BRASÍLIA 2021
Centro Universitário de Brasília - UniCEUB Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais - FAJS Curso de Bacharelado em Direito
XXXXX XXXXXX XXXXXXX
PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO
RESIDENCIAL: uma revisitação do tema sob o viés da constitucionalização do Direito Civil em um cenário de pandemia
BRASÍLIA 2021
PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO
RESIDENCIAL: uma revisitação do tema sob o viés da constitucionalização do Direito Civil em um cenário de pandemia
Artigo científico apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais - FAJS do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).
Orientadora: Professora Mestra Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
BRASÍLIA 2021
PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO
RESIDENCIAL: uma revisitação do tema sob o viés da constitucionalização do Direito Civil em um cenário de pandemia
Artigo científico apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais - FAJS do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).
Orientadora: Professora Mestra Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
BRASÍLIA, 22 DE MARÇO DE 2021
BANCA AVALIADORA
Professora Orientadora
Professor(a) Avaliador(a)
PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO
RESIDENCIAL: uma revisitação do tema sob o viés da constitucionalização do Direito Civil em um cenário de pandemia
Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx
Resumo
Este artigo analisa a penhora do bem de família do fiador de contrato locatício residencial sob a ótica da constitucionalização do Direito Civil em um contexto de pandemia. O objetivo geral do trabalho é investigar se o ordenamento jurídico brasileiro comporta uma nova interpretação acerca da possibilidade de proteção desse tipo de bem, de modo a afastar o instituto da constrição patrimonial, tendo em vista o cenário excepcional de crise sanitária e econômica desencadeado pelo vírus Covid-19. A pesquisa está atrelada ao método de revisão bibliográfica e de pesquisa jurisprudencial e legislativa. Os resultados demonstram que a necessidade de preservação dos direitos fundamentais à moradia, à saúde e à isonomia, sob o viés da dignidade da pessoa humana, em uma realidade emergencial e transitória, ampara a possibilidade de proteção do bem de família do fiador desse tipo de contrato. A conclusão é no sentido de que cabe ao Estado, destacando-se o papel do Judiciário, proteger grupos sociais vulneráveis em um cenário pandêmico, como fiadores de contratos locatícios residenciais que possam ser privados de suas moradias em decorrência de atos de constrição patrimonial que violam direitos fundamentais.
Palavras-chave: Penhora. Bem de família. Fiador. Locação residencial. Pandemia. Direitos fundamentais. Constitucionalização. Direito Civil.
Sumário
Introdução. 1 - A impenhorabilidade do bem de família. 2 - A proteção ao bem de família sob o viés da constitucionalização do Direito Civil. 3 - A exceção da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial. 3.1 - Recurso Extraordinário 407.688-8/SP. 3.2 - Recurso Extraordinário 605.709/SP. 4 - A necessidade de proteção do bem de família do fiador em contrato locatício residencial em um cenário de pandemia. Considerações finais. Referências.
Introdução
Em um cenário de crise sanitária e econômica desencadeado pela pandemia do vírus Covid-19, questões inerentes à responsabilidade patrimonial interessam diretamente a parcela significativa da população brasileira. Isso porque, diante de uma conjuntura de desemprego em alta, o instituto tem implicações reais na vida de devedores, especialmente daqueles que já se encontram vivendo em situação de vulnerabilidade social e econômica.
Segundo a Agência IBGE Notícias (DESEMPREGO, 2020), no segundo trimestre de 2020, período de avanço da epidemia do vírus Covid-19 pelo Brasil, o desemprego cresceu em 11 (onze) estados membros. Os dados, obtidos por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), revelaram a existência de 12,8 milhões de brasileiros desempregados. No período, o percentual de brasileiros em situação de desemprego (13,3%) mostrou-se 1,1 ponto percentual maior do que o índice registrado no primeiro trimestre do ano. Os dados são ainda mais expressivos no que tange ao número de desalentados1: 5,6 milhões de brasileiros, um aumento de 19,1% em relação ao primeiro trimestre de 2020.
Cabe ressaltar que, como consequência do mercado de trabalho ruim, a inadimplência tende a aumentar. Xxxxx et al. (2014, p. 643) explanam: “obrigação é o vínculo de direito material, e uma vez contraída a obrigação, uma parte (o devedor) tem o dever de satisfazer o direito da outra (do credor) sob pena de inadimplemento, o que gera a dívida”. E, uma vez surgida a obrigação, também desponta a possibilidade de responsabilização patrimonial, visto que o Código de Processo Civil (artigo 789) expressamente estabelece que, como regra geral, os bens presentes e futuros do devedor podem ser utilizados para adimplir a dívida (BRASIL, 2015a).
Nesse contexto, a impenhorabilidade do bem de família torna-se uma questão de direito novamente atual. O instituto jurídico, regulamentado pelos artigos 1.711 a 1.722 do Código Civil (BRASIL, 2002) e pela Lei 8.009, de 1990 (BRASIL, 1990), tem importante papel social, o que se torna ainda mais evidente em momentos de crise econômica. A proteção ao bem de família limita a responsabilidade patrimonial do devedor, com reflexos sobre as possibilidades de penhora. Assim, há um afastamento da regra geral do artigo 831 do Código de Processo Civil, segundo o qual, em uma execução por quantia certa, a penhora recairá sobre tantos bens quantos necessários para o pagamento do principal e acessórios (BRASIL, 2015a). Logo, ainda que a finalidade precípua da penhora seja garantir a execução, de modo a satisfazer o direito do credor (SANTOS, 2017), esse direito não é absoluto.
