PARECER
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Consulente: Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes – Sindicom
Assunto: Compartilhamento de infraestrutura de abastecimento de aeronaves no Aeroporto Internacional Xxx Xxxxx (Galeão, RJ)
Índice:
I. Consulta
II. Questão Controvertida
III. Estudo Jurídico
IV. Estudo Econômico
V. Resposta ao Quesito
I. Consulta
O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom) formulou-nos uma consulta, apresentada na forma do seguinte quesito, acompanhada da solicitação de um parecer:
Quesito: “Desde os pontos de vista jurídico e econômico, é admissível que a regulação aeroportuária da qual se encarrega a Agência Nacional de Aviação Civil no aeroporto do Galeão (RJ) imponha ao prestador privado do serviço de abastecimento de aeronaves a obrigação de compartilhar com seus concorrentes infraestrutura utilizada para desempenhar tal atividade econômica?"
Este parecer é organizado em quatro seções. A Seção II apresenta uma síntese da questão controvertida que suscitou a consulta formulada. A Seção III contém uma análise jurídica sobre as condições de regulação do compartilhamento de infraestrutura no direito brasileiro. A seção IV traz um estudo econômico que, no caso concreto, avalia as condições de entrada de novos fornecedores de combustível de aviação no Aeroporto Xxx Xxxxx (Galeão, RJ). Por fim, na última parte os elementos jurídicos e econômicos são integrados e ponderados para a apresentação, em seguida, da resposta ao quesito formulado.
II. Questão Controvertida
O caso em análise trata da possibilidade jurídica e da adequação econômica da Agência Nacional de Aviação Civil (doravante “Anac”) determinar às empresas incumbentes que fornecem combustível para as aeronaves no Aeroporto Internacional Xxx Xxxxx (doravante o “Pool”) que compartilhem sua infraestrutura
de abastecimento com seus concorrentes, empresas que pretendem ingressar nesse mercado, nesse aeroporto, valendo-se da infraestrutura operada pelo Pool.
Em outras palavras, o que se discute é se tal infraestrutura, pelo Pool construída e utilizada no aeroporto do Galeão, pode ser considerada uma essential facility e se pode, por conta disso, ser objeto de norma regulatória ou ato de autoridade reguladora ou concorrencial que imponha sua utilização por terceiros.
Como se pode notar, tem-se tanto aspectos jurídicos quanto econômicos em questão, o que justifica a elaboração de um estudo conjunto e interdisciplinar.
A seguir, apresentamos a análise jurídica regulatória para, posteriormente, à luz das premissas jurídicas suscitadas, apresentarmos o estudo econômico dedicado a verificar se a infraestrutura em questão pode ser considerada uma essential facility.
III. Estudo Jurídico
No âmbito da análise jurídica, há dois planos a serem examinados no âmbito da presente consulta. O primeiro deles é o plano constitucional e diz respeito aos parâmetros e limites estabelecidos pela Constituição Federal brasileira para a regulação de atividades econômicas desenvolvidas em regime de mercado. O segundo plano é regulatório e diz respeito às circunstâncias nas quais se pode considerar admissível que haja limitação da propriedade de certos agentes de mercado em benefício de seus rivais no mesmo mercado, por meio da determinação do compartilhamento vinculante de infraestrutura.
A. O Mandato Constitucional da Regulação Econômica
A Constituição de 1988 consagra a liberdade de iniciativa como fundamento da República e da Ordem Econômica. Ao mesmo tempo,
o texto constitucional não deixou de prever hipóteses em que tal liberdade possa vir a ser restringida para que outros valores ou finalidades, também positivados, sejam realizados.
O modelo constitucional brasileiro engendra, assim, um modelo de capitalismo regulado. É próprio deste arranjo jurídico-institucional a persecução do equilíbrio entre a ação do Estado na economia e a liberdade de iniciativa. Nem a liberdade empresarial nem as pretensões de intervenção do Estado podem ser tomadas em sentido absoluto, portanto. 1 Dito de outra forma, a regulação pública da economia, definida como a imposição, por parte do Estado, de restrições, estímulos e condicionalidades substantivas para o exercício da atividade econômica, é admissível e necessária na ordem jurídica brasileira, a despeito da plena vigência do princípio da livre-iniciativa.
É nesse enquadramento constitucional que deve ser entendida, no caso brasileiro, a competência estatal para a regulação da economia. Isso não quer dizer todavia, que tal controle administrativo possa ocorrer em qualquer caso e, em particular, que possa ocorrer de forma generalizada e permanente.
Para determinar os contornos mais precisos, bem como a extensão da regulação estatal da atividade econômica, é preciso identificar, em primeiro lugar, qual o regime jurídico constitucional em questão. Feito isso, é preciso, ainda, adotar critérios de proporcionalidade para que a intervenção reguladora não resulte desarrazoada, caprichosa ou arbitrária.
Em suma, para ser legítima, a regulação pública da economia precisa ser (i) compatível com o regime jurídico constitucional que
1 COMPARATO, Xxxxx Xxxxxx. Regime constitucional do controle de preços no mercado. In Direito Público: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1996, pp. 102-103. Nesse mesmo sentido, cf. XXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx. A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços. Nesse mesmo sentido, cf. Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, “A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços”. In Revista Diálogo Jurídico 14 (2002): 1–28e XXXXXXXX, Xxxxx X. e XXXXX XX XXXXX, Xxxx-Xxxx. Regulação e Controle de Preços do Setor Privado no Direito Brasileiro: hipóteses de possibilidade — parâmetros jurídicos — a irretroatividade das normas no campo regulatório — formas e limites de atuação do Poder Judiciário. In RDA – Revista de Direito Administrativo, v. 272, p. 253-281, 2016
organiza a atividade econômica e também (ii) ajustada proporcionalmente às características próprias do segmento a ser regulado. É a partir desta conjugação que se pode alcançar, em casos concretos, o equilíbrio entre a ação do Estado e a liberdade de iniciativa.
No que toca à compatibilidade entre a regulação e os regimes jurídicos que conformam as atividades econômicas, tem-se que a Constituição traz balizas a respeito dos múltiplos papeis do Estado na economia e, ao fazê-lo, delimita o campo de liberdade econômica privada.
Pode-se dizer que, desde a ótica da Constituição de 1988, as atividades econômicas enquanto gênero são passíveis de classificação em distintas espécies. Entre essas espécies podem ser mencionadas as seguintes: os serviços públicos (disciplinados pelo art. 175) e o caso geral das atividades econômicas desempenhadas em regime de mercado, disciplinadas e reguladas, entre outras normas, por aquelas contidas no art. 170, parágrafo único, e no art. 5 °, II.2
De um lado, a Constituição trata das atividades econômicas que venham a ser consideradas serviços públicos. Nestes casos, o regime jurídico prevalecente é aquele estabelecido pelo artigo 175, cujo conteúdo normativo atribui para o Estado, em tese, as maiores competências regulatórias.
Dito de outro modo, as atividades econômicas definidas pela legislação como serviços públicos ficam, em virtude do regime constitucional aplicável, sujeitas a um leque de alternativas reguladoras que supõe, como regra, uma atuação mais restritiva do Estado. Neste leque de alternativas, o envolvimento público pode ocorrer pela execução direta do serviço ou por meio de sua concessão
2 Embora menos relevantes para o caso objeto desta consulta, também podem ser mencionados no plano constitucional os casos de monopólio da União do art. 177 e os casos de atuação direta do Estado na economia, como empresário, regulados pelo art. 173.
ou permissão para o particular, sempre mediante procedimento licitatório prévio.
Em tais casos, o mesmo artigo 175 dispõe que a lei disciplinará as condições de prestação dos serviços quando delegados aos particulares, incluindo-se nesta disciplina aspectos como a exigência de preços módicos e balizas para a prestação adequada das atividades. O regime do artigo 175 é aquele, portanto, que reserva amplas faculdades regulatórias para o Poder Público, que é o titular da competência para o desempenho da atividade econômica em questão.
Todavia, a Constituição de 1988 também prescreveu um outro tipo de regime jurídico para as atividades econômicas desempenhadas em regime de mercado, nos termos do no art. 170, parágrafo único. Para essas, a regra constitucional é a de que prevalece a liberdade de iniciativa, sendo as possibilidades regulatórias mais restritivas da liberdade econômica exceção e não regra.3 Em termos formais, é este o comando jurídico que se depreende sobretudo da conjugação dos artigos 170, parágrafo único, e 5º, inciso II.
De acordo com o artigo 170 a regra geral que se extrai é a de que a iniciativa econômica é livre e não se sujeita a qualquer autorização ou sujeição. A exceção a esta regra é trazida pelo parágrafo único do mesmo artigo, que estabelece a possibilidade de autorização
– leia-se, a possibilidade de regulação - apenas quando a lei – vale dizer, lei em sentido formal - assim o exigir.
Com isso, pode-se entender que o enquadramento constitucional das atividades desempenhadas em regime de mercado faculta, como regra, maior liberdade ao particular, condicionando ao plano da legalidade a eventual imposição de limites e restrições, na forma de autorizações. Este regime é ainda complementado pela regra
3 Vale sublinhar que o fato de dada atividade econômica pertencer a uma categoria ou espécie, ou obedecer a um dado regime jurídico — um serviço público, por exemplo —, não é, de antemão, representativo do grau da intervenção pública ao qual ela ficará sujeita. Em outras palavras, serviços públicos, monopólios, casos de ação empresarial direta do Estado na economia ou o caso geral das atividades econômicas prestadas em regime de mercado podem ser juridicamente regulados com diferentes graus de intensidade.
do artigo 5º, inciso II, cujo texto determina que apenas a lei é capaz de obrigar o particular.
Portanto, para as atividades sujeitas ao regime do art. 170, parágrafo único, também classificadas como atividades econômicas em sentido estrito, as imposições regulatórias devem ser entendidas como excepcionais e devem, sempre, ser respaldadas em lei em sentido formal.
Vale lembrar ainda que a Constituição, a não ser excepcionalmente — como nos casos de monopólio, tal como previsto pelo artigo. 177, ou nos casos de competências da União e dos Estados, assim dispostos nos artigos 21 e 25 —, não enumera quais as atividades econômicas, entre as inúmeras desempenhadas em uma economia capitalista complexa como a brasileira, se enquadram em cada espécie de regime jurídico.
Em outros termos, a definição de cada setor econômico como serviço público ou como atividade econômica em sentido estrito não resulta diretamente da Constituição e tampouco pode ser feita arbitrariamente pela doutrina jurídica ou pelo regulador, enquanto administrador público.
Por isso, é o regime jurídico legal que conforma, sempre com base nos princípios e parâmetros constitucionais, os contornos normativos mais nítidos e precisos para a atividade econômica que se queira disciplinar ou regular.
Se tal regime jurídico disciplinar, por exemplo, o instituto da concessão criar um regime tarifário, poder-se-á dizer que se trata de um serviço público, sendo assim sujeito à incidência, entre outras, das normas do art. 175 da Constituição, bem como das normas específicas que ordenam a concessão de serviços públicos e as parcerias público- privadas. Se, por sua vez, o regime jurídico estabelecer que se trata de uma atividade de livre exercício, tratar-se-á de uma atividade
econômica em sentido estrito e sujeita, portanto, ao comando constitucional do artigo 170, parágrafo único.4
Isso equivale a dizer que o enquadramento constitucional da regulação é correspondente a cada um desses regimes, que, por sua vez, se materializa em uma conjugação dos ditames constitucionais com a disciplina legal. Nesses termos, as possibilidades e limites da regulação podem e devem ser adequadamente compreendidos.
Com isso, pode-se concluir que para as atividades econômicas desempenhadas em regime de mercado - vale dizer, atividades econômicas que não são serviços públicos, monopólios ou casos de atuação empresarial do Estado na economia – a regulação estatal deve estar imbuída do intuito de respeitar a liberdade de iniciativa e os direitos de propriedade dos agentes econômicos.
Para esses casos, vale frisar, deve ser esse o sentido da norma contida no caput do art. 174 da Constituição, ao determinar que como agente normativo e regulador da atividade econômica o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este (o planejamento) determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Além do enquadramento jurídico constitucional e legal, o mandato regulatório também deve atender a outros requisitos. Por se tratar de uma Ordem Econômica que consagra um capitalismo
4 Sobre as modalidades de intervenção do Estado no domínio econômico, a referencia no direito econômico brasileiro é a de Xxxx Xxxxxxx Xxxx, que se utiliza de três classes: intervenção por absorção ou participação, intervenção por direção e intervenção por indução. “No primeiro caso”, xxxxxx Xxxx, “o Estado intervém no domínio econômico, isto é, no campo da atividade econômica em sentido estrito. Desenvolve ação, então, como agente (sujeito) econômico”. Quando o faz por absorção, o Estado assume o controle dos meios de produção e/ou troca integralmente, atuando em regime de monopólio. Quando o faz por participação, o Estado “assume o controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito, atuando em “regime de competição com empresas privadas (...)”. No segundo e no terceiro casos (intervenção por direção e intervenção por indução), “o Estado intervirá sobre o domínio econômico”, isto é, sobre o campo da atividade econômica em sentido estrito, como regulador. Quando o fizer por direção, exercerá pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório no campo da atividade econômica em sentido estrito. Quando o fizer por indução, o Estado manipulará os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados. Cf. Xxxx Xxxxxxx Xxxx, Ordem Econômica na Constituição de 1988, 2000, pp. 148–149.
regulado, caracterizado por diferentes equilíbrios de direitos e obrigações entre o Estado e o particular, é indispensável observar que a regulação da economia não só deve ser justificável no plano dos regimes jurídicos, como também deve apresentar uma relação de proporcionalidade material vis-à-vis o tipo de atividade a ser regulada. Vale dizer: o mandato estabelecido pela Constituição para a ação econômica do Estado é tal que veda intervenções desarrazoadas, caprichosas ou arbitrárias em relação às condições materiais dos setores econômicos, considerados em suas particularidades .
Assim, por ter o condão de alterar as possibilidades de produção de riqueza e de valor, bem como de distribuição do excedente econômico, a intervenção do Estado na economia requer, consequentemente, uma adequação entre os meios empregados, os fins visados e as características próprias dos setores econômicos.
O imperativo de proporcionalidade é por isso entendido não apenas do ponto de vista formal, mas sobretudo em termos materiais. A atuação regulatória, para estar em conformidade com o mandato constitucional, precisa ser, por isso, proporcional e para isso deve estar amparada em embasamento técnico, sendo ademais compatível com a dinâmica econômica dos respectivos setores.5
Se assim não for, isto é, se por hipótese a ação do Estado sobre a economia atender apenas a categorias formais e ignorar os atributos reais e concretos da organização econômica e industrial, estar-se-á violando o modelo constitucional de um capitalismo regulado, marcado pela constante sintonia entre a pretensão reguladora e a liberdade de iniciativa.
Por isso, seja para os serviços públicos, seja para as atividades econômicas em sentido estrito, a regulação, para estar em conformidade com o equilíbrio perseguido constitucionalmente, precisa ser balizada por um parâmetro de proporcionalidade material
5 Sobre a regra da proporcionalidade e seus elementos de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, cf. XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx xx. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, Revista dos Tribunais 798, 2002, pp. 23-50.
que exclua formas caprichosas, desarrazoadas ou arbitrárias de regulação.
Em síntese, no plano constitucional, há duas balizas inescapáveis para a modulação da intervenção econômica do Estado. A primeira refere-se ao escopo desta atuação, que é diverso em função do tipo de atividade econômica em questão. Nesses termos, enquanto os serviços públicos são marcados pelo protagonismo da ação pública, as atividades econômicas em sentido estrito são, como regra, reguladas à luz das liberdades econômica e de iniciativa.
A segunda baliza diz respeito à proporcionalidade entre os meios regulatórios e os fins econômicos. É próprio do capitalismo regulado disposto constitucionalmente a perseguição de uma economia de equilíbrio entre o público e o privado. Sendo assim, nos respectivos setores, a ação concreta do Estado deve ser tal que resulte em uma atuação regulatória consistente, ou seja, uma intervenção adequada a balancear materialmente os objetivos públicos com a liberdade de iniciativa, própria de um capitalismo regulado.
B. Regulação do Compartilhamento de Infraestrutura
O compartilhamento de infraestruturas corresponde ao objetivo regulatório de se introduzir, por meios jurídicos, mecanismos de competição, que é entendida como um vetor de eficiência e de inovação capaz de produzir ganhos de bem-estar.
A rigor, originariamente, a regulação econômica e a disciplina da concorrência representavam duas modalidades diferentes de intervenção econômica. As diferenças residiam nos meios de atuação e nos objetivos perseguidos.
Enquanto a disciplina da concorrência era concebida como uma intervenção reparadora, que não visava a organização e o planejamento dos mercados, a regulação setorial sempre foi compreendida pela literatura como uma intervenção estatal cuja finalidade era estabelecer as condições para a atuação econômica.
Como explica Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, se a defesa da concorrência é uma disciplina de controle, a regulação pretende ser uma disciplina criadora de utilidade pública.6
Da mesma forma, assinala Xxxxx Xxxxxx a atuação antitruste pretende ser corretiva do mercado, não se propondo à função (própria da regulação) de organizar a forma de atuação dos mercados.7
Assim, se a função da defesa da concorrência era preservar a capacidade alocativa dos mercados ante as ameaças trazidas pelo abuso do poder econômico, a atuação regulatória justificar-se-ia, como uma medida de mitigação das falhas de mercado, para além da concentração do poder econômico.8
Tratadas deste modo, regulação e concorrência pertenceriam a campos distintos da ação econômica do Estado. Ocorre, contudo, que ambas as modalidades de intervenção têm vivenciado, nos anos recentes, uma convergência de suas pautas. Em função das reformas econômicas empreendidas desde os anos 1990, quando o papel do Estado na economia foi objeto de revisões conceituais e políticas, regulação e concorrência passaram a perseguir objetivos crescentemente convergentes.
6 Sobre isso, argumenta Xxxxxxx Xxxxx: “em termos bem simples, a diferença entre direito antitruste e regulação está basicamente na forma de intervenção. A atuação do direito antitruste é essencialmente passiva, controlando formação de estruturas e sancionando condutas. Trata-se do que a doutrina administrativa costuma chamar de atos de controle e de fiscalização, através dos quais o Estado não cria a utilidade pública, limitando-se fiscalizá-la ou controla-la. Já a regulação não pode se limitar a tal função. É preciso uma intervenção ativa, que não se restrinja ao controle, mas preocupa-se com a verdadeira criação de utilidade pública através da regulação. XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxx. Regulação da Atividade Econômica
– princípios e fundamentos jurídicos, São Paulo, Malheiros, 2001. pp. 31.
