EMENTA
PARECER/CONSULTA TC-035/2013
PROCESSO - TC-8986/2010
INTERESSADO - PREFEITURA MUNICIPAL DE SOORETAMA
ASSUNTO - CONSULTA
EMENTA
PARTICIPAÇÃO DE PARENTES DE VICE-PREFEITO MUNICIPAL EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO - INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL À CONTRATAÇÃO EM RAZÃO DO PARENTESCO - A POSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO, E POSTERIOR CONTRATAÇÃO, DE EMPRESA QUE POSSUA SÓCIO, COTISTA, ADMINISTRADOR OU PROPRIETÁRIO, QUE DETENHA GRAU DE PARENTESCO DO VICE-PREFEITO MUNICIPAL ESTÁ CONDICIONADA À LEGISLAÇÃO LOCAL OU À LEI ORGÂNICA.
Vistos, relatados e discutidos os autos do Processo TC-8986/2010, em que a Prefeita Municipal de Sooretama, Sra. Xxxxx da Conceição Rangel, formula consulta a este Tribunal, nos seguintes termos:
“Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltado que, a figura do Vice Prefeito Municipal, não está diretamente ligado ao Poder, e, não exerce nenhuma ingerência político-administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?
Justificativa: A L. 8.666/93 e posteriores alterações, não elencam taxativamente esta condição e, a doutrina é divergente, quando em casos desta jaez, fazendo-se necessário a presente consulta, para que se firma o entendimento desta Casa.”
Considerando que é da competência deste Tribunal decidir sobre consulta que lhe seja formulada na forma estabelecida pelo Regimento Interno, conforme artigo 1º, inciso XXIV, da Lei Complementar nº 621/12.
RESOLVEM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão realizada no dia onze de abril de dois mil e treze, à unanimidade, nos termos do voto do Relator, Conselheiro em substituição Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, que encampou o voto-vista do Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, preliminarmente, conhecer da consulta, para, no mérito, respondê-la nos termos do voto-vista abaixo transcrito, e dos votos complementares dos Conselheiros Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Pinto:
O EXMO. SR. CONSELHEIRO EM SUBSTITUIÇÃO XXXXX XXXXXXX XX XXXXX:
Cuidam os presentes autos de Consulta formulada pela Sra. Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx, Prefeita Municipal de Sooretama, sobre o tema que se transcreve:
Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice-Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltando que, a figura do Vice-Prefeito Municipal não está diretamente ligada ao Poder, i.e., não exerce nenhuma ingerência político-administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?
Instada a manifestar-se a 8ª Controladoria Técnica, nos termos da Instrução Técnica –
n. OT-C – nº 20/2012 (fls. 05/11), sugeriu o conhecimento da presente consulta, para, no mérito, respondê-la negativamente.
O douto Ministério Público Especial de Contas, por seu Procurador-Geral, Dr. Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx, através da MMPC 799/2012 (fls. 13), em consonância com a área técnica, pugnou no mesmo sentido.
Conforme regular distribuição, vieram os autos a este Magistrado de Contas para emissão de relatório e voto para efeito de deliberação do Egrégio Plenário, na forma do art. 18 do Regimento Interno desta Corte de Contas.
É o relatório.
V O T O
Da análise do feito, tenho que assiste razão à área técnica e ao douto representante do Ministério Público Especial de Contas, estando presentes os requisitos de admissibilidade previstos no artigo 96 do Regimento Interno desta Corte de Contas Resolução TC. 182/2002.
Quanto ao mérito, assim se manifestou a 8ª Controladoria Técnica, através da Instrução Técnica – n. OT-C – nº 20/2012, verbis:
omissis
III MÉRITO
Quanto ao mérito, o questionamento trazido à baila pela Consulente diz respeito à possibilidade de que parentes de até o terceiro grau do Vice-Prefeito possam contratar com o Poder Público, após o cumprimento das fases licitatórias. Isso porque, segundo o alegado pela Consulente, o Vice-Prefeito não exerce nenhuma influência na Administração Pública, estando limitado a substituir, em caráter eventual, o chefe do Poder Executivo Municipal.
A matéria ora apreciada está diretamente relacionada aos Princípios Administrativos Constitucionais, previstos no artigo 37, da Constituição Federal, que dispõe:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Pela simples leitura do dispositivo acima transcrito pode-se observar que se exige dos administrados e também dos administradores públicos o respeito aos Princípios da Impessoalidade e da Moralidade, o que significa afirmar que estes não podem agir de acordo com os seus interesses pessoais, devendo, no exercício da função pública, pensar no interesse público e não em vantagens pessoais.
Tal exigência deve ser observada em qualquer tipo de ato administrativo e ganha relevância quando se trata de licitações públicas. Isso porque, o objetivo de tais procedimentos é obter a mais vantajosa contratação para a Administração Pública.
Ocorre que, para a realização de uma licitação, alem do respeito aos procedimentos previstos na Constituição Federal e especificados na Lei Federal nº 8.666/93, faz-se necessário garantir que todos os direta ou indiretamente envolvidos possam agir com total imparcialidade.
Verifica-se, contudo, que a imparcialidade dos Administradores Públicos envolvidos no procedimento licitatório ficaria seriamente comprometida, se admitíssemos a participação um de seus parentes de até o terceiro grau ou dos ocupantes destes em igualdade de condições com os demais participantes.
Acerca do parentesco de até terceiro grau, ressalta-se que a Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal, ao tratar do nepotismo, proibiu a nomeação de cônjuges, companheiros, parentes consanguíneos e afins, até o 3º grau, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargos comissionados ou funções gratificadas na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas.
A referida súmula impede que parentes de até terceiro grau de ocupantes de cargo de chefia, direção e assessoramento, privilegiem-se desta relação de parentesco próxima para obterem vantagens na ocupação de cargos ou funções na Administração Pública.
Assim, ao consultar sobre a possibilidade de parentes de até o terceiro grau do Vice-Prefeito participem do procedimento licitatório e contratem com a Administração Pública, a Consulente está se referindo ao mesmo grau de parentesco tratado na súmula do nepotismo (súmula 13), ou seja, parentes e até o terceiro grau de Administradores Públicos.