Entretanto, a impenhorabilidade do bem de família também não é absoluta, sendo uma das exceções mais polêmicas a descrita no inciso VII do artigo 3º da Lei 8.009/1990: a possibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação (BRASIL, 1990). Nesse cenário, ainda que o Supremo Tribunal Federal – STF já tenha declarado a
1 Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2020), desalentados são os que não procuraram trabalho, ainda que estejam disponíveis e queiram trabalhar, por acharem que não encontrariam.
constitucionalidade do referido artigo por meio do Recurso Extraordinário 407.688-8/SP (BRASIL, 2006), a jurisprudência da corte suprema sofreu uma inflexão significativa, em 2018. Na ocasião, por meio do Recurso Extraordinário 605.709/SP (BRASIL, 2018), não submetido à sistemática da repercussão geral, prevaleceu a tese de que o bem de família do fiador em contrato de locação comercial seria impenhorável.
Em razão do exposto e da atual conjuntura de crise sanitária e econômica desencadeada pelo vírus Covid-19, definiu-se o tema deste artigo científico: “penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial: uma revisitação do tema sob o viés da constitucionalização do Direito Civil em um cenário de pandemia”. Tal temática é relevante em termos científicos-acadêmicos, pois está em consonância com a necessidade de a produção científica no Direito estar alinhada às necessidades da população e à ocorrência de fenômenos externos às Ciências Jurídicas. Por meio da revisão bibliográfica, jurisprudencial e legislativa, buscou-se uma resposta ao problema de pesquisa: é cabível uma nova interpretação acerca da penhora do bem de família do fiador em contrato locatício residencial, diante do contexto vigente? O objetivo geral estabelecido foi buscar uma resposta ao referido problema que respeitasse as bases do ordenamento jurídico brasileiro e, portanto, estivesse alinhada à Constituição Federal. O objetivo específico foi abordar os principais conceitos jurídicos atrelados ao tema.
O artigo está dividido em quatro seções, além da introdução e das considerações finais. A primeira seção apresenta as especificidades do instituto jurídico da impenhorabilidade do bem de família. A segunda seção analisa tal instituto sob a ótica da constitucionalização do Direito Civil, conceito cujas particularidades também são tratadas no referido tópico. A terceira seção aborda a exceção da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial a partir do entendimento legal e jurisprudencial atualmente vigente. Por fim, a quarta seção responde o problema de pesquisa, sem desconsiderar os elementos das demais seções.
1 A impenhorabilidade do bem de família
Partindo-se do Direito Comparado, deve-se destacar que o marco histórico mais relevante para o que, hodiernamente, denomina-se bem de família no ordenamento jurídico brasileiro advém dos Estados Unidos da América – EUA. Foi no Texas, antes mesmo da incorporação aos EUA no ano de 1845, que uma lei denominada Homestead Exemption Act, de 26 de janeiro de 1839, estabeleceu as bases do instituto (GAGLIANO; XXXXXXXX XXXXX, 0000x). De acordo com Xxxxxx (2010), a referida norma teve impactos legislativos na maior
parte das unidades da federação nos EUA, onde se passou a preservar a pequena propriedade urbana ou rural da penhora. Dutra e Xxxxxxx (2017) pontuam que a promulgação do denominado Homestead Exemption Act teria advindo de uma séria crise econômica, sendo o intuito inicial a fixação de famílias no Estado do Texas, a partir do incentivo de que o pequeno imóvel rural estaria protegido de penhora, se destinado a servir de residência ao devedor.
Gagliano e Pamplona Filho (2020a) reforçam que, no Brasil, a redação original do Projeto de Código Civil de 1916 não contemplava o bem de família, embora uma Comissão Especial do Senado tenha tido o cuidado de inserir o tema na pauta de discussões, o que culminou na aprovação da Lei com os artigos 70 a 73, que passaram a disciplinar a matéria.
Para Xxxxxx (2017), apesar da incorporação ao ordenamento jurídico nacional do instituto pelo Código Civil de 1916, a proteção ao bem de família passou a gozar de baixa eficácia. Isso porque a previsão legal era de que a proteção não seria automática: cabia ao interessado dirigir-se ao Cartório de Imóveis onde o bem estivesse registrado e, então, solicitar a inscrição do imóvel como bem de família. O ato geraria a proteção do bem em relação a dívidas constituídas após a instituição, com exceção das tributárias. Para o autor, o disposto nos artigos 70 a 73 do Código de 1916 fez com que o instituto passasse a ter importância secundária, em razão da burocracia necessária à constituição do bem como de família e da inalienabilidade relativa prevista para tal espécie de bem. Assis (2009) também é partidário da tese de que as formalidades intrínsecas à instituição do bem de família desestimulavam o uso do instituto.
Antes mesmo do advento do Código Civil de 2002, porém, houve uma importante inflexão no que tange à regulamentação do instituto. Com a promulgação da Lei 8.009, de 29 de março de 1990, setenta e quatro anos após a instituição do bem de família voluntário no Brasil, surgiu uma nova modalidade de bem de família: o obrigatório. Tal modalidade passou a afastar a questão da falta de informação quanto à possibilidade de proteção do imóvel residencial dos atos de constrição patrimonial decorrentes da responsabilidade patrimonial do devedor (CREDIE, 2010). Nesse contexto, de acordo com Xxxxxxxx, Xxxxxx e Xxxxxx (2019), a Lei 8.009/1990, ao instituir o bem de família legal e proteger contra a penhora, assim, não apenas os imóveis eleitos e registrados, fez com que o instituto do bem de família voluntário perdesse a sua eficácia social.