7 A distinção conceitual entre as duas modalidades de intervenção do Estado no domínio econômico é formulada por NUSDEO, Fábio. Fundamentos para uma Codificação do Direito Econômico, São Paulo, RT, 1995, pp. 22-28.
8 Como lembra o então juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, Xxxxxxx Xxxxxx, em Regulation and Its Reform: “As leis antitruste procuram criar ou manter as condições de um mercado competitivo ao invés de replicar os resultados da concorrência ou corrigir os defeitos de mercados competitivos. Ao fazê-lo, agem negativamente, através de algumas disposições altamente gerais que proíbem certas formas de conduta privada. Não ordenam afirmativamente às empresas que se comportem de maneiras específicas.n Em sua maior parte, elas dizem apenas às empresas privadas o que não fazer.”(em tradução livre) XXXXXX, Xxxxxxx. Regulation and its Reform, Harvard, Harvard University Press, 1982, p.157.
Entre estes, o mais evidente é a disposição de se introduzir regime de competição em setores regulados, cuja configuração estrutural, em muitos casos monopolista, limitava a pluralidade de ofertantes e a disputa de preços. Para tal propósito uma das ferramentas regulatórias mais relevantes é o assim chamado compartilhamento de infraestruturas.
É nesse domínio, atendendo ao propósito de incutir competição em setores não originariamente concorrenciais, que se apresenta a teoria das essential facilities (ativos essenciais), mais adiante discutida à luz do caso objeto desta consulta por meio de estudo econômico (infra).
Trata-se de uma construção jurídica norte-americana que visa a introduzir parâmetros objetivos para uma ação regulatória do Estado destinada a criar condições de competição.
Como discutido adiante, a noção de essential facility tem em conta que, em razão de características estruturais de determinados setores, há ativos econômicos que são imprescindíveis para o exercício da atividade. Não obstante, sua utilização é restrita a apenas um dos agentes pelo fato deste ser o detentor ou proprietário legal dos referidos ativos.
Trata-se, pois, de um bem econômico sujeito a uma combinação particular de escassez e utilidade. Isto é: a um só tempo, há ativos que são extremamente úteis para a prestação de um serviço, mas igualmente escassos e assim dominados por uma parcela restrita dos agentes econômicos.9
A caracterização de um bem como sendo um ativo essencial tem, ainda, um segundo pressuposto, qual seja, a de que ele não admite duplicação. Isto é, seja por razões econômicas, seja em virtude de atributos físicos, há bens (infraestruturas e outros ativos)
9 Sobre o conceito de essential facilities, ver, por todos, o relatório da OCDE “OECD Policy Round Tables, The Essential Facilities Concept” (1996), acessível em
<xxxx://xxx.xxxx.xxx/xxxxxxxxxxx/xxxxx/0000000.xxx>
que, conquanto sejam indispensáveis, não podem ser duplicados.10
Diante de tal circunstância, a única possibilidade de se estabelecer condições para a competição em um dado setor é a determinação, estatal e vinculante, de compartilhamento do ativo essencial. Do contrário, isto é, mantida a dominação exclusiva do ativo essencial, aqueles que não o possuem não terão condições de disputar o mercado.
A noção de essential facility, portanto, legitima a intervenção do Estado sob uma justificativa de igualdade nas condições de participação de um mercado que pode ser potencialmente competitivo. Por isso, uma vez identificada uma assimetria estrutural das condições de disputa do mercado, a única forma de se estabelecer a pluralidade de oferta e as possibilidades de concorrência é disciplinar o uso de um bem econômico pelos agentes que partilham de um respectivo setor.
Visto por um outro angulo, a regulação amparada na noção de essential facility representa uma não trivial limitação do direito de propriedade e uma atuação do Estado que circunscreve a liberdade privada de iniciativa tanto em atividades econômicas caracterizadas como serviços públicos, quanto em atividades desempenhadas em regime de mercado.
Se de um lado a teoria das essential facilities representa a possibilidade de criação de competição em setores com restrições estruturais, também é verdade que sua utilização pode impor ônus severo ao particular e, no limite, pode, a depender das circunstâncias, violar de forma inaceitável sua liberdade econômica constitucionalmente assegurada.
Por essa razão, e em conformidade com os ditames da ordem econômica constitucional, a consideração de determinado bem como uma essential facility – sobretudo quando se tratar de
10 O estudo econômico constante do item iv deste parecer aprofunda o conceito de essential facility, bem como discute, mais especificamente, sua pertinência ao caso em questão,
atividades econômicas em regime de mercado - deve ser justificada, em termos de proporcionalidade, como a única medida possível para se evitar a concentração abusiva do poder econômico, dado que pode vir a limitar a propriedade privada, constrangendo seus titulares, no sentido de dela não poderem fazer pleno uso.
Para isso, é necessário, como visto, que o ativo econômico em questão seja, simultaneamente, indispensável para a prestação do serviço e não admita, por razões econômicas ou físicas, a sua duplicação. Isso equivale a dizer que sempre que houver a possibilidade de um dado bem econômico, ainda que relevante para um determinado setor, ser substituído por uma alternativa funcional, não se admite a intervenção regulatória pela noção de essential facility.
Se assim não fosse, isto é, se a determinação do compartilhamento de infraestrutura não tivesse uma aplicação restrita e seleta a casos em que verdadeiramente sua utilização é justificável, haveria duas consequências mais evidentes para a organização econômica. A primeira delas é a configuração de um regime de “expropriação regulatória”, com conhecidas e indesejáveis repercussões na atuação futura dos agentes econômicos. A segunda consequência, decorrente da exploração econômica de bens comuns, em detrimento da propriedade privada dos ativos, é a produção de um efeito conhecido como “tragédia dos comuns”.
Com relação à primeira das consequências, a expropriação regulatória representa a imposição de perdas econômicas resultantes de decisões administrativas súbitas e extemporâneas. Em termos formais, a expropriação ocorreria no direito brasileiro apenas com perda da propriedade por um ato de desapropriação, perpetrado pelo Poder Público. Materialmente, no entanto, decisões administrativas têm a possibilidade de gerar deterioração dos direitos de propriedade e com isso uma dilapidação patrimonial dos agentes econômicos.
A literatura de regulação econômica apresenta inúmeros exemplos de expropriação regulatória, tais como, a recusa de se reajustar as tarifas de um serviço público (por conta, por exemplo, do chamado “populismo tarifário”), mesmo em cenários inflacionários, a imposição de obrigações contratuais unilaterais, sem o correspondente reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, ou ainda, a rescisão imotivada de um ajuste administrativo. Em comum, as situações em que se configura uma expropriação regulatória estão envolvidas em uma mudança abrupta das regras do jogo que até então balizavam o comportamento e as expectativas legítimas de regulados e contratados, aqui incluídas as expectativas razoáveis de rentabilidade em vista dos investimentos por eles já realizados.
Mudanças regulatórias e contratuais que alteram, na forma de expropriações regulatórias, as condições econômicas apresentam ao menos dois desdobramentos negativos. O primeiro ocorre no curto prazo e afeta diretamente o agente econômico. Mudanças como essas, seja nas regras ou nas cláusulas contratuais, representam uma ingerência indevida sobre o conjunto de direitos de propriedade e ocasiona, concretamente, uma perda econômica.
O desdobramento mais pernicioso, no entanto, não se manifesta no curto prazo. Na realidade, a maior perda é percebida a médio e longo prazos e afeta um conjunto maior de indivíduos, que vai dos gestores públicos aos usuários do serviço.
A literatura de regulação econômica, baseada em experiências empíricas, é conclusiva ao apontar que a expropriação regulatória e a violação do compromisso regulatório, estabelecido entre o Estado e o particular, geram perdas coletivas, para além dos danos particulares. As imposições injustificadas de perdas regulatórias ocasionam um cenário de fragilidade institucional que é, em última análise, contraproducente para o ambiente de negócios amplamente compreendido, com a possibilidade de alastramento para toda a economia por meio de “efeito contágio”.
A seguinte passagem de Xxxx & Xxxxxxx, em um estudo de referência sobre a relevância do chamado “compromisso regulatório”, é exemplificativa deste argumento:
“(...) Mudanças contratuais unilaterais, alterações de regras e imposições de perdas regulatórias constituem hipóteses de expropriação regulatória, cujo resultado é a conformação de um cenário institucional de risco regulatório. Diante disso, os agentes econômicos tendem a retrair seu interesse pelo investimento na execução dos serviços, gerando assim perdas para a coletividade. Pode-se com isso entender que há uma relação de proporção direta entre as perdas privadas de curto prazo e as perdas coletivas, no médio e longo prazos”.11
Sendo assim, a primeira consequência da imposição de compartilhamento de infraestrutura em cenários em que esta não se aplica, simultaneamente, por razões econômicas e jurídicas, é a configuração de um quadro de expropriação regulatória, com provável repercussão tanto no domínio privado, como na organização dos serviços.
Além disso, a imposição indevida de compartilhamento pode também gerar uma segunda consequência igualmente prejudicial: o “efeito tragédia dos comuns”. Trata-se de um efeito negativo que é decorrente da disposição de bens públicos.12
Em bens desta natureza, há uma sobreposição de direitos que acaba por ser prejudicial à sua própria preservação. Por um lado, o bem público é um ativo comum, ou seja, a sua propriedade pertence a uma coletividade. Por outro lado, cada indivíduo utiliza deste bem público de maneira privada, isto é, de forma exclusiva e auto-interessada. O resultado a que se chega em uma condição como esta é a de um uso excessivo do bem comum, em razão de
11 XXXX, Xxxxx & SPILLER, Xxxxx. “The Institutional Foundations of Regulatory Commitment: A Comparative Analysis of Telecommunications Regulation”. In Journal of Law, Economics, & Organization, Vol. 10, No. 2, (Oct., 1994). Tradução livre.
12 A referência clássica quanto à tragédia dos comuns é de XXXXXX, Xxxxxxx, “The Tragedy of the Commons”. In, Science, 13 December 1968.
sua exploração simultânea por todos os indivíduos, que pode levar, no limite, à sua gestão irracional, deterioração ou exaurimento.
O exemplo clássico da literatura é o de um lago que pertence a uma coletividade e assim sofre problemas com a pesca abusiva. Todos os indivíduos sentem-se proprietários individuais de um bem comum e assim entendem-se legitimados a usufruir ao máximo do lago e do seus peixes. O resultado alcançado é a depredação ambiental e o aniquilamento dos peixes. A “tragédia dos comuns” evidencia, portanto, um problema ínsito às ações coletivas: a combinação de interesses e incentivos individuais.
Tendo isso em conta, pode-se entender que o segundo efeito negativo da imposição indevida de uma disciplina de compartilhamento de infraestrutura é o deslocamento de bens do âmbito proprietário para um domínio coletivo, que é sujeito a problemas de coordenação e, portanto, de ação coletiva. A preservação da propriedade tem repercussões também na própria qualidade dos bens econômicos, notadamente da infraestrutura indispensável aos serviços.
Em síntese, o regime regulatório do compartilhamento de infraestrutura está assentado em uma avaliação de proporcionalidade material e demanda uma ponderação de duas ordens. Primeiro, o direito positivo, a doutrina e a jurisprudência estabelecem que o compartilhamento de bens sujeita-se a uma verificação de adequação e necessidade deste procedimento. Em consonância com a Ordem Econômica Constitucional que consagrou um capitalismo regulado, a imposição de compartilhamento de propriedade deve ser vista como uma ferramenta aceitável e necessária, mas que deve ser utilizada em casos nos quais tal medida se prova efetivamente imprescindível.
Isso significa que sua utilização é limitada àqueles casos em que a possibilidade de competição tem como condição sine qua non a flexibilização do direito de propriedade, mediante remuneração
justa pelo uso de bem de terceiro. Para isso, porém, é indispensável que a análise concreta indique que a atividade econômica dependa de um bem econômico essencial e que esta não possa ser executada por outra alternativa funcional.
Segundo, por se estar no terreno da regulação econômica, a aplicação do direito não pode ser apenas restrita à subsunção do fato à norma. Como já se assinalou, a regulação da economia impõe ao direito o dever de também projetar efeitos, sob pena de se mostrar um meio inconsistente de ordenação social.
A disciplina do compartilhamento de infraestrutura envolve, portanto, uma outra ponderação material, qual seja, aquela afeita a avaliar, de forma consequente, os impactos regulatórios. Entre estes há dois mais evidentes e que podem levar a consequências não pretendidas ou desejadas pelo regulador. A primeira é a expropriação regulatória e a consequente deterioração do ambiente institucional. A segunda é a “tragédia do comuns” com suas conhecidas consequências sobre a qualidade dos bens coletivos.
C. O Compartilhamento de Infraestrutura no Aeroporto Internacional Xxx Xxxxx
No aeroporto do Galeão, como se sabe, o serviço de abastecimento de aeronaves é prestado por meio de infraestrutura que foi construída de forma privada pelo Pool. A decisão de realização de investimentos para a construção destes ativos de infraestrutura teve, como não poderia deixar de ser, como premissa a estabilidade e algum grau de previsibilidade do marco regulatório aplicável, no qual estes bens seriam utilizados com exclusividade pelos seus proprietários. Desconsiderar esta característica dos direitos de propriedade significa aceitar, no limite, um típico comportamento free-rider, no qual ninguém deseja investir, inovar ou até manter o ativo, como veremos adiante na análise econômica mais amiúde.
A consideração a posteriori de um ativo como passível de compartilhamento representa, por isso mesmo, uma mudança nas regras do jogo e a imposição de uma perda não prevista ou estimada por estes agentes econômicos, com o potencial de produção das consequências indesejáveis já descritas.
Vale lembrar, ainda, que a possibilidade de compartilhamento é algo que pressupõe não apenas o ingresso de um agente econômico a mais como apto a utilizar a infraestrutura em questão. No limite, uma vez permitido tal compartilhamento, outros agentes econômicos, em tese, poderão fazer parte do novo arranjo de compartilhamento. Por isso, ao permitir o ingresso do primeiro agente, o regulador deve ter em conta que “n” outros poderão suscitar o mesmo pleito sem que haja razões prima facie para sua discriminação.
Tais premissas e conclusões encontram respaldo tanto na Resolução 302/2014 da Anac, que trata dos critérios e procedimentos para a alocação e remuneração de áreas aeroportuárias, quanto no Contrato de Concessão para Ampliação, Manutenção e Exploração Internacional do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro/Galeão-Antonio Carlos Jobim.13
Isso equivale a dizer que, para além da falta de argumentos e racionalidade jurídica nos itens anteriores apontados, tampouco as normas e cláusulas aplicáveis ao uso de áreas aeroportuárias (de modo geral) e a este caso (em particular) têm o condão de obrigar o Pool a compartilhar sua infraestrutura de abastecimento de aeronaves no referido aeroporto. Senão vejamos.
O que se encontra na Resolução 302/2014 da Anac são normas que dispõem sobre a alocação do que tecnicamente se
13 Trata-se de contato celebrado entre a Anac e a Concessionária Aeroporto Rio de Janeiro S.A., com a interveniência do Rio de Janeiro Aeroporto S.A. Vale notar que o Pool não é parte desse contrato e que suas relações contratuais são de natureza privada com a empresa concessionária.
designam “áreas aeroportuárias”.14 Tais áreas, nos termos do art. 2° da mencionada resolução, são os espaços destinados: (i) a órgãos públicos que devam funcionar em aeroportos, (ii) ao atendimento e movimentação de passageiros, bagagens e cargas, (iii) aos concessionários, permissionários ou autorizatários dos serviços aéreos, (iv) aos serviços auxiliares ao transporte aéreo e de abastecimento de aeronaves, (v) ao abrigo e manutenção de aeronaves, (vi) à indústria aeronáutica, bem como (vii) às demais atividades desempenhadas no aeroporto, tais como lojas, salas VIP, negócios de aluguel de carros, estacionamentos, serviços de lazer, restaurantes, lanchonetes, bares, hotéis e outros.
No artigo 9° da Resolução 302/2014 da Anac consta regra explícita no sentido de assegurar a terceiros o acesso a certas áreas do aeroporto para a prestação de serviços auxiliares ao transporte aéreo (cf. inciso IV do art. 2° da mesma Resolução). Tal norma determina que o operador do aeroporto deve disponibilizar a empresas que ofertem tais serviços o acesso às áreas necessárias à execução de suas atividades. Veja-se:
“Art. 9° O operador de aeródromo, observado, no que couber, o art. 40 da Lei no 7.565/1986, e a regulamentação referente à adequação do serviço, deverá disponibilizar às empresas que atuem ou pretendam atuar na prestação de serviços auxiliares ao transporte aéreo, de abastecimento de aeronaves e de manutenção aeronáutica, nos termos e condições estabelecidos nesta Resolução, sob livre negociação, o acesso às áreas necessárias para execução de suas atividades.
§ 1o É facultado ao operador de aeródromo limitar o acesso das empresas mencionadas no caput deste artigo às áreas necessárias quando comprovadamente não houver área disponível para realização da atividade solicitada.
§ 2o Havendo limitação de acesso a que se refere o §1o deste artigo, o operador do aeródromo deverá encaminhar à ANAC, no prazo de até 30 (trinta) dias da ocorrência do fato, a justificativa para a limitação adotada, e as possíveis medidas a serem adotadas para
14 A Resolução 302//2014 da Anac regulamenta em parte a Lei 11.182/2005, que cria a Anac. Tampouco a referida lei prevê casos de compartilhamento obrigatório de infraestruturas privadas associadas a serviços auxiliares de transporte aéreo.
eliminação das restrições existentes, com respectivos prazos, as quais serão disponibilizadas ao público no sitio eletrônico da ANAC.”
Note-se que a Resolução da Anac acima citada faz referência a “áreas aeroportuárias” e não a “infraestruturas” nessas áreas construídas e operadas por prestadores privados de serviços de abastecimento de aeronaves. Isto é, áreas aeroportuárias não se confundem com infraestruturas construídas com recursos privados por prestadores de serviços auxiliares.
Vale dizer que a regulação vigente impede que o aeroporto crie barreiras regulatorias à entrada de prestadores de serviços. Isto é, já há norma que cria procedimento para que eventuais interessados tenham disponibilizada área para realizarem investimentos em instalaçoes para sua operação.
