O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS,
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS,
pela Promotora de Justiça que a presente subscreve, com fundamento nos artigos 37, caput e § 4º, e 129, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil, na Lei nº 7.347/85, nas Leis nº 8.625/93 e Lei nº 8.429/92 e com base no Inquérito Civil Público nº 044/2016 anexo (Atena nº 201600226339), vem ajuizar a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA por Ato de IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA c/c Nulidade de Ato Administrativo c/c PEDIDO DE LIMINAR
em desfavor de:
1. RIDOVAL XXXXX XXXXXXXXXX, brasileiro, estado civil ignorado, inscrito no CPF sob o nº 000.000.000-00, Presidente da AGR – Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos, domiciliado na Avenida Goiás, Edifício Visconde de Mauá, Setor Central, CEP: 74.005-010, Goiânia/GO;
2. AGR – AGÊNCIA GOIANA DE REGULAÇÃO, CONTROLE E FISCALIZAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS, autarquia estadual inscrita no CNPJ nº 03.537.650/0001-69, com sede na Xxxxxxx Xxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxx, Xxxxx Xxxxxxx, XXX: 00.000-000, Xxxxxxx/XX;
3. ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, inscrita no CNJP com o n° 01409655/0001-80, com sede na Xxx 00, X/X, Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxx Xxx, neste ato representado pelo Procurador-Geral do Estado de Goiás, nos termos do art. 132 da C.F., com endereço profissional na Praça Dr Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx, n° 26, nesta Capital;
pelas razões de fato e direito a seguir expostas:
I – DOS FATOS
O Ministério Público do Estado de Goiás instaurou o Inquérito Civil Público nº 201600226339 para apurar irregularidades nas autorizações conferida pela AGR – Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos – a 12 (doze) empresas privadas, para exploração do serviço de transporte intermunicipal de passageiros, sem a realização de licitação.
A investigação iniciou-se a partir de matéria jornalística publicada no “Jornal O Popular”, datada do dia 02.06.2016, noticiando que a AGR prorrogou, sem licitação, contratos com 12 (doze) empresas que operam 166 linhas do transporte coletivo intermunicipal no Estado de Goiás.
Apurou-se que o ESTADO DE GOIÁS, antes de conferir as objurgadas autorizações para prestação do serviço de transporte coletivo intermunicipal, transferia a execução de tal serviço à iniciativa privada por meio de concessão, ou seja, antes o que era privatizado por concessão, passou a ser por autorização.
Atualmente existem aproximadamente 35 (trinta e cinco) empresas prestadoras do serviço de transporte intermunicipal de passageiros em Goiás, algumas delas com concessões vigentes há mais de 50 (cinquenta) anos, sem nunca terem submetido a procedimento licitatório.
As concessões foram combatidas por esta Promotoria de Justiça, que ingressou com a Ação Civil Pública nº 201004518328, em trâmite na 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia, objetivando suas anulações, justamente por, como feito agora por via da autorização, as concessões também não eram precedidas de licitação.
Com o vencimento das concessões, o ESTADO DE GOIÁS está prorrogando os contratos com as empresas privadas sob uma nova roupagem, agora por meio de autorização, tendo-se notícia que até o momento das 35 empresas
prestadoras do serviço, 12 (doze) passaram de concessionárias para autorizatárias, mediante assinatura de contratos com validade por 15 (quinze) anos.
Entretanto, pelas objurgadas autorizações esbarrarem na norma ditada pelo artigo 175 da Constituição Federal, que não prevê tal modalidade para prestação de serviços públicos, o Ministério Público recomendou ao Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO a “no exercício da autotutela, anule as autorizações concedidas a empresas privadas prestadoras do serviço de transporte rodoviário de passageiros”.
A AGR não acatou a Recomendação, sob a justificativa de que a exploração do serviço de transporte coletivo intermunicipal pode sim ser transferida ao particular por meio de autorização, utilizando-se por fundamento analogia ao disposto no artigo 21, inciso XII, alínea “e”, da Constituição Federal, que diz que compete a União “explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros”.
Assim, para a AGR, como a Constituição Federal não traça nenhuma distinção entre a autorização, concessão e permissão para a União transferir ao particular a execução do serviço de transporte interestadual e internacional de passageiros, competiria aos Estados definirem suas políticas públicas acerca do tema, por meio de suas competências legislativas.
No âmbito do ESTADO DE GOIÁS, foi editada a Lei nº 18.673/2014, que versa sobre os serviços de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros, a qual foi regulamentada pelo Decreto do Governador nº 8.444/2015 e pela Resolução Normativa nº 0040/2015-CR, todos com a previsão de privatização do serviço por autorização.
O problema é que os mencionados comandos normativos somente foram editados após o ajuizamento da mencionada Ação Civil Pública pelo Ministério Público e também após o TCE/GO ter determinado a AGR, por meio de uma liminar conferida pela Conselheira Xxxxx Xxxxxxxx, a realizar licitação no prazo de 180 para licitação do transporte intermunicipal, com claro escopo de dar uma aparente legalidade aos contratos.