O art. 1º da Lei 8.009/1990 (BRASIL, 1990) estabelece que o casal ou a entidade familiar terão o imóvel residencial próprio protegido contra qualquer tipo de dívida, salvo as exceções legais. Xxxxxxxx e Pamplona Filho (2020a) ressaltam justamente que não apenas a
família constituída pelo casamento, mas também as entidades familiares, beneficiam-se do instituto. Credie (2010) ressalta que o termo entidade familiar, utilizado na regulamentação do bem de família ex lege, abrange, para fins de alcance do instituto, não apenas a união estável e a família monoparental, como também, de acordo com corrente jurisprudencial de peso, a pessoa solteira, divorciada, separada ou viúva. Nesse cenário, cita-se a Súmula nº. 364 do Superior Tribunal de Justiça, por meio da qual se pacificou que “o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas” (BRASIL, 2008).
Também é pertinente mencionar que, segundo a Súmula nº. 486 do Superior Tribunal de Justiça, “é impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família” (BRASIL, 2012). Diante dessa conjuntura, é interessante pontuar que o STJ tem ampliado a proteção do bem de família (XXXXXXXX; TOLEDO; SANTOS, 2019).
Ademais, como a Lei 8.009/1990, por meio do artigo 1º, parágrafo único, protege os equipamentos e os móveis que guarnecem a casa, desde que quitados (BRASIL, 1990), também cabe delimitar a extensão dessa proteção. De acordo com Xxxxxxxx e Pamplona Filho (2020a), o parâmetro para a qualificação de tais itens como bens de família deve ser a existência do suficiente para um convívio familiar digno. Para os autores, a jurisprudência pátria entende que isso vai além do indispensável para a subsistência, embora não signifique a existência de luxos.
Avançando nas especificidades da impenhorabilidade do bem de família, deve-se salientar que, embora o bem de família legal tenha passado a ser a regra no ordenamento jurídico brasileiro, o instituto do bem de família convencional, antes previsto no Código Civil de 1916, continua a existir e passou a ser regulamentado pelo Código Civil de 2002, em seus artigos 1.711 a 1.722 (BRASIL, 2002). Para a instituição dessa espécie de bem de família, é exigida forma especial de manifestação de vontade – escritura pública ou testamento –, elemento essencial à validade do negócio jurídico em razão de previsão legal, sendo que a constituição ocorre com o registro do título no registro imobiliário (AZEVEDO, 2019).
Acerca da principal diferença entre os dois regimes de impenhorabilidade do bem de família atualmente vigentes no Brasil, Assis (2009, p. 23) esclarece:
Importa realçar que à Lei 8.009/1990 não interessa a qualidade e o valor da moradia. [...] O art. 1.711, caput, do Código Civil de 2002, porém, limitou o valor dos bens subtraídos voluntariamente à execução, incluindo o imóvel, a um terço do patrimônio líquido existente por
ocasião do ato. Nada obstante, a impenhorabilidade da residência familiar, de acordo com a Lei 8.009/1990, alcança tanto o casebre quanto o palácio.
Portanto, a instituição do bem de família voluntário ou convencional (decorrente da vontade da parte) pode ser utilizada para proteger o imóvel residencial de maior valor em face da possibilidade de penhora, afastando-se, desse modo, a regra geral de proteção do imóvel residencial de menor valor (ARAÚJO, 2017). Xxxxxxxx e Xxxxx (2016) concordam que essa seja uma das principais vantagens advindas da instituição do bem de família voluntário: a possibilidade de eleição do bem mais valioso como aquele que será protegido pela impenhorabilidade, considerando-se a existência de mais de um imóvel que sirva como residência familiar.
2 A proteção ao bem de família sob o viés da constitucionalização do Direito Civil
A Lei 8.009/1990, ao visar à proteção do bem de família legal, simplesmente estaria protegendo o direito à moradia previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 19882. O fato está em consonância com a preservação da dignidade da pessoa humana3 pois, quando se fala em dignidade do ser humano no âmbito das relações privadas, inerentemente discute-se o direito à moradia e, ademais, o direito à casa própria. Nesse sentido, tal opção legislativa está em conformidade com a tendência de valorização da pessoa e também promove a solidariedade elencada no artigo 3º, inciso I, da CF/884. Afinal, o Direito Civil contemporâneo confere à ideia de patrimônio uma nova dimensão, calcada na proteção da pessoa como o centro do Direito privado, o qual passa por um processo de constitucionalização (TARTUCE, 2019).
2 Segundo o artigo 6º da CF/88, “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988).
3 Um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, conforme o artigo 1º, inciso III, da CF/88 (BRASIL, 1988).
4 A construção de uma sociedade livre, justa e solidária é um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988).
Os ramos do direito infraconstitucional – como o Direito Civil, o Direito Administrativo, o Direito Penal e o Direito do Trabalho, entre outros – tiveram matérias suas de variados graus de relevância abordadas na Constituição Federal de 1988. Tal circunstância dialoga com a constitucionalização do Direito, visto que a existência dessa espécie de norma na Carta Magna limita a atuação do legislador e estabelece parâmetros para o Poder Judiciário proceder à interpretação do tema constitucionalizado (BARROSO, 2020).