Não há sentido em se confundir as regras constantes da Resolução 302/2014 da Anac com o regime privado de exploração econômica, por parte do Pool, das infraestruturas de abastecimento de aeronaves (i.e.: tanques de armazenamento de combustíveis, dutos, hidrantes, caminhões, garagens, escritórios, etc.). São itens distintos cuja confusão pode levar a conclusões equivocadas sobre os limites da ação reguladora do Estado vis-à-vis atividades econômicas prestadas em regime de mercado.
O mesmo tipo de conclusão vale para o Contrato de Concessão atualmente em vigor no caso do aeroporto do Galeão. A despeito desse documento trazer consigo normas sobre o compartilhamento de áreas e atividades operacionais no aeroporto, ele nada diz sobre a obrigatoriedade de compartilhamento de infraestruturas construídas privadamente que, como visto, não se confundem com a noção técnica de áreas aeroportuárias – isto é, espaços. Veja-se:
“Seção II – Das Áreas e Atividades Operacionais
11.6. São Áreas e Atividades Operacionais do Complexo Aeroportuário aquelas essenciais à prestação dos serviços de
transporte aéreo, tais como despacho de aeronaves, passageiros e bagagens, serviços auxiliares de rampa, carga e descarga de aeronaves, recebimento, despacho de carga e de bens transportados por aeronaves, abastecimento de combustível e lubrificantes, armazenagem e capatazia doméstica, entre outras que poderão ser definidas pela ANAC.
11.7. A remuneração pela utilização de Áreas e Atividades Operacionais para a realização das atividades próprias de prestadores de serviços de transporte aéreo e de serviços auxiliares ao transporte aéreo será livremente pactuada entre a Concessionária e as partes contratantes, sendo vedadas quaisquer práticas discriminatórias e abusivas, nos termos da legislação vigente e da regulamentação da ANAC.
11.7.2. Eventuais conflitos devem ser preferencialmente resolvidos por acordos diretos estabelecidos entre as partes contratantes;
11.7.3. Fica a critério da ANAC compor, administrativamente, conflitos de interesses não resolvidos por meio de acordos diretos estabelecidos entre as partes;
11.7.3 Para avaliar a observância do disposto no item 11.77, a ANAC monitorará os preços praticados pela Concessionária nas Áreas e Atividades Operacionais e observará as práticas de mercado, ficando a seu critério a comparação com preços praticados em outros aeroportos no Brasil e no exterior e a análise dos custos relativos à utilização das Áreas e Atividades Operacionais.
11.7.4 Em caso de descumprimento do disposto no item 11.7, a ANAC poderá, a qualquer tempo, estabelecer a regulação dos preços relativos à utilização das Áreas e Atividades Operacionais por meio de tarifas-teto, receita máxima ou outro método a ser estabelecido em regulamentação específica após ampla discussão pública, caso em que a Concessionária não fará jus ao reequilíbrio econômico-financeiro do Contrato.
11.8. Fica assegurado o livre acesso para que as Empresas Aéreas ou terceiros possam atuar na prestação de serviços auxiliares ao transporte aéreo, observada a regulamentação vigente, inclusive quando da prestação direta desses serviços pela Concessionária, sendo vedadas quaisquer práticas discriminatórias e abusivas, nos termos da legislação vigente e da regulamentação da ANAC.
11.9 Em caso de falta de capacidade para atender à solicitação de novos entrantes para prestação de serviços auxiliares ao transporte aéreo, deverá Concessionária solicitar à ANAC autorização para limitar o número de prestadores desses serviços
no Aeroporto, cabendo à ANAC fixar o número mínimo de prestadores de serviços auxiliares, que poderá ser diferenciado de acordo com a natureza do serviço.
11.9.1 A limitação disposta no item anterior poderá ser aplicada para eventual redução de número de prestadores de serviços atuantes no Complexo Aeroportuário, observadas as diretrizes fixadas em regulação da ANAC.
11.10 Para os serviços auxiliares cuja complexidade, custo ou impacto ambiental inviabilize a divisão e/ou duplicação da infraestrutura correspondente, tornando antieconômica a prestação do serviço por mais de uma empresa, deverá a Concessionária solicitar autorização à ANAC para prestar esses serviços de forma exclusiva.”
Veja-se que apesar de admitir (i) que há no Galeão áreas consideradas essenciais à prestação de certos serviços de transporte aéreo (cláusula 11.6), (ii) que a Concessionária poderá contratar a realização de atividades próprias de prestadores de serviços de transporte aéreo por meio de negociações privadas com tais contrapartes desde que não sejam adotadas práticas discriminatórias e abusivas (cláusula 11.7), (iii) que deve ser assegurado livre acesso para que empresas aéreas ou terceiros possam atuar na prestação de serviços auxiliares ao transporte aéreo sendo vedadas, mais uma vez, práticas discriminatórias e abusivas, não há qualquer menção à obrigatoriedade de compartilhamento de infraestrutura privada detida por terceiros contratados pela Concessionários (neste caso, o Pool).
Ao contrário, na cláusula 11.10, supra, fica claro que o Contrato de Concessão do aeroporto do Galeão reconhece a possibilidade de haver serviços auxiliares de alta complexidade, cujo custo ou impacto ambiental inviabilizem a divisão e/ou duplicação da infraestrutura correspondente, tornando antieconômica sua prestação por mais de uma empresa. Para tais serviços, diz a cláusula 11.10, “deverá a Concessionária solicitar autorização à ANAC para prestar esses serviços de forma exclusiva”.
Como se nota, o Contrato de Concessão, sem utilizar essa expressão do jargão regulatório, admitiu a existência de casos de
essential facilities e para esses casos criou a possibilidade de a Concessionária, mediante autorização da Anac, prestar os respectivos serviços de forma exclusiva. Vale dizer: nem mesmo em casos de essential facility há, de acordo com esse contrato de concessão, obrigação prima facie de compartilhamento.
Tal argumento somente reforça as constatações alcançadas nos itens “A” e “B” deste parecer, de que em não se tratando de uma essential facility, menos razão há para um compartilhamento forçado de infraestrutura por determinação regulatória.
A seguir, o estudo econômico analisará, em termos quantitativos e com base em dados aplicáveis ao caso concreto objeto desta consulta, em que medida, no caso do Aeroporto do Galeão, pode-se ou não falar em essential facility quando se leva em conta a infraestrutura de abastecimento de aeronaves construída e detida pelo Pool.
IV. Estudo Econômico
A)Regulação do Compartilhamento de Infraestrutura
Conforme se depreende do ofício 20/2016/GERE/SRA/ANAC, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), em manifestação dirigida ao operador aeroportuário do aeroporto de Galeão/RJ, afirma que as instalações para Parques de Abastecimento de Aeronaves naquele aeroporto poderiam ser consideradas “infraestrutura essencial”:
“O parque de abastecimento de aeronaves nos grandes aeroportos, em especial de aeroportos que atendem aeronaves que fazem voos de longo curso como o aeroporto do Galeão, é uma essential facility, infraestrutura necessária para a operação de uma determinada atividade em condições de igualdade com as firmas concorrentes, caracterizada pela inviabilidade econômica de sua duplicação”.
De fato, a análise econômica da pertinência da regulação de livre acesso à rede de hidrantes no aeroporto do Galeão passa pela aplicação da chamada tese da “facilidade essencial”. Esta última seria um subconjunto da conduta mais geral de “recusa a negociar” conforme a OCDE (1996) 15 . Este é um aspecto das políticas regulatórias relacionadas às infraestruturas totalmente associadas com os padrões de análise típicas da defesa da concorrência. Xxxxxx, como a falha de mercado que está se avaliando se refere ao “poder de mercado”, a convergência do padrão de análise da intervenção por meio da agência reguladora setorial e da agência de concorrência deveria ser o mesmo.
A afirmação liga-se ao questionamento de condições de acesso por terceiros às instalações, naquele aeroporto, pertencentes ao pool de distribuidores de combustíveis de aviação, composto por Shell, BR e AirBP. Nesse contexto, a afirmação genérica de que toda a base de armazenagem e movimentação seria uma essential facility sequer merece consideração, por ser imprecisa e incluir uma série de ativos de fácil duplicação. O único fator que poderia alçar um PAA à condição de infraestrutura essencial seria regulatório, ou seja, a ausência de área disponível para sua instalação, conforme autorização necessária pelo operador aeroportuário. Conforme informações recebidas nesta consulta, esse não é o caso do aeroporto de Galeão, em que há áreas disponíveis para investimentos em novas instalações. Assim, todos os ativos referentes a armazenagem, carregamento de caminhões- tanque, escritórios estariam longe dos requisitos próprios para qualificação como essenciais, uma vez que sua duplicação não envolve limitações técnicas, operacionais, ou de viabilidade econômica.
Os únicos ativos que, argumenta-se, mereceriam dedicação
15 “Essential facilities cases are a subset of refusal to deal cases”.
intelectual para uma discussão sobre essencialidade, seriam os dutos de hidrantes, instalados subterraneamente no aeroporto. Sua duplicação, embora não seja impossível, como mostra a recente duplicação dos hidrantes no aeroporto de Cumbica-SP, envolve maiores dificuldades operacionais e de custo. Mas não é claro se seriam essenciais para uma distribuidora de combustíveis de aviação atuar de modo competitivo no mercado.
Assim, apresentamos a análise econômica do caso concreto do acesso à rede de hidrantes com base na jurisprudência internacional relativa à conduta de recusa a negociar e à tese da facilidade essencial. A seção a seguir apresenta a análise da conduta de recusa a negociar na defesa da concorrência. A tese da facilidade essencial mais especificamente é tratada na seção C. Na seção D destaca-se a importância de uma história prévia de negociações dos termos de acesso para que o regulador entenda ser desejável a política de livre acesso. A seção E aplica a tese da facilidade essencial à rede de hidrantes em aeroportos, especialmente Galeão. A análise do papel da posição dominante na avaliação da regulação de acesso à rede de hidrantes no Galeão é realizada na seção F. A seção G trata da dificuldade prática de implementação da regulação de livre acesso em dois contextos: da política de livre acesso pelo uso dos ativos e pela entrada na sociedade do pool. A seção H discute as diferenças entre as recusas condicional e incondicional de negociar e a seção I as implicações competitivas da estratégia dos clientes em contratar mais de um fornecedor. A seção J conclui este estudo econômico.
B) Conduta de Recusa a Negociar na Defesa da Concorrência
Entende-se que, em geral, a avaliação de com quem se deve ou não negociar é algo a ser feito por cada agente individualmente. Afinal, cada um está em melhores condições do que terceiros,
incluindo o regulador, em avaliar quais transações geram mais valor para si. Assim, quando dois agentes transacionam é porque houve uma avaliação recíproca de que aquela transação gera ganhos para ambos, uma situação Pareto superior.
Um corolário deste raciocínio é que quando um agente se recusa a negociar com outro é porque a transação não deverá gerar, pelo menos para quem recusa a negociação, um ganho, indicando que a transação não deve resultar em uma situação Pareto superior, como no caso em que a transação ocorre voluntariamente.
Isso implica que a “recusa a negociar” não é uma conduta intrinsecamente ruim para o bem-estar. Na verdade, na grande maioria dos casos, é o contrário: a não disposição de uma parte para negociar constitui um indicativo forte de que a transação não é positiva para o bem estar e, portanto, não deveria nem mesmo ser realizada.
Uma das exceções a esta premissa de que a possibilidade de “recusar a negociar” é positiva para o bem-estar está associada com a questão da concorrência. Neste caso, a conduta é tida como “potencialmente anticompetitiva” pois gera um valor para a parte que recusa a negociação justamente pelos efeitos que este ato tem sobre a inibição da concorrência. Como a concorrência apresenta um valor difuso positivo para a sociedade, a recusa a negociar pode gerar efeitos negativos que vão além do agente cuja solicitação de negociação foi recusada. Esses efeitos externos podem sugerir que a imposição da obrigação de negociar por um regulador ou por uma autoridade de concorrência pode ser benéfica ao bem-estar.
Tal como qualquer outra conduta potencialmente anticompetitiva, no entanto, aqui cabe uma análise pela “regra da razão”, ponderando custos e benefícios de uma intervenção na livre decisão de um agente econômico. A questão é em que condições a imposição de uma obrigação como esta tem maior probabilidade de gerar um efeito liquidamente positivo.
A doutrina e a jurisprudência na área de defesa da concorrência apresentam pistas importantes tanto para a análise da conduta de “recusa a negociar” em geral quanto para o seu subtipo que seria a aplicação da tese da “facilidade essencial” em particular. A OCDE (2007 e 1996) organizou resenhas das práticas internacionais tanto em “recusa a negociar” (refusal to deal) quanto especificamente em “facilidades essenciais” pelas quais se podem depreender algumas condições mínimas pelas quais pode fazer sentido, do ponto de vista econômico, determinar a obrigação de negociar, seja por um regulador, seja por uma autoridade da concorrência. Passemos agora à análise mais específica da facilidade essencial.
C) Essential Facility
A análise da existência da essential facily (aqui também denominada facilidade essencial) constituiria um subtipo da conduta mais geral de recusa a negociar, sendo o padrão da análise econômica basicamente o mesmo. 16 De fato, o economista Xxxx Xxxxxxx, citado no texto da OCDE (2007), argumenta que “não há qualquer distinção econômica entre o cenário de recusa a negociar comum com o insumo sendo crítico para as firmas à jusante e
casos envolvendo uma facilidade essencial”17.
Vejamos a análise comumente aplicada especificamente à facilidade essencial. A OCDE (1996), baseada no caso AT&T/MCI, destaca que nos EUA são quatro os elementos necessários para se aplicar a teoria da facilidade essencial:
16 Como colocado por Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx e Xxxxx (2002) “a doutrina da facilidade essencial tem sido articulada como um subconjunto dos chamados casos de “recusa a negociar”” (the essential facility doctrine has been articulated as a subset of the so-called “refusal to deal” cases”).
17 “Xxxxxxx sees no economic distinction between the common refusal to deal scenario (…). Where the input is critical to downstream firms and cases involving an essential facility”.
1. Controle da facilidade essencial por um monopolista;
2. Incapacidade de um competidor em, na prática e de forma razoável, duplicar a facilidade essencial;
3. A negação do uso da facilidade essencial pelo competidor;
4. A factibilidade de prover a facilidade essencial para o competidor.
Note-se que no elemento do ponto “2”, acima, a palavra “essencial” é chave. Implica que este elemento não pode ser satisfeito tão somente indicando que a utilização do insumo ou da facilidade seria mais barato que as alternativas. Como destacado pela OCDE (2007):
“O segundo elemento, que a duplicação seja impraticável ou não razoável, constitui um padrão de prova mais rigoroso do que sendo “mais econômico” que as alternativas. “Como a palavra “essencial” indica, um agente solicitando acesso deve mostrar mais que uma inconveniência ou mesmo uma perda econômica; ele deve mostrar que uma alternativa à facilidade não é factível””18.
Procurando dar mais concretude à ideia de “essencialidade”, Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx e Xxxxx (2002) argumentam que “o ativo em questão não pode estar disponível por outras fontes ou ser duplicável pela firma buscando acesso. Uma facilidade não será considerada essencial se facilidades equivalentes existem ou onde os benefícios a serem derivados do acesso às alegadas facilidades essenciais podem ser obtidos de outras fontes” ”19.
18 “The second element, that duplication be impractical or unreasonable, is a higher standard than being “more economical” than alternatives. “As the word “essential” indicates, a plaintiff must show more than inconvenience, or even some economic loss; he must show that an alternative to the facility is not feasible.””
19 “the asset in question must not be available from other sources or capable of duplication by
the firm seeking access. “a facility will not be deemed essential if equivalent facilities exist or where the benefits to be derived from access to the alleged essential facility can be obtained from other sources””.
Sendo assim, requer-se que o controle da facilidade essencial, de fato, implique, no caso de “recusa a negociar”, a eliminação da concorrência e não apenas uma desvantagem competitiva para o rival.
No caso da União Europeia, a OCDE (1996) se baseia em artigo oficial do DG IV, que define como condicionantes para a não aplicação da tese da facilidade essencial:
“Se o comprador tem outra fonte satisfatória de oferta, se os bens ou serviços não são essenciais, ou se um competidor a mais não aduzirá nada significativo à concorrência, a lei antitruste não deveria obrigar a empresa dominante a ofertar”.
Precedente europeu fundamental, exemplar sobre a necessidade de não haver alternativa de acesso a outro insumo, é dado pelo caso Xxxxxxx. A empresa Mediaprint publicava dois jornais que compreendiam 46,8% do mercado de jornais diários da Áustria. Mediaprint havia estabelecido o único sistema de entrega de jornal em âmbito nacional, o que permitia a distribuição de seus jornais logo nas primeiras horas da manhã. Xxxxx Xxxxxxx, o dono de um jornal concorrente com 3,6% do mercado do mercado de jornais austríacos, demandou acesso ao sistema de distribuição de Mediaprint. A concessão deste “acesso” dos jornais de Bronner ao sistema de distribuição da Mediaprint foi recusada por esta última. A questão é se faria sentido definir o sistema de distribuição da Mediaprint como uma facilidade essencial ou não.
Uma das principais condições impostas pela Corte para definir se o sistema de distribuição de Mediaprint seria um caso de facilidade essencial em Bronner, conforme Xxxxxx (2004), foi de que:
“o serviço de entrega era por si mesmo indispensável para o negócio, no sentido de não existirem substitutos reais ou potenciais para o sistema de entrega em casa de Mediaprint. A Corte decidiu que essas condições não se verificaram dado que outros métodos menos vantajosos de distribuir jornais diários existiam, e que não
havia obstáculos técnicos, legais ou econômicos para estabelecer outro esquema de entrega nacional A Corte definiu que não seria
suficiente que o estabelecimento de um novo sistema de entrega em casa não fosse economicamente viável em função da pequena circulação do jornal diário a ser distribuído. Em lugar disso, a Corte afirmou que deveria ser demonstrado que não seria economicamente factível criar um segundo sistema de entrega para a distribuição de jornais diários com a circulação comparável com aquele dos jornais diários distribuídos pela Mediaprint”.20
Evrard (2004) sumaria a mudança de entendimento procedida pelo caso Xxxxxxx:
“Sob o caso Xxxxxxx, não é suficiente demonstrar que o proprietário da facilidade está em uma posição dominante no mercado à montante, dado que uma posição dominante não exclui a existência de facilidades alternativas.”21
Apesar de o CADE não realizar usualmente a análise de facilidades essenciais, em alguns casos a ideia de avaliar o quão indispensável se configura um insumo relevante é pertinente a esta discussão. No ato de concentração n° 08012.001656/2010-01 22 , caso Cosan/Shell, de distribuição comercialização e revenda de combustíveis, houve análise da influência dos chamados “condomínios de distribuição” ou "pools". A atuação no mercado de distribuição de combustíveis poderia ocorrer por meio de construção
20 “that the service in itself was indispensable to carrying on that person´s business, inasmuch as there is no actual or potential substitute in existence for the home-delivery scheme. The court decided these conditions were not met since other, less advantageous methods of distributing daily newspapers existed, and there were no technical, legal or economic obstacles to establishing nationwide delivery scheme The Court held that it was not sufficient that
the establishment of a second home-delivery scheme was not economically viable because of the small circulation of the daily newspaper to be distributed. Instead, it said that it must be demonstrated that it is not economically feasible to create a second delivery scheme for the distribution of daily newspapers with a circulation comparable to that of the daily newspapers distributed by Mediaprint.”