Neste sentido, o parecer em consulta nº 04/2012, lavrados nos autos do processo nº 2942/2009, pelo Auditor de Controle Externo, Xxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx, cujo trecho passa-se a transcrever:
SEGUNDO QUESTIONAMENTO O segundo questionamento diz respeito à possibilidade de uma construtora, que tem como um de seus engenheiros responsáveis profissional autônomo que presta serviço a várias construtoras, participar de processo licitatório em município em que o pai do engenheiro é Prefeito municipal e conseqüentemente contratante. O deslinde da questão passa também pela análise dos princípios da moralidade e da impessoalidade. Por meio deles, chega-se à conclusão de que a contratação pelo Município de construtora em que o engenheiro responsável seja filho do Prefeito é irregular. Isso porque a conduta esperada do
administrador é que seus atos sejam desvinculados de paixões ou parcialidade, o que dificilmente se constata quando o ato envolve interesse de parentes ou pessoas com vínculo afetivo próximo. Como parâmetro, pode-se mencionar a Súmula Vinculante n. 13, do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu a nomeação de cônjuges, companheiros, parentes consangüíneos ou afins, até o 3º grau, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargos comissionados ou funções gratificadas na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas. O referido instrumento normativo, apesar de cuidar de matéria diversa às licitações e contratos, refletiu bem o conteúdo dos princípios da moralidade e da impessoalidade ao pressupor que a nomeação de cônjuges, companheiros ou parentes para o exercício de cargos ou funções gratificadas implica em favorecimento deles em relação aos demais. A Administração, nesses casos, deixa de agir de maneira impessoal e passa a atuar de forma a privilegiar os interesses particulares de seus agentes em detrimento do interesse público. Trata-se de um ônus a que o administrador, enquanto investido nessa função, deve se submeter. No âmbito do procedimento licitatório, o caminho não pode ser diferente. O administrador que se depare, no momento de realização do certame, com empresas que tenham cônjuges, companheiros ou parentes como sócios diretores, engenheiros responsáveis, etc., deverá desclassificá-las, sob pena de fulminar os princípios em questão. Isso porque, tendo poder de decidir sobre a contratação, poderia querer privilegiar aqueles com quem tem laços de parentesco.
Não restam, pois, dúvidas de que o parentesco de até terceiro grau de Administradores Públicos direta ou indiretamente responsáveis por procedimentos licitatórios podem sim macular a sua isonomia, ainda que pelo simples fato de retirarem a sua credibilidade.
Ressalta-se que o Vice-Prefeito, embora tenha afirmado a Consulente, a sua total ausência de ingerência político-administrativa, estando restrito a eventuais substituições do chefe do Executivo Municipal, não se pode com isso concordar, pois ele faz parte da cúpula do Poder Executivo Municipal, sendo eleito na mesma chapa do Prefeito e recebendo, inclusive, subsídios para atuar na Administração Pública, ainda quando não esteja substituindo o Prefeito.
Deste modo, mesmo que não tenha o Vice-Prefeito funções diretamente relacionadas ao procedimento licitatório, não se pode dizer que ele não exerce ingerências político- administrativas e de que não tenha qualquer influência no procedimento licitatório, o que ocorre pelo simples fato de estar ocupando um cargo político na cúpula do Poder Executivo Municipal, podendo sim abalar a isonomia de uma licitação.
IV CONCLUSÃO
Por todo o exposto, sugere-se o conhecimento da presente consulta, para no mérito concluir que os participantes do procedimento licitatório, que detenham grau de parentesco de até o
terceiro grau, com a pessoa do Vice-Prefeito Municipal estão impedidos de contratar com a Administração Pública.
Neste sentido, os Administradores Públicos que no momento da realização do certame depararem-se com licitantes que tenham grau de parentesco até o terceiro grau com o Prefeito ou Vice-Prefeito deverão desclassificá-los, sob pena de fulminar os Princípios da Moralidade e Impessoalidade que regem a Administração Pública.
Do mesmo modo, caso tenham sido vencedores do procedimento licitatório pela inobservância da Administração Pública não poderão ser contratados pelo poder público.
Verifico que, a área técnica e o douto representante do Parquet manifestaram-se acertadamente pelo conhecimento da presente consulta, opinando no sentido de que os licitantes que no momento da realização do certame tenham parentesco até o 3º (terceiro) grau com o Prefeito ou Vice-Prefeito deverão ser desclassificados.
Registra-se que o Supremo Tribunal Federal sumulou referido entendimento na súmula vinculante de nº 13, relativamente às contratações para exercício de cargos comissionados e funções gratificadas.
A instrução, bem lançada, de lavra do Sr. Xxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx, Auditor de Controle Externo, caminha no sentido de que Administradores Públicos que, no momento da realização do certame, depararem-se com licitantes que tenham grau de parentesco até o terceiro grau com o Prefeito ou Vice-Prefeito deverão desclassificá-los, sob pena de fulminar os Princípios da Moralidade e Impessoalidade que regem a Administração Pública, em razão de seu conteúdo normativo.
Por todo o exposto, acompanhando o pronunciamento do douto representante do Ministério Público Especial de Contas, adoto, in totum, a manifestação da 8ª Controladoria Técnica e VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no mérito respondê-la no sentido de que estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal.
VOTO, por fim, no sentido de que seja encaminhado à consulente, cópia deste voto e da Instrução Técnica nº OT-C 20/2012, emitida pela 8ª Controladoria Técnica, após, arquive-se os autos.
VOTO-VISTA DO EXMO. SR. CONSELHEIRO XXXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX:
RELATÓRIO
Na 13ª Sessão Ordinária, realizada no dia 04 de março de 2013, pedi vista do presente processo que trata de consulta formulada pela Senhora Xxxxx da Conceição Rangel, Prefeita Municipal de Sooretama, contendo a seguinte indagação:
“Eventualmente participante de procedimento licitatório, que detenha grau, com a pessoa do Vice Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltado que, a figura do Vice Prefeito Municipal, não está diretamente ligado ao Poder, i.e., não exerce nenhuma ingerência político- administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da Chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?”
A questão, inicialmente, foi analisada pela 8ª Controladoria Técnica, mais especificamente, pela Auditora de Controle Externo, Senhora Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, por meio da OT-C nº. 20/2012, que se manifestou com o seguinte opinamento:
Por todo o exposto, sugere-se o conhecimento da presente consulta, para no mérito concluir que os participantes do procedimento licitatório, que detenham grau de parentesco de até o terceiro grau, com a pessoa do Vice-Prefeito Municipal estão impedidos de contratar com a Administração Pública.
Neste sentido, os Administradores Públicos que no momento da realização do certame depararem-se com licitantes que tenham grau de parentesco até o terceiro grau com o Prefeito ou Vice-Prefeito deverão desclassificá-los, sob pena de fulminar os Princípios da Moralidade e Impessoalidade que regem a Administração Pública.
Do mesmo modo, caso tenham sido vencedores do procedimento licitatório pela inobservância da Administração Pública não poderão ser contratados pelo poder público.
Instado a manifestar-se, o Ministério Público de Contas encampou o posicionamento citado, por meio da Manifestação MMPC 799/2012.
O Conselheiro Relator Substituto Senhor Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, por sua vez, proferiu o seguinte voto:
Por todo exposto, acompanhando o pronunciamento do douto representante do Ministério Público Especial de Contas, adoto, in totum, a manifestação da 8ª Controladoria Técnica e VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no mérito respondê-la no sentido de que estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal.
VOTO, por fim, no sentido de que seja encaminhado à consulente, cópia deste voto e da Instrução Técnica OT-C nº. 20/2012, emitida pela 8ª Controladoria Técnica, após, arquive-se os autos.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
Inicialmente, importante informar que, nos termos do que dispõem os artigos 95 e 96, da Resolução TC 182/2002, bem como os requisitos específicos, constantes no artigo 1º, inciso XXIV, da Lei Complementar 621/2012, a presente Consulta preenche os requisitos/pressupostos gerais de admissibilidade, motivo pelo qual conheço da presente Consulta quanto a sua admissibilidade.
