Ref.: Projeto de Lei nº 382/2019
São Paulo, 28 de junho de 2021.
Ref.: Projeto de Lei nº 382/2019
A Federação Brasileira de Bancos - FEBRABAN, entidade representativa das instituições bancárias com estabelecimentos instalados no Estado do Amazonas, vem perante V.Exa. manifestar-se sobre os Projetos de Lei nº 382/2019, de autoria do Deputado Xxxx Xxxx (PRB), que dispõe “Proíbe as instituições financeiras de ofertar e celebrar contrato de empréstimo financeiro com aposentados e pensionistas por meio de ligação telefônica.”.
Após análise detalhada do teor da citada proposição, encaminhamos a presente Nota Técnica, para apreciação e consideração de V.Exa., manifestando o entendimento desta Federação quanto às imperfeições jurídicas e inconvenientes que certamente advirão da aplicação da norma, se aprovada.
Em síntese, entendemos que o projeto:
• O Poder Executivo Federal, aconselhado pelo Ministério da Economia juntamente com o Banco Central do Brasil, decidiu pelo veto parcial dos artigos 124-E e 124- F integrantes do Projeto de Lei de Conversão n° 11/2019, relativo a MP n° 871/2019, que, em suma, vedavam o oferecimento e contratação de empréstimos consignados por aposentados e pensionistas.
• O XX 000/00, da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, de mesmo teor, foi considerado inconstitucional e vetado integralmente pelo Poder Executivo local.
• É discriminatório ao considerar que os idosos não possuem discernimento para efetuar a contratação de crédito por telefone e avaliar a real necessidade e impacto de seus atos.
• Colide com o disposto no Estatuto do Idoso, que proíbe que o idoso seja objeto de qualquer tipo de discriminação ou opressão.
• Viola o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) que estabelece mecanismos de proteção contratual ao consumidor, aplicáveis também aos empréstimos firmados por idosos.
• Ao restringir as formas de contratação, trará enorme desconforto a milhares de pessoas que atualmente utilizam o telefone para realizar suas operações, bem como, impactará diretamente no fluxo de pessoas atendidas diariamente pelas agências, com o aumento das filas para atendimento.
• Contraria a Instrução Normativa do INSS nº 100/18, que permite a concessão de empréstimos aos aposentados e pensionistas, inclusive por meio telefônico, porém coloca um prazo mínimo de carência para a contratação desse crédito.
• Desta forma, não é razoável que apenas no Estado do Amazonas os idosos não possam realizar a contratação de empréstimos por meio do telefone.
Certos de que os interesses do Poder Público e das Instituições Financeiras no processo de melhoria contínua da prestação de serviços aos cidadãos são convergentes, agradecemos antecipadamente a compreensão e atendimento às nossas considerações.
Nota Técnica Projetos de Lei nº 382/2019
Assembleia Legislativa do Amazonas
A FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos), principal entidade representativa do setor bancário brasileiro, é uma associação sem fins lucrativos que tem o compromisso de fortalecer o sistema financeiro e suas relações com a sociedade e contribuir para o desenvolvimento econômico, social e sustentável do País.
O quadro associativo da entidade conta com 119 (cento e dezenove) instituições financeiras associadas de um universo de 155 (cento e cinquenta e cinco) em operação no Brasil, as quais representam 98% (noventa e oito por cento) dos ativos totais e 97% (noventa e sete por cento) do patrimônio líquido das instituições bancárias brasileiras. A FEBRABAN não realiza operações financeiras de qualquer natureza, ou seja, não faz empréstimos, financiamentos, transferências de valores, aplicações, captação de recursos de investimentos ou recebe depósitos de poupança, para pessoas físicas ou jurídicas.
O objetivo da Federação é representar seus associados em todas as esferas do governo
– Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e entidades representativas da sociedade, para o aperfeiçoamento do sistema normativo, a melhoria continuada dos serviços e a redução dos níveis de risco. Também busca concentrar esforços que favoreçam o crescente acesso da população aos produtos e serviços financeiros.
Texto do Projeto
Art. 1° É vedado as Instituições Financeiras ofertar e celebrar contrato de empréstimos de qualquer natureza, com aposentados e pensionistas, por ligação telefônica no Estado do Amazonas.