21 “Under Bronner, it does not suffice to demonstrate that the owner of the facility is in dominant
position in the upstream Market, since a dominant position does not exclude the existence of alternative facilities”.
22 Ver no site do CADE: xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxxxxxxx/xxxxxxxx/xxxxxxxxx_xxxxxxxx_xxxxxxx.xxx?0xx0xxx_X0 g7aNQoTAtnXFTGZoWZS2jMuLHerU3SeJDBxx8V93mlN2VzWBiPdXhMn6SbmIn5wOfQwA HUMudcFA,,
de bases de distribuição própria ou pelo compartilhamento das bases que pode ocorrer mediante: a) contratos de cessão de espaço em que uma ou mais distribuidoras são detentoras dos ativos e, havendo ociosidade, cede o espaço ocioso para uma concorrente;
b) condomínios de distribuição também denominados de "pools”.
A questão aqui seria se estes pools poderiam ser considerados facilidades essenciais ou insumos tão críticos que requereriam intervenção do regulador para uma política de livre acesso. A conclusão do relator Xxxxxxx Xxxx naquele caso foi de que “o acesso aos "pools" pode melhorar as margens das Requerentes, entretanto não impede a concorrência no mercado de distribuição”. Ou seja, a questão avaliada aqui não foi se o acesso de qualquer agente demandante do pool tornaria as condições de todos equânimes para a provisão do serviço, mas se a falta de acesso inviabilizaria a atuação dos concorrentes.
Mas, mais do que isso, conforme Xxxxxx (2004), pelo precedente do caso Xxxxxxx, cabe avaliar também se uma alternativa, que não exista atualmente, pode ser desenvolvida em uma abordagem forward-looking:
“Além do mais, mesmo se alternativas não existam ainda, não pode ser concluído que a facilidade seja indispensável. De fato, uma avaliação olhando para frente do mercado à jusante terá que determinar se alternativas viáveis podem ser desenvolvidas.”23
Note-se que este é um requisito ainda mais forte. Não obrigatoriamente é necessário que já existam outros substitutos operando, bastando que haja a possibilidade razoável deles serem desenvolvidos.
De qualquer forma, tanto o documento mais recente da OCDE (2007) sobre recusa a negociar como o documento mais específico
23 “Moreover, even if alternatives do not exist yet, it cannot be concluded that the facility is indispensable. Indeed, a forward-looking assessment of the downstream market will have to determine whether viable alternatives can be developed”.
sobre o tema da facilidade essencial (OCDE (1996)) indicam uma postura significativamente crítica.
Um problema usualmente apontado é que a doutrina da facilidade essencial não requer prova de prejuízo à concorrência e nem mesmo de probabilidade deste prejuízo, algo que usualmente se considera fundamental em qualquer análise de conduta antitruste. Conforme a OCDE (2007):
“Uma característica importante da doutrina de facilidade essencial, pelo menos tal como foi definida no caso MCI, é que ela não requer prova de dano à concorrência. Ela nem mesmo requer uma probabilidade de tal dano. Esta observação tem levado mais de um analista a menosprezar a doutrina. Xxxxxxxxx, por exemplo, observa que ao falhar em requerer uma prova de prejuízo à competição, a doutrina da facilidade essencial perde o seu apelo no
§2 da Xxx Xxxxxxx. Ela passa a operar como um estatuto de 24 “acesso justo” que força um conjunto de firmas privadas a acomodar outro conjunto de firmas privadas mesmo quando a concorrência não é melhorada. Como resultado a doutrina é ou supérflua ou mesmo inconsistente com princípios antitruste básicos.”25
E esta crítica não se restringe a apenas um dos lados do Atlântico. A OCDE (2007) destaca que tanto nos EUA (destaque para o caso Xxxxxx) como na Europa (destaque para o caso Xxxxxxx, já mencionado), a doutrina foi significativamente criticada, ecoando a visão de Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2002) de que “a doutrina da facilidade essencial é tanto prejudicial quanto desnecessária e deveria ser abandonada”26.
24 A principal lei antitruste americana.
25 “ An important characteristic of the essential facility doctrine, at least as it was defined in MCI, is that it does not require proof of harm to competition. It does not even require a likelihood of such harm. That observation has led more than one commentator to disparage the doctrine. Xxxxxxxxx, for example, remarks that by failing to require proof of harm to competition, the essential facility doctrine “ loses its mooring in § 2 of the Sherman Act. It begins to operate as a “fair access” statute that forces one set of private firms to accommodate another set even when competition is not improved. As a result the doctrine is either superfluous or else inconsistent with basic antitrust principles.”
26 “the essential facility doctrine is both harmful and unnecessary and should be abandoned”
No caso Xxxxxxx, foi destacado ainda que caberia analisar as condições de acesso não para viabilizar um agente qualquer baseado numa política de assistência à entrada sem critério algum, mas sim as condições do que seria um entrante eficiente. Como colocado por Xxxxxxxx e Xxxxxx (2006):
“A Corte europeia de Justiça argumentou que “a empresa dominante reter uma vantagem sobre o competidor pelo mero fato de apenas usar a facilidade para si própria não pode justificar a solicitação de acesso àquela. Portanto, de acordo com a Corte,
ao investigar se uma facilidade essencial ocorre, não deveríamos focar unicamente no poder de xxxxxxx xx xxxxxxxxxxxx xx xxxxxxxxxx xx xxxxxxx x xxxxxxx, xx xxxxxxx a concluir que a conduta do proprietário de reservar o mercado à jusante para si seja automaticamente um abuso. Outro ponto importante levantado pela Corte é que na determinação de se a facilidade é essencial ou não, a agência antitruste não deveria focar no custo de construir uma facilidade alternativa ou na busca por facilidades alternativas que estejam ajustadas para a capacidade específica do competidor particular que esteja requerendo acesso; em lugar disso, deveria se referir à situação de equilíbrio de um competidor representativo eficiente que tenha as capacidades normais (econômicas, comerciais e tecnológicas) requeridas para levar o negócio de uma forma eficiente. Em outras palavras, o Tribunal parece sugerir que o custo de procurar facilidades alternativas deveria ser direcionado para um competidor que já alcançou a escala mínima eficiente para entrar no mercado relevante. Se for feito de outra forma, qualquer novo entrante em qualquer mercado poderia manter o direito de ter o acesso aos insumos dos incumbentes mesmo quando ele for muito pequeno para cobrir os custos de iniciar o negócio”.27
27 ”The European court of Justice argued that “the mere fact that by retaining a facility for its own use, a dominant undertaking retains an advantadge over a competitor cannot justify requiring access to it”… Thus, according to the Court, in order to investigate whether an essential facility is in place, we should not focus solely on the market power of the owner of the facility in the upstream market, so as to conclude that the conduct of the facility owner of “reserving to itself the downstream market is automatically an abuse”. Another important point raised by the court is that in determining whether a facility is essential or not the antitrust agency should not taylor the cost of building an alternative facility or search for alternative facilities to the specific capacity of the particular competitor that is currently requiring access; rather, it should refer to the equilibrium situation of a representative efficient competitor who has the normal abilities (economic, commercial, technological) required for carrying that business in an efficient way. In other words, the Court seems to suggest that the cost or procuring alternative facilities should be tailored on a competitor who already reached the minimum efficient scale to enter the relevant market. Otherwise any new entrant in any market could maintain the right to have access to incumbent´s inputs when it is too small to cover the start up costs”.
Seria reconhecido neste caso, portanto, que não faria sentido utilizar a doutrina da facilidade essencial para fomentar a concorrência e a entrada a qualquer custo. Apenas entrantes tão eficientes quanto o associado à jusante do incumbente deveriam ser induzidos a entrar. Caso contrário, se estaria estimulando uma concorrência sem quase efeito sobre a eficiência e, portanto, sobre o bem-estar. Seria uma política de induzir a concorrência pela concorrência como um fim em si próprio e não como um meio de aumentar a eficiência do setor. Esta mesma discussão se replica na análise da escolha do preço a ser pago pelo acesso que faremos mais abaixo.
Um reflexo evidente da fragilidade conceitual da doutrina da facilidade essencial é a falta de homogeneidade de sua aplicação. Como colocado pela OCDE (1996):
“A variância das definições é grande. De fato, os analistas não conseguem nem mesmo concordar sobre quais casos podem ser designados como de “facilidade essencial”. Entre países, a variância é até maior.”28
Esse conjunto de ressalvas à doutrina da facilidade essencial fez com que sua aplicação concreta pelas cortes americanas acabasse sendo reduzida. Conforme Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx e Hooks (2002):
“Dada o rigor dos requisitos amplamente adotados definidos no caso MCI Communications, as cortes americanas raramente acharam que os proprietários teriam responsabilidade de negociar sob a doutrina da facilidade essencial”29.
28 “The variance in definitions is great. Indeed, commentators cannot even agree on which U.S cases come within the purview of “essential facilities”. Among countries, the variance is even larger.”
29 “given the stringency of the widely-adopted requirements set forth in MCI Communications. US courts rarely find liability under the essential facilities doctrine”.
Concordando ou não com estas avaliações menos benignas à doutrina da facilidade essencial, há uma mensagem importante aqui: a aplicação concreta da doutrina para efeito de políticas de livre acesso a um insumo qualquer deve ser realizada de forma muito cuidadosa, evitando o objetivo de simplesmente estimular competição a qualquer custo. Uma política de estímulo à concorrência baseada simplesmente no incremento de competidores pouco eficientes pode ser liquidamente negativa.
D) Rede de Hidrantes e Facilidade Essencial
Assim, para a aplicação da doutrina da facilidade essencial, é preciso demonstrar que sem o acesso à rede de hidrantes, não haveria a menor possibilidade de um agente competir neste mercado. Ou seja, não deveria haver qualquer forma alternativa de competir.
Este não é o caso, no entanto. Além dos hidrantes, há a possibilidade de se recorrer a caminhões-tanque (CTAs) os quais constituem o método de abastecimento mais utilizado na maior parte dos aeroportos brasileiros.
A competitividade relativa de hidrantes e CTAs depende do tamanho da aeronave, distância do voo e nível de aglomeração no pátio de manobras das aeronaves e veículos no aeroporto. Para aeronaves maiores, mais utilizadas em vôos internacionais, a operação de abastecimento por hidrantes tende a ser mais competitiva. O problema estaria na necessidade de utilizar mais do que um CTA para aqueles aeroportos mais congestionados em terra. A utilização de mais do que um CTA é menos eficiente do que pela rede de hidrantes, para esses casos específicos de aeroportos e aeronaves, mas está longe de ser inviável, como veremos adiante.
As redes de hidrantes constituem custos (literalmente) afundados, envolvendo mais custos fixos que variáveis. De um lado,
o custo fixo da instalação da rede de hidrantes é maior que o da aquisição de CTAs. Ademais, este custo fixo é afundado no caso dos hidrantes enquanto os CTAs podem ser utilizados em outros aeroportos pela mesma empresa ou mesmo vendidos, o que torna a entrada por este meio mais fácil. Ao custo fixo maior corresponde um custo variável médio menor da operação por meio da rede de hidrantes. Nada garante que na combinação dos custos fixos e variáveis, o custo de uma operação com CTAs será maior ou menor que a com hidrantes. Conforme informação da AirBP, por exemplo, a sua operação isolada por meio de CTAs, antes da entrada no pool, era 15% mais barata do que depois da entrada no pool.
Dadas as economias de escala e facilidade operacional existentes na utilização da rede de hidrantes, quando esta infraestrutura é construída, alguns aeroportos optam por diferentes soluções com os fornecedores se reunindo em um pool com ativos compartilhados ou com o próprio aeroporto sendo o detentor da propriedade dos hidrantes, exemplo do aeroporto de Miami.
O uso da rede de hidrantes, no entanto, está longe de ser indispensável para a competitividade seja em aeroportos sem ou com hidrantes. Em alguns aeroportos como Xxxxxx Xxxxxx, Congonhas, Porto Alegre e Cuiabá simplesmente não há rede de hidrantes.
Um caso interessante é o do aeroporto de Viracopos que tinha majoritariamente vôos internacionais, antes da entrada da Azul. Aquele aeroporto não tem rede de hidrantes ativa e continua operando vários vôos internacionais. Isto indica que a ausência deste ativo não prejudica a competitividade de Viracopos em atrair vôos internacionais. Ou seja, para as empresas aéreas não importa se sua aeronave será abastecida por hidrante, ou CTA, importa apenas que seja abastecida.
Em Salvador e Fortaleza, cada distribuidora possui sua própria rede de hidrantes, o que mostra que, a depender do
aeroporto, não é impensável a duplicação desta infraestrutura.
Há casos de competição de empresas operando com rede de hidrantes e empresas operando com CTAs. No aeroporto de Belém, não há pool, estando apenas a BR operando com a sua própria rede de hidrantes. A Shell fechou sua rede de hidrantes e atende a TAM, inclusive com vôos internacionais naquele aeroporto. No aeroporto de Foz do Iguaçu, só a Shell opera com hidrante, sendo que XX x Xxx XX xxxxxx xxx XXX. Xx Xxxxxxx, XX e Shell têm rede de hidrantes, enquanto Air BP opera só com CTA.
No Galeão, especificamente, a entrada da Air BP mostra que não apenas é possível a competição, mas que também há incentivo à entrada de empresas apenas operando com CTAs, mesmo em um aeroporto grande com uma já estabelecida rede de hidrantes.
De fato, os dados da entrada da AirBP mostram que não há qualquer dificuldade na entrada via CTAs. A tomada da decisão para a entrada no Galeão, exclusivamente via CTAs, ocorreu em dezembro de 2006, tendo iniciado a operação em maio de 2008, um período de 18 meses. O investimento total para a entrada foi de apenas R$ 8 milhões divididos da seguinte forma:
Quadro I - Investimentos da AirBP para Entrada no Galeão
Itens | Valor |
Instalação de derivação no duto da refinaria da Petrobras para a área concedida | R$ 1,5 milhões |
Instalação de tanques de armazenagem | R$ 4,5 milhões |
CTAs | R$ 2 milhões |
Total | R$ 8 milhões |
Fonte: AirBP
Um aspecto importante da entrada da Air BP não apenas no Galeão, mas também no resto do País é que quando a entrada ocorreu em 2005, a empresa estava mirando tão somente o mercado de vôos internacionais, servindo-se exclusivamente de CTAs,
inclusive em aeroportos nos quais existia rede de hidrantes, como o próprio Xxxxxx. Apenas em 2016 que a AirBP começou a conquistar clientes domésticos. A American Airlines era servida pela Air BP no Galeão para vôos para os EUA com base apenas em CTAs. Assim, mesmo para vôos internacionais, não se pode afirmar que a rede de hidrantes seja uma facilidade essencial.
Apenas em meados de 2012, com a decisão do CADE de determinar a alienação da Jacta (empresa que concentrava os ativos de aviação da COSAN, que seriam adquiridos pela Shell), a empresa passou a ter acesso ao pool e aos hidrantes. Ou seja, apenas a partir de 2013/14 que os dados passam a capturar melhor o efeito deste acesso. O quadro a seguir mostra a evolução dos volumes vendidos e participação de mercado da Air BP no Rio de Janeiro de 2010 a 2016.
Note-se que se contabiliza para o Rio de Janeiro os aeroportos Xxxxxx Xxxxxx, Jacarepaguá, Macaé e Galeão. Como a Air BP não atua no Xxxxxx Xxxxxx, suas participações no Galeão são superiores aos números abaixo.
Quadro II - Evolução dos Volumes Vendidos e Participação de Mercado da AirBP no Rio de Janeiro de 2010 a 2016
2010 (*) | 2011 (*) | 2012 (*) | 2013 (*) | 2014 | 2015 | 2016 | |
Volume Vendido pela Air BP | 82910 | 123653 | 151284 | 157289 | 160261 | 158597 | 184681 |
Participaçã o de mercado | 7% | 9% | 10% | 11% | 12,5% | 12,8% | 15,6% |
Fonte: Sindicom
(*) Números arredondados.
Note-se que a AirBP cresce seu volume continuamente de 2010 a 2014, incrementando dois pontos percentuais em 2010 (antes do acesso à rede de hidrantes) e 1 ponto percentual por ano de 2011 até 2014, passando de 7% para 12,5%. O volume, no entanto, cai em 2015, ainda que com incremento da participação de
xxxxxxx, que sobe ainda 0,3 ponto percentual naquele ano e depois mais 2,8 pontos percentuais em 2016. Assim, o ritmo de crescimento não parece ter sido significativamente alterado com o acesso à rede de hidrantes. Definitivamente, não é possível afirmar que o acesso à rede de hidrantes tenha tido impacto relevante sobre esta evolução.
Mesmo em relação ao desempenho da AirBP em outros estados, os dados não corroboram a crença na essencialidade de hidrantes, como pode ser visto no quadro abaixo.
Quadro III - Evolução dos Volumes Vendidos e Participação de Mercado da AirBP no DF, Pernambuco e São Paulo de 2010 a 2016
2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
Volume Xxxxxxx xxxx Xxx XX xx XX | 00000 | 69824 | 63576 | 4790 | 14826 | 92501 | 65280 |
Part. De Mercado da Air BP no DF | 8% | 19% | 18% | 1% | 3% | 16% | 13% |
Volume Vendido pela Air BP em Pernambuco | 19 | 21 | 75 | 404 | 246 | 1621 | 39957 |
Part. De Mercado da Air BP em Pernambuco | 0% | 0% | 0% | 0% | 0% | 1% | 17% |
Volume Vendido pela Air BP em SP | 10893 | 10478 | 37356 | 330943 | 482709 | 536140 | 512783 |
Part. De Mercado da Air BP em SP | 0% | 0% | 1% | 11% | 16% | 18% | 18% |
Fonte: Sindicom
Em Pernambuco, as participações de mercado da empresa são e permanecem sendo após o acesso à rede de hidrantes muito próximas a zero. Apenas em 2016, três/quatro anos após obtido o acesso, é que se consegue um contrato maior que permite se chegar a um percentual de 17% no aeroporto de Recife.