De qualquer forma, a autorização para o particular explorar o serviço de transporte coletivo intermunicipal são nulas, por violar o artigo 175 da Constituição Federal, e ilegais, por violar a Lei Federal nº 8.987/95, reguladora das concessões e permissões, que estabelece claramente a necessidade de prévia licitação.
II – DO DIREITO
1. Da Inconstitucionalidade dos Atos de Autorização emitidos pela AGR em favor de Empresas Privadas:
A Lei Estadual nº 18.673/2014 dispõe sobre os serviços de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros, prescreve em seu artigo 2º que:
Art. 2º. cabe ao Estado de Goiás explorar, diretamente ou mediante concessão, permissão ou autorização, os serviços de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros e instituir taxas e emolumentos para administração, fiscalização e controle de tais serviços”;
Mais adiante, o artigo 7º da citada lei estadual dispõe que a autorização para prestação do serviço de transporte intermunicipal de passageiros ocorrerá “quando se tratar de prestação de serviço de transporte não regular ou regular desvinculado da exploração de infraestrutura”.
Mas o que seria transporte regular e não regular ditos pela lei? Em seus próprios termos, transporte não regular é o serviço de transporte privado rodoviário intermunicipal, individual ou coletivo, de passageiros para fretamento eventual ou turístico, fretamento contínuo escolar entre municípios (art. 5º, parágrafo único, inciso II). Já o transporte regular é o serviço de utilidade pública de transporte público rodoviário intermunicipal coletivo de passageiros e acessível a toda população mediante pagamento individualizado, com deslocamentos entre dois ou mais municípios (art. 5º parágrafo único, inciso I).
Outra pergunta: o que é a infraestrutura que quando dela o transporte regular for desvinculado permite contratações por autorização? A lei não dá resposta. Cogita-se que seja os terminais rodoviários, pontos de embarque e
desembarque (…). Porém, se tal cogitação se confirmar, as autorizações levadas a efeito são ilegais, pois todas as empresas autorizatárias utilizam dessa infraestrutura.
Entretanto, o mais grave encontra-se na disposição do artigo 10, § 1º, I, da Lei Estadual nº 18.673/2014, verbis:
Art. 10. A prestação do serviço de transporte não regular e regular desvinculado da exploração de infraestrutura, ressalvado o disposto em legislação específica, dependerá de prévia autorização do ente regulador.
§ 1º. A autorização é ato administrativo vinculado, que faculta a prestação do serviço de transporte nas modalidades indicadas no inciso I do art. 7º desta Lei, mediante a observância das seguintes regras:
I – não depende de prévia licitação;
Isso mesmo! Uma aberração. O mencionado dispositivo traça uma nova ordem para a transferência da execução do serviço de transporte intermunicipal de passageiros, que não encontra nenhum respaldo na Constituição Federal, na Lei Federal nº 8.987/95 (regime de concessões e permissões) e na Lei nº 8.666/93 (licitações).
Há um claro desvio de finalidade na Lei Estadual nº 18.673/2014, que é o beneficiar indevidamente as empresas privadas exploradoras do serviço, o que se deu, convenientemente, após o Ministério Público ter ingressado com
ação judicial pleiteando a nulidade das concessões e a realização de licitação, bem como após o TCE/GO ter também determinado a realização de licitação.
Para concretizar os comandos da citada Lei Estadual, foi editado pelo Governador do Estado o Decreto nº 8.444/2015 e pela AGR a Resolução Normativa nº 0040/2015-CR, igualmente prevendo a possibilidade de contratação por autorização de empresas privadas exploradoras do serviço de transporte intermunicipal de passageiros sem licitação, quando o transporte for regular desvinculado de infraestrutura.
O Decreto nº 8.444/2015 estabelece em seu artigo 3º que a única diferença entre o transporte intermunicipal de passageiros constante de infraestrutura com o desvinculado de infraestrutura é que o primeiro “faz parte de uma rede de ligações entre si” e o segundo “não compõe uma rede de ligações entre si”, porém, em nenhum momento explica o que vem a ser a tal “rede de ligações entre si”, tampouco o que é a mencionada “infraestrutura”.
Diferente do que consta na Lei Estadual e no referido Decreto, a Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR dispõe sobre o procedimento para as autorizações e estabelece que elas terão vigência por 15 (quinze) anos.
Pois bem. A causa de pedir da presente ação refere-se a nulidade dos contratos de autorização firmados entre a AGR e 12 (doze) empresas privadas para exploração do serviço público de transporte coletivo de passageiros, sob
2 (dois) fundamentos: 1) a autorização não é cabível para transferir ao particular a execução do serviço de transporte coletivo intermunicipal de passageiros; 2) ainda que se admita a autorização, jamais ela poderia ocorrer sem a realização de procedimento licitatório.
O artigo 175 da Constituição Federal estabelece que “Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.
Vê-se que a Constituição Federal deixa claro que todo serviço público, incluído entre eles o transporte intermunicipal de passageiros, será prestado diretamente pelo Poder Público ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação.