Art. 2° Em caso de descumprimento a instituição financeira será multada no valor de 5.000 (cinco mil reais), cobrada em dobro no caso de reincidência até o limite de R$ 5O.0OO,O0 (cinquenta mil reais).
Parágrafo único. A multa será revertida para o Fundo Estadual de Defesa do Consumidor, criado pela Lei ne 2.228, de 29 de junho de L994.
Art. 3° O Poder Executivo regulamentará a presente lei no que couber.
Art.4° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
I – Do lançamento da Autorregulação Bancária para o Crédito Consignado
Objetivando o aperfeiçoamento no atendimento aos clientes na oferta de crédito consignado no país, a FEBRABAN - Federação Brasileira de Bancos e a ABBC - Associação Brasileira de Bancos anunciariam, no dia 24.09.19, a criação do Sistema de Autorregulação de Operações de Empréstimo Pessoal e Cartão de Crédito com Pagamento Mediante Consignação, já em vigor desde 02 de janeiro de 2020, atualmente, mais de 1 milhão pessoas inscritas.
Até o momento, vinte e três instituições e conglomerados que ofertam o produto aderiram à Autorregulação. Juntas, as instituições, nas quais estão inclusos os maiores bancos do país, representam 97,88% do volume da carteira de crédito consignado de bancos em todo território nacional.
Batizado de Autorregulação do Crédito Consignado, o sistema fortalece os princípios bancários de bom atendimento aos clientes, e tem três objetivos principais:
1) Criar um sistema de bloqueio de ligações à disposição dos consumidores que não queiram receber ofertas de crédito consignado;
2) Formar uma base de dados para monitorar reclamações sobre oferta inadequada
do produto;
3) Estabelecer medidas voltadas à transparência, ao combate ao assédio comercial e à qualificação de correspondentes.
A adesão à Autorregulação do Crédito Consignado foi voluntária e é acompanhada de compromissos voltados ao aperfeiçoamento da oferta do produto. A lista dos bancos participantes foi apresentada ao Banco Central, à Secretaria Nacional do Consumidor e ao Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS).
Acerca do Sistema de Bloqueio de Ligações, a FEBRABAN e a ABBC trabalharam juntas no desenvolvimento de um programa nos moldes do “Não Perturbe”, já usado por órgãos de defesa do consumidor, voltado para a oferta de crédito consignado ao cliente bancário.
Assim, uma vez realizado o cadastro do telefone fixo ou móvel no “Não Perturbe”, tanto os bancos, quanto os correspondentes por eles contratados, não podem fazer qualquer oferta de operação de crédito consignado, 30 dias após a inclusão neste sistema. A ferramenta, está em pleno funcionamento desde 02 de janeiro de 2020.
Outra importante medida da Autorregulação para coibir o assédio por meio de ofertas abusivas ao consumidor diz respeito à portabilidade de operações de crédito consignado. Os bancos participantes se comprometem a não remunerar seus correspondentes pela portabilidade da operação de crédito consignado ou pelo refinanciamento dela antes de 360 dias, contados da data do negócio. Atualmente, o correspondente é remunerado a cada operação transferida de um banco a outro, independentemente do prazo.
Os participantes da Autorregulação devem enviar aos consumidores, com os quais celebram as concessões de crédito consignado, informações básicas relacionadas à operação, como identificação da instituição financeira contratante; data e número do contrato; canais de relacionamento da instituição financeira; valor do empréstimo contratado pelo consumidor; e quantidade e valor de parcelas. As informações devem ser enviadas em até 5 dias contados da data de liberação do crédito ao cliente.
A Autorregulação do Crédito Consignado ainda prevê a realização de avaliação dos correspondentes, com três itens que são apurados.
No primeiro, são consideradas reclamações feitas aos canais internos dos bancos, à plataforma xxxxxxxxxx.xxx.xx, e reclamações registradas no Banco Central e nos
Procons. Essa análise levará em conta o número de reclamações em relação ao volume da carteira de empréstimos.
No segundo, são consideradas as ações judiciais decorrentes da atuação dos correspondentes. As áreas de compliance dos bancos participantes se responsabilizam pelo envio das informações, que deve ocorrer até o dia 25 do mês subsequente ao mês base.
Por fim, no terceiro item é considerada uma avaliação feita por uma consultoria independente, contratada pelos bancos, que leva em conta questões de governança e gestão de dados.