No Distrito Federal, a AirBP cresce significativamente de 2010 para 2011, passando de um volume de 28.401 para 69.824, o que corresponde a um incremento de 8% para 19% de participação. Este salto ocorre antes do acesso à rede de hidrantes. Em 2012, há um decréscimo discreto das vendas (63.576) e participação (18%), havendo uma queda significativa de mais que doze vezes para 4.790 e a participação de mercado para 1% em 2013. A AirBP recupera uma pequena parte do volume perdido em 2014 (14826 de volume e 3% de participação) e retoma sua trajetória anterior, ainda que não plenamente em 2015 (com 92.501 de volume e 16% de participação), mas novamente com queda em 2016 (com 65280 de volume e 13% de participação), não consolidando a recuperação em relação à participação anterior de 2012 de 18%.
Note-se que o acesso à rede de hidrantes neste caso acontece tão somente depois da entrega das obras de reformas e ampliação do aeroporto que ocorre em meados de 2014. Não se pode descartar que o acesso à rede de hidrantes tenha contribuído com a recuperação mais expressiva em 2015. No entanto, esta recuperação foi em alguma medida comprometida com a perda de 3
pontos percentuais em 2016 e nunca se equiparou à conquista de posição obtida em 2012 de 18% apenas com a estrutura de CTAs.
No caso de São Paulo até 2012, a participação de mercado da AirBP estava entre 0 e 1%, dando um salto significativo em 2013 para 11% e depois para 16% e 18% no triênio 2014/16. Poderia se pensar que Xxxxxxxxx, portanto, teria sido um exemplo da “essencialidade” da rede de hidrantes para viabilizar a entrada de um novo player. Ledo engano. No caso de Guarulhos, a Air BP não podia construir sua instalação pois o aeroporto tinha pendências na área ambiental A aquisição dos ativos da Jacta, nos quais este problema já estava equacionado, acabou por ter sido um meio de resolver este problema de forma imediata. Ou seja, o ativo crítico em Guarulhos para viabilizar a entrada da Air BP não foi a rede de hidrantes, mas a resolução da barreira de ordem burocrática. Se a Air BP estivesse adquirindo uma infraestrutura apenas com CTAs que já possuísse tal licença, teria resolvido o problema do mesmo jeito. De qualquer forma, o problema mencionado não existe mais desde a privatização do aeroporto, não sendo relevante para os próximos entrantes.
Dois pontos adicionais da história de entrada da AirBP são relevantes. Primeiro, além de entrar nestes aeroportos apenas usando CTAs, a Air BP não tinha qualquer expectativa de entrar no pool até a decisão do CADE que ocorreu em 2011 (quando não se sabia ainda para quem iriam os ativos da Jacta) e que acabou por se efetivar apenas em meados de 2012. Ou seja, uma empresa com grande expertise no mercado internacional decidiu entrar mesmo sabendo que não contaria com o acesso à rede de hidrantes, a qual veio ocorrer posteriormente.
Segundo, a participação de mercado adquirida pela Air BP segue nos quatro mercados analisados uma trajetória ascendente, mas não há correlação clara com o evento do acesso à rede de hidrantes. Ou seja, os efeitos do diferencial do acesso à rede de hidrantes não indicam tratar-se de ativo essencial para competir. A
AirBP já crescia nos aeroportos do Rio de Janeiro e DF antes do acesso à rede de hidrantes. Em Pernambuco o efeito do acesso à rede de hidrantes, se ocorreu, demorou entre 3 e 4 anos para acontecer. Em São Paulo, o diferencial não foi a rede de hidrantes e sim a entrada nas instalações do PAA que já continham licença ambiental que vinha junto com a aquisição da Jacta.
A variável relevante para a competitividade relativa hidrantes/CTAs é o tamanho do abastecimento. Para abastecimentos maiores, hidrantes são mais vantajosos especialmente pelo fato de, na operação por CTA, serem necessários mais de um caminhão, o que requer mais tempo de abastecimento, especialmente em aeroportos mais congestionados em terra. Para a média de vôos internacionais de pouco mais de 91 mil litros, a média de tempo de abastecimento para hidrantes é de 1 hora e meia a 2 horas, enquanto para CTAs coloca-se cerca de 30 minutos a mais, o que pode ser uma diferença relevante a depender do cronograma estabelecido para a permanência do avião em solo.
De qualquer forma, mesmo aviões maiores usualmente mais utilizados para vôos internacionais poderão ter um abastecimento mais eficiente por CTAs quando o volume de combustível requerido for menor ou quando houver longo “tempo de solo”. Para aeroportos menos congestionados em terra, esta “restrição de eficiência” baseada em apenas um caminhão tende a ser mais relativizada, podendo ser igualmente eficiente mais de um CTA.
No caso específico da entrada da Granpetro que concentra a sua atuação na aviação executiva, os valores para a instalação de tanques de armazenagem e CTAs no Galeão tendem a ser inferiores aos R$ 8 milhões da AirBP. Note-se que a Air BP entrou com CTAs maiores que a média, com capacidade de 40 mil litros, dado o seu foco em vôos internacionais. Sendo assim, o custo com CTAs mais calibrados para a aviação executiva seria, certamente, inferior ao valor de R$ 2 milhões do Quadro I.
Mais do que isso, o encaixe do hidrante não serve para esta aviação executiva, sendo apenas possível o abastecimento via CTAs. Na aviação executiva o bocal do combustível é mais parecido com o de automóvel do que com os dos aviões comerciais. É, inclusive, impossível o abastecimento destes aviões executivos por hidrantes. Mantido este perfil de atuação, a demanda real da GranPetro tem mais a ver com o acesso (barato) ao duto e ao PAA do pool do que com o acesso à rede de hidrantes, que se alega ser uma facilidade essencial. Dutos e PAA, no entanto, têm ainda menos características de facilidade essencial que a rede de hidrantes, o que enfraqueceria o pleito da empresa. A possibilidade de duplicação, em especial, é totalmente viável em dutos e PAA, o que tornaria a alegação de facilidade essencial ainda mais risível do que na rede de hidrantes.
Xxxxxxxxxx agora que a vantagem do abastecimento por hidrante sempre ocorre com um abastecimento que requer mais de um CTA. Há muitos CTAs de 45 mil litros no Brasil. Na entrada da Air BP no Galeão em 2005, a entrada ocorreu por meio exclusivo de CTAs de 40 mil litros com foco exclusivo em vôos internacionais, sem qualquer acesso à rede de hidrantes.
Há, no entanto, CTAs de 60 mil litros, inclusive utilizados por BR e Raízen, que diminuem a necessidade de mais de um veículo para a realização do abastecimento, especialmente em vôos internacionais.
Avaliando os dados do mês de março de 2016 da BR em Guarulhos, temos alguns números aproximados. Dos 72,5 milhões de litros vendidos pela empresa, 31,3 milhões, ou 43,2%, foram destinados a abastecimentos com mais de 60 mil litros. Ou seja, para 56,8% do total abastecido, sequer se cogita de vantagem competitiva para a rede de hidrantes. Quando colocamos estes números em termos de números de abastecimentos realizados, são 343 abastecimentos com mais de 60 mil litros em um total de 6.175, ou seja, pouco mais de 5,5%. A média de abastecimentos deste
grupo superior a 60 mil litros foi de pouco mais de 91 mil litros, ou seja, pouco mais de 1 CTA e meio.
Mesmo para vôos internacionais, onde a questão do diferencial dos hidrantes poderia ser levantada, dificilmente os requerimentos de abastecimento ultrapassam 120 mil litros, ou seja, dois CTAs de 60 mil litros, o que implica que o diferencial de eficiência não é tão grande quanto se houvesse a necessidade de três ou mais CTAs. Pelos dados da BR em março de 2016, o volume de litros vendidos com abastecimentos superiores a 120 mil litros foi de 2,9 milhões de litros, ou seja, cerca de 4,1% do total abastecido pela BR naquele mês em Guarulhos. A média de abastecimentos acima de 120 mil litros é muito próximo do limite inferior, quase 123,9 mil litros. Avaliando pelo número de abastecimentos, foram 0,5% do total de abastecimentos realizados. A tabela a seguir sumaria estes números. O maior abastecimento daquele mês para a BR atingiu
131.387 litros.
Xxxxxx XX - Xxxxxxx xxx Xxxxxxxxxxxxxx xx XX em Guarulhos em Março de 2016
Tamanho dos Abastecimentos | Total de Litros | % total | Total de Abastecimentos | % total |
Acima de 60 mil litros (mais de um CTA) | 31.370.487 | 43,2 | 343 | 5,5 |
Acima de 120 mil litros (mais de dois CTAs) | 2.973.180 | 4,1 | 31 | 0,5 |
Todos | 72.510.882 | 100 | 6.175 | 100 |
Fonte: Sindicom. Elaboração própria.
Apesar de, na comparação dos custos variáveis no abastecimento via hidrante e via CTAs, o custo variável total da operação do primeiro ser realmente inferior ao segundo, a diferença não é significativa. O Sindicom fez um cálculo do custo variável total da operação de abastecimento em Guarulhos comparando a configuração atual, que mistura abastecimento por hidrantes e CTAs
com uma operação hipotética apenas por CTAs, mais que dobrando o número de CTAs de 32 para 73.A diferença foi de pouco mais de R$ 50 mil Reais a menos (R$ 5.481800 – R$ 5.431400,00) no custo variável da rede de hidrantes, o que é pouco mais de 0,9% de diferença. Se for colocada a depreciação com capital fixo, presumivelmente, a operação com CTAs ficaria até mesmo mais barata.
Quadro V – Custos Variáveis Operação Atual em Guarulhos (Hidrantes
+ 32 CTAs) X Operação Hipotética (só CTAs- 73)
Custos Operaçao Atual
Caminhoes Rede Hidrantes
Anual | QD E | Valor | |||
Caminhão | Pneu | 5.000,00 | 32 | 160.000,00 | |
Combustível | 2.400,00 | 32 | 76.800,00 | ||
Manutenção Geral | 12.000,00 | 32 | 384.000,00 | 325.000,00 | |
Luz | 420.000,00 | 0,5 | 210.000,00 | 210.000,00 | |
Funcionário* | 52.800,00 | 77 | 4.065.600,00 |
* Salário + Encargos + Benefícios
Custo Variável Total da Operação 5.431.400,00
Considerado Market Share de 50% no aeroporto com a malha utilizada
Custos Operação Apenas por CTA | |||||
Anual | QD E | Valor | |||
Caminhão | Pneu | 5.000,00 | 73 | 365.000,00 | |
Combustível | 2.400,00 | 73 | 175.200,00 | ||
Manutenção Geral | 12.000,00 | 73 | 876.000,00 | ||
Luz | 0,5 | - |
Funcionário | 52.800,00 | 77 | 4.065.600,00 | |
Custo Variável Total da Operação 5.481.800,00 |
Fonte: Sindicom
Mas a avaliação de um projeto de hidrantes comparativamente a um de CTAs passa não apenas pelos custos fixo e médio esperados, envolvendo também os riscos envolvidos e flexibilidade na operação de abastecimento. O hidrante tem mais riscos de segurança e ocorrências ambientais que os CTAs. Por exemplo, o pit e as mangueiras estão mais expostas a manobras de terceiros na operação com hidrantes do que com CTAs. Na operação com hidrantes há maior dificuldade de se perceberem ocorrências ambientais e as corrosões do sistema elétrico são menos detectáveis. A dificuldade de eliminação de água e impurezas e de rastreamento de problemas nos estoques de combustível é maior no sistema de hidrantes.
Da perspectiva da flexibilidade da operação, os CTAs permitem executar destanqueios das aeronaves, o que não é possível no sistema de hidrantes. Há ainda nos CTAs maior capacidade de realizar a manutenção da aeronave sem desabastecimento.
As principais vantagens do abastecimento via rede de hidrantes é a maior rapidez da operação, o que é especialmente relevante para aviões maiores que realizam vôos internacionais e o menor trânsito no pátio, concorrente de espaço com outros veículos como os que levam bagagens ou passageiros por exemplo.
No entanto, como as principais empresas fazem uso dos hidrantes em um aeroporto como o Galeão, este problema de congestionamento é menor, havendo maior espaço para entrantes terem mais CTAs. Ou seja, o problema de congestionamento no aeroporto restringe mais a operação de novos CTAs de entrantes em aeroportos sem rede de hidrantes do que naqueles com rede de
hidrantes onde os incumbentes não operam com seus CTAs. Assim, se de um lado a rede de hidrantes é um substituto dos CTAs, ela também facilita sua adoção por entrantes ao reduzir o congestionamento na área de estacionamento de aeronaves que ocorreria se todos os incumbentes atuassem por meio de CTAs.
Essa análise indica que uma condição necessária para que a rede de hidrantes em aeroportos possa ser considerada facilidade essencial simplesmente não se verifica: a existência de uma alternativa suficientemente competitiva como os CTAs, que na verdade constitui a principal forma de abastecimento de aviões em todo o Brasil, descaracteriza completamente a tese da facilidade essencial.
No caso em tela, a entrada da Air BP em vários aeroportos brasileiros dispensa a própria necessidade de exercícios hipotéticos de entrada por meio de CTAs. Mais do que isso, esta entrada foi focada exclusivamente no atendimento a vôos internacionais, justamente aqueles para os quais se alega a maior dificuldade competitiva de CTAs frente à rede de hidrantes.
Como a ideia de facilidade essencial é construída justamente para selecionar os casos em que pode fazer sentido realizar uma intervenção regulatória de obrigação de compartilhamento da infraestrutura, apenas esta constatação já deveria afastar a política de livre acesso neste segmento. A definição de uma política de livre acesso apenas para que haja plena igualdade de acesso aos ativos que permitam o uso da rede de hidrantes se torna, portanto, uma intromissão excessiva e desarrazoada sobre o direito de propriedade das empresas do pool. A geração de ineficiência no setor, com desestimulo ao investimento e inovação, é um resultado mais esperado que os ganhos supostamente provenientes de um número maior de players no mercado.
Vejamos a seguir o papel da posição dominante na aplicação na análise da conduta de recusa a negociar e na da facilidade
essencial.
E) O Papel da Posição Dominante na Análise do Acesso à Rede de Hidrantes
Uma condição necessária padrão para haver um potencial anticompetitivo na conduta de “recusa a negociar” deve ser a verificação de posição dominante no mercado. Como colocado pela OCDE (2007), “é amplamente aceito que firmas não dominantes têm o direito de escolher com quem elas negociam”30.
Considerando os dados do anuário de 2016 do Sindicom31, o mercado brasileiro de combustíveis de aviação é dividido basicamente entre BR com 56,5%, Shell com 32% e Air BP com 11,3%, ficando 0,2% para as outras.
O mercado relevante, no entanto, não é definido no plano nacional, mas sim por aeroporto, no caso o Galeão, e limitado ao JET. Os dados que temos do Sindicom se referem, no entanto, não apenas ao Galeão, mas também aos aeroportos Xxxxxx Xxxxxx, Jacarepaguá e Macaé onde a Air BP não atua.
A participação de mercado no Rio de Janeiro em 2016 é de 58% BR, 26% Shell e 16% Air BP. O quadro a seguir apresenta a evolução recente das participações de XxxXX, BR e Shell no triênio 2014/16. Note que as participações da Air BP e da BR crescem com uma queda não desprezível da participação da Shell que passa de 32,1% para 26,4% no período. Esta variação sugere uma rivalidade significativa entre estas empresas. O fato de Air BP crescer continuamente no Rio de Janeiro (e concentrada no Galeão com foco em vôos internacionais) desde 2010 como visto no quadro II acima também confirma esta hipótese.
30 “It is widely accepted that non-dominant firms have a right to choose with whom they deal”.
31 xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/XXXXXXX_0000_XXXXX_XXXXX0_XXX%00(0).xxx
Quadro VI – Evolução dos Volumes Vendidos e Participações de Mercado no Rio de Janeiro 2014/16
AirBP | Part. % | BR | Part % | Shell | Soma | ||
2014 | 160596 | 12,50% | 711315 | 55,35% | 413100 | 32,15% | 1285011 |
2015 | 158853 | 12,83% | 699798 | 56,52% | 379488 | 30,65% | 1238139 |
2016 | 185047 | 15,61% | 687315 | 57,97% | 313322 | 26,43% | 1185684 |
Fonte: Sindicom
BR, Shell e Air BP são sócias no pool da rede de hidrantes do Galeão. Sendo assim, este é um caso em que o detentor do “insumo” (a rede de hidrantes) não é um player isolado, mas o próprio oligopólio existente.
Considerando o conjunto das três empresas, haveria, portanto, posição dominante (100%) na oferta do insumo “rede de hidrantes”. Como cada uma é sócia independente no pool na proporção de sua participação no segmento à jusante, não se pode afirmar que cada uma isoladamente possui posição de dominância frente à administração do insumo.
Atualmente, a BR detém 64,6% do pool, a Shell 22,4% e a Air BP 13%. Pelas regras do pool, a participação na rede de hidrantes reflete a utilização da rede de hidrantes por cada um dos seus proprietários nos últimos três anos. De fato, aqueles percentuais se ajustam ao longo do tempo conforme as participações dos sócios na movimentação no pool varia a partir de um determinado patamar. Quando a participação na movimentação total de um player varia para cima ou para baixo mais que 5%, isto deve implicar transferência da participação societária no pool de quem perdeu para quem ganhou movimentação relativa. Ou seja, nas regras do pool não é a participação que define quanto se pode movimentar e, portanto, sua participação de mercado, mas sim o quanto se movimenta que define a participação societária. Esta última, portanto, seria endógena, não representando dificuldades para o crescimento ou decréscimo das participações dos sócios no mercado. Simplesmente não há como sócios majoritários limitarem
a capacidade competitiva dos sócios menores por meio da limitação de utilização da infraestrutura.
Assim, aqui cabe avaliar a existência de posição dominante conjunta de BR, Shell e Air BP com base na propriedade da infraestrutura do pool.