No tocante ao mérito da consulta formulada pela Prefeitura de Sooretama, temos que esta se refere à possibilidade ou não de participação em procedimento licitatório e posterior contratação de empresa, que possua sócio cotista, administrador ou proprietário, que detenha grau de parentesco com a pessoa do Vice-Prefeito Municipal.
A Lei Maior traz em artigo 37, caput, os princípios que regem a administração pública, sendo eles legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, dispõe ainda no inciso XXI que, ressalvados os casos previstos em lei, as obras, serviços, compras e alienação serão contratados mediante processo de licitação pública, vejamos:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (grifo nosso)
Em obediência ao princípio da legalidade, descrito no texto constitucional, a administração pública está subordinada à lei, ou seja, só se pode fazer o que a lei expressamente autorizar ou determinar.
Como visto acima, a Lei Maior determina que as obras, serviços, compras e alienações serão contratadas mediante licitação, obedecendo ao que preconiza a própria Constituição e as legislações acerca do tema.
A Constituição Federal, no artigo 54, inciso I, alínea ‘a’, proíbe os deputados e senadores de firmar ou manter contratado com o poder público, in verbis:
Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:
I - desde a expedição do diploma:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; (grifo nosso)
Veja-se que a regra é proibir os deputados e senadores de firmarem ou manterem contrato com administração pública, salvo se o contrato obedecer a cláusulas uniformes, ou seja, "aquelas que são impostas pela administração pública, sem opção de escolha pelo contratado" (Ac. no 18.572/2000, de 19.10.2000 - REspe no 18.572, relator Ministro Xxxxxxxx Xxxxxxx).
Já a Lei de Licitações, 8.666/93 traz outras hipóteses de impedimento de participação em certames licitatórios, previstas no art. 9º, in verbis:
Art. 9º Não poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução
de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários:
I - o autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física ou jurídica;
II - empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela elaboração do projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital com direito a voto ou controlador, responsável técnico ou subcontratado;
III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação.
§ 1º É permitida a participação do autor do projeto ou da empresa a que se refere o inciso II deste artigo, na licitação de obra ou serviço, ou na execução, como consultor ou técnico, nas funções de fiscalização, supervisão ou gerenciamento, exclusivamente a serviço da Administração interessada.
§ 2º O disposto neste artigo não impede a licitação ou contratação de obra ou serviço que inclua a elaboração de projeto executivo como encargo do contratado ou pelo preço previamente fixado pela Administração.
§ 3º Considera-se participação indireta, para fins do disposto neste artigo, a existência de qualquer vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou trabalhista entre o autor do projeto, pessoa física ou jurídica, e o licitante ou responsável pelos serviços, fornecimentos e obras, incluindo-se os fornecimentos de bens e serviços a estes necessários.
§ 4º O disposto no parágrafo anterior aplica-se aos membros da comissão de licitação. (grifo nosso)
A Lei proíbe apenas, o autor do projeto básico, empresa envolvida com o autor do projeto básico e os servidores ou dirigentes do órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação a participarem do certame.
Observa-se que não há nenhuma vedação, expressa, à participação de parentes, afins ou consanguíneos, do prefeito, do vice-prefeito, dos vereadores, e dos ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança, no certame licitatório. A lei neste ponto tem por objetivo configurar uma espécie de impedimento à participação de determinadas pessoas na licitação, a fim de assegurar a proteção do princípio da isonomia e da moralidade administrativa.
Contudo, por resultar em restrição de direito e fundar-se em entendimento preventivo quanto à potencialidade de influência prejudicial ao certame, o rol constante no art. 9º da Lei nº 8.666/93 deve ser interpretado restritivamente, não podendo, pois, ser alargado pelo intérprete da lei, conforme gradação do art. 37, XXI, da CF/88.
Destarte, qualquer interpretação tendente a restringir a participação de interessados em hipótese não prevista em lei, restará inadequada, por afrontar o princípio da isonomia e o postulado da legalidade, consagrado no inciso II, art. 5º, da Constituição da República: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
Em resumo, o vínculo de parentesco, por si só, não pode servir de base para justificar o impedimento de participação de determinada pessoa em um certame licitatório, visto que: a) não há previsão expressa contida em lei quanto ao impedimento de participação de pessoa física ou de pessoa jurídica da qual seja integrante sócio que possua relação com membro da entidade promotora da licitação; b) não se pode presumir, sem qualquer ato ou fato objetivamente provado, a existência de vício no certame resultante de hipotética influência decorrente da relação de parentesco.
Todavia, faz-se necessário aferir o que preconiza a legislação local, a Constituição Estadual e a Lei Orgânica do Município acerca do tema, haja vista que a Constituição determina que a competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de Licitação e Contratos1 e autoriza aos Estados legislarem sobre questões específicas a respeito do tema2.
No mesmo sentindo, a Lei de Licitações determina que os Estados, Distrito Federal, Municípios e Administração Pública Indireta deverão adaptar suas normas sobre licitações e contratos ao disposto na referida lei.
O Estado do Espírito Santo, em sua Constituição, ratifica a vedação trazida no artigo 54, I, ‘a’, da Carta de Outubro e proíbe também, o servidor público, sob pena de
1 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (grifo nosso)
2 Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. (grifo nosso)
demissão, de participar ou realizar qualquer modalidade de contrato, de ajuste ou compromisso com o Estado, leia-se:
Art. 35. É vedado ao servidor público, sob pena de demissão, participar, na qualidade de proprietário, sócio ou administrador, de empresa fornecedora de bens e serviços, executora de obras ou que realize qualquer modalidade de contrato, de ajuste ou compromisso com o Estado.
Nota-se, que a vedação trazida pela Constituição Estadual norteia-se no inciso III do artigo 9º da Lei nº. 8.666/93, inovando apenas quando a sanção imposta ao servidor, ou seja, em caso de descumprimento do preceito legal, o servidor poderá ser demitido.
Desta forma, compreende-se que o Legislador Municipal, também deverá se pautar no que preconiza a Lei de Licitações não podendo, portanto, editar norma mais “benéfica” que a Lei 8.666/90, não havendo impedimento em ser mais restritivo que a norma federal.
Assim, caso a legislação local ou a Lei Orgânica não proíba, ou, seja omissa quanto à participação ou contratação de parentes, afins ou consanguíneos, do prefeito, do vice- prefeito, dos vereadores e dos ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança no certame, estes não podem ser impedidos de participarem da licitação e posteriormente, em virtude desta, serem contratados pela administração municipal.
