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EXCELENTÍSSIMO SENHOR XXXX FEDERAL DA VARA ÚNICA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE IRECÊ/BA
PROTOCOLO PRM-IRE-BA nº 0542/2017 (cópia parcial do Inquérito Civil nº 0.00.000.000000/0000-00)
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República que esta subscreve, com fundamento nos arts. 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 5°, inciso III, alínea “d”, e 6°, incisos VII, alínea “b”, e XIV, alínea “g”, da Lei Complementar n° 75/1993 e no art. 1º, inciso I, da Lei nº 7.347/1985, vem propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de
XXXX XXXXXXXX XXXXXX, ex-Prefeito Municipal de Irecê/BA, * pelas razões fáticas e jurídicas aqui expostas.
I – DO OBJETO
A presente demanda versa sobre a ausência de adoção das providências necessárias e suficientes à entrada em plena operação do Aterro Sanitário de Irecê/BA, de responsabilidade do Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, ex-Prefeito Municipal durante o período de 2013 a 2016. Importante ressaltar que tal conduta omissiva contribuiu para a continuidade na ocorrência de danos ao meio ambiente nos municípios de Irecê, Lapão, Xxxx Xxxxxxx, Uibaí, Presidente Dutra, Central, Jussara e São Gabriel.
II – DOS FATOS
II.I. DO CONVÊNIO
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Firmou-se, no dia 12/05/2009, o Convênio nº 0.00.00.0000/00 entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba – CODEVASF e o Município de Irecê/BA.
Os recursos deste Convênio integravam o Programa de Revitalização da Bacia do Rio São Francisco, sendo seu objeto a “…implantação do sistema de tratamento de resíduos sólidos urbanos…”, no Município de Irecê/BA.
Os Municípios consorciados e beneficiados pelo Convênio em questão são: Irecê, Lapão, Xxxx Xxxxxxx, Uibaí, Presidente Dutra, Central, Jussara e São Gabriel.
Inicialmente, sua vigência seria de 360 (trezentos e sessenta) dias. Posteriormente, por intermédio de diversos Termos Aditivos, prorrogou-se seu vencimento para 23/10/2012.
II.II. DOS RECURSOS PÚBLICOS
A mencionada municipalidade recebeu a quantia de R$ 3.329.771,65 (três milhões trezentos e vinte e nove mil setecentos e setenta e um reais e sessenta e cinco centavos), oriunda da União, com a contrapartida de R$ 175.251,14 (cento e setenta e cinco mil duzentos e cinquenta e um reais e quatorze centavos). Depositou-se este numerário na conta-corrente nº 37.027-4, agência nº 0548-79, do Banco do Brasil, localizada em Irecê/BA e aberta especificamente para o Convênio em questão.
II.III. DA AUSÊNCIA DE CUMPRIMENTO INTEGRAL DO CONVÊNIO
A Informação nº 006/2015, referente ao Relatório de Auditoria nº 034/2013, presente no Processo Administrativo nº 59500.002802/2013-99, explicita que “...Embora sendo apresentada a prestação de contas, esta não coaduna com o laudo técnico apresentado pelo fiscal do convênio…valor atualizado a recolher de R$ 437.756,79, referente aos itens não executados e corrigidos…Além disso, conforme descrito no resumo fotográfico realizado pela equipe de auditoria…o prejuízo ao erário vai além desses valores, sendo necessário levantamento mais aprofundado, com cálculos e medições, para se avaliar o real dano ao erário, por serviços pagos e não executados, e/ou mal executados ou incompletos...” (págs.
116/118 do arquivo “Processo n° 59500.000541-2008-13 VOL IV” contido na pasta “Xxxxx xx xxxxxx 000, xx xxxxxx 0” xx xxxxx xxxxx).
A CODEVASF instaurou Tomada de Contas Especial – TCE em razão das irregularidades encontradas quando da análise da prestação de contas do Convênio nº 0.00.00.0000/00. Seu Relatório concluiu que “…houve execução parcial de 89,45% do objeto pactuado...”. (arquivo “TCE_Irecê_2015_CONV_0.93.09.0019-1” contido na pasta “Mídia da pagina 421, do volume 2” da mídia anexa).