Pelos critérios do § 2º do art. 36, Lei nº 12.529/11 , BR e Shell possuem posição dominante unilateral no Galeão com mais de 20% de participação. Já a Air BP não contaria com esta presunção de poder de mercado unilateral32.
Mas a análise mais relevante aqui reside na análise da posição dominante conjunta do setor. BR, Shell e Air BP conjuntamente possuem quase 100% do mercado do Galeão, ou seja, mais do que 75%, o que poderia implicar, em tese, uma presunção de poder de mercado coordenado. Esta presunção é reforçada por dois fatores. Primeiro, a existência do pool que, ao resultar em operações conjuntas e compartilhamento do armazenamento comum de combustível, permite teoricamente uma maior coordenação entre as empresas. Em particular, a infraestrutura comum pode supostamente resultar em maior compartilhamento de informações entre as empresas, o que permite também um exercício de poder maior do que se as operações físicas de armazenagem e transporte do combustível fossem totalmente independentes.
Do ponto de vista teórico, esta tendência natural de eventual capacidade de coordenação, no entanto, é mitigada pelo Acordo de Confidencialidade das Participantes. Sempre há uma única administradora das operações do pool por vez, ou seja, a administração do pool é exercida por apenas uma das sócias em um dado período de tempo, as quais se revezam. Na versão 2015/16, o acordo define que a administradora não deverá divulgar informações operacionais, inclusive para as outras participantes. Veda-se à
32 Utilizaremos “posição dominante” e “poder de mercado” como sinônimos.
Administradora, de qualquer forma, acesso a quaisquer informações comerciais.
Na verdade, constitui um princípio fundamental do acordo no pool que haja separação plena das atividades operacionais do pool das atividades comerciais de cada empresa. O objetivo explícito desta segmentação é o compliance concorrencial das atividades do pool, o que limitaria a possibilidade teórica de coordenação conferida pela operação conjunta destes ativos. Este arranjo mitiga o poder de mercado coordenado do pool.
O que muda o poder coordenado quando da entrada de outros players no segmento à jusante? Se for apenas um player entrante, a soma da participação de mercado dos quatro maiores players (C4) continua acima de 75%, mantendo-se a presunção de poder coordenado. Se for mais que um entrante e que se consiga reduzir o C4 abaixo de 75%, esta fonte de poder de mercado coordenado presumida se reduz.
Se a entrada ocorrer por política de livre acesso no pool, a operação conjunta no âmbito da infraestrutura comum agora de “n” e não mais 3 empresas permanece. Independente do Acordo de Confidencialidade acima descrito, a eventual capacidade de coordenação se mantém a mesma.
Já em uma entrada independente por meio de CTAs, o fato de não se estar no pool já reduziria uma fonte potencial de poder de mercado coordenado, assumindo que a operação conjunta permite pelo menos algum poder coordenado que não ocorreria com operações totalmente independentes.
Em síntese, a entrada independente do pool, por meio de CTAs, tem o potencial de ser mais disruptiva da perspectiva da concorrência do que a entrada por meio da política de livre acesso. Ou seja, além de não ser justificável a política de livre acesso pela infraestrutura não ser realmente essencial, é bem razoável postular que o eventual aporte de concorrentes ligado a esta medida não
trará os ganhos esperados na concorrência.
F) As Dificuldades Práticas para a Implementação da hipótese de Livre Acesso
Não é claro qual o modelo de livre acesso desejado ao pool do Galeão. Os requerentes de acesso apenas pagariam pelo uso da infraestrutura ou se tornariam sócios?
Para cada um desses formatos (não sócio demandante do uso e sócio), há problemas não desprezíveis de implementação e acompanhamento. A intervenção implica a imposição de uma obrigação a negociar seja o serviço de acesso à infraestrutura de tancagem e de hidrantes, seja a incorporação forçada regulatória de novos sócios.
Como não constitui transação voluntária entre as partes, não há mais a garantia de ganhos recíprocos, ou seja, de uma transação Pareto eficiente como destacado na seção II. Para se justificar a política, é preciso que o ganho em termos de redução de poder de mercado mais do que compense as potenciais perdas. Boa parte dessas últimas está relacionada com a dificuldade do regulador em acertar as condições corretas de livre acesso, especialmente preços, que não desestimulem investimento e inovação, e da possível geração de típicos problemas de tragédia dos comuns. Veremos inicialmente na subseção VI.1 os problemas do livre acesso ao uso do ativo (sem necessidade de o requerente de acesso virar sócio) e à propriedade do ativo.
G) Livre Acesso ao Uso do Ativo
Vejamos a hipótese de que os requerentes de acesso apenas demandam acesso sem se tornarem sócios. Nesses casos, a
obrigação de livre acesso corresponderia a uma obrigação de negociar o serviço de acesso à infraestrutura de tancagem e de hidrantes, sem implicar divisão da propriedade dos ativos.
Nesse contexto, o regulador e/ou autoridade de concorrência de forma muito frequente terá que definir em que termos e condições o produto ou serviço de acesso deverá ser oferecido. Como a definição de um preço de acesso muito alto a um insumo ou de condições comerciais muito duras pode ser equivalente à recusa pura e simples de negociar, é muito usual que uma eventual obrigação regulatória de negociar esteja inevitavelmente associada a uma obrigação de fazer preços e/ou condições de acesso dentro de determinados parâmetros, subindo em mais um degrau o espaço de intervenção. E há vários efeitos negativos desta intervenção como colocado pela OCDE (2007):
“alguns tribunais e autoridades de concorrência têm expressado sua preocupação com que a regulação explícita dos termos e condições de oferta de uma firma dominante reduza os incentivos para a inovação e investimento das firmas em vários setores-por medo que (uma vez se tornando dominante) a firma será forçada a compartilhar os benefícios deste investimento ou inovação com outros nos termos e condições regulados. Ao mesmo tempo, preocupações têm sido expressadas de que a obrigação de prover acesso irá reduzir os incentivos dos próprios potenciais entrantes em investir, optando por contar com as facilidades do incumbente. Colocado de outra forma, uma preocupação tem sido expressa de que o acesso mandatório a termos e condições regulados apesar de parecerem ser pró-competitivas no curto prazo, arriscam limitar a competição no longo prazo”33.
Em síntese, os ganhos de concorrência no curto prazo podem
33 “some courts and competition authorities have expressed concerns that explicit regulation of the terms and conditions of supply of a dominant firm will reduce the incentives for innovation and investment by firms in many sectors – for fear that (once dominant) the firm will be forced to share the benefits of that investment or innovation with others at regulated terms and conditions. At the same time, concerns have been expressed that mandated access will reduce the incentives for potential entrants themselves to invest in their own facilities, choosing to instead rely on the facilities of the incumbent. Put another way, the concern has been expressed that mandating access at regulated terms and conditions may appear to be pro-competitive in the short term whereas it risks limiting competition in the long term.”
ser mais do que compensados pelos efeitos sobre os incentivos a investir e inovar, o que é uma questão associada à competição em um prazo mais longo.
Este trade-off entre o curto e longo prazos tornou as autoridades de concorrência mais rigorosas na análise da conduta de “recusa de negociar”, especialmente as da União Europeia e dos EUA. Conforme a OCDE (2007):
“A relutância de alguns tribunais e autoridades de concorrência de se verem envolvidos em definir os termos e condições de comércio é refletida em parâmetros mais rigorosos para definir que uma recusa de negociar esteja em violação da lei de concorrência.
Algumas jurisdições, entretanto, tal como a União Europeia e os EUA, têm adotado parâmetros mais rigorosos para as acusações de “recusa de negociar”. Embora os critérios mais precisos para a avaliação da recusa de negociar difiram nessas duas jurisdições, a tendência básica na atitude judicial para a recusa de negociar é a mesma: os tribunais se tornaram menos dispostos a entender que as firmas dominantes sejam culpadas. Hoje em dia é bem difícil ganhar um caso de abuso de dominância baseado em uma recusa de negociar tanto na União Europeia quanto nos EUA.”34.
Em síntese, a necessidade de a autoridade reguladora ou da concorrência definirem as condições do acesso, especialmente preços, está fortemente ligada à destruição do incentivo ao investimento tanto de quem provê o acesso como de quem demanda o acesso à facilidade essencial.
No documento de 1996, a OCDE já provia um exemplo hipotético do efeito do acesso mandatório sobre a eficiência dinâmica com base na construção de um porto em três cenários, de
34 “The reluctance of some courts and competition authorities to get involved in setting the terms and conditions of trade is reflected in higher thresholds for finding that RTDs are in violation of competition law Some jurisdictions, however, such as the EU and the
US, have been adopting higher thresholds for “refusal to deal” claims. Although the precise standards for evaluating refusal to deal differ in those two jurisdictions, the basic trend in judicial attitudes toward refusal to deal is the same: the courts have become less willing to find dominant firms liable. Today, it is quite difficult to win an abuse of dominance case based on a refusal to deal in either the EU or the US. Some other OECD countries treat refusal to deal harshly by comparison”.
alta, média e baixa demanda. Assumindo um investidor neutro ao risco, o exemplo mostra uma situação em que o porto seria construído sem uma política de livre acesso, mas não o seria na presença de tal política:
“a firma pode se deparar com três resultados possíveis: um retorno negativo em qualquer caso -com ou sem acesso mandatório- (baixa demanda), um retorno negativo se o acesso for mandatório mas positivo quando pode excluir concorrentes do acesso (demanda média), e um retorno positivo mesmo quando o acesso é mandatório (demanda alta). Deve ser o caso no qual se a firma espera que ele deverá prover acesso mandatório, então ela não construiria o porto, mas se ela espera que o acesso não será mandatório, então ela construiria o porto” Então, o dever de prover acesso pode impedir
o investimento inicial na facilidade”35.
A potencial relação negativa entre livre acesso e investimento já foi reconhecida pelo CADE. O Conselheiro Ragazzo no PA 08012.002692/2002-73 faz uso de uma importante passagem de Whish (2001)36:
“é importante reconhecer que devem haver limites à doutrina das essential facilities. Demandar a uma firma dominante que conceda acesso à sua infra-estrutura é uma intervenção significativa por parte da autoridade antitruste; uma aplicação excessiva da doutrina das essential facilities pode gerar efeitos econômicos
35 “the firm may face three possible outcomes: a negative return on investment in the port in any case (low demand), a negative return if access is mandated but positive if it can exclude competitors (medium demand), and a positive return even when access is mandated (high demand). It may be the case that if the firm expects access to be mandated, then it would not build the port, but it expects access not to be mandated, then it would build the port…. Hence a duty to provide access can deter initial investment in such a facility”.
36 “it is important to recognise that there must be limits to the essential facility doctrine. Demanding that a dominant firm should grant access to its facilities is a major intervention on the part of a competition authority; and an excessive application of the essential facilities doctrine can have harmful economic effects. This is not only because there is an element of expropriation in requiring one firm to grant access to its property to a competitor, but also because the prospect that third parties might be able to demand a “free ride” on the fruits of another's investment might deter the latter from making the investment in the first place. It is clear therefore that there must be a sensible limit upon what is to be considered to be an essential facility, and that the circumstances in which access to it can be mandated under Article 82 should be determined with the need not to discourage investment in mind". XXXX, Xxxxxxx. Xxxxxxxxxxx Xxx. 0 Xxxxxxx, Xxxx, XX: Butterworths, 2001,
prejudiciais. Isso não apenas porque há um elemento de expropriação em se requerer que uma firma conceda acesso de sua propriedade a um competidor, mas também porque a possibilidade de que terceiros possam demandar urna “free ride” nos frutos do investimento de outrem pode dissuadir este último de realizar o próprio investimento. É claro, portanto, que deve haver um limite sensível sobre o que seja considerada uma essencial facility, e que as circunstâncias em que o acesso a ela pode ser determinado sob o Artigo 82 devem ser analisadas tendo-se em mente a necessidade de não desencorajar investimentos." (tradução livre)
Daí o relator do processo conclui favoravelmente à restrição no livre acesso da British Gas (BG) e Enersil ao gasoduto da TBG em função do que seria a perda de incentivo no investimento:
“nota-se que uma eventual recusa ou limitação de acesso à BG e à Enersil por parte da TBG justificou-se em razão da necessidade de recuperar os pesados investimentos aportados pela Petrobras na construção do GASBOL. O enorme montante financeiro despendido, as obrigações firmadas e os riscos assumidos pelos proprietários da infraestrutura em um momento ainda incipiente da indústria do gás jamais poderiam ser compensados no curto período de 2 ou 3 anos de operação do gasoduto, época em que ocorreram as condutas alegadas. Conclusão diversa por parte dos órgãos de defesa da concorrência certamente tenderia a desencorajar novos investimentos semelhantes, em prejuízo da sociedade e de uma correta aplicação da doutrina concorrencial.“
A relação da facilidade essencial com o investimento aqui passa pela forma de precificar o acesso. A tendência do regulador é usualmente precificar o acesso abaixo do custo de oportunidade para o provedor, fazendo cair o lucro esperado e, portanto, o incentivo a investir.
Um exemplo de política de livre acesso em que não há imposição de novos sócios é a de unbundling no setor de telecomunicações. Xxxxxx (2006) faz uma resenha desta literatura que contém valiosas lições para o caso em tela, para a qual realizamos uma síntese em seguida.
Há, inevitavelmente, uma discussão sem fim entre incumbentes e entrantes nos países em que o regulador de telecomunicações optou por implementar o unbundling sobre o quão apropriados são os preços regulados de acesso. De fato, quaisquer que sejam os preços de acesso regulados, os entrantes sempre reclamam que eles são muito elevados para que eles sobrevivam e cresçam no mercado. Da mesma forma, para os incumbentes, quaisquer que sejam os preços de acesso, eles são sempre baixos demais para a devida recuperação do investimento37.
Os que defendem a visão dos incumbentes como Sidak e Xxxxxxx (1998) argumentam que preços de acesso regulados são pervasivos e “representam uma quebra do contrato regulatório”38. Estes autores e Xxxxxxx (2004) avaliaram a política de acesso aberto por meio do unbundling da perspectiva do debate sobre “expropriação regulatória” 39de propriedade privada, especialmente quando envolve o requerimento de colocação (collocation) de equipamentos do entrante dentro das facilidades dos incumbentes. Para ambos os autores, “o unbundling mandatório constitui uma invasão física de propriedade do incumbente ordenada pelo governo”40. Isto ocorre dado que o unbundling destruiria pelo menos em parte o poder do incumbente de controlar o uso de sua propriedade, o que constitui um dos aspectos mais fundamentais do que confere significado econômico à cesta de direitos do “direito de propriedade”. Nesse sentido, Xxxxx e Xxxxxxx (1998) afirmam que o Telecom Act de 1996 americano “transformou a rede de telefonia local em um tipo de comuns”, o que eles apresentam como “a tragédia dos telecomuns”41 , referência à conhecida “tragédia dos comuns”, clássica da literatura econômica, e que como veremos terá
37 Veja, por exemplo, Xxxx (2004).
38 “represents a breach of the regulatory contract”.
39 “regulatory takings”
40 “mandatory interconnection and unbundling constitute a government ordered, physical invasion of the property of the incumbent”.
41 “had turned the local telecommunications network into a kind of commons”, a qual os autores apresentam como “the tragedy of telecommons”.
um significado próprio no caso em tela. Pior, o unbundling seria uma expropriação para uso privado e, comparado ao caso de expropriações para uso público, as chances de que o resultado líquido da intervenção será positiva é muito menor.
A ideia da expropriação regulatória transformando o setor em uma “tragédia dos comuns” se tornaria ainda mais forte quando o valor da compensação ou o preço de acesso fosse menor que o valor real da propriedade expropriada, o que criaria uma tendência a mais intervenção do que é normalmente requerido. Este seria o caso das regras usuais de preços de acesso baseadas no custo incremental de longo prazo (Long Run Incremental Cost (LRIC)) ou em qualquer fórmula que resulte em preço abaixo do custo de oportunidade do incumbente. De qualquer forma, o principal ponto é que, como o incumbente deixa de ser o “reclamante residual” (residual claimant) sobre os retornos do investimento por uma eficiência e qualidade do serviço maiores, os incentivos econômicos para alcançar tais objetivos são comprometidos.
O uso da precificação de acesso por meio do custo incremental de longo prazo ou outra metodologia que implique preços de acesso menores aumentaria os incentivos do incumbente para deteriorar a qualidade do acesso ao rival, um ponto ressaltado por Laffont e Tirole (2000, p. 154/161). Isto ocorreria, segundo os autores, porque os reguladores usualmente considerariam o acesso à rede do incumbente apenas como um instrumento para auxiliar a entrada a qualquer custo e não como uma outra linha de negócio que deve gerar lucro tanto quanto as outras.
Xxxx, Xxxxxxx e Xxxxxxx (1998), Hausman e Xxxxx (1999), Xxxxx, Xxxxx e Xxxxx (2000) e Xxxxxxx (2004), entre outros autores, argumentam que quando há elevada incerteza na demanda futura (que é o caso em aeroportos) ou tecnologia, há uma assimetria básica que a metodologia do preço de acesso baseado no LRIC não incorpora. Se a demanda futura acabar sendo “alta”, o entrante requer o acesso e se beneficia do “bom estado da natureza”. No
entanto, se a demanda futura se realizar “baixa”, o entrante não requer a entrada por meio do livre acesso e evita as perdas que o incumbente já incorreu, dado que o custo da infraestrutura é todo ele afundado (sunk) 42 . Como ressaltado por Xxxxxxx, o entrante “se beneficia na alta do mercado, enquanto é capaz de evitar a baixa do mercado”43 . Hausman e Xxxxx (1999) apontam que mesmo se o entrante requerer o livre acesso e iniciar sua operação utilizando a infraestrutura do incumbente, nada impede que este operador decida sair quando um estado ruim de demanda se realiza. Sendo assim, se há a política de livre acesso, o preço de acesso deveria explicitamente incorporar a exposição do incumbente ao risco que não é incorrida pelo entrante. Caso isto não ocorra, o retorno do investimento ficaria abaixo do nível competitivo com consequências negativas ao investimento. Este efeito pode ser interpretado como uma perda de “um valor de opção” da decisão de investimento44, e, portanto, importa mais quando os retornos do setor forem mais voláteis e imprevisíveis.