Os três itens juntos são monitorados pelo Setor e podem gerar aplicação de medidas administrativas, que preveem advertência, suspensão de contratação de novas operações por até 30 dias, e ainda a suspensão definitiva de contratação de novas operações pelos correspondentes que não se adequarem às regras.
Recentemente, a autorregulação da FEBRABAN puniu 48 correspondentes bancários no mês de abril devido a reclamações de clientes que tiveram problemas na oferta do crédito consignado. Inclusive, 3 deles tiveram as autorizações para atuar em nome dos bancos suspensas definitivamente.
Em janeiro e março, já haviam sido aplicadas punições, 52 e 54, respectivamente. O aumento de sanções demonstra o resultado do maior rigor no monitoramento da atuação dos correspondentes bancários na oferta do consignado. Assim, até o momento, 219 correspondentes foram advertidos e 196 tiveram suas atividades suspensas temporariamente. Nos casos de reincidência os agentes tiveram suas atividades suspensas de 5 a 30 dias. Além disso, 21 tiveram sua atuação interrompida permanentemente.
Desta forma, os bancos podem receber penalidades por conduta omissiva, caso não apliquem medidas previstas na Autorregulação por infrações cometidas pelos correspondentes. As multas variam de R$ 45 mil até R$ 1 milhão, e levarão em conta a gravidade da infração e o porte da instituição financeira participante. Os valores arrecadados serão destinados a projetos de educação financeira.
II – Do veto parcial ao Projeto de Lei de Conversão 11/19 (MP nº 871/2019)
Antes de adentramos nas questões técnico-jurídicas que inviabilizam os PL’s em referência, cumpre destacar que o Poder Executivo Federal, aconselhado pelo Ministério da Economia juntamente com o Banco Central do Brasil, decidiu pelo veto parcial dos artigos 124-E e 124-F integrantes do Projeto de Lei de Conversão n° 11/2019, relativo a MP n° 871/2019, que previam:
“Art. 124-E. É vedada a transmissão de informações de benefícios e de informações pessoais, trabalhistas e financeiras de segurados e beneficiários do INSS a qualquer pessoa física ou jurídica, diretamente ou por meio de interposta pessoa, física ou jurídica, para a prática de qualquer atividade de marketing, oferta comercial, proposta, publicidade direcionada a beneficiário específico ou qualquer tipo de
atividade tendente a convencer o beneficiário do
INSS a celebrar contratos e obter captação de clientela.”
“Art. 124-F. É vedada às instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil que mantenham Convênios ou Acordos de Cooperação Técnica com o INSS, diretamente ou por meio de interposta pessoa, física ou jurídica, qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial, proposta, publicidade direcionada a beneficiário específico ou qualquer tipo de atividade tendente a convencer o beneficiário do INSS a celebrar contratos de empréstimo pessoal e cartão de crédito.”
Entendeu o Executivo que o art. 000-X xxxxxxxxx sobre “matéria já disciplinada pela Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, que dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais da liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da pessoa natural.”
Entretanto é importante frisar que o entendimento relativo à intenção presente em ambos os artigos no sentido de inviabilizar a prática de qualquer atividade de marketing, oferta comercial, proposta, publicidade ou celebração de contratos de empréstimo, foi que tal vedação causaria um desequilíbrio concorrencial no mercado e ofensa ao princípio da livre iniciativa presente no art. 170 da Constituição Federal:
“A propositura legislativa, ao impedir a realização de oferta de qualquer tipo de crédito pessoal por parte das instituições conveniadas ao INSS, tem o potencial de estimular a divulgação de produtos por instituições não conveniadas, causando um desequilíbrio concorrencial no mercado em ofensa ao princípio da livre iniciativa com espeque no art. 170 da Constituição da República.”
No dia 24.09.19, os vetos foram apreciados em sessão plenária do Congresso Nacional, sendo ambos os vetos mantidos pelos parlamentares. Assim, é notório que existe compreensão em âmbito federal de que a intenção de proibir o oferecimento de empréstimos consignados interfere diretamente na atividade empresária, violando o princípio constitucional da livre iniciativa, além de causar desequilíbrio no mercado, motivo pelo qual os artigos foram revogados.
III – Do veto integral aos PL’s 117/2019 e 699/15, semelhantes ao PL ora analisados.
