Número do Relator:
Número do Relator:
Relator do Acordão: Data do Julgamento: Data da Publicação:
1.0024.13.297740-6/003
Des.(a) Xxxxxxxxxx Xxxxx Xxx.(a) Xxxxxxxxxx Xxxxx 28/11/2017
07/12/2017
Númeração
2977406-
EMENTA: APELAÇÃO CIVEL - AÇÃO CIVIL COLETIVA - CONTRATO BANCARIO - ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS - PRELIMINAR - LITISCONSORCIO PASSIVO NECESSÁRIO REJEITADA - DÉBITO EM CONTA - PREVISÃO CONTRATUAL - AUSENCIA DE ILICITUDE - DESCONTO DE DÍVIDA INADIMPLIDA - CONTAS E APLICAÇÕES DO DEVEDOR E GARANTIDORES - CLÁUSULA VÁLIDA - AUTONOMIA DA VONTADE - ABUSIVIDADE NÃO VERIFICADA - SENTENÇA MANTIDA.
- Haverá necessidade de formação de litisconsórcio passivo "por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes" (art. 114, CPC). O fato de as demais instituições financeiras supostamente adotarem a mesma cláusula contratual impugnada na presente demanda coletiva não enseja a formação de litisconsórcio necessário, porquanto o requerido não possui qualquer relação jurídica com as demais instituições financeiras. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
- A Constituição da República de 1988 atribuiu a "defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (art. 127) ao Ministério Público, já tendo sido reconhecida, pelo Superior Tribunal de Justiça, a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação coletiva na defesa de clientes de instituição bancárias (art. 129, III, CR).
- É válida a cláusula contratual que estipula o débito automático como forma de pagamento de dívida contraída pelo devedor, não se mostrando ela, em termos gerais, abusiva.
- Tal medida inclusive está regulamentada pelo BACEN, exigindo-se a anuência do cliente, a qual pode ser conferida no próprio contrato firmado com a instituição financeira, consoante disposto na Resolução nº 3.695/2009.
- De igual modo, a estipulação de desconto em conta ou aplicações financeiras do devedor ou de seus garantidores, no caso de inadimplência, tem como objetivo conferir maior segurança às transações firmadas com a instituição financeira, o que reduz os riscos de inadimplência, facilitando a obtenção de crédito pelo consumidor.
- Assim, tal disposição contratual não afronta as disposições consumeristas, tampouco contraria o princípio da boa-fé.
- Preliminar rejeitada. Negado provimento ao recurso. Sentença mantida.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.13.297740-6/003 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em rejeitar a preliminar de litisconsórcio passivo necessário. Negar provimento ao recurso.
DESA. XXXXXXXXXX XXXXX RELATORA.
DESA. XXXXXXXXXX XXXXX (RELATORA)
V O T O
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS em face da sentença de fls. 798/806 proferida pelo MM. Juiz da 15ª Vara Cível da Capital que, nos autos da "Ação Civil Coletiva" proposta contra BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A, julgou improcedentes os pedidos iniciais, deixando de condenar o autor ao pagamento de despesas processuais, nos termos do artigo 87 do CDC c/c art. 18 da Lei nº 7.347/85.
Inconformado, o apelante afirma que o Código Civil tem como norte a função social do contrato e a boa-fé, as quais devem auxiliar na interpretação dos negócios jurídicos. Sustenta que o consumidor se encontra em uma situação de fragilidade em relação ao sistema bancário.
Salienta que o apelado estipula em seus contratos de adesão duas espécies de cláusulas abusivas e contrárias à função social do contrato e à boa-fé, a saber: - a primeira, se refere a forma de pagamento, imposta através de débito automático em quaisquer contas do consumidor; e - a segunda, trata-se de cláusula mandato confiscatória, autorizando a instituição financeira a utilizar de qualquer disponibilidade financeira em nome do cliente (ou de seu fiador/avalista) junto ao conglomerado do Banco Santander, para liquidar ou amortizar a dívida não paga.
Destaca que as referidas cláusulas constam em contrato de adesão de forma automática, sem o prévio e espontâneo consentimento do consumidor. Pondera que tais cláusulas estão previstas em diversas modalidades de contrato, tais como: cheque especial, abertura de conta, financiamentos, renegociação de dívida, crédito pessoal, dentre outros, que estão indicados às fls. 176/287 dos autos.
No que diz respeito à primeira cláusula, que autoriza o débito automático das prestações devidas na data de vencimento destas, o parquet defende que a instituição financeira, na condição de depositária, depende de autorização do consumidor para movimentar as contas deste, a qual não pode ser dada de forma ampla e genérica. Pondera que a apropriação do dinheiro do cliente pode recair sobre verba de natureza alimentar e conclui pela ilegalidade de tal prática, nos termos do artigo 39, VIII do CDC.