Em razão das ilicitudes descritas supra, o Ministério Público Federal aditou a Ação de Improbidade Administrativa n° 3843-38.2015.4.01.3312, assim como ofereceu Denúncia com base no Procedimento Preparatório n° 0.00.000.000000/0000-00, ambas em tramitação nesta Subseção Judiciária.
Convém esclarecer que tais fatos aconteceram em lapso temporal abrangido pela gestão municipal pertinente ao período de 2009 a 2012, imediatamente anterior à do Sr. LUIZ PIMENTEL SOBRAL. Logo, o Sr. XXXX XXXXXXXX SOBRAL não figura no polo passivo das duas lides.
II.IV. DO RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL
Equipe composta por integrantes de diversos entes públicos estaduais e federais realizou, no dia 22/04/2013, uma Fiscalização Preventiva Integrada – FPI no Município de Irecê/BA, especificamente nas áreas concernentes ao lixão em funcionamento e ao Aterro Sanitário em construção (págs. 207/242 do arquivo “VOLUME 1” da mídia anexa).
De início, o Relatório de Fiscalização Ambiental decorrente desta atividade esclarece que “...Entende-se por aterro sanitário o empreendimento no qual ocorre a disposição de resíduos sólidos para que, com a adoção de critérios técnicos de engenharia, haja minimização dos impactos negativos ao meio ambiente...”.
Já “...O lixão, por sua vez, configura uma prática inadequada de disposição dos resíduos sólidos sem a consideração de quaisquer parâmetros técnicos durante sua implantação e operação. Não há impermeabilização do solo, captação e tratamento de gases e
chorume, confinamento, compactação, recobrimento e segregação dos resíduos. Desse modo, diversos danos são causados ao meio ambiente e à população local como: contaminação do solo, subsolo, águas subterrâneas, águas superficiais, proliferação de vetores e liberação de gases danosos à saúde humana...”
Prosseguindo, “…o depósito de resíduos de Irecê que se encontra atualmente em operação trata-se de lixão, já que os resíduos sólidos são lançados no solo de forma inadequada, a céu aberto, sem qualquer medida de proteção ao meio ambiente e a saúde pública, tendo como consequência a proliferação de vetores de doenças, geração de odores, poluição do solo, além da situação de descontrole quanto aos tipos de resíduos recebidos neste local, tais como de serviço de saúde…”.
Concluiu-se que “...O funcionamento da área inspecionada representa risco de danos à saúde pública e ao meio ambiente. Não são obedecidos critérios e normas técnicas relativas à operação de locais de destinação final de resíduos sólidos, bem como, do ponto de vista formal, faltam documentos que assegurem o seu funcionamento. Diante do exposto, fica clara a falta de condições para que a área continue exercendo a função de destino final dos resíduos sólidos do município de Irecê...”
Diante deste quadro, o aludido Relatório listou uma série de recomendações endereçadas à Prefeitura Municipal de Irecê/BA, cujo mandatário era o Sr. XXXX XXXXXXXX SOBRAL entre as recomendações, dentre as quais se destacam: “…deverá elaborar o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos Sólidos – PIGRS, nos termos da Lei Federal nº 12.305/2010…deverá iniciar a implementação/operacionalização do Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos Sólidos – PIGRS imediatamente após a sua elaboração, devendo estar em funcionamento pleno num prazo de 180 dias após sua aprovação…Tão logo se inicie a operação do aterro sanitário consorciado, a Prefeitura deve cessar a disposição de resíduos do lixão…deverá apresentar ao Ministério Público, sem prejuízo de outros órgãos competentes, Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) para a área do lixão…” (grifo nosso).