A constitucionalização do direito infraconstitucional deriva de um movimento translativo ocorrido em diversos países por meio do qual as constituições passaram a ocupar a centralidade dos sistemas jurídicos. No Brasil, a partir de 1988, a Lei Suprema passou a gozar não apenas de supremacia formal. A força normativa da Constituição Federal, em um contexto de abertura do sistema jurídico e de valorização dos princípios constitucionais, tem sido verificada na existência de uma supremacia material e axiológica. Nesse contexto, o fenômeno da constitucionalização representa alçar a Constituição ao centro da ordem jurídica, não apenas de forma a validar a ordem infraconstitucional, como também estabelecendo parâmetros de interpretação para todas as normas do ordenamento. Assim, aos Poderes Legislativo e Executivo passam a serem impostos limites e deveres positivos para a consecução dos fins constitucionais. Paralelamente, ao Poder Judiciário, passa a ser cogente a utilização de técnicas interpretativas, entre as quais a interpretação conforme a Constituição da norma infraconstitucional, de modo a preservar valores e fins constitucionais (BARROSO, 2020).
Nesse cenário, para Fachin (2009), o Direito Civil brasileiro contemporâneo parte da premissa de que os direitos fundamentais devem ser parâmetros de análise das relações estabelecidas entre particulares de modo direto e imediato. O autor defende que a doutrina e a jurisprudência pátrias, no âmbito cível, não devem estar atreladas a dogmatismos positivistas rígidos, visto que a análise de casos concretos deve estar alinhada à construção de uma sociedade justa, em que os direitos fundamentais sejam respeitados.
A dignidade da pessoa humana passa a ser entendida como valor supremo do sistema jurídico, o que acarreta o surgimento de novos vetores de interpretação dos institutos jurídicos de direito privado. No Direito Civil, institutos basilares da disciplina tornam-se subordinados à dignidade da pessoa humana – a exemplo da propriedade, do contrato e da responsabilidade civil –, em uma lógica em que os direitos fundamentais possuem eficácia direta e imediata sobre as relações privadas. Desse modo, o Direito Civil adquire um viés emancipatório, que supera
dicotomias antigas acerca dos limites entre direito público e direito privado (FACHIN; PIANOVSKI, 2008).
Destarte, a relação entre o instituto cível da impenhorabilidade do bem de família e a proteção ao direito fundamental à moradia é uma vertente do assunto a ser estudada. De acordo com Xxxxxx (2009/2010), embora o direito fundamental à moradia somente tenha sido positivado na ordem constitucional a partir da Emenda Constitucional nº. 26 de 2000,
[...] sempre haveria como reconhecer um direito fundamental à moradia como decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal), já que este reclama, na sua dimensão positiva, a satisfação das necessidades existenciais básicas para uma vida com dignidade, podendo servir até mesmo como fundamento direto e autônomo para o reconhecimento de direitos fundamentais não expressamente positivados, mas inequivocamente destinados à proteção da dignidade. (SARLET, 2001 apud SARLET, 2009/2010, p. 12).
De todo modo, a introdução expressa do direito à moradia como direito fundamental de cunho social no texto constitucional refletiu o posicionamento do Estado brasileiro no plano internacional, visto que o referido direito está elencado na Declaração Universal dos Direitos Humanos5 e no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais6. Cabe ressaltar que o direito à moradia possui duas dimensões: a negativa e a positiva. Para os fins deste artigo, destaca-se a primeira dimensão, que tem o sentido de defesa, de proteção do indivíduo contra arbitrariedades que o privem do direito a uma moradia digna. Assim, a impenhorabilidade do bem de família prevista na Lei 8.009/1990 está em consonância com tal dimensão (XXXXXX; BRANCO, 2020).
A limitação da responsabilidade patrimonial do devedor em prol do direito fundamental à moradia, portanto, é um exemplo de constitucionalização do Direito Civil, de modo a assegurar a dignidade da pessoa cujo patrimônio possa ser objeto de constrição, assim como a dignidade de sua família. Xxxxx e Xxxxxxx (2017), inclusive, associam o direito à moradia como decorrente do princípio da proteção à família, previsto no artigo 226 da Carta Magna7. Nesse contexto, é necessário ressaltar a importância do instituto do bem de família não apenas para o ordenamento jurídico nacional, como para a sociedade brasileira como um todo.
Diante do exposto, deve-se sempre considerar que o exercício do poder econômico e social está cada vez mais presente nas relações civis entre particulares. Logo, ainda que se tenha
5 A Declaração Universal dos Direitos Humanos faz menção ao direito à moradia em seu artigo 25 (ONU, 1948). 6 O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais faz menção ao direito à moradia em seu artigo 11 (ONU, 1966).
7 A Constituição Federal de 1988 considera a família a base da sociedade e objeto de proteção especial do Estado (BRASIL, 1988).
convencionado nomear de eficácia horizontal a eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre agentes privados, na prática, são comuns relações entre atores privados marcadas pela assimetria de poder. Tal desequilíbrio, inclusive, pode ser mais nítido do que aquele observado nas relações entre o Estado e os particulares, em que vigora a denominada eficácia vertical dos direitos fundamentais. De todo modo, a efetiva aplicação de direitos fundamentais nas relações privadas tende a ocorrer por meio de um agente estatal, sendo o Judiciário o responsável por solucionar controvérsias de tal ordem (SARLET, 2012). E, no âmbito deste trabalho, importa uma controvérsia específica no que tange à constitucionalização do Direito Civil: a possibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial.