Em relação à segunda cláusula, entende tratar-se de "verdadeiro confisco para autoexecução do saldo devedor e sem qualquer limitação". Diz que os contratos de adesão não recebem a anuência expressa e específica do consumidor, que não tem o poder de discutir as cláusulas avençadas com a instituição financeira.
Assevera que a mera adesão ao contrato não significa que o consumidor tenha tomado conhecimento integral do seu conteúdo. Discorre sobre o acesso à informação assegurado ao consumidor. Pontua que o desconto não autorizado tem vedação expressa na Resolução nº 3.695/09 do BACEN.
Ainda que se considere devido o desconto sem anuência do
consumidor, entende ser abusiva a ausência de limitação desses descontos, afrontando o equilíbrio contratual em prejuízo do consumidor, nos termos do artigo 39, inciso V do CDC. Relata que a falta de saldo suficiente ou disponível em conta corrente para pagamento de outras dívidas pode trazer inúmeros prejuízos ao consumidor, cabendo a este eleger as dívidas que pretende pagar prioritariamente, dentro de sua realidade financeira.
Indica que, mesmo não sendo conta salário a jurisprudência do STJ tem se manifestado no sentido de limitar os descontos em 30% dos rendimentos do correntista. Cita as normas legais que dispõem sobre a limitação de descontos na remuneração dos servidores e empregados, bem como dos proventos de aposentados e pensionistas.
Argumenta que a cobrança extrajudicial e a eventual execução do débito são os caminhos naturais que o credor deveria adotar para exigir os seus créditos. Reafirma que os descontos previstos na cláusula impugnada não tem qualquer limitação, podendo incidir sobre todos os valores disponíveis do consumidor.
Relata que os fiadores e avalistas seriam, neste caso, consumidores por equiparação, nos termos do artigo 29 do CDC, devendo ser resguardados seus direitos.
Requer seja dado provimento ao recurso, para que a sentença seja reformada, julgando-se procedentes os pedidos iniciais para declarar-se a abusividade das cláusulas indicadas pelo requerente (Parquet), bem como seja o apelado condenado na obrigação de não
fazer, em âmbito nacional, no sentido de não inserir tais cláusulas em contratos futuros e, nos contratos vigentes, fique impedido de debitar valores de contas ou disponibilidades financeiras dos consumidores, sem a prévia e expressa anuência destes. Pugna ainda seja o apelado condenado à obrigação de fazer, no sentido de obter a expressa anuência dos consumidores no caso de débitos em suas contas, limitados, porém, a 30% do valor de sua renda mensal, devendo tal obrigação ser publicada em jornal de ampla circulação em cada Estado da Federação e em seu sítio eletrônico.
Pede o arbitramento de multa cominatória e condenar o apelado a indenizar os consumidores pelos danos materiais e morais sofridos individualmente, a serem apurados em liquidação de sentença. Por fim, requer a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, sugerindo o valor de R$ 2.000.000,000 (dois milhões de reais).
Contrarrazões recursais apresentadas pelo apelado às fls. 824/837, reitera os fundamentos apresentados em sua contestação. Diferencia o débito em folha de pagamento do débito em conta, ressaltando que a limitação de 30% abrange apenas aquele. Sustenta que o débito em conta decorre da autonomia da vontade do consumidor. Cita entendimento jurisprudencial que respaldaria a conclusão adotada na sentença. Salienta que a Resolução nº 3.695 somente considera abusivo o débito automático quando não houver cláusula contratual autorizando expressamente a operação. Reitera serem lícitas as cláusulas contratuais impugnadas pelo Ministério Público. Diz que a referida autorização de débito em conta, concedida em caráter irrevogável, constitui uma garantia da relação contratual, o que afeta a avaliação de risco do crédito concedido e, por consequência, afeta o custo do negócio. Requer seja negado provimento ao recurso e confirmada a sentença apelada.
Manifestou-se a Procuradoria de Justiça à fl. 841 reiterando os termos do recurso interposto pelo parquet.
Relatado, examino e ao final, decido.
Recurso próprio, tempestivo e dispensado o preparo, em virtude da isenção conferida pelo artigo 10, inciso VI da Lei Estadual nº 14.939/2003.
Conheço do apelo, presentes os demais pressupostos de admissibilidade.
Recebo a apelação nos termos do art. 1.012 do NCPC.
PRELIMINARES
O apelado em sede de contrarrazões reitera os termos da sua contestação, pugnando sejam examinadas as preliminares de ausência de interesse de agir e existência de litisconsórcio passivo necessário.
Registro que, em relação à preliminar de ausência de interesse de agir, a questão já foi analisada por esta Câmara no agravo de instrumento sequencial 001 (fls. 748/758), estando, pois, preclusa a matéria.