A FPI efetivou vistorias in loco também nos municípios de Lapão, Xxxx Xxxxxxx, Uibaí, Presidente Dutra, Central, Jussara e São Gabriel, em abril/2013 e maio/2015. Constatou-se que em todos existem lixões, com impactos nocivos ao meio ambiente de caráter
similar ao observado em Irecê/BA (págs. 243/256 do arquivo “VOLUME 1” e págs. 04/159 do arquivo “VOLUME 2”, ambos da mídia anexa).
No corpo do Relatório alusivo ao Município de Irecê/BA, consta ainda o seguinte trecho: “…tem-se em via de implantação o “Consórcio Público de Desenvolvimento Sustentável do Território de Irecê”, do qual Irecê é integrante. Após a conclusão da obra do aterro sanitário que, conforme licença de implantação (Portaria INEMA nº 13.437/2010) receberá os resíduos dos municípios de João Dourado, Jussara, Lapão, Presidente Dutra, São Gabriel, Central, Jussara e Irecê…” (sic).
Em resumo:
1°) os lixões de Irecê/BA e mais sete municípios não obedecem critérios e normas técnicas relativas à operação de locais de destinação final de resíduos sólidos;
2°) estes lixões são áreas com severos impactos negativos ao solo, ao subsolo, à atmosfera, à fauna, à flora e à saúde pública;
3°) a inoperância do Aterro Sanitário de Irecê/BA impossibilita o encerramento destes oito lixões, perpetuando significativas lesões ambientais.
II.V. DO TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL
Em razão dos fatos aqui narrados, celebrou-se um Termo de Ajustamento de Conduta – TAC entre o Ministério Público Estadual – MPE e o Município de Irecê/BA, representado por Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, no dia 24/09/2013 (págs. 178/184 do arquivo “VOLUME 2” da mídia anexa).
Já na Cláusula Primeira do referido TAC, o Município de Irecê/BA reconheceu expressamente que há a ocorrência de danos ao meio ambiente, em virtude do depósito irregular de resíduos sólidos no já descrito lixão. Nas seguintes, a municipalidade se comprometeu a cumprir diversas medidas em prazos definidos. No que pertine à presente AIA, destacam-se:
CLÁUSULA SEGUNDA: O município obriga-se a promover a destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados no âmbito do seu território, na forma e prazos fixados na Lei n° 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos e pelo Decreto n° 7404/2010, que a regulamenta;
CLÁUSULA OITAVA: O município obriga-se, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses, a implantar o aterro sanitário, através de consócio intermunicipal, com a devida licença ambiental, visando a adequação do tratamento e disposição final dos rejeitos (grifo nosso);
CLÁUSULA NONA: O município obriga-se no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses, deixar de depositar os resíduos na área atualmente utilizada como depósito irregular, “lixão”, bem como de qualquer outra área, pública ou privada, não licenciada ambientalmente.
Em respeito às Leis nºs 11.445/2007 e 12.305/10, o gestor responsável pela comuna assumiu a responsabilidade de apresentar ao MPE, no prazo de 12 (doze) meses, o Plano Municipal de Saneamento Básico, contendo, por sua vez, o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos.
Aliado a isto, o município também se obrigou a, no prazo de 90 (noventa) dias, dar início à implementação, por meio de Lei Municipal, da coleta seletiva dos resíduos, com vistas ao reaproveitamento e reciclagem dos resíduos sólidos.
Entretanto, o Sr. XXXX XXXXXXXX SOBRAL simplesmente NÃO cumpriu com o quanto compromissado no TAC, sem qualquer razão plausível.
Saliente-se que o MPE também firmou TACs com outros cinco entes federativos municipais – Presidente Dutra, Xxxx Xxxxxxx, Uibaí, Central e Jussara – com conteúdos similares ao pactuado com Irecê/BA. Contudo, a inatividade do Aterro Sanitário de Irecê/BA impede o cumprimento integral destes acordos, visto que envolvem obrigatoriamente a supressão de seus respectivos lixões (págs. 185/219 do arquivo “VOLUME 2” da mídia anexa).