3 A exceção da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial
A Lei 8.009, de 29 de março de 1990, elenca um rol de exceções à regra geral de impenhorabilidade do bem de família nos incisos de seu artigo 3º. Para os fins deste trabalho, importa destacar a exceção descrita no inciso VII do referido artigo: a possibilidade de penhora do bem de família do fiador no âmbito de um contrato de locação (BRASIL, 1990). Tal exceção foi incluída na lei em comento pela Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991, a qual dispõe acerca das locações dos imóveis urbanos, assim como dos procedimentos a elas pertinentes. Essa segunda norma – conhecida como Lei do Inquilinato – determinou, em seu artigo 82, a introdução do mencionado dispositivo na lei anterior (BRASIL, 1991).
Em termos genéricos, um contrato de locação é um negócio jurídico por meio do qual o locador, mediante contraprestação remuneratória, fornece ao locatário, por determinado período, a utilização de coisa não fungível (locatio rei), a execução de obra específica (locatio operis faciendi) ou a prestação de serviço (locatio operarum). No entanto, pela atual sistemática do Código Civil em vigência, a empreitada e a prestação de serviços passaram a constituir espécies contratuais autônomas8. Consequentemente, o termo contrato de locação passou a ser associado apenas à locação de coisas. Tal espécie de contrato normalmente se protrai no tempo (contrato de execução continuada), prevê obrigações recíprocas (sinalagmático) e é oneroso (TARTUCE, 2020).
No que tange à locação de imóveis urbanos, entretanto, há um microssistema jurídico próprio, a já citada Lei 8.245/1991, a qual estabelece não apenas normas de direito material (inclusive no âmbito penal), como também normas de direito processual. Tal espécie de
8 O Código Civil de 2002 disciplina a locação de coisas do artigo 565 ao artigo 578, a empreitada do artigo 610 ao artigo 626 e a prestação de serviços do artigo 593 ao artigo 609 (BRASIL, 2002).
contrato de locação tem como finalidade prover ao locatário e sua família habitação, ou propiciar o desenvolvimento de atividades econômicas, tanto no comércio e na prestação de serviços, quanto na indústria (há ainda a possibilidade de oportunizar o desenvolvimento de atividades sem fins lucrativos). Assim, essa espécie de locação possui características básicas próprias, as quais não se restringem àquelas decorrentes do regime geral estabelecido pelo Código Civil (LÔBO, 2020).
Quanto ao contrato de fiança, trata-se de negócio jurídico por meio do qual o fiador, com o seu próprio patrimônio, garante dívida que originalmente não contraiu, passando assim a assumir a responsabilidade patrimonial por dívida alheia9. A fiança representa modalidade de garantia pessoal (ou fidejussória), o que significa que são os bens do fiador que asseguram o crédito. Desse modo, o credor constitui o outro polo do contrato (a participação de quem contraiu a dívida não é obrigatória). Entre as características dessa espécie de contrato, destacam-se a unilateralidade, visto que a apenas uma das partes é imposta obrigação, assim como a acessoriedade, pois está atrelada a um contrato principal, a exemplo de um contrato de locação (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2020b). A propósito, cabe mencionar que a Lei 8.245/1991 (artigo 37 e incisos) expressamente elenca a fiança como uma das modalidades de garantia passíveis de serem exigidas pelo locador, assim como a caução, o seguro de fiança locatícia e a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (BRASIL, 1991).
Xxxxxxx (2013, p. 5) explicita o entendimento quanto à responsabilidade do fiador:
[...] até o vencimento da obrigação a dívida deverá ser exigida do devedor, e não do fiador; esse somente poderá ser responsabilizado se e quando o devedor (rectius, afiançado) não efetuar o pagamento prometido, pois desse fato é que nasce a sua responsabilidade. É por essa razão, por exemplo, que nos contratos de locação de imóveis urbanos até o vencimento os aluguéis devem ser exigidos do inquilino, mas não do fiador, cuja responsabilidade surgirá logo que a dívida vença e não seja cumprida pelo devedor principal.
No que tange à importância social do contrato de fiança, Xxxxxxxxxx (2010) ressalta que o instituto permite que cidadãos cujo patrimônio não seja significativo possam ser inseridos na cadeia econômica referente ao fluxo de bens e serviços. Para o autor, a difusão da fiança no mercado locatício exemplifica o fato.
3.1 Recurso Extraordinário 407.688-8/SP
9 Segundo o artigo 818 do Código Civil: “Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra” (BRASIL, 2002).
Esse, aliás, foi o entendimento predominante quando do julgamento do Recurso Extraordinário 407.688-8/SP, cujo acórdão foi proferido em 2006. Na ocasião, por meio do controle difuso de constitucionalidade, declarou-se que o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/1990 – o qual dispõe acerca da possibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação – não viola a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2006).
Xxxxxx e Branco (2020) ressaltam os seguintes pontos do entendimento majoritário firmado no RE 407.688-8/SP: o dispositivo legal em análise não afronta o direito à moradia; o referido direito, cujas possibilidades de execução são múltiplas, não é sinônimo de direito à propriedade. Já Xxxxxx (2012), ao sintetizar os argumentos que prevaleceram nesse julgado paradigmático, acrescenta os seguintes tópicos: o ato de o fiador voluntariamente dar o seu imóvel em garantia está em consonância com a dimensão não individual do direito à moradia, assegurando tal direito em uma escala mais ampla; a eventual impossibilidade de penhora do bem dado em garantia e a falta de outras garantias acarretaria prejuízo ao próprio direito de moradia, devido à provável diminuição na oferta de imóveis disponíveis para locação.