Diante disso, passo ao exame da próxima preliminar.
I - FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO
O litisconsórcio necessário está previsto no artigo 114 do CPC e deve ser observado "por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes".
Deve haver, portanto, a necessidade de que todos os sujeitos integrem a relação processual.
No caso em comento, o apelado salienta que as cláusulas discutidas neste lide são utilizadas pelas demais instituições financeiras. Defende que os pedidos iniciais, caso julgados procedentes, produzirão um desequilíbrio do banco réu e seus clientes perante o mercado, o que justifica a inclusão de todas as instituições financeiras no polo passivo.
Não prospera, porém, a tese do recorrido, tendo em vista que sequer há prova nos autos de que tais cláusulas são utilizadas pelas demais instituições financeiras, tampouco existe comprovação de quais empresas usam destas disposições.
E mais, o banco apelado não possui qualquer relação jurídica com as demais instituições financeiras, de modo a exigir a formação de litisconsórcio no presente caso, tal como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça em caso semelhante:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AÇÃO DESTINADA A IMPOR À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA A OBRIGAÇÃO DE ADOTAR O MÉTODO BRAILLE NOS CONTRATOS BANCÁRIOS DE ADESÃO CELEBRADOS COM PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA VISUAL. 1. FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. DESCABIMENTO, NA HIPÓTESE.
2. DEVER LEGAL CONSISTENTE NA UTILIZAÇÃO DO MÉTODO BRAILLE NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS BANCÁRIAS ESTABELECIDAS COM CONSUMIDORES PORTADORES DE DEFICIÊNCIA VISUAL. EXISTÊNCIA. NORMATIVIDADE COM ASSENTO CONSTITUCIONAL E LEGAL. OBSERVÂNCIA. NECESSIDADE. 3. CONDENAÇÃO POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS COLETIVOS. CABIMENTO. 4. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA PARA O DESCUMPRIMENTO DAS DETERMINAÇÕES JUDICIAIS. REVISÃO DO VALOR FIXADO. NECESSIDADE, NA ESPÉCIE.
5. EFEITOS DA SENTENÇA EXARADA NO BOJO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA DESTINADA À TUTELA DE INTERESSES COLETIVOS STRICTO SENSU. DECISÃO QUE PRODUZ EFEITOS EM RELAÇÃO A TODOS OS CONSUMIDORES PORTADORES DE DEFICIÊNCIA VISUAL QUE ESTABELECERAM OU VENHAM A FIRMAR RELAÇÃO CONTRATUAL COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA EM TODO O TERRITÓRIO NACIONAL. INDIVISIBILIDADE DO DIREITO TUTELADO. ARTIGO 16 DA LEI N. 7.347/85. INAPLICABILIDADE, NA ESPÉCIE. PRECEDENTES. 7. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A instituição financeira demandada, a qual se imputa o descumprimento de um dever legal, não mantém com as demais existentes no país (contra as quais nada se alega) vínculo jurídico unitário e incindível, a exigir a conformação de litisconsórcio passivo necessário. A existência, por si, de obrigação legal a todas impostas não as une, a ponto de, necessariamente, serem demandadas em conjunto. In casu, está-se, pois, diante da defesa coletiva de interesses coletivos stricto sensu, cujos titulares, grupo determinável de pessoas (consumidores portadores de deficiência visual), encontram-se ligados com a parte contrária por uma relação jurídica base preexistente à lesão ou à ameaça de lesão. E, nesse contexto, os efeitos do provimento judicial pretendido terão repercussão na esfera jurídica dos consumidores portadores de deficiência visual que estabeleceram, ou venham a firmar relação contratual com a instituição financeira demandada, exclusivamente.
(...)
(REsp 1315822/RJ, Rel. Ministro XXXXX XXXXXXX XXXXXXXX, TERCEIRA
TURMA, julgado em 24/03/2015, DJe 16/04/2015) ( detaquei)
Portanto, inexiste obrigação de formar litisconsórcio entre todas as instituições financeiras do país no caso em análise, devendo ser rejeitada a preliminar arguida pelo apelado.
Diante disso, rejeito a preliminar de formação de litisconsórcio passivo necessário.
NO MÉRITO
Cuida-se de ação coletiva movida pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais ao argumento de que as cláusulas, que autorizam o requerido/apelado a debitar os valores existentes em quaisquer contas, aplicações ou disponibilidades financeiras do consumidor, no intuito de liquidar ou amortizar as obrigações por ele assumidas perante o Banco Santander, seriam abusivas.