O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina já se pronunciou sobre a questão. Vejamos:
Diante da omissão na Lei Orgânica e na legislação local, parentes do Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores não podem ser impedidos de participar de licitação e contratar com a Municipalidade, não se estendendo essa possibilidade àqueles agentes políticos ou a pessoas jurídicas nas quais mantenham participação societária, em face do princípio da moralidade e da vedação contida no art. 9º da Lei Federal nº 8.666/93 em relação aos dirigentes de órgãos ou entidades promotoras da licitação. (TCE- SC, Prejulgado 1102)
Por conseguinte, é necessário verificar se as legislações municipais, inclusive a Lei Orgânica, veiculam algum impedimento. Caso a legislação local ou a Lei Orgânica proibirem a participação de parentes de servidores, estes não poderão participar do certame ou serem contratados pelo Município.
O Supremo Tribunal Federal pronunciou-se acerca do tema. Leia-se:
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUNICIPAL. LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE BRUMADINHO-MG. VEDAÇÃO DE CONTRATAÇÃO COM O MUNICÍPIO DE PARENTES DO PREFEITO, VICE- PREFEITO, VEREADORES E OCUPANTES DE CARGOS EM COMISSÃO. CONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR DOS MUNICÍPIOS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
A Constituição Federal outorga à União a competência para editar normas gerais sobre licitação (art. 22, XXVII) e permite, portanto, que Estados e Municípios legislem para complementar as normas gerais e adaptá-las às suas realidades.
O Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que as normas locais sobre licitação devem observar o art. 37, XXI da Constituição, assegurando “a igualdade de condições de todos os concorrentes”. Precedentes.
Dentro da permissão constitucional para legislar sobre normas específicas em matéria de licitação (...). A proibição de contratação com o Município dos parentes, afins ou consanguíneos, do prefeito, do vice-prefeito, dos vereadores e dos ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança, bem como dos servidores e empregados públicos municipais, até seis meses após o fim do exercício das respectivas funções, é norma que evidentemente homenageia os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, prevenindo eventuais lesões ao interesse público e ao patrimônio do Município, sem restringir a competição entre os licitantes.
Inexistência de ofensa ao princípio da legalidade ou de invasão da competência da União para legislar sobre normas gerais de licitação.
Recurso extraordinário provido. A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do ministro Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 29 de maio de 2012. Ministro XXXXXXX XXXXXXX Xxxxxxx
Por fim, faz-se necessário tecer alguns comentários a respeito da Súmula Vinculante nº. 13 do Supremo Tribunal Federal, que veda o nepotismo nos Três Poderes, no âmbito da União, dos Estados e dos municípios, vejamos:
“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”
A Súmula, na prática, proíbe a contratação de parentes de autoridades e de funcionários para cargos de confiança, de comissão e de função gratificada no serviço público, veja-se que a vedação é bem específica e dirige-se aos parentes consanguíneos ou afins que sejam nomeados para exercer os cargos supracitados. Logo, não pode ter seu alcance estendido ao processo licitatório, eis que não faz nenhuma menção a contratação de serviços, obras, compras ou alienação.
DECISÃO
Diante do exposto acima, com a devida vênia ao entendimento técnico ratificado pelo ilustre representante do Ministério Público de Contas e também pelo Relator, profiro meu voto, nos seguintes termos:
Conhecer da presente consulta, uma vez que preenche os requisitos necessários para sua admissibilidade.
Responder, quanto ao mérito, que não há vedação legal que impeça participação em procedimento licitatório e posterior contratação de empresa, que possua sócio cotista, administrador ou proprietário, que detenha grau de parentesco com a pessoa do Vice Prefeito Municipal.
Entretanto, é necessário verificar se as legislações municipais, inclusive a Lei Orgânica, veiculam algum impedimento. Caso a legislação local ou a Lei Orgânica proibirem a participação de parentes de quaisquer agentes públicos, estes não poderão participar do certame ou serem contratados pelo Município.
O EXMO. SR. CONSELHEIRO EM SUBSTITUIÇÃO XXXXX XXXXXXX XX XXXXX:
1. Cuidam os presentes autos de Consulta formulada pela Sra. Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx, Prefeita Municipal de Sooretama, sobre o tema que se transcreve:
Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice-Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltando que, a figura do Vice-Prefeito Municipal não está diretamente ligada ao Poder, i.e., não exerce nenhuma ingerência político- administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?
2. Instada a manifestar-se a 8ª Controladoria Técnica, nos termos da Instrução Técnica – n. OT-C – nº 20/2012 (fls. 05/11), sugeriu o conhecimento da presente consulta, para, no mérito, respondê-la negativamente.
3. O douto Ministério Público Especial de Contas, por seu Procurador-Geral, Dr. Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx, através da MMPC 799/2012 (fls. 13), em consonância com a área técnica, pugnou no mesmo sentido.
4. Após ter proferido voto, o Eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx pediu vistas dos autos, tendo prolato do voto de vista pugnando pela possibilidade de contratação, conforme teor do mesmo acostado aos autos.
É o sucinto relatório.
C O M P L E M E N T O D E V O T O
1.0 DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE:
1.1 Verifica-se da análise do feito, como já afirmado, que estão presentes os requisitos de admissibilidade previstos no artigo 96 do Regimento Interno desta Corte de Contas, Resolução TC. 182/2002, motivo pelo qual a consulta deve ser conhecida.
2.0 DO MÉRITO DA CONSULTA:
2.1 Em data anterior, proferi voto no sentido de que a contratação de parentes de Prefeito e
Vice-Prefeito teria impedimento em nosso ordenamento jurídico pátrio, em razão do conteúdo normativo dos princípios constitucionais, sobretudo o da moralidade e o da impessoalidade.
2.2 Trouxe ao debate, naquela data, a bem lançada instrução técnica, de lavra do Sr. Xxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx, Auditor de Controle Externo, que se posicionou no sentido de que Administradores Públicos que, no momento da realização do certame, se depararem com licitantes que tenham grau de parentesco até o terceiro grau, com o Prefeito ou Vice- Prefeito, deverão desclassificá-los, sob pena de fulminar os Princípios da Moralidade e Impessoalidade que regem a Administração Pública, em razão de seu conteúdo normativo.
2.3 Registrei, também, que o Supremo Tribunal Federal sumulou referido entendimento na súmula vinculante de nº 13, relativamente às contratações para exercício de cargos comissionados e funções gratificadas, conceitos estes que deve reconhecer são inaplicáveis ao caso.
2.4 O eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx pediu vistas dos autos, tendo emitido o respectivo voto, concluindo pela possibilidade de participação em certame licitatório, bem como a respectiva contratação de parente de Prefeito e Vice-prefeito que sejam sócio- cotista, administrador ou proprietário dos respectivos gestores, por ausência de impedimento legal.
2.5 Devo parabenizar o Eminente Conselheiro por seu belíssimo voto, cuja clareza é singular, entrementes, embora conclua que não há óbice legal para a contratação, por meio de processo licitatório, de parentes de agentes políticos, em razão da ausência de impedimento legal específico, tal restrição relaciona-se aos casos previstos no dispositivo, nos termos do art. 9, incisos I, II e parágrafos da Lei 8.666/93.