XX.XX. DA RECOMENDAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Face à inação do Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, o Ministério Público Federal expediu a Recomendação nº 35/2016, datada de 19/09/2016 (págs. 228/237 do arquivo “VOLUME 2” da mídia anexa).
Então, recomendou-se ao Sr. XXXX XXXXXXXX SOBRAL que “…ADOTE TODAS AS PROVIDÊNCIAS INDISPENSÁVEIS, DE ORDEM OPERACIONAL, ADMINISTRATIVA E NORMATIVA, À ENTRADA EM PLENA OPERAÇÃO DO ATERRO SANITÁRIO DE IRECÊ, ATÉ O DIA 31 DE DEZEMBRO DE 2016…”, conferindo-se o
prazo de 20 (vinte) dias, a contar do recebimento, para que o então Prefeito Municipal de Irecê/BA se manifestasse a respeito da referida Recomendação.
Deste modo, o Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX remeteu petição, protocolada nesta Procuradoria da República em 27/09/2016, na qual requereu o arquivamento do Inquérito Civil que embasa esta exordial, mantendo-se silente quanto à Recomendação. Portanto, o MPF expediu ofício ao demandado, datado de 28/09/2016, no qual indagava se o mesmo acatava ou não aquela Recomendação (págs. 239/244 e 249/250 do arquivo “VOLUME 2” da mídia anexa).
Em resposta, o Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX encaminhou ofício protocolado nesta Procuradoria da República em 03/11/2016, no qual asseverou que “…o Município entregará à população o aterro sanitário em funcionamento até 31 de dezembro de 2016…” (págs. 02/04 do arquivo “VOLUME 3” da mídia anexa).
Posteriormente, o Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX enviou ofício, protocolado nesta Procuradoria da República em 18/11/2016, que contem como anexo “...o cronograma para início da operação do aterro sanitário no ano de 2016...” (págs. 39/43 do arquivo “VOLUME 3” da mídia anexa).
Todavia, o Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX NÃO forneceu posteriormente, ao Parquet Federal, qualquer documentação apta a comprovar que cumpriu integralmente a aludida Recomendação.
III – DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
III.I. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
Os recursos federais decorrentes do Convênio nº 0.00.00.0000/00 correspondem a aproximadamente 95% (noventa e cinco por cento) do numerário empregado na execução das obras do Aterro Sanitário de Irecê/BA, consoante o tópico “II.II. DOS RECURSOS PÚBLICOS”.
Revela-se patente o interesse federal subjacente a este caso concreto, visto que a inoperância deste equipamento público representa um notório desperdício de dinheiro público, procedente em sua quase totalidade do erário da União.
A contemporânea inatividade do Aterro Sanitário de Irecê/BA, dentre outros fatores decorrente da reiterada e injustificável omissão do Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, implica na gradual e inexorável degradação deste bem.
Não custa rememorar que o Aterro Sanitário de Irecê/BA jamais atendeu à sua finalidade social, pois nunca funcionou; o prolongamento desta situação resultará na sua completa destruição, o que inviabilizará definitivamente a destinação prevista. Logo, a entrada em operação deste equipamento representa a preservação de tão relevante patrimônio público, erguido majoritariamente às custas de numerário federal.
Assim sendo, incide o disposto no artigo 109, inciso I, da Constituição Federal
de 1988.
III.II. DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
A Constituição Federal de 1988 consagrou como obrigação do Poder Público a defesa, preservação e garantia de efetividade do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Veja-se:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Não há um conceito único de meio ambiente no Brasil. Temos, decerto, um conceito legal e vários doutrinários. O primeiro pode ser encontrado no art. 3º, I, da Lei n° 6.938/1981. É a letra da lei:
(Entende-se por) meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
Entre os conceitos de meio ambiente colhidos na doutrina, cabe destacar o ensinamento de Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx:
O direito constitucional ao meio ambiente é entendido como direito fundamental de terceira geração, sendo talvez o mais típico desta. É chamado direito de solidariedade2, pois, em sua concepção original, firma-se na solidariedade entre os povos e as gerações. É o que reconhece o Ministro Xxxxx xx Xxxxx, do Supremo Tribunal Federal:
III.III. POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS
1Direito Ambiental Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 20.