Com efeito, são dois tipos de cláusulas distintas, a saber:
(I) - a que lhe autoriza automaticamente a debitar, na conta corrente, poupança ou qualquer disponibilidade financeira do consumidor, o valor principal, os encargos financeiros, tarifas, tributos e/ou demais despesas relativas à operação contratada, na data da sua exigibilidade, sem que tenha ocorrido a prévia e expressa anuência do consumidor;
(II) - a que lhe autoriza a debitar os valores existentes em quaisquer contas de depósitos, aplicações ou disponibilidade financeiras dos consumidores, bem como de seus avalistas/fiadores/demais coobrigados, a fim de liquidar ou amortizar quaisquer dívidas inadimplidas perante o apelado, sem que tenha ocorrido a prévia e expressa anuência do consumidor.
Tem-se, pois, que a primeira cláusula autoriza o banco apelado a debitar, na data de seu vencimento, diretamente das contas ou disponibilidades financeiras do consumidor o valor da obrigação assumida, ao passo que a segunda trata de obrigações não pagas tempestivamente pelo consumidor, ficando autorizado, igualmente, a instituição financeira a debitar tais valores das contas e/ou disponibilidades financeiras do consumidor ou seus garantidores.
DA AÇÃO COLETIVA
A Constituição da República de 1988 conferiu especial relevância ao Ministério Público, atribuindo-lhe a "defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (art. 127).
De igual modo, a Carta Magna inseriu dentre as funções institucionais do Parquet o dever de "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos" (art. 129, III) (destaquei).
É de se pontuar que o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação coletiva na defesa de clientes de instituição bancárias, veja-se:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRARIEDADE AO ARTIGO 460, DO CPC. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. INOVAÇÃO RECURSAL. VEDAÇÃO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ANÁLISE. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CDC. APLICABILIDADE ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SÚMULA N. 297 DO STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL.
1. Na hipótese em que o Tribunal de origem examina e decide, fundamentadamente, as questões suscitadas pela parte, não se configurando, assim, a ocorrência de negativa de prestação
jurisdicional que possa nulificar o acórdão recorrido.
2. A finalidade dos embargos declaratórios é sanar omissão, contradição ou obscuridade existente no acórdão embargado, e não inaugurar debate a respeito de matérias não suscitadas nas instâncias ordinárias.
3. A competência para a fixação de honorários advocatícios é privativa do magistrado, constituindo-se em cláusula abusiva a que prevê tal providência por parte das instituições financeiras.
4. "É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste" (Súmula n.
60/STJ).
5. Na hipótese de figurar num dos pólos da relação jurídica pessoa hipossuficiente deve prevalecer a regra mais benigna a este, devendo, portanto, ser aplicado o disposto no artigo 94, do CPC.
6. O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública tutelando direitos coletivos de correntistas, que na qualidade de consumidores, firmam contrato de abertura de crédito com instituições financeiras e são submetidos a cláusulas abusivas.
7. A jurisprudência desta Corte consolidou seu entendimento no sentido de que é aplicável as normas dispostas no Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras. Súmula n. 297 do STJ.
8. A transcrição das ementas dos julgados tidos como divergentes é insuficiente para a comprovação de dissídio pretoriano viabilizador do recurso especial.
9. Recurso especial não-conhecido.
(REsp 537.652/RJ, Rel. Ministro XXXX XXXXXX XX XXXXXXX, QUARTA
XXXXX, julgado em 08/09/2009, DJe 21/09/2009)
O Código de Defesa do Consumidor tratou de conceituar os direitos coletivos lato sensu em seu artigo 81, nos seguintes termos:
"Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum."
Em exame acurado e cuidadoso dos autos, é possível concluir-se que, em verdade, os direitos discutidos na presente lide, notadamente, quanto à declaração de nulidade das cláusulas acima destacadas, devem ser classificados como coletivos stricto sensu, na medida em que, segundo o disposto no inciso II do parágrafo único do artigo 81 da Lei 8078/90, são transindividuais de natureza indivisível e decorrentes de uma relação jurídica base dos consumidores/clientes com a própria instituição financeira, a qual é anterior à demanda.
Sobre o tema, são esclarecedoras as lições de Xxxxxx Xxxxxx Xx. E Xxxxxx Xxxxxx Xx.:
"Os direitos coletivos stricto sensu (art. 81, par. ún., II, do CDC foram
classificados como direitos transindividuais (com a mesma sinonímia descrita acima), de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas indeterminadas, mas determináveis (frise-se, enquanto grupo, categoria ou classe determinável), ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica base.
Nesse particular, cabe salientar que essa relação jurídica base pode dar-se entre os membros do grupo affectio societatis ou pela sua ligação com a 'parte contrária'. No primeiro caso temos os advogados inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (ou qualquer associação de profissionais); no segundo, os contribuintes de determinado imposto. Os primeiros ligados ao órgão de classe, configurando-se como 'classe de pessoas' (advogados); os segundos ligados ao ente estatal responsável pela tributação, configurando- se como 'grupo de pessoas' (contribuintes).