Todavia, o artigo 21, XII, “e”, da Constituição dispõe que compete a União “explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros”.
Então teria um certo “conflito” entre os artigos 175 e 21, XII, “e” da Constituição Federal? Evidente que não, e a resposta é dada pela simples análise do conceito e alcance do instituto da autorização.
XXXX XXX XXXXXX XXXXXXXX FILHO1 ensina que
1 In, Manual de Direito Administrativo, Editora Atlas, 25ª Edição, p. 441.
“Na verdade, não há autorização para a prestação de serviço público. Este ou é objeto de concessão ou de permissão”.
Acrescenta ainda que:
A autorização é ato administrativo discricionário e precário pelo qual a Administração consente que o indivíduo desempenhe atividade de seu exclusivo ou predominante interesse, não se caracterizando a atividade como serviço público”.
Obvio que o particular para o qual a execução do serviço de transporte intermunicipal de passageiros foi transferida não desempenha a atividade “de seu exclusivo e predominante interesse”, logo, a autorização não serviria para esse fim.
O mencionado autor vai além e combate taxativamente a tese defendida pela AGR de que a autorização mencionada no art. 21, XII, CF, poderia justificar as autorizações para prestação de serviços públicos.
Segundo XXXX XXX XXXXXX XXXXXXXX XXXXX:
“Costuma-se fazer remissão ao art. 21, XII, da CF, para justificar a dita autorização de serviço público. Assim, não nos parece. O art. 21 da CF dá competência à União Federal para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, algumas atividades, como serviços de radiofusão sonora, de sons e imagens, navegação, transporte, etc. Essas atividades contudo, nem
sempre são típicos serviços públicos; algumas vezes são exercidas por particulares no próprio interesse destes, ou seja, sem que haja qualquer benefício para certo grupamento social. Desse modo, a única interpretação cabível, em nosso entender, para a menção às três espécies de consentimento federal, reside em que a concessão e a permissão são os institutos próprios para a prestação de serviços públicos, e a autorização o adequado para o desempenho da atividade do próprio interesse do autorizatário”.
Assim, embora esteja no rol do artigo 21, XII, da CF a possibilidade da União transferir ao particular por meio de autorização o serviço de transporte interestadual rodoviário de passageiros, necessário analisar no caso concreto a essência do serviço que está sendo transferido, se é de interesse público ou do próprio interesse do autorizatário.
Para o mencionado autor:
“É certo que pode haver equívoco na rotulação dos consentimentos estatais. Cumpre, entretanto, averiguar a verdadeira essência. Ainda que rotulada de autorização, o ato será de permissão se alvejar o desempenho de serviço público; ou, ao contrário, se rotulado de permissão, será de autorização se o consentimento se destinar à atividade de interesse do particular.
Além disso, há o argumento que consideramos definitivo: a Constituição Federal, ao referir-se à prestação indireta de serviços públicos, só fez menção à concessão e à permissão (art. 175). parece-nos, pois, que hoje a questão está definitivamente resolvida, no sentido de que o ato de
autorização não pode consentir o desempenho de serviços públicos”.
Especificamente sobre o tema – transporte de passageiros -, XXXX XXX XXXXXX XXXXXXXX FILHO2 leciona que seria possível autorização quando o transporte for de interesse privado, como por exemplo, vans que conduzem moradores para residências situadas em local de mais difícil acesso em morros, ou ainda o serviço de táxis. Porém, deixa claro que o serviço de transporte coletivo de passageiros “é inegavelmente um serviço público”.
Some-se ao disposto, que a Lei Federal nº 12.587/2012, que institui a Política Nacional de Mobilidade, diferencia o serviço de transporte público coletivo do transporte privado coletivo, sendo certo inferir que somente este último é que poderá ser explorado pelo particular por meio de autorização, já que ao primeiro, o artigo 175 da Constituição é taxativa em estabelecer a concessão e permissão como únicas formas de delegação.
Essa conclusão encontra respaldo na doutrina de XXXX XXX XXXXXX XXXXXXXX XXXXX, o qual explica que o transporte interestadual que poderia ser autorizado ao particular seria, por exemplo, o fretamento de ônibus para passeio, mas nunca o transporte coletivo de passageiros, definido como serviço público.
Posto isso, com amparo na Constituição Federal, na Lei nº 12.587/2012 e na melhor doutrina, não há dúvidas que o serviço de transporte coletivo
2 In, Manual de Direito Administrativo, Editora Atlas, 25ª Edição, p. 443.
de passageiros é serviço público e, como tal, sua execução somente poderá ser transferida ao particular por meio de concessão ou permissão, sempre por licitação.
Acrescente-se, ainda, que no âmbito federal existe agência reguladora para fiscalização do serviço de transporte interestadual de passageiros, que é a ANTT, e no Estado de Goiás a fiscalização está a cargo da AGR, deixando claro, mais uma vez, a natureza pública do serviço.