No voto do relator, Ministro Xxxxx Xxxxxx, consignou-se que a própria ratio legis da exceção descrita no dispositivo em comento seria a preservação do direito social à moradia. Nas razões do voto, destacou-se que uma das principais dificuldades da população brasileira no acesso ao mercado de locação predial advém da inexistência, da insuficiência e da onerosidade de garantias que possam resguardar os proprietários de imóveis disponíveis para aluguel. O relator também destacou que os fiadores não são obrigados a firmarem o contrato de fiança e que a decretação de inconstitucionalidade do artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/1990 acarretaria o rompimento do equilíbrio do mercado. Isso porque, segundo a lógica adotada, outras garantias mais dispendiosas passariam a ser sistematicamente exigidas nos contratos de locação residencial (BRASIL, 2006).
Assis (2009) destaca no voto do Ministro Xxxxxx a menção ao fato de a obrigação de fiança ter sido voluntariamente assumida pelo fiador. Para o jurista, a autonomia privada deve ser preservada nesse tipo de contrato, sob pena de o espírito coletivo ser instado a promover a irresponsabilidade social. Em seu entendimento, não é adequado iludir os outros, prestando-se garantia que não será honrada em caso de necessidade.
Xxxxxxx (2013) também adota tal raciocínio. Para o civilista, a proteção ao fiador não deve prevalecer em detrimento da proteção ao credor (locador), que tem pleno direito de cobrar a dívida em razão do princípio da autorresponsabilidade. De acordo com a sua avaliação, se
vigoram a autorresponsabilidade e a isonomia nas relações jurídicas, a dignidade do credor deve ser resguardada por meio da constrição do imóvel dado voluntariamente em garantia.
Porém, apesar do entendimento majoritário explicitado no voto do Ministro Xxxxxx, o Recurso Extraordinário 407.688-8/SP não foi julgado por unanimidade. Os Ministros Xxxxxx Xxxxxx, Xxxxx xx Xxxxx e Xxxx Xxxx, vencidos, votaram no sentido de declarar a impossibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação. Em resumo, a divergência foi sustentada pelo argumento de “[...] que a moradia é necessidade vital do trabalhador e de sua família, cuidando-se, portanto, de direito indisponível e não sujeito a expropriação via penhora embasada em contrato de fiança” (SARLET; XXXXXXXX; XXXXXXXXX, 2019, p. 655).
O Ministro Xxxx Xxxx, ademais, alegou que a penhora do bem de família do fiador representaria ofensa ao princípio da isonomia, pois não há previsão legal de penhora do bem de família do afiançado. Para o Ministro, eventualmente, poderia haver o descumprimento proposital da obrigação de pagar o aluguel com o intuito de o locatário poupar para a quitação de prestações referentes à aquisição da casa própria (BRASIL, 2006). Nesse contexto, Xxxxxxxxxx (2010) sugere que o princípio da isonomia poderia ser resguardado, nesse tipo de situação, caso fosse adotada uma interpretação extensiva das exceções elencadas no artigo 3º da Lei 8.009/1990, de modo a permitir ao fiador recompor o seu patrimônio por meio da execução do imóvel do locatário. O próprio autor, no entanto, reconhece a existência de obstáculos nesse tipo de interpretação, em especial quando se considera que, geralmente, não é possível a interpretação extensiva de normas restritivas de direito.
Nessa mesma conjuntura, Gagliano e Pamplona Filho (2020a) entendem que, sob a ótica do Direito Civil Constitucional, a exceção prevista no artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/1990 viola o artigo 5º da Constituição Federal10, justamente porque o princípio da isonomia não estaria sendo respeitado. Para os civilistas, a natureza acessória do contrato de fiança não é condizente com a possibilidade de penhora do bem de família do fiador, especialmente quando se considera que o bem de família do locatário não está sujeito à constrição patrimonial.
Tartuce (2019) também interpreta que o entendimento que prevaleceu no julgamento do Recurso Extraordinário 407.688-8/SP viola o princípio constitucional da isonomia. O autor cita, ademais, a violação ao direito à moradia e ao princípio da razoabilidade, interpretando como
10 Segundo o caput do artigo 5º da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]” (BRASIL, 1988).
inadequado o tratamento diferenciado dispendido ao fiador e ao locatário. Como agravante, também considera como contestável o argumento de que o acesso a habitação alugada seria estimulado e facilitado diante da possibilidade de penhora do bem de família daquele que prestasse fiança. Para Tartuce, em razão de tal possibilidade, poucos se prestam a serem fiadores em contratos de locação.
Em complemento a tal raciocínio, cabe citar que, para Credie (2010), já que o objetivo do legislador era facilitar as locações em geral, o ideal seria impor a fiança bancária como garantia a esse tipo de contrato. Assim, o bem de família do fiador estaria preservado e o aumento na contratação desse tipo de serviço bancário faria com que as taxas diminuíssem, o que vai de encontro ao argumento de se tratar de serviço de alto custo.