Tramitou na Assembleia Legislativa do Espírito Santo o XX 000/0000, de autoria do Dep. Doutor Xxxxxxxx e de mesmo teor, que: “Proíbe as instituições financeiras do Estado a ofertar e celebrar contrato de empréstimo financeiro com aposentados e pensionistas por meio de ligação telefônica”.
O PL, na oportunidade, foi integralmente vetado (06.05.19) pelo Exmo. Sr.
Governador Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxxxx, que assim entendeu:
“(...) No presente caso, ao proibir as instituições financeiras do Estado ofertar e celebrar contrato de empréstimo de qualquer natureza com aposentados e pensionistas por meio de ligação telefônica, o legislador estadual excedeu a competência que lhe cabia, gravando o Autógrafo de Lei em vício de inconstitucionalidade.
A proposta, ao estabelecer tal regramento, distancia-se das disposições previstas na Lei Federal, de modo que incorre em substituição e não em suplementação. Na verdade, extrapola a autorização constitucional voltada ao preenchimento de lacunas acaso verificadas na legislação federal.
Não há a tentativa estadual de suplementar as normas já existentes. Ao contrário, o legislador estadual pretende definir nova disciplina global sobre o tema, proibindo as instituições financeiras do Estado ofertar e celebrar contrato de empréstimo de qualquer natureza com aposentados e pensionistas por meio de ligação telefônica, previsão esta não existente na Lei Federal n. 8.078/1990, que instituiu o Código de Proteção e Defesa do Consumidor.
(...)
Em outras palavras, a matéria objeto das normas veiculadas pelo Autógrafo de Lei em estudo i) demanda um tratamento geral e uniforme, por ser de interesse nacional; ii) não configura mero desdobramento de disciplina contida em um regramento geral preexistente; e iii) não têm nenhuma conexão com as peculiaridades locais do Estado federado.
(...)
Segundo porque o Autógrafo em epígrafe proíbe a oferta e celebração de contrato de empréstimo de qualquer natureza com aposentados e pensionistas por meio de ligação telefônica, criando, logicamente, o direito de os consumidores e dos órgãos estaduais de defesa do consumidor exigirem desses "fornecedores" o cumprimento dessa conduta. Ocorre que as operações de empréstimo por meio de ligação telefônica não ocorrem dentro de um quadro estático, onde os fornecedores e os consumidores situam-se dentro do território de um mesmo Estado. Ao contrário. As instituições financeiras estão situadas em outros Estados. Nessa situação, os consumidores capixabas continuam a ter o direito de exigir o cumprimento do dever em tela, mas agora em face de empresas situadas fora dos limites do Estado do Espírito Santo (que não deveriam ser os destinatários do dever). Situação essa que demonstra, claramente, que o âmbito de incidência territorial da norma em análise extravasa as fronteiras do nosso Estado, alcançando todo o território nacional.
(...)
Desse modo, por qualquer ângulo que se analise a questão, o Estado do Espírito Santo não deve extrapolar sua competência legislativa concorrente e propor lei estadual, que regulamenta matéria que não preenche qualquer lacuna ou especifica a aplicação da norma geral as peculiaridades locais do Estado.
(...)
Logo, o Autógrafo de Lei acaba por se imiscuir no âmbito de competência concorrente da União para legislar sobre consumo e defesa do consumidor, conforme dispõe o inciso V do art. 24 da Constituição Federal.
Destarte, ao editar norma que interfere na competência legislativa da União, o Legislativo Estadual viola o princípio constitucional do Pacto Federativo, previsto no art. 18 da CF/88, sendo o Autógrafo de Lei n. 22/2019 inconstitucional". (...)”
No mesmo sentido, recentemente, Projeto de lei, também com conteúdo semelhante ao ora analisado, foi vetado integralmente no Estado do Rio de Janeiro e este veto foi mantido pela Assembleia Legislativa, sendo o projeto arquivado em definitivo.
O XX 000/0000, de autoria do Dep. Xxxxx Xxxxxxxx (PMDB), buscava vedar às instituições financeiras a formalização de empréstimos financeiros com os idosos nos terminais de autoatendimento.
Ao vetar o projeto, o Governador que é de competência privativa da União legislar sobre matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações e serviços. Afirma ainda que a regulação das instituições financeiras pela União impede que cada ente Federativo fixe regras completamente distintas.