Cabe ressaltar que a relação-base necessita ser anterior à lesão (caráter de anterioridade). A relação-base forma-se entre os associados de uma determinada associação, os acionistas da sociedade ou ainda os advogados, enquanto membros de uma classe, quando unidos entre si (affectio societatis, elemento subjetivo que os une entre si em busca de objetivos comuns); ou, pelo vínculo jurídico que os liga a parte contrária, e.g., contribuintes de um mesmo tributo, estudantes de uma mesma escola, contratantes de seguro com um mesmo tipo de seguro etc." (Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. V. 4. 10ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2016, p. 69/70)
É de se ponderar, ademais, que a discussão envolve, de forma secundária, direitos individuais homogêneos, porém, o pedido principal, sem dúvidas, refere-se a defesa de interesses coletivos propriamente ditos.
Quanto à matéria, cito excerto constante no REsp. nº 292.636/RJ em que o Ministro XXXXXX XXXXXXXX, em caso semelhante, dissertou
sobre a natureza da lide em que se discute a nulidade de cláusulas constantes em contrato bancário:
"Releva no caso a diferenciação entre os interesses coletivos, de um lado, e os interesses individuais homogêneos, de outro. Ao pleitear o parquet estadual a nulidade de cláusulas, que é de interesse de componentes de um grupo de forma indivisível, está ele tratando de um direito coletivo. A proclamação da nulidade beneficiará a todos, de modo igual.
Há um aspecto importante a destacar nesse ponto para evidenciar que esta ação civil pública visa, principalmente, resguardar interesses coletivos e apenas secundariamente proteger interesses individuais homogêneos. A peça exordial reporta-se a novos clientes que, a todo momento, possam vir a celebrar contratos daquele tipo com os réus. Está referindo-se - evidentemente - não só aos clientes atuais, como também aos futuros, de conformidade, aliás, com o que, com acuidade, deixara anotado o Magistrado singular quando concedera a tutela antecipatória.
O pleito vestibular objetiva primordialmente amparar os direitos de um grupo determinado ou determinável, mas indivisível e não quantificável de plano.
Cuidando-se, assim, na espécie em exame, de perseguida proteção a interesses coletivos, indiscutível é a legitimação do Ministério Público Estadual para intentar a presente ação civil pública.
Apenas de maneira secundária e consequencial, conforme assinalado acima, é que se cogitará, se for o caso, dos interesses individuais homogêneos." (REsp 292.636/RJ, Rel. Ministro XXXXXX XXXXXXXX, QUARTA TURMA,
julgado em 11/06/2002, DJ 16/09/2002, p. 190)
Feita tal distinção, passo ao exame das alegadas abusividades das cláusulas apontadas pelo Parquet.
I - QUANTO À CLÁUSULA QUE AUTORIZA O DÉBITO AUTOMÁTICO DE OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS PELO CONSUMIDOR
Para melhor compreensão da controvérsia, transcrevo algumas cláusulas constantes nos contratos disponibilizados pelo banco apelado e que estão sendo impugnadas:
5.1.2 A CDL, será debitada em conta corrente de titularidade do (s) EMITENTE(S), na mesma data escolhida pelo (s) EMITENTE(S) para débito dos encargos financeiros decorrentes desta operação. (fl. 187)
11. Considerando que todos os encargos financeiros, tarifas e tributos relativos a presente operação ou na hipótese de parcelamento, serão debitados na conta corrente indicada nesta CÉDULA, o(s) EMITENTE(S) se obriga(m) neste ato, a prover respectiva conta com recursos suficientes e imediatamente disponíveis para efetivação desses débitos, na data da sua exigibilidade, os quais desde já autoriza(m). Referidos débitos serão realizados com preferencia em relação a qualquer outro débito pendente de realização, solicitado ou não pelo(s) EMITENTE(S), ficando o BANCO autorizado a utilizar o próprio limite de crédito, se necessário. (fl. 190)
42. O CLIENTE autoriza expressamente o BANCO, em caráter irrevogável e irretratável, a cobrança ou débito em sua conta corrente, conta poupança ou qualquer disponibilidade financeira, das tarifas relativas aos serviços prestados pelo BANCO. Na conta corrente, o débito das tarifas ocorrerá sobre o saldo disponível, que inclui eventual limite de cheque especial contratado. A relação dos serviços tarifados, o valor das tarifas e eventuais alterações são disponibilizados ao CLIENTE na Tabela de Serviços do BANCO, afixada em todas às suas dependências e disponível também no "site" do BANCO (xxx.xxxxxxxxx.xxx.xx). (fl. 206)
12. A liquidação do valor de principal, encargos financeiros e demais
despesas desta operação será mediante débito na conta corrente do EMITENTE indicada no campo 1 do preambulo, obrigando-se o EMITENTE, desde já, a prover a respectiva conta com recursos suficiente e imediatamente disponíveis, para efetivação do débito de que trata esta cláusula. O referido débito será realizado em conta corrente, especialmente na primeira hora do dia, com preferencia, em relação a qualquer outro débito pendente de realização, solicitado ou não pelo EMITENTE. (fl. 221)
A despeito dos argumentos apresentados pelo parquet, não vislumbro haver abusividade nas cláusulas acima transcritas, as quais autorizam o débito automático de obrigações assumidas pelo consumidor.