2.6 Entretanto, entendo que as ações dos gestores públicos devem pautar-se sempre na busca do atendimento aos princípios norteadores da atividade administrativa e da proteção à isonomia, calcados na moralidade e na eficiência, como bem leciona Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx, em sua obra Lei de Licitações e Contratos Administrativos, verbis:
Considera-se um risco a existência de relações pessoais entre os sujeitos que definem o destino da licitação e o particular que licitará. Esse relacionamento pode, em tese, produzir distinções incompatíveis com a isonomia. A simples potencialidade do dano é suficiente para que a lei se acautele.
[...] O impedimento consiste no afastamento preventivo daquele que, por vínculos pessoais com a situação concreta, poderia obter benefício especial e incompatível com o princípio da isonomia. O impedimento abrange aqueles que, dada a situação específica em que se encontram, teriam condições (teoricamente) de frustrar a competitividade, produzindo benefícios indevidos e reprováveis para si e para terceiro. grifei e negritei
A lei de licitações, acerca do tema assim versa:
Art. 9º — Não poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários:
[...]
III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação. grifei e negritei
2.7 Ocorre que o dispositivo legal é claro quanto ao impedimento da participação de determinadas pessoas na licitação, resguardando a moralidade pública e a isonomia e, da leitura do inciso III, supra-mencionado, abstrai-se que, expressamente, restou impedido de participar da licitação o servidor ou dirigente do órgão ou entidade contratante responsável pelo certame, além de empresas cujos sócios, administradores, empregados, controladores, sejam servidores ou dirigentes dos órgãos contratantes.
2.8 Obviamente que num primeiro momento referidas contratações alcançam aquelas relativas entre prefeitos e a municipalidade e, por extensão, a sua participação em processos licitatórios, no lecionar de Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx: a simples potencialidade do dano é suficiente para que a lei se acautele.
2.9 Devo trazer à colação, o entendimento mais recente e predominante do Tribunal de Contas da União – TCU, que nos termos do Acórdão nº 607/2011 do Plenário, cujo Relator fora o Ministro substituto Xxxxx Xxxx Xxxxxxxx, assim se posicionou, literris:
[...] a irregularidade verificada no item 3.4 acima afronta os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade que devem orientar a atuação da Administração Pública e, mesmo que a Lei n. 8.666, de 1993, não possua dispositivo vedando expressamente a participação de parentes em licitações em que o servidor público atue na condição de autoridade responsável pela homologação do certame, vê-se que foi essa a intenção axiológica do legislador ao estabelecer o art. 9º dessa Lei, em especial nos §§ 3º e 4º, vedando a prática de conflito de interesse nas licitações públicas, ainda mais em casos como
o ora apreciado em que se promoveu a contratação de empresa do sobrinho do prefeito mediante convite em que apenas essa empresa compareceu ao certame. grifei e negritei
2.10 Deste modo, é dever de todo administrador demonstrar no procedimento licitatório que promoveu a maior competitividade possível, que houve a mais ampla, detalhada irrestrita demonstração de lisura.
2.11 Nessa mesma linha de entendimento, é o magistério do jurista Xxxx xxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, que afirma:
O direito condena condutas dissociadas dos valores jurídicos e morais. Por isso, mesmo quando não há disciplina legal, é vedado ao administrador conduzir-se de modo ofensivo à ética e à moral. A moralidade está associada à legalidade: se uma conduta é imoral, deve ser invalidada. grifei e negritei
2.12 Apesar de o conceito de moral ser aberto, ele pode e deve ser determinado pelo aplicador do direito, nos casos concretos, afinal a moralidade administrativa distingue-se da moral comum.
2.13 A moral administrativa é um conceito jurídico heterônomo, isto é não pode ser determinado pelo próprio agente (no caso o Prefeito e o Vice-prefeito), mas por algo externo a ele, principalmente por normas jurídicas editadas pelo Estado.
2.14 Assim, na ausência de vedação expressa, na Lei n. 8.666/93, de participação em certame licitatório de parentes de servidores ou agentes políticos, cabe ao gestor público que realiza a licitação observar atentamente os princípios norteadores da administração pública, sobretudo os da moralidade, isonomia, impessoalidade e competitividade, visando, com isso, a uma atuação administrativa voltada à satisfação do interesse primário, qual seja a supremacia do interesse público.
2.15 Desse modo, ainda que seja obrigado a concordar com o Eminente Conselheiro que pedira vistas dos autos, quanto à inexistência de vedação na lei 8.666/93, no que se refere à contratação de parentes de Prefeito e Vice-prefeito, por meio de procedimento licitatório, entendo que a hipótese não prescinde da observância aos princípios da moralidade, isonomia, impessoalidade e maior competitividade possível.
2.16 Necessário frisar que nessa espécie de contratação, o Administrador deve demonstrar cabalmente nos autos do procedimento licitatório, o atendimento aos princípios da moralidade, da impessoalidade, de modo a evitar eventuais suspeitas de favorecimento nos sobreditos certames.
Por todo o exposto, acompanhando o voto de vista do Eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no mérito respondê-la no sentido de que não estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o
terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal, devendo demonstrar que foram observados os princípios da moralidade, isonomia, impessoalidade e a maior competitividade possível no certame respectivo.
VOTO, por fim, no sentido de que seja encaminhado à consulente, cópia do voto do Relator, do Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, da Instrução Técnica nº OT-C 20/2012, emitida pela 8ª Controladoria Técnica, após, providenciadas as comunicações devidas, arquive- se os presentes autos.
É como voto.
VOTO-VISTA DO EXMO. SR. CONSELHEIRO XXXXXXX XXXXXX XXXXXX XXXXXX XXXXXXX:
I – RELATÓRIO
Com o propósito de me inteirar de forma mais completa sobre o tema tratado no processo referenciado, pedi vista em sessão plenária, o que me permitiu elaborar o voto que nesta oportunidade submeto à apreciação do Colegiado.
Inicialmente, assinalo que os presentes autos cuidam de Consulta formulada pela representante da Prefeitura Municipal de Sooretama, Srª Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx, que em razão do ordenamento jurídico, bem como da doutrina, que diz ser divergente sobre o tema, apresentou a seguinte indagação:
“Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltando que, a figura do Vice Prefeito Municipal não está diretamente ligada ao Poder, i.e., não exerce nenhuma ingerência político-administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da Chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?”
Após a regular tramitação dos processos pela área técnica (OT-C 20/12 – fls. 05/11) e pelo Ministério Público de Contas (MMPC 799/12 – fls. 13), ambos concluíram pelo conhecimento da Consulta e, no mérito, respondê-la negativamente, no sentido de que os parentes do Vice Prefeito, que detenham grau de parentesco até terceiro grau, estariam impedidos de contratar com a Administração Pública.
O Em. Relator, Conselheiro Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, proferiu o voto 239/13, tendo por base os princípios da impessoalidade e da moralidade, bem como os termos constantes da súmula vinculante nº 13 e parecer em consulta TC nº 04/2012, lavrados nos autos do processo nº 2942/2009, concluindo o que segue:
“A instrução, bem lançada, de lavra do Sr. Xxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx, Auditor de Controle Externo, caminha no sentido de que Administradores Públicos que, no momento da realização do certame, depararem-se com licitantes que tenham grau de parentesco até o terceiro grau com o Prefeito ou Vice-Prefeito deverão desclassificá-los, sob pena de fulminar os Princípios da Moralidade e Impessoalidade que regem a Administração Pública, em razão de seu conteúdo normativo.