Parte desta literatura também enfatiza o desincentivo ao investimento dos próprios entrantes com o unbundling e que isso compromete o vigor competitivo que se deseja fomentar. Crandall (2002), por exemplo, argumenta que as entrantes nos EUA que construíram a sua própria infraestrutura, em lugar de apenas solicitar unbundling, foram mais bem sucedidas no negócio do que aquelas que contavam tão somente com o conforto da política de livre acesso.
De fato, se a imposição de obrigação de negociar pode estimular a concorrência à jusante (downstream), ela certamente desestimula a concorrência à montante (upstream). Como destaca a OCDE (2007):
42 No caso dos hidrantes em aeroportos, são inclusive literalmente afundados.
43 “benefits on the upside, while avoiding the downside”.
44 Outros autores também já exploraram a “teoria das opções reais” da decisão de investimento, incluindo suas implicações na relação entre unbundling e investimento. Ver Hausman (1999) e Hausman e Sidak (1999).
“Isto faz com que a entrada no mercado à montante seja menos factível, reduzindo a probabilidade de que a posição dominante neste mercado seja erodida pelas forças naturais do mercado. Por que? Porque os entrantes à montante teriam que competir contra uma firma dominante que agora está sendo forçada a cobrar preços menores este fator também torna a entrada menos
atrativa aos entrantes potenciais à montante”45.
No caso do livre acesso à rede de hidrantes, a ANAC parece sinalizar para a precificação com base no investimento não amortizado:
“as empresas incumbentes tiveram gastos correspondentes aos investimentos em bens e benfeitorias necessários para a operação do pool. Se o acesso de uma distribuidora for vinculado a um pagamento superior ao investimento não amortizado, a entrante vai necessariamente ter um gasto maior do que as incumbentes. No limite, a precificação com base na expectativa de receitas futuras permitiria que as distribuidoras que já possuem contrato com o aeroporto extraíssem todo o lucro da atividade da entrante concorrente.
Dessa forma, o valor da parcela de participação no pool deve ser precificado com base no valor não amortizado dos bens e benfeitorias. Este é o valor que compensaria as incumbentes pelos investimentos realizados e manteria a contestabilidade da atividade de abastecimento, na medida em que permitiria a concorrência em igualdade de condições. A intuição econômica por trás do entendimento de que a indenização por investimentos realizados deve corresponder ao valor não amortizado dos bens e benfeitorias pode ser observada no § 3º do art. 40 da Lei nº 7.5655, de 19 de dezembro de 1986 (Código Brasileiro de Aeronáutica)”
A discussão sobre preços de acesso ótimos é longa, tendo sido muito desenvolvida no setor de telecomunicações tal como resenhado em Mattos (2003). O preço de acesso ótimo, no entanto, não pode se basear apenas na contribuição para a depreciação do
45 “it may also make entry in the upstream Market less feasible and thereby reduce the likelihood that the dominant position in the market will be eroded by natural market forces. Why? Because upstream entrants would have to compete against a dominant firm that is now being forced to charge lower prices……….That factor also makes entry less attractive to potential upstream entrants”.
custo fixo não amortizado. Para se prover acesso há um custo variável também representado especialmente por mão de obra do pool, custos de manutenção, dentre outros, que, pelo menos em parte, vão ser colocados a serviço do “negócio” de acesso.
De qualquer forma, a precificação com base estritamente no custo contábil (mesmo contando custos fixos e variáveis) também sofre de fortes críticas. A principal delas é que a noção relevante de “custo” em economia refere-se ao custo de oportunidade e não ao contábil. Assim, a precificação de acesso deve incorporar o que o incumbente proprietário da infraestrutura deixa de ganhar ao prover o acesso que é a própria definição de custo de oportunidade.
Esta regra de preço de acesso que se baseia no custo de oportunidade é a “regra do componente de preço eficiente” (ECPR) e foi assim defendida por Xxxxxx e Sidak (1994,p. 94):
“Um requisito crítico para a eficiência econômica é que o preço de qualquer produto não deve ser inferior ao seu custo marginal ao seu custo médio incremental. A análise econômica enfatiza que os custos marginais pertinentes assim como os custos incrementais médios devem incluir todos os custos de oportunidade incorridos pelo fornecedor. Aqui o custo de oportunidade se refere a todos os ganhos potenciais que a firma fornecedora deixa de receber, seja pela provisão dos próprios insumos ou comprando de outrem, ou pelo oferecimento de serviços aos concorrentes que forçam o fornecedor a abrir mão de lucros nestes negócios perdidos.... a regra ótima de insumos define simplesmente que o preço de um insumo deveria igualar o seu custo incremental médio, incluindo todos os custos de oportunidade incrementais pertinentes”46.
46 A critical requirement for economic efficiency is that the price of any product be no lower than that product’s marginal cost or its average incremental cost. Economic analysis emphasizes that the pertinent marginal cost as well as the average incremental cost must include all opportunity costs incurred by the supplier in providing the product. Here opportunity cost refers to all potential earning that the supplying firm forgoes, either by providing inputs of its own rather than purchasing them, or by offering services to competitors that force it to relinquish business to those rivals, and thus to forgo the profit on that lost business. The
optimal input-pricing rule states simply that the price of an input should equal its average- incremental cost, including all pertinent incremental opportunity costs”.
Xxxxxx e Xxxxx (1994,p. 99) defendem que o ECPR “implica um nível de preço precisamente igual ao que seria aquele definido por mercados perfeitamente competitivos ou perfeitamente contestáveis” 47 , o que seria um indicativo de sua otimalidade econômica.
Laffont e Tirole (1994, p.1695 and 1996, p.242), por sua vez, mostram que o ECPR satisfaz as propriedades de otimalidade econômica de Xxxxxx sob certas condições, o que seria uma propriedade muito desejável. Em especial, a regra do ECPR permite que a entrada só ocorra quando o entrante é, de fato, mais eficiente que o incumbente e poderá ser capaz de conferir mais eficiência à operação. Isto contrastaria frontalmente com a ideia de fomentar a concorrência a qualquer custo, inclusive de agentes pouco eficientes que comprometem a eficiência geral do serviço.
Vejamos o efeito de uma regra de preço de acesso diferente do custo de oportunidade sobre o investimento na linha da regra inicialmente postulada pela ANAC. Se o concessionário vai tão somente recuperar o preço da parcela não amortizada, o concessionário, em seu negócio de acesso apenas recupera o que investiu sem lucro. Naturalmente ele preferiria investir o mesmo valor em algum outro negócio que recuperasse o investimento e ainda resultasse em um lucro líquido. Ou seja, considerando o custo de oportunidade dos recursos desembolsados no investimento, o investidor preferiria alocá-los onde conseguisse o melhor retorno e não em um negócio pelo qual o regulador define um acesso compulsório a um rival. Este corresponde a um comprometimento direto de um dos principais direitos relativos à propriedade que é “auferir renda do ativo”, implicando uma tendência ao subinvestimento tanto em novos ativos como na manutenção dos existentes.
47 “yields a price level set in precisely the same way it would be in a perfectly competitive or perfectly contestable market”.
Dessa forma a precificação feita pela “expectativa de receitas futuras” refutada acima pela ANAC, se interpretada devidamente como custo de oportunidade, constitui uma base muito mais sólida do ponto de vista do incentivo ao investimento e eficiência do que a recuperação dos ativos não amortizados.
A precificação pelos investimentos não amortizados seria confiscatória e não proveria os sinais adequados de investimento, contrariamente ao presumido pela ANAC. Isso indica que, se confirmada a orientação de obrigar o acesso e ainda fazê-lo por um preço de acesso confiscatório, haverá um efeito negativo sobre a eficiência e o investimento no setor.
Mais que isso, o acesso fácil e barato desincentiva a busca de substitutos pelas firmas menores conforme colocado pela OCDE (2006):
“o compartilhamento forçado compromete os incentivos das firmas menores a investir e inovar de outra forma. Se eles estão legalmente autorizados a acessar o produto ou serviço da firma dominante em termos melhores do que a firma dominante deseja prover a eles, então o incentivo das firmas menores a desenvolver os seus próprios substitutos irá decrescer”48.
Avaliando isto para o caso de abastecimento de combustível em aeroporto, é razoável postular que a entrante terá menos incentivo a investir em seus próprios CTAs (que não são custos afundados) para competir com os incumbentes já que podem contar com o acesso fácil à infraestrutura de hidrantes do pool.
Xxxxxxx (2005) mostrou que, de fato, houve queda no investimento no setor de telefonia em função do unbundling comparativamente a outros setores de tecnologia de informação em
48 “forced sharing harms the incentives of smaller firms to invest and innovate in another way. If they are legally entitled to access the dominant firm´s product or service on better terms that the dominant firm wanted to give them, then smaller firms´ incentive to develop their own substitute will decrease”.
que não havia tal requerimento.
O abandono da regulação de line-sharing e de unbundling no local loop nos EUA gerou, por sua vez, maior vigor no investimento pelos entrantes. Pociask (2003), Bourreau e Xxxxx (2004) Willig, Xxxx, Xxxxxxx e Xxxxxxxx (2002) mostram evidências na mesma linha. De acordo com estes autores, algumas vezes se constatou um efeito curioso, mas totalmente racional: os próprios incumbentes ofereciam condições de acesso atrativas para os entrantes de forma a dissuadi-los de realizarem seus próprios investimentos, o que os tornaria concorrentes mais vigorosos. Um regulador francês chegou a vetar um preço de acesso definido pelo incumbente considerado tão baixo que desincentivava totalmente o investimento dos entrantes. A estratégia dos incumbentes era clara: induzir os entrantes a serem dependentes deles para o resto da vida e não competir de forma mais agressiva!
Como a competição gerada pela entrada dependente do entrante no unbundling foi se revelando muito precária, a justificativa desta política passou a ser a ideia que se entra pequeno e dependente para depois ser capaz de crescer e construir a própria infraestrutura. A União Europeia, por exemplo, contava fortemente com a ideia da complementaridade intertemporal baseada no que Cave (2004) chamou da “escada de investimento” ou “ladder of investment” (conhecido como tese do “stepping-stone” nos EUA). Hausman e Xxxxx (2004) mostraram para um conjunto de países que “com um pequeno conjunto de possíveis exceções, a rationale para um unbundling obrigatório não parece ter se substanciado na prática. O mais claro exemplo é o da hipótese do stepping stone, a qual não foi comprovada em qualquer país de nossa pesquisa... os entrantes pareceram em geral permanecer dependentes dos elementos desagregados com livre acesso da rede e fizeram pouco esforço para substituir tais ativos com seus próprios investimentos”. Além disso, “ a hipótese da barreira à entrada, que implica que o unbundling mandatório é necessário nas telecomunicações para
superar as barreiras à entrada, é rejeitada (...) Finalmente, a competição dos entrantes em geral não parece implicar preços menores ao consumidor (...) há escassa evidência que os entrantes tenham inovado pela agregação de serviços de voz e dados sob uma única oferta--- colocado de forma diferente, a única “inovação” oferecida pelos entrantes veio na forma de marcas e distribuição mais do que em melhorias nas redes e outras infraestruturas”49.
Para Spiller e Xxxxx (2003), os custos de transação se tornam exacerbados no contrato de unbundling tendo em vista sua complexidade, a qual o torna particularmente “incompleto”. De acordo com Xxxxxxx e Xxxxx (2003), isto “cria numerosas oportunidades para jogos estratégicos e manobras legais”, sendo que “litígios e processos regulatórios custosos e demorados são mais a regra que a exceção” 50 . Isto requer uma intervenção regulatória bem mais pesada com elevadas chances de erro.
O início da política de unbundling nos EUA ilustra a dificuldade de induzir uma negociação livre e cooperativa entre as partes. Como descrito por Hausman e Xxxxx (2000), “no outono de 1996, entrantes e incumbentes não chegaram a nenhum acordo voluntário sobre o preço dos elementos de rede desagregados e de revenda. Como consequência, milhares de procedimentos de arbitragem iniciaram no outono de 1996. Em muitos casos, cada processo arbitral era um procedimento entre um único entrante e um incumbente”.
De fato, o padrão geral do unbundling no mundo todo foi de
49 “with a few possible exceptions, the rationales for mandatory unbundling do not appear to be substantiated in practice. The clearest example is the stepping stone hypothesis, which fails to be substantiated in any country in our survey……CLECs generally appear to remain dependent upon unbundled elements and have made little attempt to substitute those assets with their own facilities”. Além disso, “the entry barrier hypothesis, which implies that mandatory unbundling is necessary to overcome entry barriers in local communications is rejected…..Finally, competition from CLECs generally does not appear to lower retail prices
……There is scant evidence that entrants “innovated” by bundling voice and data services under a single offering…..Stated differently, the only “innovation” offered by entrants came in the form of branding and distribution rather than improvements in networks and other infrastructure”.
50 “creates numerous opportunities for strategic ploys and legal maneuvering”, being that “costly and time-consuming litigation and regulatory processes are more the rule than the exception”.
atraso na implementação de 2/3 anos depois que a política se tornou mandatória.
O problema principal do unbundling e de outras políticas de livre acesso é a possível característica de “expropriação regulatória” que resulta na criação do já mencionado problema de “tragédia dos comuns”, o que veremos mais adiante.
H) Livre Acesso à Propriedade do Ativo
A outra forma de implementar a política de livre acesso é impor a que todos que demandem acesso aos ativos do pool se tornem sócios do empreendimento.
Neste caso algumas mudanças significativas são requeridas no arranjo de governança do pool. Atualmente, a BR detém 64,6% do pool, a Shell 22,4% e a Air BP 13%. O mínimo que cada empresa pode ter é 10%, além de ser “tecnicamente capaz de operar as instalações”. Isto visa a mitigar eventual comportamento free-rider de sócios muito pequenos com baixa capacidade técnica e pouco interesse nos objetivos globais de investimento e manutenção dos ativos do pool.
Na hipótese de acesso por meio da imposição de novos sócios, este percentual mínimo de propriedade do pool provavelmente deveria se reduzir, o que agudizaria estes problemas de free-riding.
O problema do comportamento free-rider de sócios pequenos não se limita à questão do alcance dos objetivos de otimizar privadamente os gastos em investimento e manutenção dos ativos do pool. Também há um problema com os objetivos coletivos de segurança e cuidados com meio ambiente que dizem respeito à prevenção de externalidades negativas da operação do pool. Assim, um problema de subprovisão de bens coletivos relativo à segurança e meio ambiente da sociedade passa a ser um problema interno da
“empresa” representada pelo pool.
Não à toa, é parte do acordo do pool as “Diretrizes de Segurança, Saúde e Proteção do Meio Ambiente para Operações de Aeroportos em Pool”. Assim, define-se que devem ser identificados, testados e mantidos todos os sistemas críticos de segurança e proteção do meio ambiente das instalações como o sistema de combate a incêndio, alarme de nível de tanques, sistema de alarme do sistema de hidrantes, sistema de recolhimento de produto e caixas separadoras, dentre outros, além de plano de contingências. É necessário da administradora monitoramento constante das caixas separadoras de água oleosa das instalações do pool com testes mensais de efluentes medindo acidez, temperatura, nível de óleos e graxas, sulfactantes e sulfetos e fenóis. A necessidade de evitar vazamentos requer manutenção periódica em juntas, flanges, tubulações, válvulas e sistemas operacionais, além da elaboração de relatório sobre passivo ambiental da instalação. Há também a necessidade de investimentos em equipamentos de proteção ambiental como bacias de contenção impermeabilizada, “overfill protection” em tanques, sistemas de drenagem olcosa, dentre outros.
O problema de free-riding nas políticas de livre acesso são destacadas pela OCDE (2007) que argumenta que a imposição de livre acesso pode levar a perdas de “economias de operação integrada”. O fato de existirem vários players operando, de forma não plenamente coordenada, sobre a mesma infraestrutura certamente pode gerar prejuízo ao seu uso racional e eficiente e comprometer o cumprimento de normas regulatórias como requisitos ambientais e de segurança. Como colocado pela OCDE (2007):
“A obrigação de prover o serviço pode resultar na perda de economias de operação integrada ou outros efeitos indesejáveis que compensam quaisquer benefícios potenciais da maior competição e inovação em mercados relacionados. Em Taipei/China, por exemplo, o acesso ao coque (um sub-produto da indústria do acesso) foi
negado a uma firma à xxxxxxx quando a autoridade de concorrência não pôde ser satisfeita com o endereçamento de questões ambientais pela firma”51.
A OCDE (2007) enfatiza que uma das condições requeridas para que seja aplicada uma obrigação de negociar é de que
“Deve ser técnica e economicamente factível que a firma que se recusa a negociar proveja o serviço requerido – isto é, deve ser possível prover o serviço sem risco à segurança, ao meio ambiente, ou outros processos e operações da firma. Adicionalmente, a firma deve ser capaz de prover o serviço sem perturbação indevida do serviço, perda de economias de integração, ou perda de flexibilidade.”52
No caso do pool dos hidrantes em aeroportos este pode ser um problema natural. Como os custos de um acidente podem ser compartilhados por todos os sócios, pode haver desincentivo a investir em cuidados para a segurança por cada player isoladamente. Uma forma de mitigar este problema é garantir a qualidade dos sócios, especialmente assegurando que eles possuam uma expertise reconhecida e um custo reputacional alto se for dado causa a algum acidente.
Um indicativo de que esta preocupação é uma consideração de fundamental importância no setor, inclusive muito mais relevante do que evitar a concorrência é a história de entrada da AirBP no pool do Galeão.
Cumpre lembrar a intervenção do CADE em 2011 no ato de
51 “The requirement to provide service may result in the loss of economies of integrated operation or other undesirable effects that outweigh any potential benefits from enhanced competition and innovation in related markets. In Chinese/Taipei, for example, access to coke (a by-product of steel manufacturing) was denied to a downstream firm when the competition authority could not be satisfied that environmental concerns would be adequately addressed by that firm”.
52 “It must be technically and economically feasible for the refusing firm to provide the requested service – that is, it must be possible to provide service without risk to safety, the environment or other processes and operations of the firm. In addition the firm must be able to provide the service without undue disruption, loss of economies of integration, or loss of flexibility.”
concentração 08012.004341/2009-73 em que Shell e Esso/Cosan fundiram em 2009 os ativos localizados em aeroportos referentes ao fornecimento de combustível de aviação. A parte da Esso era representada pela empresa Jacta. O CADE determinou a alienação desta empresa para um outro player que não fosse a BR. Como a Jacta tinha participação no pool de hidrantes do Galeão, esta participação deveria também ser transferida para o novo sócio. Essa transferência que ocorreria da Shell para o novo player, no entanto, requeria anuência prévia do sócio não envolvido no ato de concentração, a BR.