Entretanto, ainda que se admita que autorização como instrumento para transferir a execução do serviço público de transporte coletivo de passageiros ao particular, jamais ela poderia se dar sem licitação, como feito pela AGR.
A autorização, por si só, não desobriga o agente público em proceder a licitação. Acontece que muitas vezes não há porque instaurar o certame, pois não existe a disputa, o que não é o caso do serviço de transporte coletivo intermunicipal de passageiros.
A Lei Estadual nº 18.673/2014, ao dispor em seu artigo 10,
§ 1º, I, que as autorizações serão concedidas sem licitação, contrariou disposição clara da Constituição Federal que determina a realização de licitação pela Administração Pública.
Não há nenhum amparo jurídico capaz de subsidiar a Lei Estadual nº 18.673/2014 e seus regulamentos expostos no Decreto nº 8.444/2015 e na
Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR, de sorte que os atos e contratos que levaram a expedição de autorização conferida pela AGR a empresas privadas para exploração do serviço de transporte coletivo intermunicipal de passageiros são absolutamente NULOS.
Obtempera-se que a AGR, ao responder o Ministério Público que não acataria a Recomendação para suspender os indigitados atos de autorização, nada disse sobre a ausência de licitação.
É bom registrar que existem diversos julgados reconhecendo que a prestação do serviço público de transporte de passageiros somente poderá ser transferida ao particular por meio de licitação, como exemplo:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EXPLORAÇÃO DE TRANSPORTE INTERESTADUAL DE PASSAGEIROS, INDEPENDENTEMENTE DE AUTORIZAÇÃO, PERMISSÃO OU CONCESSÃO DO PODER PÚBLICO. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. NECESSIDADE DE PRÉVIO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. PRECEDENTES. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL PROVIDAS - Nos termos da
Constituição (arts. 21, XII, e, e 175), compete à União explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços transporte rodoviário interestadual de passageiros, mediante prévio e regular procedimento licitatório. - À Administração, e somente a ela, na condição de titular do poder concedente, cabe analisar a conveniência ou oportunidade de deferir linhas a empresas de transporte rodoviário coletivo de passageiros, realizar seccionamentos, extensões, estabelecer itinerários e o mais que for pertinente a essa
atividade. - O Judiciário não pode se substituir ao Administrador nessas hipóteses. - Mesmo em face de omissão do Poder Público em realizar o certame para o deferimento de linha em trecho no qual haja concreta necessidade do serviço para a população, o máximo que ele poderia fazer era impor à Administração a realização do processo licitatório, ou responsabilizá-la pelo ato omissivo, não entregar a linha diretamente a uma dada empresa, ainda mais interferindo no exercício do poder de polícia da União sobre o transporte interestadual de passageiros da região. - Em princípio, nenhuma empresa tem direito de prestar serviço público, se para tanto não foi regularmente escolhida pela Administração, mediante o procedimento cabível, para obter a concessão, permissão ou autorização, ainda que o venha operando irregularmente, não importa desde quando. - A rigidez dessas regras não constitui qualquer violação à livre iniciativa, muito ao contrário, submete-a aos lindes constitucionais e legais, mormente quando há outras empresas interessadas. - Somente em situações excepcionais, para atender necessidade concreta de oferecimento ao público de serviço de transporte por acaso inexistente em dada localidade, garantindo-lhe o direito de ir e vir, poderia o Judiciário, e apenas em caráter precaríssimo, autorizar empresa a prestá-lo, ou a continuar a fazê-lo, mesmo assim mediante verificação da legitimidade judicial para argüir dito direito, que normalmente as pessoas privadas não detêm, e apenas até que regularizada a situação, com a realização da licitação cabível. - Excepcionalidade não configurada nos autos, já por existir outra empresa, essa titular da devida permissão, atuando na área, já por falecer à requerente, legitimidade para defender direito difuso da população. - Precedentes do STF, STJ e de diversos tribunais, inclusive o TRF5, e até desta 4.ª Turma. - Apelações e remessa oficial providas. (TRF-5 - AC: 318349 CE 2003.05.00.010558-5, Relator: Desembargador Federal Xxxxxxx Xxxxxxx, Data de Julgamento: 28/11/2006,
Quarta Turma, Data de Publicação: Fonte: Diário da Justiça - Data: 09/02/2007 - Página: 596 - Nº: 29 - Ano: 2007)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERESTADUAL DE PASSAGEIROS. AUTORIZAÇÃO, CONCESSÃO OU PERMISSÃO DE EXPLORAÇÃO DO SERVIÇO. OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM PROMOVER LICITAÇÕES. POPULAÇÕES DESATENDIDAS. INTERVENÇÃO EXCEPCIONAL DO PODER