Por todo o exposto, acompanhando o pronunciamento do douto representante do Ministério Público Especial de Contas, adoto, in totum, a manifestação da 8ª Controladoria Técnica e VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no mérito respondê-la no sentido de que estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal.”
Após, o Eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx pediu vistas dos autos, tendo prolatado voto de vista nº 348/13, pugnando pela possibilidade de contratação, conforme teor do mesmo acostado aos autos:
“Responder, quanto ao mérito, que não há vedação legal que impeça participação em procedimento licitatório e posterior contratação de empresa, que possua sócio cotista, administrador ou proprietário, que detenha grau de parentesco com a pessoa do Vice Prefeito Municipal.
Entretanto, é necessário verificar se as legislações municipais, inclusive a Lei Orgânica, veiculam algum impedimento. Caso a legislação local ou a Lei Orgânica proibirem a participação de parentes de quaisquer agentes públicos, estes não poderão participar do certame ou serem contratados pelo Município.”
Por fim, vieram aos autos o Conselheiro Relator Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, através do voto nº 362/13, que acompanhando o voto de vista do Eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, externou o seu entendimento sobre a matéria da seguinte forma:
“VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no mérito respondê-la no sentido de que não estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal, devendo demonstrar que foram observados os princípios da moralidade, isonomia, impessoalidade e a maior competitividade possível no certame respectivo. “
É o relatório. Passo à análise.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Considerando que o tema ora tratado ‘parentesco nas licitações públicas’ é recorrente em nosso país, realizei pesquisa, na qual constatei a existência de duas correntes contrapostas sobre a matéria, tanto em decisões judiciais e administrativas, como na doutrina posta.
A primeira corrente permite a participação de parentes no processo licitatório, entendendo que não se pode ampliar o rol de pessoas impedidas de participar, constante do art. 9º, § 3º, da Lei 8.666/93, e a outra, entendendo que tal participação fere princípios constitucionais, principalmente o da impessoalidade e da moralidade, veda a participação de parentes nas licitações, inviabilizando, esta última, por vezes, a contratação local, principalmente nos municípios menores, em que é difícil um determinado fornecedor local não ter relação de parentesco com algum dirigente do órgão licitante.
Nesse sentido, me foi apresentado um trabalho científico apresentado ao Instituto Espiritossantense de Educação – IESES, como requisito para obtenção do título de Especialista em Direito Administrativo, de autoria do Auditor de Controle Externo, Sr. Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx, cujos termos pedimos permissa para aproveitar:
“4 ENTENDIMENTO DE ALGUMAS CORTES DE CONTAS
(...) Os Tribunais de Contas de Santa Catarina e do Paraná, conforme citação 159 da obra de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx (2009, p. 56) permitem a participação de parentes, como deixa claro o trecho abaixo transcrito:
“O art. 9°, II, da Lei n° 8.666/93, não veda a participação em processo licitatório de parente de servidor ou dirigente lotado no órgão ou entidade contratante. Os vícios constatados no competitório podem ensejar a sua invalidação por duas vias: pelos recursos inerentes à licitação, ou pela ação popular, quando afrontados os princípios esculpidos no art. 37, caput, da Constituição Federal, princípios estes que não obstam a participação de parentes de servidores em licitação promovida pelo órgão ou entidade onde esteja lotado (TC/SC – Processo n° 17.546/37-93). O TC/PR entendeu possível a participação de livraria de propriedade do irmão do prefeito, em licitação para aquisição de materiais de escritório (Resolução n° 4.492/94)”
O Tribunal de Contas de Minas Gerais (Brasil, TCEMG) não veda a participação de parentes nos processos licitatórios, fazendo, entretanto, ressalvas, recomendações que entendemos pertinentes, e que na verdade deveriam ser seguidas em todos os casos, pois que inerentes à Administração Pública. Assim se encerra a manifestação da referida Corte:
“ (...) Por todo o exposto, concluiu que, embora seja possível, em tese, a contratação de parentes próximos de servidores ou agentes políticos, por meio da participação em procedimento licitatório, a hipótese não prescinde da observância dos princípios da moralidade, isonomia, impessoalidade e da maior competitividade possível, sendo recomendável que, nessa espécie de contratação, o gestor demonstre, nos autos do procedimento licitatório, de forma consistente, que foram respeitados os aludidos princípios, de modo a se afastarem possíveis questionamentos sobre a ocorrência de influências nocivas na condução dos certames. O parecer foi aprovado por unanimidade (Consulta n. 862.735, Rel. Cons. Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, 18.04.12).
5 POSICIONAMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL
(...)
Por sua vez, Xxxx Xxxxxxx Xxxxx (2008), em estudo específico, é enfático ao concluir:
“O art.9º, da Lei 8.666/1993 lista, taxativamente, o rol de hipóteses, com base numa ordem numerus clausus, pelas quais pessoas físicas ou jurídicas encontram-se impedidas de participarem, direta ou indiretamente, de licitações, nos termos ali previstos. Neste particular, só o Poder Legislativo, e mais ninguém, poderá regular a matéria, sob pena de ofensa direta ao disposto no art.22, XXVII, do Texto Magno. Assim, presentes os pressupostos lógico – pluralidade de objetos e de ofertantes; jurídico – atendimento ao
interesse público; e fático– presença de vários interessados em disputar o certame, nada poderá invalidar, do ponto de vista jurídico, a licitude e a legitimidade do certame licitatório. O contrário disso seria empreender interpretação inconstitucional de leis constitucionais”.
Neste contexto, incluir parente da autoridade competente, responsável pela homologação da licitação pregão, dentre a vedação contida no inc. III, do art. 9º, da Lei nº 8.666/93, estaria o exegeta interpretando extensivamente o dispositivo, quando sua matéria exige interpretação estrita, conforme sustenta Xxxxxx Xxxxx (1999, p. 134):
Nada mais errôneo, pois, pela própria Lei, o conceito de participação indireta nos é dado pelo § 3º do art. 9º, e ali, as relações abrangidas recaem sobre o autor do projeto e a empresa licitante. Não se pode, portanto, dar outra abrangência ao § 3º e ao conceito de participação indireta, posto que, sendo o art. 9º norma vedativa, não pode contemplar senão interpretação estritíssima. Abrange também, e só, o membro da Comissão (§ 4º).
(...)
6 DECISÕES DE CORTES SUPERIORES
Assim, defendendo a linha de pensamento à qual nos filiamos, entendemos que qualquer interpretação que restrinja a participação de interessados ao processo licitatório, em hipótese não prevista em lei, restará exacerbada, pois afronta o princípio da legalidade, consagrado no inciso II, art. 5º, da Constituição Federal do Brasil: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
Se a Lei 8.666/93 diz quais são as pessoas impedidas de participar dos certames licitatórios, somente o legislador pode alterar essa relação.