Além disso, aduz que a pessoa maior de 60 anos, de forma geral, é plenamente capaz de responder por seus atos e conclui que “o projeto vai na contramão das discussões atuais”. Cita também o Código de Defesa do Consumidor que estipula condições que resguardam os direitos dos consumidores, sem distinção de idade.
Deste modo, entendeu o Governador que, se o PL fosse aprovado, a medida seria discriminatória em relação aos idosos e certamente prejudicaria parcela da população por restringir as formas de contratação impactando diretamente no fluxo de pessoas atendidas pelas agências.
Assim, diante do exposto, seguindo o entendimento do Executivo dos Estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro, deve o PL ser rejeitado por possuir teor semelhante ao dos PL’s 117/19 e 699/15.
IV - Da contrariedade ao interesse público.
Muito embora o objetivo dos PL seja o de proteger os idosos de uma suposta fragilidade e ingenuidade para a prática de determinadas condutas, como a contratação de
empréstimos por telefone, a proposição acaba por ser discriminatória ao considerar que tais pessoas não possuem discernimento para avaliar a real necessidade e impacto de seus atos.
Note-se que a pessoa maior de 60 anos é plenamente capaz para os atos da vida civil. Afirmar, apenas por um critério etário, que a pessoa perderia sua capacidade de tomar decisões viola frontalmente a Constituição Federal, em especial o artigo 3º, IV, que proíbe qualquer forma de discriminação em razão da origem, raça, cor, sexo ou idade.
O projeto contraria também a Lei nº. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), que, em seu artigo 4º prevê que “nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.
Frise-se, há muitos idosos produtivos e atuantes, que contribuem diretamente para o desenvolvimento do país. Nesse sentido, é cada vez mais comum a presença de maiores de 60 anos no mercado de trabalho, em decorrência, sobretudo, do aumento da qualidade e expectativa de vida da população brasileira.
Assim, o Projeto de Lei vai na contramão das discussões atuais em que se avalia o aumento da idade mínima para se pleitear a aposentadoria, bem como o aumento da idade para aposentadoria compulsória no serviço público, que atualmente é de 75 anos. Tais revisões decorrem justamente do reconhecimento de que os idosos são plenamente capazes e aptos a desempenhar as mais diversas funções, agregando experiência e conhecimento.
Desta forma, enquanto são efetuados inúmeros debates para se permitir que o trabalhador possa continuar em sua função após os 75 anos, o Projeto fixa que aos 60 anos, ou seja, 15 anos antes, o idoso não mais teria discernimento para a contratação de um empréstimo por telefone.
Destacamos ainda que a legislação atual estipula condições que resguardam os consumidores, sem distinção de idade. Nesse sentido, o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) estabelece mecanismos de proteção contratual ao consumidor, aplicáveis também aos empréstimos firmados por idosos, ao dispor que “os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.
Cumpre esclarecer que o atendimento por telefone visa atender uma necessidade imediata e, portanto, proporciona comodidade e conveniência ao cliente, sendo um dos canais de atendimento na rede bancária. Trata-se de uma escolha do cliente, que pode optar ou não por contratar empréstimos por esse canal ou por outros meios disponíveis, de acordo com sua preferência. Assim, o projeto acaba por prejudicar os clientes que fazem uso desta modalidade de atendimento.
Ademais, cabe destacar que com a pandemia da COVID-19, vedar e, consequentemente, exigir que o idoso, aposentado e pensionista, saia de um lugar seguro, sua residência, muitas vezes se utilizando de transporte público, para ir até uma agência bancária para contratar um produto ou empréstimo coloca esse grupo de pessoas, mais sensíveis a doença, em alto risco de saúde. Lembrando que toda orientação dos principais órgãos de saúde é para que a locomoção seja a menor possível.
Desta forma, a aprovação do Projeto trará enormes prejuízos à população, sobretudo aos idosos, sem que qualquer benefício seja alcançado. Ademais, ao limitar as formas de contratação, o projeto trará enorme desconforto a milhares de pessoas que atualmente utilizam o telefone para realizar suas operações, bem como, impactará diretamente no fluxo de pessoas atendidas diariamente pelas agências, com o aumento das filas para atendimento.
V - Da invasão da competência privativa da União para legislar sobre Sistema Financeiro
A competência para legislar sobre o sistema financeiro nacional é privativa da União, conforme previsto no artigo 22, VII e o artigo 48, XIII, da Constituição Federal.