JUDICIÁRIO. 1. Não obstante seja incontroverso que somente por meio de licitação é possível a autorização, concessão ou permissão de exploração de serviços de transporte rodoviário interestadual de passageiros (Constituição Federal, art. 21, inc. XII, e), há mais de duas décadas a Administração se omite em deflagrar procedimentos licitatórios. 2. Estudos técnicos reconhecem que, com o desenvolvimento do país nessas últimas décadas, aumentou a demanda das populações interioranas no que tange à operacionalização de transporte coletivo interestadual de passageiros. 3. A autora obteve do extinto DNER autorização para explorar o serviço público de transporte rodoviário de passageiros nos trechos Porto Seguro (BA) - Sena Madureira (AC), Assis Brasil (AC) - Colniza (MT) e Ariquemes (RO) - Boa Vista (RR), com seccionamentos, no ano de 1.984. Todavia, tem sofrido restrições à sua atividade mediante autuações por parte da Agencia Nacional de Transportes Terrestres - ANTT e pelo Departamento de Polícia Rodoviária Federal, em que aplicam sanções pela execução de serviços de transporte rodoviário interestadual de passageiros sem prévia autorização ou permissão. 4. Há mais de 20 (vinte) anos a apelante tem atuado junto ao Poder Público com vistas a regularizar sua situação. Durante todo esse período, a Administração tem negado a autorização provisória à autora para operar nos referidos itinerários
sob o argumento da necessidade de se realizar licitação pública. Entretanto, não obstante o decurso de mais de duas décadas, o procedimento licitatório não foi realizado até o presente momento, caracterizando flagrante omissão da Administração Pública no cumprimento de suas atribuições. 5. Não é tarefa do Poder Judiciário estabelecer linhas, deferir concessões e permissões, mas apenas averiguar a licitude da ação ou omissão da Administração que, neste particular, é ilegal e abusiva, contrária ao interesse público, ao desenvolvimento do país, ao princípio da legalidade e da moralidade. 6. Em face da excepcionalidade da situação, que perdura no tempo em prejuízo dos usuários dos serviços de transporte interestadual de passageiros, constatada a omissão da Administração em deflagrar procedimento licitatório para concessão de serviço de transporte interestadual regular de passageiros, cabe ao Poder Judiciário assegurar a continuidade da prestação do serviço público, até que seja realizado o competente processo de licitação, garantindo- se, assim, o direito constitucional de ir e vir da coletividade envolvida. Precedentes: AG 2004.01.00.007110-3/DF, rel. Des. Federal Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, DJ de 11/11/2004; AC 2006.35.02.000233-
2/GO, rel. Des. Federal Fagundes de Deus, e-DJF1 de 29/04/2011; AC 0018524-60.2003.4.01.3400/DF, rel. Des.
Federal Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, e-DJF1 de 13/05/2011; AC 0007331-97.2007.4.01.3500, rel. Juiz Federal Xxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx - conv., rel. p/ acórdão Des. Federal Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, publ. 21/10/2011 e- DJF1 P. 218. 7. A ANTT promoverá a fiscalização regular à empresa autora nos mesmos moldes que atua com relação às demais. 8. Apelação da autora provida. (TRF-1 - AC: 4168 RO 0004168-86.2006.4.01.4101, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE
XXXXX XX XXXXXXX, Data de Julgamento: 24/10/2012, QUINTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.744 de 16/11/2012)
Assim, não há dúvidas que as autorizações concedidas pela AGR a empresas particulares são inconstitucionais, justamente por seus pressupostos de validade dados pela Lei Estadual nº 18.673/2014, Decreto 8.444/2015 e Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR também o serem.
A inconstitucionalidade da lei ordinária gera, por consequência, a inconstitucionalidade dos atos administrativos praticados com fundamento nesta, em razão do dever de compatibilidade vertical.
3. Dos Atos de Improbidade Administrativa Praticados pelo Requerido RODOVAL DARCI CHIARELOTO:
Segundo Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx Junior3 improbidade administrativa significa “servir-se da função pública para angariar ou distribuir, em proveito pessoal ou para outrem, vantagem ilegal ou imoral, de qualquer natureza, e, por qualquer modo, com violação aos princípios e regras presidentes das atividades na Administração Pública, menosprezando os deveres do cargo e a relevância dos bens, direitos, interesses e valores confiados à sua guarda, inclusive por omissão, com ou sem prejuízo patrimonial”.
A Lei nº 8.429/92, que reafirma os princípios administrativos previstos no caput do art. 37 da CF e especifica os atos de improbidade administrativa, contempla três modalidades de atos de improbidade
3 XXXXXXX XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx, Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2001. P.113
administrativa, são eles: 1) atos que importam enriquecimento ilícito (art. 9º); 2) atos que causam prejuízo ao erário (art. 10); 3) atos que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11).
In casu, a conduta do requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO amolda-se a modalidade de ato de improbidade administrativa que causa dano ao erário e atenta contra os princípios da administração pública.
Primeiro, destaca-se que o Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO levou a efeito as combatidas autorizações, estando ciente de que tramita no Poder Judiciário ação cujo objeto consiste exatamente em determinar a obrigação de licitação para privatização da execução do serviço de transporte intermunicipal de passageiros.
Sabia, ainda, que o TCE/GO determinou liminarmente a realização de licitação no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias para deflagração de licitação para a prestação do serviço.