Seria de se esperar da BR e da própria Shell que estariam admitindo um sócio concorrente no pool que mirassem um player de menor capacidade competitiva. Afinal de contas, este novo sócio seria um concorrente agora com acesso à rede de hidrantes. Com certeza, a Granpetro seria um player com menor força esperada no mercado que a AirBP, até mesmo por ter seu foco na aviação executiva. Se a preocupação fosse minimizar o vigor competitivo do novo player, a escolha recairia evidentemente sobre a Granpetro.
No entanto, optou-se, por um procedimento baseado em um leilão. Naturalmente, nesses casos, os players mais eficientes, na ausência de restrições na eligibilidade para participar do procedimento, são os mais prováveis ganhadores. E foi o que aconteceu: a AirBP, uma multinacional com reconhecida expertise no mercado e com muito maior potencial competitivo do que a Granpetro ganhou o leilão. A empresa já havia entrado no Galeão exclusivamente por meio de CTAs e já detinha uma participação relevante. O que levou tanto a Shell a arriscar por um procedimento impessoal com grande probabilidade de levar a um sócio com capacidade de roubar clientela maior e a BR aceitar isto?
A hipótese mais plausível é que os potenciais problemas de
“tragédia dos comuns”53 e suas implicações para a manutenção e segurança da operação do pool foram mais relevantes do que o natural desejo de não aumentar a concorrência no setor. A maior expertise da AirBP está amplamente associada a uma também muito maior capacidade da empresa de seguir os padrões de segurança de acidentes e de risco ambiental dos outros sócios BR e Shell.
De fato, ter um sócio acostumado com elevados padrões de segurança de acidentes e meio ambiente mitiga este problema usual de tragédia dos comuns próprio a este tipo de sociedade. Além da maior expertise quanto à manutenção da segurança do uso coletivo do sistema de hidrantes, a AirBP conta com um custo reputacional por eventual descuido na gestão do sistema muito maior que a Granpetro. Simplesmente, como empresa multinacional, este custo atravessa as fronteiras nacionais.
Os riscos referentes ao processo de abastecimento de aeronaves são confirmados no site do “Piloto Policial”. O site recomenda 54 às tripulações especial cuidado com revendas de combustível “bandeira branca” e que sejam pouco operadas pela empresa.
A manipulação do combustível no momento do abastecimento também é cercada de cuidados, com recomendações para certificar- se que os extintores estejam disponíveis e em local próximo à aeronave, que o “fio metálico”, próprio para evitar descarga elétrica, foi conectado pelo abastecedor na aeronave, que não ocorra reabastecimento com passageiros a bordo sem pelo menos um dos tripulantes a bordo e com os motores desligados, que não ocorra
53 Conforme a Wikipedia em 16/12/2016, “a tragédia dos comuns é uma teoria econômica que explica uma situação em um sistema de recursos compartilhados onde usuários individuais agindo de forma independente de acordo com o seu próprio interesse se comportam contrariamente ao bem comum de todos os usuários destruindo o recurso por meio de sua ação coletiva”. ( the tragedy of the commons is an economic theory of a situation within a shared-resource system where individual users acting independently according to their own self-interest behave contrary to the common good of all users by depleting that resource through their collective action).
54 xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxx-xxxxxxx-x-xxxxxxxx-xx-xxxxxxxxxxxxxxx-xx- aeronaves/
reabastecimento com passageiros a bordo quando os motores estiverem em funcionamento, que não se permita “pessoas estranhas” próximas da aeronave durante o reabastecimento, que não se fume ou permita-se que se fume próximo à aeronave durante o processo de reabastecimento, que não se utilize celular ou meio eletrônico similar durante o processo de reabastecimento.
A diluição regulatória da propriedade da infraestrutura como forma de prover livre acesso tem um grande potencial de induzir comportamento free-rider não apenas para os objetivos empresariais como investimento e inovação, mas também para os objetivos que geram externalidades positivas como segurança e meio ambiente. Ademais, algumas regras de governança do pool como o percentual mínimo de propriedade (10%) e de rodízio na administração do pool terão que ser revisadas com efeitos negativos sobre a lógica atual de funcionamento desta infraestrutura compartilhada.
Este tipo de compartilhamento de infraestrutura por concorrentes naturalmente já traz o potencial de conflitos societários e de filosofia de operação. Obrigando a entrada de empresas menores, com perfis de cultura organizacional e expertise de negócio bem diferentes das atuais três sócias, todas com ampla experiência internacional, este potencial de conflito tende a se exponencializar. A infraestrutura vira um “banheiro público” no qual ninguém cuida, preserva ou investe.
I) Recusa a Negociar e Requerimento de História Prévia de Transações
Dada a dificuldade em definir quando a recusa de negociar é ou não anticompetitiva e ainda os potenciais efeitos negativos sobre investimento e inovação da imposição de termos e condições de acesso ao bem ou serviço, as autoridades de concorrência têm uma
tendência a intervir majoritariamente quando já existe uma história prévia de transações. Ou seja, a autoridade tende a intervir mais nos casos em que a transação já ocorria, mas foi interrompida, do que nos casos em que ela não acontecia.
Nesse caso, os termos das transações prévias podem ser utilizados mais ativamente como base para o novo acordo agora sob a égide do regulador. Ademais, o fato de que havia uma transação voluntária antes pode ser tomado como um indicativo que, de fato, ela tem maior propensão a ser criadora líquida de valor para as partes em relação ao caso em que nunca houve transação prévia. As informações disponíveis sobre estes termos reduziriam a assimetria de informação do regulador. Conforme a OCDE (2007):
“Entretanto, os tribunais e as autoridades de concorrência são mais dispostos a atacar a recusa para negociar quando já há um padrão existente ou passado de negociação do produto ou serviço em questão....... Nesses casos, os tribunais ou autoridades de concorrência derivam maior conforto dos fatos que (a) é tecnicamente e economicamente factível prover o produto ou serviço em questão; (b) é menos provável haver uma justificativa objetiva para a recusa de ofertar; e (c) os termos e condições providas em outro lugar provêm um referencial por meio do qual eles poderia impor a obrigação à empresa dominante de ofertar o serviço. Embora estes outros preços não sejam um referencial perfeito (dado que as condições podem variar ou diferir entre mercados diferentes), eles são provavelmente menos imperfeitos do que definir um preço de acesso regulado de novo (...).
Casos de recusa a negociar tendem a ser mais difíceis
quando a firma dominante não tem histórico de prover o produto ou serviço em questão a firmas externas.55”
Como mostram Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx e Xxxxx (2002), a
55 “However, courts and competition authorities have been more willing to attack refusal to deal when there is an existing or historic pattern of dealing in the product or service in question (…) In these cases, the courts or competition authorities draw some comfort from the facts that (a) it is technically and economically feasible to provide the product or service in question; (b) there is less likely to be an objective justification for the refusal to supply; and (c) the terms and conditions at which the service is provided elsewhere provide a benchmark at which they could mandate service by the dominant firm. Although these other prices are not a perfect benchmark (since conditions may change or differ across markets), they are less likely to be imperfect than setting a regulated access price de novo”.
existência de transações bem estabelecidas anteriores à recusa de negociar foi um ponto fundamental no famoso caso Xxxxx Skiing:
“Xxxx que a decisão do defendente de recusar a negociar partia de um arranjo lucrativo prévio de longo prazo com o seu concorrente, a definição do juiz de que não havia uma justificação de negócio válida para o término do arranjo era amplamente suportada”56.
Em nosso caso concreto, temos que a Granpetro ou outras requerentes de acesso (à exceção de um teórico retorno da Esso) nunca fizeram parte do pool, o que implica inexistir história prévia de transações que conferisse segurança maior ao regulador sobre o escopo da intervenção. Os preços de acesso terão que ser definidos sem qualquer referência anterior de mercado, ampliando significativamente o espaço de erro do regulador.
J) Recusa Condicional X Incondicional
Esta dificuldade adicional de, além de obrigar a negociar, definir alguns termos mínimos da negociação (como o preço de acesso) faz com que haja mais dificuldade de se realizarem intervenções nos casos da chamada “recusa a negociar incondicional” do que nos casos de “recusa a negociar condicional”.
A distinção é muito simples. A recusa incondicional acontece quando o agente proprietário da infraestrutura de acesso simplesmente não negocia em qualquer circunstância, independente do que o demandante de acesso fizer.
Já na “recusa condicional”, o proprietário da infraestrutura de acesso se recusa a negociar, por exemplo, caso o demandante de
56 “Because the defendant´s decision departed from a long-standing profitable arrangement with its competitor, the jury´s determination that there was no valid business justification for the termination of the arrangement was amply supported”.
acesso não lhe conceda exclusividade, não aceite atuar em apenas alguns territórios, não aceite cobrar menos que um preço determinado, e assim por diante. Neste caso de recusa condicional, uma intervenção simples e possível é que o proprietário da infraestrutura abra mão da condição e oferte nos termos que oferta com a condição.
O economista de Berkeley e ex-economista chefe da seção antitruste do Departamento de Justiça Americano, Xxxx Xxxxxxx, conforme reportado pela OCDE (2007) chega a defender que a recusa de negociar incondicional nunca deveria gerar um processo antitruste:
“Eu sou a favor de uma abordagem na qual as recusas incondicionais verticais para negociar nunca acionem um processo antitruste, independente de se o insumo de monopólio é especialmente valoroso.” Ele explica sua posição apontando que recusas de negociar incondicionais são mais difíceis de corrigir com remédios comportamentais do que as recusas de negociar condicionais. O último tipo pode ser remediado simplesmente pela proibição da continuação do uso das restrições que acionam a recusa. Se a recusa a negociar é incondicional, porém, o desenho de um remédio comportamental é mais difícil porque não há quaisquer condições a eliminar e nenhum outro comprador gerando transações que sirvam de referência. Em lugar disso, o tribunal ou agência terá que calcular um teto de preços (e/ou regular alguns fatores transacionais não preço) Além disso, ele observa, que os
benefícios da intervenção em tais casos não são claros em função
do potencial de efeitos indesejáveis e negativos nos mercados adjacentes e/ou no longo prazo”.57
A recusa de prover livre acesso ao pool é incondicional. Não
57 “I favor an approach whereby vertical unconditional refusals to deal never trigger antitrust liability, regardless of whether the monopoly input is especially valuable”. He explains his position by pointing out that unconditional refusal to deal are harder to correct with behavioural remedies than conditional refusal to deal are. The latter type can be remedied simply by prohibiting further use of the conditions that trigger the refusal. If the refusal to deal is unconditional, though, designing a behavioural remedy is more difficult because there are no conditions to eliminate and no other buyers generating transactions that can serve as benchmarks. Instead, the court or agency will have to calculate a price ceiling (and/or regulate some non-price transactional factors…… Furthermore, he notes, the benefits of intervening in such cases are unclear because of the potential for causing unwanted, harmful effects in adjacent markets and/or in the longer term”.
é porque a Granpetro se recusa a ser exclusiva ou não deseja comprar outros serviços do pool (que seria uma venda casada) ou outra condição qualquer. A motivação principal seria evitar a tragédia dos comuns que resultaria da proliferação de proprietários e do eventual descuido gerado pelo acesso de não proprietários.
H. Conclusões do Estudo Econômico
A aplicação da doutrina da facilidade essencial está longe de ser trivial. O principal equívoco dos reguladores é presumir que qualquer infraestrutura que sirva de insumo a uma atividade e que conta com dificuldades de duplicação por economias de escala deve ser regulada. A premissa é que todos os competidores devem ter condições totalmente equânimes de acesso a esta infraestrutura, tanto quanto o próprio proprietário.
Como vimos, a doutrina da facilidade essencial atual, especialmente na Europa e nos EUA, tem sido muito mais rigorosa do que isto. Primeiro, em lugar do parâmetro de intervenção que demanda a promoção do “acesso equânime” a qualquer custo, avalia-se cada vez mais criteriosamente a existência de alternativas àquela infraestrutura. Mais do que isso, avalia-se a possibilidade de surgirem estas alternativas em um espaço de tempo não muito longo.
No caso em tela, não apenas existe uma alternativa à rede de hidrantes, que são os Caminhões Tanque (CTAs), como a vantagem da primeira em relação à segunda é, no máximo, bastante discreta. Há vários aeroportos sem rede de hidrantes e com vôos internacionais como Viracopos. Há alguns com concorrência vigorosa entre empresas operando rede de hidrantes e outras apenas operando CTAs.
A BR fez um exercício específico para Guarulhos, comparando os custos variáveis da operação atual da empresa que
tem uma combinação de abastecimento por meio de hidrantes e CTAs com uma operação hipotética só com CTAs. O custo variável é realmente menor no caso do acesso por meio de hidrantes, mas a diferença se revelou desprezível em 0,9%. Se acrescentássemos a depreciação pelos respectivos custos fixos, quase certamente a operação com CTAs se revelaria uma operação mais barata. A própria Air BP indicou que sua operação seria 15% mais barata por meio de CTAs. Presumivelmente, a empresa ainda sim prefere o acesso por meio da rede hidrantes pelo menor tempo de abastecimento de aviões maiores que fazem vôos internacionais.
O caso da entrada concreta da Air BP em vários aeroportos, mas especialmente no Galeão, focando seu negócio em vôos internacionais exclusivamente a partir de CTAs e concorrendo com empresas operando por rede de hidrantes e ainda crescendo constitui prova cabal que esta infraestrutura está muito longe de ser indispensável. A relação do acesso à rede de hidrantes possibilitada pela aquisição da Jacta em 2012, em função de decisão do CADE, com o crescimento da Air BP nestes aeroportos não é clara. A empresa já vinha crescendo antes e basicamente manteve este ritmo de crescimento após o acesso à rede de hidrantes.
Enquanto para a avaliação da facilidade essencial se faz normalmente uso de exercícios hipotéticos prospectivos, o exemplo da entrada prévia bem sucedida da Air BP, sem recorrer e sem expectativa de recorrer ao acesso à rede de hidrantes, já constitui indicador seguro de que a tese não é aplicável.
Ademais, o custo de entrada por meio de CTAs não é significativo. A entrada da Air BP, custou R$ 8 milhões. Empresas com objetivos presumivelmente menos ambiciosos como a Granpetro, mais focada na aviação executiva, podem ter custos de entrada ainda menores, com CTAs menores.
Um ponto a se discutir sempre na aplicação da doutrina da facilidade essencial ou mesmo na análise da conduta mais geral de
“recusa a negociar” é qual o valor que se espera da nova concorrência que se espera seja aportada pela política de livre acesso, que não poderia ocorrer pela entrada por meio de CTAs.
Na verdade, como a entrada por CTAs é realizada de forma totalmente independente da entrada integrada ao pool, é possível que aquela possa implicar um vigor competitivo mais significativo do que a entrada por via do livre acesso, seja por que meio for. De fato, enquanto as políticas de livre acesso em geral facilitam a entrada, elas também tendem a tornar o vigor competitivo proveniente desta nova concorrência mais frágil. A experiência das telecomunicações demonstra que a relação de dependência que se gera pode tornar todos os entrantes “viciados” em livre acesso, acomodados à vida tranquila de estar à sombra do incumbente. A entrada independente tende a ter um valor competitivo superior quando viável.
Outro problema é o comprometimento do usufruto dos direitos de propriedade da infraestrutura, especialmente por uma precificação de acesso inadequada. Constranger o uso dos ativos pela política de livre acesso gera efeitos negativos sobre os incentivos a investir e inovar.
A potencial falta de expertise e o comportamento free-riding dos demandantes de acesso podem gerar um típico problema de “tragédia dos comuns”, com problemas sobre os esforços para a manutenção dos ativos, segurança da operação e controle dos impactos sobre o meio ambiente. Os ativos do pool poderiam se transformar em um verdadeiro “banheiro público”.
Por fim, a regulação de livre acesso sempre exige um elevado requerimento informacional por parte do regulador e a chance de errar é imensa. Daí que há um conforto muito maior do regulador em intervir quando a transação de acesso já ocorria anteriormente. Os preços e as condições de acesso, neste caso, ganham um parâmetro mínimo de mercado baseado na própria história da transação que ocorria voluntariamente.
Todos estes pontos indicam que a política de livre acesso para a rede de hidrantes no aeroporto do Galeão não seria uma boa ideia. Em especial, a existência de alternativa competitiva como os CTAs já comprometeria o que seria uma condição necessária para uma avaliação adequada sobre a aplicação da doutrina da facilidade essencial ou mesmo da mais geral de “obrigação a contratar”. A política de livre acesso na rede de hidrantes no aeroporto do Galeão, em síntese, apresenta escassos benefícios e elevados custos esperados e não deveria ser implementada.
VI. Resposta ao Quesito
A partir dos estudos jurídico e econômico acima realizados, respondemos ao Quesito formulado e abaixo novamente transcrito:
“Desde os pontos de vista econômico e jurídico, é admissível que a regulação aeroportuária da qual se encarrega a Agência Nacional de Aviação Civil no aeroporto do Galeão (RJ) imponha ao prestador privado do serviço de abastecimento de aeronaves a obrigação de compartilhar com seus concorrentes infraestrutura por ele construída e utilizada para desempenhar tal atividade econômica?"
Resposta: Não, a regulação aeroportuária que imponha ao prestador privado do serviço de abastecimento de aeronaves a obrigação de compartilhar com seus concorrentes infraestrutura utilizada para desempenhar tal atividade econômica não é admissível seja porque (i) uma tal forma de regulação violaria os ditames da ordem econômica constitucional em vigor por ser incompatível com a natureza jurídica dos serviços prestados pelo Pool, seja porque (ii) as consequências e implicações concretas de uma tal medida causariam, na forma de uma expropriação regulatória, uma fissura indesejável no
compromisso regulatório instituído em casos como este, com a possibilidade igualmente indesejável de utilização não adequada da infraestrutura existente (conforme a analogia que fizemos à “tragédia dos comuns”), seja porque (iii) nem a Resolução 302/2014, nem o Contrato de Concessão relativo à exploração privada do aeroporto do Galeão preveem ou criam a possibilidade de compartilhamento obrigatório de infraestruturas privadas, eis que essas não se confundem com a noção de áreas aeroportuárias. Todas essas conclusões têm respaldo no estudo econômico apresentado acima, que evidencia que (iv) a infraestrutura em questão não configura uma essential facility, especialmente por haver disponível alternativa, já mais do que testada e em operação, de realizar abastecimentos de aeronaves, os CTAs.
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