Conforme entendimento do STF “as instituições financeiras atuam em todo o território nacional, por vasta rede de estabelecimentos ou agências, que se comunicam com as matrizes e lhes cumprem instruções e ordens, muitas das quais derivadas do Banco Central. Tudo indica, portanto, que a regulação dessa atividade deva ser realizada pelo ente federativo central e não local.” (ADI 3155).
A vedação constitucional existe justamente para impedir que cada Ente Federativo fixe regras que estabeleçam restrições ou condicionamentos inteiramente distintos, o que não seria coerente dado que a atividade financeira é exercida em todo o território nacional de forma igual, obedecendo aos normativos expedidos pelo Banco Central do Brasil.
Vale dizer, não seria razoável que apenas no Estado do Amazonas os idosos não pudessem realizar a contratação de empréstimos por meio do telefone. Isso porque não há nenhuma particularidade específica do Estado que justifique essa diferenciação em relação aos demais Entes da Federação.
Observe-se que o tema objeto do projeto já foi inclusive regulamentado em âmbito federal e de maneira diversa da estabelecida no projeto em análise.
Nesse sentido, a Instrução Normativa INSS/PRES nº 100, de 28.12.18, proíbe que as Instituições Financeiras efetuem qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial e proposta que tente convencer o beneficiário do INSS a firmar contratos de empréstimo pessoal e cartão de crédito, com pagamento mediante desconto direto no benefício, pelo prazo de 180 dias após a concessão do benefício.
A IN determina ainda que nos primeiros 90 dias após a concessão do benefício, não poderão ser contratados quaisquer empréstimos. Após esse período, o próprio aposentado, pensionista ou representante legal poderá solicitar a contratação dessa modalidade de crédito diretamente à Instituição Financeira.
Desta forma, a norma federal permite a concessão de empréstimos aos aposentados e pensionistas, inclusive por meio telefônico, porém coloca um prazo mínimo de carência para a contratação desse crédito. Por sua vez, o projeto proíbe a realização, de maneira definitiva, de qualquer contratação por telefone, o que demonstra ser o texto proposto contrário à regulamentação federal da matéria.
VI – Conclusão
Com base em todos os argumentos expostos, solicitamos, com a devida vênia, que o Projeto de Lei nº 382/2019 seja rejeitado. Entretanto, caso não seja possível, propomos as seguintes alterações por meio do texto substitutivo abaixo:
Substitutivo nº XXX ao PL nº 382/2019
O projeto de Lei nº 382/2019 passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1° Na oferta de crédito consignado ficam as instituições financeiras obrigadas a apresentar de forma clara e objetiva as características do produto, considerando:
I – taxas de juros;
II - tarifas incidentes; III – eventuais seguros; IV- impostos; e
V - custo efetivo total (“CET”).
Art. 2° As operadoras de crédito consignado deverão manter à disposição dos consumidores serviço de bloqueio do recebimento de ligações para oferta do produto, denominado “Não Perturbe”.
§ 1º. A partir do trigésimo dia do ingresso do usuário no cadastro, as operadoras de crédito consignado não poderão efetuar ligações telefônicas para ofertar este produto às pessoas inscritas no cadastro ora criado.
§ 2º. As operadoras de crédito consignado deverão incluir nos contratos celebrados, cláusula que contenha a vedação contida no § 1º;
§ 3º. A previsão estabelecida no §1º do presente artigo não contempla as ligações que tenham por objetivo confirmar dados do consumidor, para a prevenção à fraude, realização de cobranças e para efetuar a retenção de solicitações de portabilidade, com ou sem oferta de refinanciamento.
§ 4º. Caso o consumidor se manifeste por não receber ligações para oferta de crédito consignado, o seu contato será incluído no cadastro pelo prazo de 2 (dois) anos.
§ 5º. O consumidor poderá solicitar a sua exclusão do Cadastro a qualquer momento.
Art. 3° O não cumprimento do disposto nesta Lei implicará as seguintes penalidades, a serem aplicadas aos infratores pela autoridade administrativa no âmbito de sua atribuição:
I- Advertência;
II - Multa no montante de até 50 (cinquenta) Unidades Padrão Fiscal do Município/Estado;
III - Multa no montante de até 100 (cem) Unidades Padrão Fiscal do Município/Estado, em caso de reincidência.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor 180 (cento e oitenta) dias após a data de sua publicação.