Com efeito, não se pode olvidar que o consumidor goza de especial proteção em nosso ordenamento, nos termos do artigo 5º, XXXII da Constituição Federal, tendo seus direitos regulados, dentre outros diplomas legais, pelo Código de Defesa e Proteção ao Consumidor.
Não se tem dúvidas de que ao Poder Público incumbe zelar pela proteção do consumidor, haja vista que se trata de parte vulnerável nas relações comerciais, tendo sido criados para tanto diversos instrumentos de defesa do consumidor.
Todavia, em se tratando de ação coletiva, não se pode desconsiderar os impactos econômicos que a demanda pode trazer ao mercado de consumo.
Especificamente, em relação à autorização de débito automático das obrigações assumidas pelo consumidor junto ao Banco, ora apelado, não havendo por isso mesmo, que se falar em abusividade, a priori, da aludida cláusula.
A autorização de desconto direto da conta do consumidor dos débitos existentes perante a Instituição Financeira influencia no próprio objeto do contrato, na medida em que ao conceder um financiamento ou crédito especial os Bancos, indubitavelmente, levam em consideração a diminuição dos riscos inerentes àquele contrato.
Ora, ao permitir o desconto automático em sua conta, o consumidor está conferindo maior segurança à transação, medida que reduz os riscos da atividade, o que indiretamente beneficia o próprio consumidor que tem o acesso facilitado ao crédito e a redução das taxas de juros ou tarifas cobradas pela instituição financeira, em face da natureza da operação.
Ademais, tal medida beneficia diretamente o próprio consumidor, uma vez que reduz os encargos de mora a serem suportados em decorrência de possível inadimplência.
O débito automático tem sido uma prática cotidiana que facilita a vida das pessoas que optam por este sistema de pagamento, a fim de evitar que as intempéries e esquecimentos do dia a dia provoquem sua inadimplência.
Com efeito, embora em casos pontuais a cláusula que permite o débito direto na conta dos consumidores possa vir a prejudicar a subsistência do devedor, é preciso que se tenha cuidado ao analisar uma demanda coletiva dessa natureza. E o motivo é que pode existir uma parcela de consumidores que aderiram espontaneamente à referida cláusula, que pretendem honrar com a quitação de seus débitos e concordam que o banco se utilize desse instrumento para receber seus créditos. Portanto a invalidação dessa cláusula poderá lhes trazer danos ainda maiores.
Neste contexto, ainda que a relação de consumo esteja sujeita a regras diferenciadas, com intuito de proteger o consumidor e minimizar sua vulnerabilidade na relação, é essencial que se observe a autonomia da vontade, princípio que norteia as relações contratuais, permitindo, assim, ao consumidor optar por aderir a uma cláusula que, a princípio, poderá lhe trazer benefícios e facilitar o seu acesso a créditos com maior rapidez.
Enfim, não me parece que a referida previsão contratual imponha ao consumidor uma desvantagem excessiva ou que seja incompatível com a boa-fé (art. 51, IV, CDC), tampouco afronta o sistema de proteção ao consumidor (art. 51, XV, CDC).
Trata-se de cláusula tida pela jurisprudência pátria como lícita e regular, conforme os julgados abaixo:
"APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO BANCÁRIO. CARTÃO DE CRÉDITO E CONTA CORRENTE. AUTORIZAÇÃO DE DÉBITO AUTOMÁTICO. POSSIBILIDADE. A cláusula
autorizadora de débito em conta é perfeitamente legal e permanece enquanto convier ao interesse das partes. E, enquanto permanecer, por certo autoriza os
pagamentos automáticos. Não caracterização de abusividade, nem de ilicitude. Inocorrência de dano moral indenizável. Apelo provido. Sentença reformada. (TJMG - Apelação Cível 1.0701.15.023364-4/001, Relator(a): Des.(a) Xxxxxx Xxxxxxxx, 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 23/08/2017, publicação da súmula em 05/09/2017)
APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO PAGAMENTO MÍNIMO - DÉBITO EM CONTA-CORRENTE - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - DANOS MORAIS - NÃO CONFIGURAÇÃO.
