxxxx/xxxx/00000. Acesso em 06 set 2021. p.69.
176 XXXXXXXX, X. E se essa crise mudasse radicalmente o mundo do trabalho. Caderno de Administração. Maringá, v.28, 2020. Disponível em: xxxxx://xxxxxxxxxx.xxx.xx/xxx/xxxxx.xxx/XxxXxx/xxxxxxx/xxxx/00000. Acesso em 6 set 2021. p. 93.
177 YUNIS. J. E. D.; XXXXXX, M. A. D. D. A possibilidade da flexibilização da legislação trabalhista diante da situação de excepcionalidade causada pela pandemia da Covid-19. Revista do Tribunal do Trabalho da 2ª Região. São Paulo, n. 25, p. 92-102. 2021. Disponível em: xxxxx://xxxxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxx/000000000/00000. Acesso em 28 Abr 2021. p. 96 e 97.
fins sociais a que a norma se dirige e às exigências do bem comum, ademais refletem:
A exegese constitucional – assim como de todo o ordenamento jurídico – gera resultados interpretativos diferentes conforme o momento social e o caso concreto que enfrenta. Nesse sentido, a necessidade imperiosa de preservação do emprego e da relação harmoniosa entre empregados e empregadores permearão uma interpretação jurídica sistemática, sempre considerando a supremacia da Constituição da República, para buscar a melhor compreensão da adequação ou não das medidas praticadas pelo Executivo ante o quadro caótico trazido pela Covid-19.
Frente a isso, é possível realizar uma análise dos casos levados a justiça do trabalho, relacionadas a aplicação das normas contidas na Lei 14.020/2020, para entender como a norma será tradada nos casos concretos e ato contínuo verificar a segurança jurídica que ela impõe. Percebe-se que, por exemplo, as tentativas de fraude ou ausências de respeito a legislação instituída de forma emergencial foram levadas a cabo pelo poder judiciário, que nos casos de irregularidade puniu os infratores, o que pode ser percebido julgado do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região178 abaixo:
EMENTA: RESCISÃO DO CONTRATO APÓS SUSPENSÃO DO CONTRATO EM RAZÃO DA PANDEMIA DE COVID-19. MULTA SOBRE FGTS. SALÁRIOS DO PERÍODO DE SUSPENSÃO. A
pandemia de COVID-19 configura situação de força maior, mas a redução da indenização pela rescisão do contrato de trabalho pela metade somente é devida apenas quando comprovado que houve encerramento da empresa ou do estabelecimento de trabalho do autor, o que não resta demonstrado no caso. Durante o período de suspensão do contrato de trabalho com base no art. 5º da MP nº 936/2020, convertida na lei nº 14.020/2020, não é devido pela empregadora o pagamento dos salários, mas somente do valor da ajuda compensatória quando a empresa é enquadrada na situação prevista no § 5º desse dispositivo legal. Recurso da reclamada parcialmente provido.
(TRT da 4ª Região, 5ª Turma, 0020637-05.2020.5.04.0011 ROT, em
24/05/2021, Desembargadora Xxxxxx Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx).
178 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Recurso Ordinário Trabalhista nº 0020637- 05.2020.5.04.0011. Relator: Xxxxxx Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, 24 de maio de 2021. Disponível em: xxxxx://xxx.xxx0.xxx.xx/xxxxxxxxx/xxxx/xxxxxxxx/xxxxxxx/xxx/xXxxX-xxxXX-0xxx0XxX0X. Acesso em 4 set 2021.