A Lei n° 12.305/2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, encontrando-se sujeitas à sua observância “as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos”, conforme disposto em seu artigo 1°, § 1° (grifo nosso).
A referida legislação define como destinação final ambientalmente adequada, a “destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos”, assim como a “disposição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos”, conforme disposto em seu artigo 3°, incisos VII e VIII, respectivamente (grifo nosso).
O mesmo diploma legal define como gerenciamento de resíduos sólidos, o “conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei”, conforme disposto em seu artigo 3°, inciso X (grifo nosso).
Com efeito, a Lei n° 12.305/2010 estabelece como um dos objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos a “não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”, conforme disposto em seu artigo 7°, inciso II. Tal objetivo, contudo, não tem sido cumprido com a existência do “lixão” de Irecê/BA, o qual claramente não dá a destinação adequada aos rejeitos da região, ocasionando problemas ambientais gravíssimos.
Ademais, o art. 10 do já referido ato normativo determina “que incumbe ao Distrito Federal e aos Municípios a gestão integrada dos resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, sem prejuízo das competências de controle e fiscalização dos órgãos
federais e estaduais dos Sisnama, do SNVS e do Suasa, bem como da responsabilidade do gerador pelo gerenciamento de resíduos, consoante estabelecido nesta Lei” (grifo nosso).
III.IV. DA RESPONSABILIDADE
No que tange à responsabilidade do Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, o art.
25 da citada Lei prevê que “O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da Política Nacional de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu Regulamento”. Na esfera municipal, a administração pública é comandada pelo Prefeito Municipal (grifo nosso).
Na mesma linha, o art. 29 esclarece que “Cabe ao poder público atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar ou cessar o dano, logo que tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos” (grifo nosso).
No mesmo sentido, seu art. 52: “Sem prejuízo da obrigação de, independentemente da existência de culpa, reparar os danos causados, a ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas que importe inobservância aos preceitos desta Lei ou de seu regulamento sujeita os infratores às sanções previstas em lei, em especial às fixadas na Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que 'dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências', e em seu regulamento”.
Por fim, o art. 54 da Lei n° 12.305/2010, em seu delimitou que a disposição final ambientalmente adequada dos resíduos deveria ser integralmente implementada até o dia 02 de agosto de 2014. Pontue-se que este termo final ocorreu justamente durante o mandato do Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX.
Importante mencionar que a disposição final ambientalmente adequada dos resíduos implica, necessariamente, na eliminação dos denominados “lixões”, isto é, no encerramento desta modalidade inadequada de disposição final de resíduos sólidos, cuja principal
característica é a simples descarga do lixo sobre o solo, a céu aberto, sem a adoção das medidas de proteção ao meio ambiente ou à saúde pública.
O lixão acarreta diversas e expressivas lesões ambientais, tais como a liberação de chorume e outras substâncias (com a decorrente contaminação do solo e da água), a proliferação de insetos, a atração de animais (especialmente ratos), o risco de incêndios (com a contaminação do ar), a presença de mau cheiro etc, sendo, em verdade, uma grande fonte de poluição, em notória agressão ao ecossistema em geral e aos seres humanos em particular.
Acrescente-se que a construção, operação, manutenção e conservação deste Aterro Sanitário é de responsabilidade do Município de Irecê, representado pelo seu Prefeito Municipal. Xxxx xxxx incidem sobre a pessoa física que exerce o cargo eletivo em questão, independentemente da formalização do Convênio e das obras de construção do Aterro Sanitário terem ocorrido em gestão pretérita.