Existente cláusula, nas condições gerais do contrato de cartão de crédito, autorizando o débito automático, em conta-corrente, do valor mínimo da fatura do cartão de crédito, não há que se falar em ato ilícito ou prática abusiva da instituição financeira que assim procede.
Para que se condene alguém ao pagamento de indenização por dano moral, é preciso que se configurem os pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, que são o dano, a culpa do agente, em caso de responsabilização subjetiva e o nexo de causalidade entre a atuação deste e o prejuízo.
O desconto do valor mínimo da fatura do cartão de crédito da autora em sua conta corrente, na forma de débito automático, não enseja dano moral, sobretudo quando não houve qualquer demonstração de que tais fatos a tenham exposto a situação vexatória. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.13.197152-5/001, Relator(a): Des.(a) Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 28/01/2016, publicação da súmula em 12/02/2016)
CONTRATO BANCÁRIO. Cartão de crédito e conta corrente. Débito automático das faturas na conta corrente em que a autora recebe benefício previdenciário. Possibilidade, pois dita autorização se insere na disponibilidade de direitos do cliente. Débito que vêm sendo descontados há mais de sete anos, sem oposição. Não caracterização de abusividade, nem de ilicitude. Repetição incabível. Inocorrência, de resto, de dano moral indenizável. Ação improcedente. Recurso não provido.
(TJSP; Apelação 1003719-35.2016.8.26.0576; Relator (a): Xxxxxxxx xxx Xxxxxx; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José do Rio Preto - 8ª Vara Cível; Data do Julgamento: 29/09/2016; Data de Registro: 30/09/2016)
EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. PAGAMENTO EM PARCELAS MENSAIS. DÉBITO EM CONTA CORRENTE. AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DO DEVEDOR E DO AVALISTA. LEGALIDADE. AÇÃO DECLARATÓRIA VISANDO À NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. PROVIDÊNCIA QUE NÃO AUTORIZA A SUSPENSÃO DOS DESCONTOS DEVIDAMENTE AUTORIZADOS EM CONTA CORRENTE.
1. O débito em conta corrente é uma prática que facilita a vida das pessoas. Em caso de empréstimo bancário, desde que devidamente autorizados, os descontos das parcelas do financiamento podem ser feitos na conta corrente do devedor, onde são depositados os seus proventos, não comprometendo a sua subsistência e de sua família.
2. O ajuizamento de ação declaratória visando à nulidade de cláusulas contratuais, que seriam abusivas, no entender do devedor, por si só não é o bastante para autorizar a suspensão dos descontos das parcelas do empréstimo em sua conta corrente.
(Xxxxxxx n.191123, 20030020092798AGI, Relator: ROBERVAL CASEMIRO
BELINATI 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 15/03/2004, Publicado no DJU SEÇÃO 3: 27/05/2004. Pág.: 49)
E ainda, é importante ressaltar que a questão da autorização de débito em conta já está regulamentada pelo BACEN, exigindo-se a anuência do cliente, tal como se extrai da Resolução nº 3.695/2009, nos seguintes termos:
Art. 3º É vedada às instituições financeiras a realização de débitos em contas de depósitos e em contas de pagamento sem prévia autorização do cliente. (Redação dada pela Resolução nº 4.480, de 25/4/2016.)
§ 1º A autorização referida no caput deve ser fornecida por escrito ou por meio eletrônico, com estipulação de prazo de validade, que poderá ser indeterminado, admitida a sua previsão no próprio instrumento contratual de abertura da conta de depósitos.
§ 2º O cancelamento da autorização referida no caput deve surtir efeito a partir da data definida pelo cliente ou, na sua falta, a partir da data do recebimento pela instituição financeira do pedido pertinente.
Art. 4º Ficam as instituições financeiras obrigadas a acatar as solicitações de cancelamento da autorização de débitos automáticos em conta de depósitos à vista, apresentadas pelos clientes desde que não decorram de obrigações referentes a operações de crédito contratadas com a própria instituição financeira.
Portanto, estando a questão regulamentada pelo Banco Central, o qual exige a anuência do cliente, não se pode considerar abusiva a cláusula constante em contrato bancário que estipula o débito automático como forma de pagamento das obrigações assumidas pelo consumidor, não havendo afronta ao artigo 39, VIII do CDC.
Por fim, conquanto se possa vir a considerar como abusivo, em princípio, o desconto superior a 30% sobre os rendimentos do consumidor, tal questão deverá ser apurada de acordo com o caso concreto, levando-se em consideração a movimentação financeira da pessoa, seus rendimentos e até mesmo o tipo de conta e aplicações do cliente, não sendo possível simplesmente limitar tais descontos, de modo genérico, em demanda coletiva.
Assim sendo, deve ser mantida a sentença de improcedência quanto ao pedido de nulidade da cláusula que autoriza o débito automático em contratos bancários.