Segundo, que embora as autorizações estejam mascaradas por uma aparente legalidade, conferida pela Lei Estadual nº 18.673/2014 e regulamentos, o desvio de finalidade das normas é manifesto, não podendo jamais o agente público se escusar de cumprir o que está claramente determinado pela Constituição Federal.
A Lei Estadual nº 18.673/2014 foi editada a “toque de caixa”, para garantir às poderosas empresas de transporte intermunicipal de passageiros um tratamento exclusivo, nunca visto em nenhuma outra forma de
contratação de serviços públicos, permitindo a perpetuação na execução do serviço.
Observe que as autorizações foram dadas pelo período de 15 (quinze) anos, e nesse interregno, como é típico do ato de autorização, caso a administração resolva revogá-las, ainda terá que indenizar as empresas, ou seja, terá que indenizar alguém que explora um serviço público de modo inconstitucional. Parece justo? Nenhum pouco.
Terceiro e último, a presunção de constitucionalidade das leis não impede a responsabilização dos agentes públicos pela prática de atos de improbidade administrativa, haja vista que o princípio da legalidade administrativa não se reduz à situação de conformidade do ato administrativo com a lei, no sentido estrito. Os atos da administração devem estar de acordo com todo o ordenamento e, sobretudo, com a base de sustentação, a Constituição Federal.
Pelo princípio da supremacia, todas as situações jurídicas devem se conformar com os princípios e preceitos da Constituição. Logo, a autorização para prestação de serviço público e ainda sem licitação, como as aqui descritas, com base em leis manifestamente inconstitucionais, são também inválidas por inconstitucionalidade.
Assim, destacadas essas três premissas, não há como o Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO eximir-se da responsabilidade de responder pelos atos de improbidade que praticou ao autorizar empresas particulares
explorarem o serviço público de transporte intermunicipal de passageiros ao arrepio da Constituição Federal.
Ao autorizar empresas privadas a prestarem o serviço público de transporte coletivo intermunicipal de passageiros, o Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO frustrou a licitude da obrigatória licitação, dispensando-o indevidamente, razão pela qual encontra-se incurso na conduta descrita no artigo 10, caput e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92, in verbis:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente;
Atente-se que a jurisprudência do TJGO e dos Tribunais Superiores reconhece que o dano ao erário causado pela dispensa indevida de licitação é in re ipsa, ou seja, presumido, conforme destaca-se dos enunciados abaixo transcritos:
EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. POLO INDUSTRIAL. CESSÃO DE USO DE ÁREA PÚBLICA A
PARTICULARES SEM LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS EXIGIDOS PELA LEI Nº 8.666/93. DANO IN RE IPSA. ACERVO PROBATÓRIO SUFICIENTE. CARACTERIZAÇÃO DOS ILÍCITOS DESCRITOS NOS ARTIGOS 10, VIII, E ART. 11, CAPUT E INCISOS I, II E IV, DA LEI N. 8.429/92. PENA. OBSERVÂNCIA DO ART.
12 DA LIA. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE NÃO CARACTERIZADAS. PREQUESTIONAMENTO 1. A demonstração do elemento subjetivo (dolo), conquanto exigível para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 da Lei n. 8.429/99, não se faz necessária para a caracterização do ato ímprobo regulado no respectivo artigo 10, cuja materialização reclama, neste particular, apenas a configuração da culpa. Precedentes do STJ. 2. A dispensa indevida de licitação ocasiona prejuízo in re ipsa ao Erário, na medida em que o Poder Público deixa de contratar a melhor proposta, em razão das condutas dos administradores. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3. A outorga de cessão de uso de área pública a particulares, sem licitação prévia, afronta não só a Lei n. 8.666/93, mas também a Lei n. 8.429/92, porquanto afigura-se evidente a lesão aos princípios da administração pública, especialmente quando inaplicáveis as exceções legais que justificam a dispensa ou inexigibilidade do ato licitatório. 4. Em situações desse jaez, em que fora comprovada a lesão ao Poder Público, ainda que pendente de liquidação o respectivo prejuízo, impõem-se aos agentes públicos infratores, de forma cumulativa e individualizada, as penalidades de ressarcimento integral do dano, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou dele receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios. 5. A aplicação das penalidades previstas na norma exige que o magistrado considere, no caso concreto, 'a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente' (conforme previsão expressa contida no parágrafo único do art. 12 da Lei 8.429/92), atentando
para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, como procedido neste feito. 6. Afasta-se a alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015 quando o acórdão recorrido dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais, em conformidade, ainda, com as manifestações pretéritas aviadas pelas partes desde a exordial até o encerramento da instrução, não sendo exigível a abordagem específica de cada uma das teses desenvolvidas pelas partes, mas apenas acerca dos temas necessários à integral solução da lide. Precedentes do STJ. 7. Os embargos de declaração não têm o condão de funcionar como sucedâneo de recurso, não se viabilizando, por meio de sua oposição, a mera rediscussão de matéria já decidida, pois como cediço, seu objetivo é expungir da decisão embargada eventual obscuridade, contradição, omissão ou erro material. 5. Ausentes quaisquer dos vícios catalogados no art. 1.022 do CPC/2015, afiguram-se incabíveis os embargos de declaração. (XXXX, APELACAO CIVEL 475913-20.2007.8.09.0011, Rel. DES. XXXXXXXX XXXXX XXXXXX, 2A XXXXXX XXXXX, julgado em 10/05/2016, DJe 2035 de 30/05/2016)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. REJEIÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POLO INDUSTRIAL. CESSÃO DE USO DE ÁREA PÚBLICA A PARTICULARES SEM LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DOS RE- QUISITOS EXIGIDOS PELA LEI Nº 8.666/93. DANO IN RE IPSA. ACERVO PROBATÓRIO SUFICIENTE QUANTO À CONDUTA DE EX-PREFEITOS E EX- SECRETÁRIOS MUNICIPAIS. CARACTERIZAÇÃO DOS ILÍCITOS DESCRITOS NOS ARTIGOS 10, VIII, E ART. 11, CAPUT E INCISOS I, II E IV, DA LEI N. 8.429/92. AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AO EX-VICE-
PREFEITO. 1. O princípio da identidade física do juiz
comporta temperamento, devendo a sua aplicação ser conjugada com outros princípios do ordenamento jurídico, como, por exemplo, o princípio do pas de nullité sans grief.