Nessa linha, importante a decisão da Segunda Turma do STF - Supremo Tribunal Federal (Brasil, STF), que, por votação unânime, declarou a constitucionalidade do artigo 36 da Lei Orgânica do Município de Brumadinho (MG), que proíbe contratos entre o município e parentes, afins ou consanguíneos, dos agentes políticos locais e dos ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança, bem como dos servidores e empregados públicos municipais, até seis meses após o fim do exercício das respectivas funções.
Essa decisão entendemos como de grande importância para o deslinde da matéria, razão pela qual vamos dela tratar em maior profundidade.
Essa decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 423560, relatado pelo Ministro Xxxxxxx Xxxxxxx. O recurso foi interposto pela Câmara Municipal de Brumadinho contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG), que havia decidido ser inconstitucional lei municipal que imponha restrições a parentes de prefeito, vice-prefeito e vereadores de contratar com o município, além daquelas previstas nos artigos 22, inciso XXVII e 37, inciso XXI, da CF, regulamentado pela Lei 8.666/93.
Por seu turno, a Câmara de Vereadores de Brumadinho sustenta que estabeleceu normas complementares à Constituição Federal, que se coadunam com o princípio da moralidade administrativa, consagrado no artigo 37, caput (cabeça), da Constituição Federal (CF). Alega ter agido dentro dos limites estabelecidos, para tal, pelos artigos 30, inciso II, da CF, e 171, inciso II, da Constituição do Estado de Minas Gerais, que permitem aos municípios legislarem complementarmente às Cartas federal e estadual.
Assim, segundo aquela Câmara, o dispositivo impugnado pelo PMDB apenas estabeleceu norma de interesse local, adaptada à realidade do município, sem ofender o dispositivo constitucional que atribui à União competência privativa para estabelecer normas gerais. Decisão. Ao decidir, a Turma acompanhou o voto do relator, ministro Xxxxxxx Xxxxxxx, que concordou com o argumento de que a Câmara de Vereadores somente exerceu o seu direito de legislar complementarmente à Constituição Federal e à do Estado de Minas Gerais.
Ele admitiu que a Lei 8.666/93, que regulamentou o artigo 37, inciso XXI, da CF, estabeleceu uma série de impedimentos à participação em licitações, mas não vedou a participação de servidores, administradores ou seus parentes em tais eventos. Segundo ele, existem doutrinadores que admitem essa participação, com base no princípio da legalidade. O ministro Xxxxxxx Xxxxxxx disse, no entanto, que o artigo 30, inciso II, da CF, abre espaço para os municípios legislarem sobre o tema, como o fez a Câmara de Vereadores de Brumadinho, até que sobrevenha nova norma geral sobre o assunto.
Com base nessa decisão do STF, verificamos ser possível o impedimento da participação de parentes em processos licitatórios, desde que aja lei local com tal dispositivo. Ou seja, é possível a vedação de participação de parentes em licitações, desde que haja lei local assim normatizando.
(...)
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Objeto constante de questionamentos judiciais, a relação de parentesco como fator de impedimento de participação nas licitações públicas é tema que merece mais atenção dos estudiosos em direito.
E o problema não se encerra com a questão legal. A decisão do STF anteriormente vista é parte da solução. Quando se suscita a questão de proibição de participação de parentes em licitações, não há que se falar tão somente em atentado aos princípios constitucionais explícitos da administração pública, mas deve haver consulta também aos da razoabilidade, da economicidade, da dignidade da pessoa humana, da liberdade de trabalho, da livre iniciativa e da função social da empresa.
Será razoável impedir a participação de alguém em uma licitação sob o único argumento do parentesco? Considerar, de antemão, o parentesco como atestado de má conduta não seria uma presunção contrária à Constituição Federal, onde está escrito que todos são honestos até prova em contrário?
Sobre a presunção vejamos o que diz a respeito o processualista Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx (2005, p. 113):
Presunção é um processo racional do intelecto, pelo qual do conhecimento de um fato infere-se com razoável probabilidade a existência de outro ou o estado de uma pessoa ou coisa.
Se uma proposta de um parente tiver um preço melhor, e for afastada da disputa somente em razão do parentesco, não estará desrespeitado o princípio da economicidade?
Decidir, sob o argumento de que o parentesco, por si só, é motivo ensejador de favorecimentos, sem qualquer comprovação insuscetível de dúvidas, não atenta contra o princípio constitucional da dignidade humana?
É claro que ao ser constatado o parentesco no processo licitatório, a administração pública deve ficar mais atenta a eventuais favorecimentos indevidos. No entanto, ela não pode lançar inverdades a qualquer pessoa que seja sem provar que aquela relação pode motivar um favorecimento ilícito, sob o risco de ofender o princípio constitucional da dignidade humana.
Ocorre que a partir do momento que a empresa venceu por apresentar a proposta mais vantajosa para a Administração, não pode ser impedida de contratar com esta sem que haja o fundamentado receio de fraude à licitação. Trata-se de apologia à boa-fé, ao passo que a má-fé deve ser devidamente comprovada para que não se dê ensejo a injustiças.
A intenção aqui não é defender o parentesco nos certames licitatórios. Pelo contrário, é deixar claro que a administração pública deve se ater ao que é melhor para a sociedade. Desta forma, não havendo provas de que um parente de servidor da entidade promotora da licitação está sendo favorecido e tendo em vista sua proposta mais vantajosa para a administração e administrados, não há que se falar em fraude.
O favorecimento se configura mediante provas substanciais. Portanto, a inexistência de motivos concretos que justifiquem o impedimento e a apresentação de uma proposta que venha a ser a melhor aos olhos inclusive da sociedade não têm o cunho de imputar à pessoa jurídica ou física a pecha da fraude por aquela possuir um parente no órgão licitante.
A ação dos gestores públicos deve pautar-se sempre pela busca do atendimento aos princípios insculpidos na Constituição, mormente os que regem a Administração Pública. E, como ensina Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx (2004, p. 842):
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos.
Não podemos, com base apenas na presunção, impedir a participação de alguém em um certame, pois essa decisão poderá estar prejudicando alguém de boa fé, e até mesmo a própria administração.
(...)
Neste contexto, outra não haverá de ser a conclusão do caso sob análise, senão de que há possibilidade da Administração Pública contratar parentes do Vice-Prefeito, através de regular procedimento licitatório, cabendo a recomendação aos gestores que promovam a demonstração cuidadosa e consistente, por meio de documentos e fundamentos técnicos, de que conferiram ao certame a maior competitividade possível.
Assim, ratifico integralmente o entendimento extraído do voto de vista e do voto do Relator Originário, no sentido da possibilidade de participar da licitação e de contratar com a Administração Pública, parentes até o terceiro grau do Vice-Prefeito Municipal, já que indiscutivelmente a licitação é um procedimento no qual está implícita a obediência aos princípios norteadores da Administração Pública, em especial, o da impessoalidade e o da moralidade. Nesse aspecto específico, acompanho o voto por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Há de se atentar, ainda, para que sejam também respeitados os demais princípios tratados no artigo científico acima disposto, como o da economicidadede, da dignidade da pessoa humana, da liberdade de trabalho, da livre iniciativa e da função social da empresa, de modo a evitar eventuais suspeitas nos certames, excluindo possíveis questionamentos de nulidade e, reflexamente, prejuízo a Administração Pública envolvida, resguardando, ainda, a imagem dos dirigentes.