Em síntese, o Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX:
1°) dispôs de quatro anos (do início de 2013 ao final de 2016) para finalizar e colocar em operação o Aterro Sanitário de Irecê/BA. Contudo, não o fez;
2°) não cumpriu os encargos assumidos, espontaneamente, no TAC do Ministério Público Estadual e na Recomendação do MPF. Ambos envolviam a definitiva implantação deste Aterro;
3°) agrediu frontalmente a legislação ambiental, especialmente a concernente à Política Nacional de Resíduos Sólidos;
4°) detinha conhecimento acerca da inoperância do Aterro Sanitário de Irecê/BA, de modo inequívoco, desde o primeiro semestre do ano inaugural do exercício do munus de Prefeito Municipal.
Esta afirmativa é confirmada através da simples leitura: a) da Portaria n° 193/2013, datada de 03/06/2013 e subscrita pelo Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX, cujo objeto era instituir “...a Comissão para recebimento Provisório da Obra do Aterro Sanitário do Município de Irecê...”; b) do Relatório de Vistoria Técnica resultante da atuação desta Comissão,
datado de 18/06/2013 (págs. 123/142 do arquivo “VOLUME 2” da mídia anexa);
5°) mais grave, não apresentou razões, minimamente fundamentadas e razoáveis, que justificassem a não entrada em operação do Aterro no decurso de sua gestão.
III.V. DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Visível a infração a variados princípios administrativos. Aliás, há a notória incidência do previsto no dispositivo abaixo, reproduzido da Lei n° 8.429/1992:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
[…]
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
O Sr. XXXX XXXXXXXX XXXXXX deixou de praticar, durante todo o seu mandato, ato de ofício. Era-lhe obrigatório, cogente, adotar todas as providências essenciais para a entrada em operação do Aterro Sanitário de Irecê/BA, por força das normas de regência, do TAC e da Recomendação.
Adicione-se que o desrespeito às normas de proteção ambiental e outras correlatas implicou simultaneamente na transgressão ao Princípio da Legalidade.
Além disso, agride-se o Princípio da Eficiência, constante do art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988, de observância obrigatória pela Administração Pública Municipal, visto que a inatividade do Aterro é uma clara afronta ao bom funcionamento da “máquina pública”. A inexistência de coletiva seletiva de lixo em Irecê/BA, por exemplo, medida indispensável ao uso otimizado deste equipamento, além de resultar no inadequado descarte de diversos materiais com potencial poluidor no meio ambiente, acarreta a inexistência de uma cadeia econômica geradora de empregos, renda e tributos.
Acrescente-se a violação do Princípio da Boa-fé Objetiva, previsto nos artigos 113, 187 e 422, todos do Código Civil. Se ao particular, no âmbito do negócio jurídico, é exigível uma conduta ética, correta, digna, irrepreensível, ao agente público ainda mais se aplica tal dever,
pois este lida diretamente com o interesse público. Logo, também houve afronta ao Princípio da Moralidade, igualmente presente no art. 37, caput, da Carta Magna Pátria.
IV – DOS PEDIDOS
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL postula:
a) a notificação do Demandado para apresentação de manifestação escrita em 15 dias, nos termos do art. 17, § 7º, da Lei n° 8.429/1992;
b) o recebimento desta petição inicial e posterior citação do Réu para, querendo, opor-se à pretensão aqui deduzida, nos termos do art. 17, § 9º, da Lei n° 8.429/1992, sob pena de revelia;
c) a notificação da CODEVASF e do Município de Irecê/BA, para os fins do art. 17, § 3º, da Lei nº 8.429/1992;
d) a condenação do Requerido nas penas previstas no art. 12, inciso III da Lei de Improbidade Administrativa, especialmente a suspensão dos direitos políticos;
e) por fim, protesta pela produção de todas as provas em direito admitidas, em especial, depoimento pessoal do Demandado, oitiva de testemunhas, perícias, e outras que se fizerem necessárias ao longo da instrução.
Dá-se à causa o valor R$ 1.000,00 (um mil reais), por imposição legal, tendo em vista o valor inestimável da demanda.
Irecê/BA, 30 de janeiro de 2017.
XXXXXX XXXXXXXXXXX XX XXXXXX
Procurador da República
*informações omitidas para fins de divulgação