2. Não restando caracterizado nenhum prejuízo às partes, sobretudo no pertinente aos princípios do contraditório e da ampla defesa, não é viável reconhecer-se a nulidade da sentença, por ter sido prolatada por juiz que não presidiu a instrução do feito ou por julgador diverso daquele que examinou o pedido de tutela antecipada, mormente quando a designação desse outro magistrado, para prolatar a sentença, não se deu de forma aleatória, ou arbitrária, mas por meio de decreto do próprio Presidente do Tribunal de Justiça. Preliminar rejeitada 3. A demonstração do elemento subjetivo (dolo), conquanto exigível para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 da Lei n. 8.429/99, não se faz necessária para a caracterização do ato ímprobo regulado no respectivo artigo 10, cuja materialização reclama, neste particular, apenas a configuração da culpa. Precedentes do STJ. 4. A dispensa indevida de licitação ocasiona prejuízo in re ipsa ao Erário, na medida em que o Poder Público deixa de contratar a melhor proposta, em razão das condutas dos administradores. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 5. A outorga de cessão de uso de área pública a particulares, sem licitação prévia, afronta não só a Lei n. 8.666/93, mas também a Lei n. 8.429/92, porquanto afigura-se evidente a lesão aos princípios da administração pública, especialmente quando inaplicáveis as exceções legais que justificam a dispensa ou inexigibilidade do ato licitatório. 6. Em situações desse jaez, em que fora comprovada a lesão ao Poder Público, ainda que pendente de liquidação o respectivo prejuízo, impõem-se aos agentes públicos infratores, de forma cumulativa e individualizada, as penalidades de ressarcimento integral do dano, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou dele receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios. 7. A relativa valia das provas colhidas no inquérito civil, não
corroboradas por aquelas da instrução processual, quanto aos atos de improbidade imputados a um dos apelados, indica a necessidade da manutenção da sentença que o absolveu. (XXXX, APELACAO CIVEL 475913- 20.2007.8.09.0011, Rel. DES. XXXXXXXX XXXXX XXXXXX, 2A XXXXXX XXXXX, julgado em 15/03/2016, DJe 1996 de 29/03/2016)
Acerca do dolo na conduta do Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO, tem-se que ele, como já dito, tinha ciência que tramitava ação judicial para determinar a AGR a realização de licitação, bem como que o TCE/GO havia determinado a deflagração de procedimento licitatório no prazo de 180 dias e, também foi recomendado pelo Ministério Público a suspender os atos de autorização, contudo, avesso a tudo isso, em ato livre e consciente, levou a efeito seu intento.
Não há dúvidas, portanto, quanto ao dolo na conduta do Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO.
O Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO encontra- se ainda incurso na conduta descrita no artigo 11, caput e inciso I, da Lei nº 8.429/92, pois atentou contra os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade e eficiência, que dispõe, in verbis:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
Sobre o referido dispositivo da lei de improbidade, Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxx0 sustenta que violar um princípio “é a modalidade mais grave e ignóbil de improbidade administrativa, pois contempla o comportamento torpe do agente público que desempenha funções públicas de sua atribuição de forma desonesta e imoral”.
Certamente que deixar de aplicar a Constituição Federal em favor de poderosas empresas de transporte coletivo intermunicipal, dando um “jeitinho” para prorrogação de seus contratos por mais 15 (quinze) anos, o Requerido agiram de forma desonesta e imoral.
XXXXXXX XXXXXX e XXXXXXX XXXXXXX XXXXX0
acrescentam ainda que para prática do ato de improbidade administrativa descrito no artigo 11 da LIA é necessário o dolo do agente, sendo admitido a modalidade culposa somente para os atos que causaram dano ao erário.