III - CONCLUSÃO
Diante do exposto, acompanhando o voto de vista do Eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, encampado pelo Eminente Conselheiro Relator Xxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxx, VOTO pelo CONHECIMENTO da presente consulta, para, no MÉRITO respondê-la no sentido de que não estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal, devendo, contudo, a demonstração de observância aos princípios da moralidade, isonomia e impessoalidade, bem como da ampla concorrência, consoante a própria legislação exige.
Encaminhe cópia à consulente dos votos de nºs. 348/13 e 362/13, da lavra dos Eminentes Conselheiros Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, respectivamente.
VOTO-VISTA DO EXMO. SR. CONSELHEIRO XXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX XXXXX:
1. Tratam os autos de consulta formulada pela Prefeitura Municipal de Sooretama com a seguinte indagação, verbis:
Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltado que, a figura do Vice Prefeito Municipal, não está diretamente ligado ao Poder, e, não exerce nenhuma ingerência político-administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?
Justificativa: A L. 8.666/93 e posteriores alterações, não elencam taxativamente esta condição e, a doutrina é divergente, quando em casos desta jaez, fazendo-se necessário a presente consulta, para que se firma o entendimento desta Casa.
2. Manifestou-se a 8ª Controladoria Técnica através da Instrução OT-C 20/2012, da lavra da Auditora Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, que assim concluiu, verbis:
Eventual participante de procedimento licitatório, que detenha grau de parentesco até terceiro grau, com a pessoa do Vice Prefeito Municipal, após o cumprimento das fases procedimentais, está impedido de contratar com o Poder Público em razão do parentesco, ressaltado que, a figura do Vice Prefeito Municipal, não está diretamente
ligado ao Poder, e, não exerce nenhuma ingerência político-administrativa na administração, estando resumido apenas à eventual substituição ao Prefeito, no exercício da chefia do Poder Executivo, nos casos que elenca a LOM?
Justificativa: A L. 8.666/93 e posteriores alterações, não elencam taxativamente esta condição e, a doutrina é divergente, quando em casos desta jaez, fazendo-se necessário a presente consulta, para que se firma o entendimento desta Casa.
3. O Ministério Público de Contas, na manifestação MMPC 799/2012, da lavra mdo Procurador Dr. Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx, acompanhou o posicionamento da Área Técnica.
4. Em seu voto, o Eminente Relator, Conselheiro Substituto Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx aqconpanhou o posicionamento da Área Técnica e do Paqrquet de Contas, votando pelo conhecimento da consulta e no mérito, para respondê-la no sentido de que estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito Municipal.
5. Em voto de vistas, o não menos eminente Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, conheceu da consulta e, no mérito, entendeu que não há vedação legal que impeça participação em procedimento licitatório e posterior contratação de empresa, que possua sócio cotista, administrador ou proprietário, que detenha grau de parentesco com a pessoa do Vice Prefeito Municipal.
Ressaltou, o ilustre Conselheiro que é necessário verificar se as legislações municipais, inclusive a Lei Orgânica, veiculam algum impedimento. Caso a legislação local ou a Lei Orgânica proibirem a participação de parentes de quaisquer agentes públicos, estes não poderão participar do certame ou serem contratados pelo Município.
6. O Conselheiro Relator, Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, proferiu novo voto, complementando o anterior, acolhendo o voto do Conselheiro Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, respondendo a consulta no sentido de que não estão impedidos de participar de processo licitatório e de contratar com a Administração Pública, qualquer pessoa que tenha parentesco até o terceiro grau com o Vice-Prefeito
Municipal, devendo demonstrar que foram observados os princípios da moralidade, isonomia, impessoalidade e a maior competitividade possível no certame respectivo.
7. Em voto de vistas, o também Eminente Conselheiro Xxxxxxx Xxxxxxx ratificou integralmente o entendimento extraído do voto de vista e do voto do Relator Originário, no sentido da possibilidade de participar da licitação e de contratar com a Administração Pública, parentes até o terceiro grau do Vice-Prefeito Municipal, já que indiscutivelmente a licitação é um procedimento no qual está implícita a obediência aos princípios norteadores da Administração Pública, em especial, o da impessoalidade e o da moralidade. Nesse aspecto específico, acompanho o voto por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Registrou ainda o Ilustre Conselheiro que, verbis: Há de se atentar, ainda, para que sejam também respeitados os demais princípios tratados no artigo científico acima disposto, como o da economicidadede, da dignidade da pessoa humana, da liberdade de trabalho, da livre iniciativa e da função social da empresa, de modo a evitar eventuais suspeitas nos certames, excluindo possíveis questionamentos de nulidade e, reflexamente, prejuízo a Administração Pública envolvida, resguardando, ainda, a imagem dos dirigentes.
É o relatório.
EMENTA: CONSULTA. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. GRAU DE PARENTESCO. IMPEDIMENTO DE CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO. VOTO DE VISTA. ACOMPANHAMENTO RELATOR E VOTOS CONS. XXXXXXXX XXXXXXX E XXXXXXX XXXXXXX.
V O T O
1. Solicitei vistas deste processo para melhor conhecimento da questio aqui analisada.
2. Entendo que os Conselheiros Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx, elaboraram votos brilhantes, esgotando o assunto, em razão do que, acompanho integralmente seus posicionamentos, pelos seus jurídicos fundamentos.
Também entendo que deverá ser enviado à consulente cópia dos votos elaborados pelos Eminentes Conselheiros Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx.
É como VOTO.
Composição Plenária
Presentes à sessão plenária da deliberação os Senhores Conselheiros Xxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxx, Presidente, Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, Relator, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx e o Conselheiro em substituição Xxxxxxx Xxxxx. Presente, ainda, o Dr. Xxxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxx, Procurador Especial de Contas em substituição ao Procurador-Geral do Ministério Público Especial de Contas.
Sala das Sessões, 11 de abril de 2013.
CONSELHEIRO XXXXXXXXX XXXXXX XXXXX XX XXXXXX
Presidente
CONSELHEIRO XXXXX XXXXXXX XX XXXXX
Relator
CONSELHEIRO XXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX XXXXX
CONSELHEIRO XXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX
CONSELHEIRO XXXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX
CONSELHEIRO XXXXXXX XXXXXX XXXXXX XXXXXX XXXXXXX
CONSELHEIRO XXXXXXX XXXXX
Em substituição
Fui presente:
DR. XXXXX XXXXXX XXXXX XX XXXXXXXX
Procurador Especial de Contas em substituição ao Procurador-Geral
Lido na sessão do dia:
XXXXXXX XXXXX XXXXXXX XXXXXX
Secretário-Geral das Sessões