3.2 Recurso Extraordinário 605.709/SP
Diante dessa conjuntura, uma vez exploradas as peculiaridades do Recurso Extraordinário 407.688-8/SP, torna-se necessário citar a evolução jurisprudencial proveniente do julgamento do Recurso Extraordinário 605.709/SP. Em junho de 2018, quando a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal analisou o caso (não submetido à sistemática da repercussão geral), venceu a tese de que o bem de família do fiador em contrato de locação comercial é impenhorável. Na ocasião, prevaleceu a divergência suscitada pela Ministra Xxxx Xxxxx (os Ministros Xxxx Xxx e Xxxxx Xxxxxxx acompanharam-na). A divergência foi no sentido de que o direito fundamental à moradia do fiador não pode ser prejudicado, nesse tipo de contrato, em benefício da livre iniciativa (embora a legislação não faça distinção entre as duas espécies de locação no que tange à possibilidade de penhora do bem de família do fiador). Foram vencidos o Ministro relator Xxxx Xxxxxxx e o Ministro Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, partidários das teses de que: conquanto o direito à moradia dos locatários não esteja em discussão, a impenhorabilidade do bem de família em contrato de locação comercial restringiria a livre iniciativa; paralelamente, a possibilidade favorável à penhora teria o condão de estimular o empreendedorismo, de modo que os locatários de imóveis comerciais possam firmar contratos em bases mais favoráveis (SARLET; XXXXXXXX; XXXXXXXXX, 2019).
Nas palavras da Ministra Xxxx Xxxxx, que levantou a divergência (BRASIL, 2018, p.
36):
A imposição de limites à penhora de certos bens constitui conquista civilizatória, endereçada a assegurar o mínimo existencial. Admitir a penhora de bem de família para satisfazer débito decorrente de locação comercial, em nome da promoção da livre
iniciativa, redundaria, no limite, em solapar todo o arcabouço erigido para preservar a dignidade humana em face de dívidas.
Portanto, embora a livre iniciativa11 seja um dos fundamentos da República Federativa do Brasil – artigo 1º, inciso IV da CF – e um dos fundamentos constitucionais da ordem econômica – artigo 170 da CF – (BRASIL, 1988), no julgamento do RE 605.709/SP o amparo constitucional do instituto não foi suficiente, nos termos da divergência, para justificar a penhora do bem de família do fiador em contrato de locação comercial.
Nesse contexto, embora o fato não signifique uma superação do decidido no RE 407.688-8/SP, o julgado de 2018 do STF abre margem para que a Corte revise, ao menos em parte, a jurisprudência até então consolidada acerca da possibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2019). O acórdão proferido quando do julgamento do RE 605.709/SP pode dar ensejo a uma reabertura do contraditório no âmbito do problema, de modo a propiciar não apenas uma readequação da jurisprudência do STF, como também acionar uma revisão do entendimento do STJ12, assim como das demais instâncias no que tange à matéria. Tal readequação, ainda que parcial, pode ser no sentido de assegurar a proteção do bem de família dado em garantia em contrato de locação residencial nos casos nos quais o imóvel objeto de constrição patrimonial sirva de moradia à família do fiador, não existindo alternativa para realocá-la dignamente (SARLET, 2018).
4 A necessidade de proteção do bem de família do fiador em contrato locatício residencial em um cenário de pandemia
A partir do contexto relatado nas seções anteriores, buscar-se-á analisar o porquê da necessidade de, em um cenário de pandemia, proteger o bem de família do fiador em um contrato de locação residencial. Antecipadamente, já se adianta que a retórica a ser desenvolvida terá como base a promoção do princípio constitucional da isonomia e, consequentemente, também o princípio da dignidade da pessoa humana, já abordados. Isso porque o cenário de pandemia desencadeado pelo vírus Covid-19 afetou toda a sociedade. Porém, enquanto locatários foram legalmente protegidos da situação de vulnerabilidade que
11 Para Barroso (2020), a livre iniciativa, em conjunto com o princípio da autonomia da vontade, acarreta a possibilidade de os cidadãos promoverem o desenvolvimento de qualquer atividade (desde que não haja vedação pela ordem jurídica), em um cenário em que vigoram a liberdade de contratação, a propriedade privada e as relações jurídicas amparadas no consenso entre as partes.
12 Em 2015, o STJ editou a Súmula 549, segundo a qual: “é válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação” (BRASIL, 2015b).
uma eventual liminar de despejo decorrente do inadimplemento do aluguel pudesse ocasionar
– vide a Lei 14.010 de 2020 (BRASIL, 2020a), cujas peculiaridades serão adiante expostas –, a referida legislação não veio a proteger o bem de família do fiador em contratos do gênero.
O fato se torna ainda mais questionável quando se ressalta que a fiança é um contrato acessório e que embora direito à moradia não seja sinônimo de direito à propriedade, o ato de constrição patrimonial em um período pandêmico pode colocar o fiador que reside no imóvel penhorado em uma situação de vulnerabilidade social. Em um momento em que as autoridades de saúde pública recomendam aos cidadãos ficarem em suas casas, privar o fiador de sua residência representa uma afronta potencial não apenas ao direito à moradia, como também ao direito à saúde, igualmente previsto no rol dos direitos sociais elencados no artigo 6º da Constituição Federal (BRASIL, 1988), em um evidente prejuízo à dignidade da pessoa humana.