In casu, o dolo na conduta do Requerido já foi satisfatoriamente demonstrado no tópico anterior que tratou do ato que acarretou dano ao erário.
Destarte, por suas condutas enquadrarem-se nos tipos descritos nos artigos 10º, caput, VIII, e 11, caput, I, da Lei nº 8.429/92, o requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO deverá submeter-se às sanções descritas no artigo
4 XXXXXX XXXXXXXXXX XXXXX. Lei de Improbidade Administrativa Comentada, Atlas, 2002, p. 54.
5 In, Improbidade Administrativa. 3ª Edição. Lumen Juris. p. 283.
12, II e III, da mesma lei.
III. DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA
As circunstâncias do caso em apreço atendem aos requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil: “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
A probabilidade do direito ressai expressamente dos dispositivos legais supracitados, especialmente do artigo 175 da Constituição Federal, que dispõe que a todo serviço público será prestado diretamente ou por concessão ou permissão, sempre por meio de licitação.
O perigo de dano decorre da grave inconstitucionalidade que está sendo levada a efeito com as objurgadas autorizações, as quais se se concluírem, poderão, inclusive, gerar direito a indenização às permissionárias, caso o ato seja revogado
Ressalte-se que muito maior do que o dano de se permitir que as empresas que tiveram seus contratos finalizados continuem exercendo a
execução do serviço sem nenhum ato administrativo é o de autorizá-las, inconstitucionalmente a explorarem o serviço por 15 anos.
A Lei da Ação Civil Pública prevê ainda que “poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo” (art. 12).
Destarte, considerando que o direito que se pretende ver realizado é assegurado por lei e pela Constituição Estadual, e não havendo justificativa plausível para se admitir a autorização para transferir ao particular a prestação do serviço público de transporte intermunicipal de passageiros, urge que seja concedida a tutela provisória de urgência, a fim de:
1. suspender a eficácia da Lei Estadual nº 18.673/2014, do Decreto nº 8.444/2015 e da Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR;
2. suspender os atos de autorização e eventuais contratos firmados entre o ESTADO DE GOIÁS, AGR e empresas privadas prestadoras do serviço público de transporte intermunicipal de passageiros;
IV - DOS PEDIDOS
Por todo o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO requer a
Vossa Excelência:
1. Seja a presente ação autuada e processada na forma do rito preconizado pelo artigo 17, da Lei n.º 8.429/92;
2. A concessão de tutela provisória de urgência, a fim de:
2.1. suspender a eficácia dos artigos 2º, 7º e 10º,§ 1º, I, da Lei Estadual nº 18.673/2014, do Decreto nº 8.444/2015 e da Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR;
2.2. suspender os atos de autorização e eventuais contratos firmados entre o ESTADO DE GOIÁS, AGR e empresas privadas prestadoras do serviço público de transporte intermunicipal de passageiros;
3. Seja determinada a notificação do requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO para oferecer, caso queira, manifestação preliminar, conforme art. 17, § 7º, da Lei n.º 8.429/92, observando que somente contra ele pesa a acusação de ato de improbidade administrativa;
4. Seja recebida a petição inicial, determinada a citação dos Requeridos para, caso queiram, contestarem os termos da presente
ação;
5. Seja julgado procedente o pedido, em todos os seus aspectos, para:
5.1) Em face dos Requeridos ESTADO DE GOIÁS e AGR:
a) confirmar a tutela de urgência, procedendo-se a anulação das autorizações e eventuais contratos firmados com empresas particulares para prestação do serviço público de transporte intermunicipal de passageiros;
b) determinar a realização de licitação para os contratos objeto desta ação, caso o Poder Público decida transferir ao particular a execução do serviço de transporte coletivo intermunicipal de passageiros, com amparo no artigo 175 da Constituição Federal e na Lei nº 8.666/93;
5.2) Em face do Requerido RIDOVAL DARCI CHIARELOTO: condená-lo às penas do artigo 12, II e III, da Lei nº 8.429/92, por estar incurso nas condutas descritas nos artigos 10, caput e inciso VIII e 11, caput e inciso I, da mesma lei;
5.3) A declaração incidental de Inconstitucionalidade dos artigos 2º, 7º e 10º, § 1º, I da Lei Estadual nº 18.673/2014,
do Decreto nº 8.444/2015 e da Resolução Normativa da AGR nº 0040/2015-CR, bem como dos atos de autorização e eventuais contratos firmados entre o ESTADO DE GOIÁS, AGR e empresas privadas prestadoras do serviço público de transporte intermunicipal de passageiros;
6. Requer a produção de todos os meios de provas admitidos em direito, notadamente a juntada posterior de documentos e prova testemunhal;
7. A condenação dos requeridos ao pagamento das custas, emolumentos processuais e ônus de sucumbência;
8. A juntada do Inquérito Civil Público em anexo.
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Goiânia, 04 de agosto de 2016.
VILLIS MARRA
Promotora de Justiça
78ª Promotoria de Justiça