II - QUANTO À CLÁUSULA QUE AUTORIZA O DESCONTO DE OBRIGAÇÕES NÃO ADIMPLIDAS NAS CONTAS E APLICAÇÕES DO CONSUMIDOR E SEUS GARANTIDORES
Antes de examinar a matéria, transcrevo a cláusula impugnada de forma a facilitar a compreensão da controvérsia:
AUTORIZAÇÕES
24ª - A fim de liquidar ou amortizar qualquer obrigação assumida perante o BANCO neste instrumento, fica o Credor autorizado pelo EMITENTE e/ou pelo(s) AVALISTA(S), em caráter irrevogável e irretratável, a fazer uso das disponibilidades existentes em qualquer conta ou posição de sua titularidade, seja conta corrente, de poupança, ou de qualquer aplicação financeira, podendo para tanto, efetuar resgates e remanejar saldos de uma conta para outra.
§ Único - Tratando-se de conta, posição ou aplicação conjuntas, solidária (e/ou) ou coletiva, a autorização de que trata o "caput" será válida inclusive quando a obrigação que se pretende liquidar ou amortizar for de responsabilidade de apenas um dos titulares. (fls. 223/224)
Trata-se de cláusula constante em cédulas de crédito bancário, estando redigida em tópico próprio e devidamente destacada, tal como exige o artigo 54, § 4º do CDC.
Além disso, como já dito no tópico anterior, a estipulação desta forma de cobrança em contratos bancários tem como objetivo conferir maior segurança às transações firmadas com a instituição financeira, o
que reduz os riscos de inadimplência, facilitando a obtenção de crédito pelo consumidor.
Com efeito, a meu ver, a previsão de desconto direto da conta ou outras aplicações financeiras do consumidor ou de seus garantidores não afronta as disposições consumeristas, tampouco contraria o princípio da boa-fé.
Registro que os avalistas e/ou fiadores tornam-se garantidores da dívida por livre e espontânea vontade, de modo que não pode ser afastada a sua responsabilidade no caso de inadimplemento pelo devedor principal, mostrando-se, igualmente, lícita e válida a cláusula de desconto em relação a eles.
Sobre o tema, e na mesma linha de pensamento, os seguintes julgados:
"Contrato bancário Contrato de crédito rotativo em conta corrente Ação condenatória de devolução de valores debitados em conta corrente, de indenização por dano moral e de revisão de contrato bancário Art. 252 do Regimento Interno do TJSP Sentença ratificada Cláusula que autoriza o banco a debitar da conta do avalista pessoa física o débito contraído pela pessoa jurídica Abusividade não constatada Não provimento à apelação.
(TJSP; Apelação 9171703-31.2009.8.26.0000; Relator (a): Xxx Xxxxxx; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 6ª VC; Data do Julgamento: 16/05/2013; Data de Registro: 17/05/2013)
APELAÇÃO. CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO. AVALISTA. DESCONTO REALIZADO EM CONTA CORRENTE. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA.
INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSIVIDADE. DANO MORAL
INEXISTENTE. É legal o desconto efetuado em conta corrente, quando autorizado, expressamente, pelo devedor. Não havendo ilegalidade no desconto, inviável a condenação em dano moral.
(XXXX, Xxxxxxx n. 967412, 20150111412373APC, Relator: XXXXXX XXXXX
6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 14/09/2016, Publicado no DJE: 27/09/2016. Pág.: 359/375)
Nesse passo, é importante registrar que a Resolução nº 3.695/2009 do BACEN, já mencionada acima, não faz qualquer distinção em relação às dívidas que podem ser debitadas da conta do cliente, sendo válido o desconto em conta corrente, independentemente se o titular figura como devedor ou garantidor, desde que tenha anuído com tal medida.
Logo, a presente disposição contratual não tem natureza "confiscatória", como afirma o parquet, notadamente, porque decorre da autonomia privada, havendo livre manifestação de vontade do contratante.
Portanto, também neste ponto, entendo que a sentença apelada que julgou improcedente o pedido inicial deve ser mantida, visto que a cláusula impugnada não apresenta qualquer ilicitude.
Em virtude do que está sendo decidido, restam prejudicados os demais pedidos (indenização por danos morais coletivos e obrigação de não fazer).
Diante do exposto, rejeito a preliminar de formação de litisconsórcio passivo necessário suscitada pelo apelado. E no mérito, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo incólume a bem lançada sentença.
O presente feito é isento de custas e honorários de sucumbência, conforme artigo 10, inciso VI da Lei Estadual nº 14.939/2003 e artigo 87 do CDC.
É como voto.
DES. XXXXXXX XX XXXXXXXX XXXXX - De acordo com o(a) Relator(a). DES. MANOEL DOS REIS MORAIS - De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: "REJEITARAM A PRELIMINAR DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."