Inicialmente, cabe destacar que, tão logo a pandemia do vírus Covid-19 tornou-se uma realidade no Brasil, diversos projetos de lei no âmbito federal surgiram com o intuito de assegurar a proteção contra ordens de despejo. Essa conjuntura está em consonância com a constitucionalização do Direito Civil, pois tais iniciativas do Poder Legislativo federal buscavam afastar a aplicabilidade de institutos de direito privado em prol da preservação de direitos fundamentais, os quais possuem eficácia horizontal nas relações entre atores privados.
O XX 000/0000, de autoria do deputado federal Xxxx Xxxxxx, do Partido dos Trabalhadores (PT/SE), surgiu a partir da propositura de alterar o Código de Processo Civil, de modo a, uma vez declarada uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde – OMS, autorizar por tempo indeterminado, independentemente do motivo, a suspensão do cumprimento de ordens de despejo e remoções judiciais ou extrajudiciais, assim como o cumprimento de mandados de reintegração de posse. O autor do Projeto de Lei apresentou como justificativa o avanço da pandemia de Covid-19 (e também o eventual surgimento de futuras pandemias), cuja consequência está atrelada à remoção de populações economicamente vulneráveis de suas habitações, as quais caracterizou como já precárias. Para o deputado Xxxx Xxxxxx, com as ações de despejo, tais populações passam a estar mais vulneráveis ao vírus, frequentemente sujeitas à situação de rua, ou a espaços de habitação reduzidos, o que é incompatível com o isolamento de idosos e de outros grupos de risco (BRASIL, 2020b).
O XX 000/0000, de autoria do deputado federal Xxxxx Xxxxxxx, do partido Avante (MG), foi redigido a partir da busca pela promoção da suspensão, pelo período de 90 (noventa dias), do cumprimento de ordens de despejo referentes a locações de imóveis residenciais e
comerciais. Como justificativa, o deputado consignou que a pandemia de Covid-19 ocasionou impactos nos serviços de saúde, na assistência social e na economia. Por prever o comprometimento da renda de trabalhadores e de microempresários como consequência das medidas de distanciamento social e de quarentena, houve a propositura do referido PL. No texto do Projeto, ressaltou-se que a suspensão das ordens de despejo é favorável ao combate da emergência de saúde pública desencadeada pelo vírus, pois tal medida contribui “para o bem- estar e tranquilidade da população neste momento de necessário isolamento social, ao passo que também coopera para impedir o alastramento da doença” (BRASIL, 2020c).
Já o PL 1.090/2020, de autoria da deputada federal Xxxxx xx Xxxxxxx, do Partido dos Trabalhadores (PT/RS), foi criado para propor a suspensão da execução das ordens de despejo durante toda a vigência de eventual declaração de estado de emergência ou calamidade pública nos casos nos quais os imóveis servissem como residência ou fossem utilizados em atividades vinculadas à subsistência. Diante da situação extraordinária com diversos impactos na atividade econômica, a deputada citou a teoria da imprevisão na justificativa do PL, assim como a preservação do direito à moradia e também do direito ao trabalho, visto que muitos empreendedores pagam aluguel para manterem seus estabelecimentos em funcionamento (BRASIL, 2020d).
Também cabe elencar outros projetos de lei que surgiram no âmbito do Poder Legislativo federal e que tratam da mesma matéria – suspensão das ordens de despejo durante o período de pandemia –, visto que, embora cada uma das seguintes iniciativas legislativas contenha as suas próprias peculiaridades, as justificativas apresentadas por seus respectivos parlamentares autores foram bastante similares e dialogam com as justificativas dos projetos descritos nos parágrafos anteriores, sendo eles: (i) PL 1.684/2020, de autoria do deputado federal Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, do Partido dos Trabalhadores – PT/SP (BRASIL, 2020e); (ii) PL 1.784/2020, de autoria do deputado federal Xxxxx Xxxxxxxx, do Partido dos Trabalhadores – PT/SP (BRASIL, 2020f); (iii) PL 1.902/2020, de autoria da deputada federal Xxxxxx Xxxx, do Partido dos Trabalhadores – PT/PI (BRASIL, 2020g); (iv) PL 1.975/2020, de autoria da deputada federal Xxxxxxx Xxxxxxxxx, do Partido dos Trabalhadores – PT/RN (BRASIL 2020h); e (v) PL 2.093/2020, de autoria do deputado federal Xxxxxx Xxxxxx, do Partido Progressista – PP/SP (BRASIL, 2020i).
Porém, diante dessa conjuntura, um projeto legislativo em específico deve ser destacado: o Projeto de Lei 1.179/2020, de autoria do senador Xxxxxxx Xxxxxxxxx, do Partido
Social Democrático (PSD/MG). A iniciativa tratava da criação de um Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) como resposta à pandemia do vírus Covid-19. De caráter abrangente, o PL dispunha acerca do estabelecimento de um regime jurídico suis generis que durasse de 20 de março de 2020 a 30 de outubro de 2020. Tal regime abrangeria diversos tópicos no âmbito do Direito Privado, tais como: resilição, resolução e revisão de contratos; usucapião; condomínios edilícios; direito de família e sucessões; e locações de imóveis urbanos – tópico especialmente relevante para os fins deste artigo. De modo geral, o RJET flexibilizava a aplicação de diversos institutos jurídicos, inclusive por meio da suspensão da aplicação de determinadas normas legais (BRASIL, 2020j).
Na justificativa do referido PL, o senador Xxxxxxxxx citou que os parlamentos de outros países de destaque no cenário internacional, a exemplo da Alemanha e dos Estados Unidos, aprovaram medidas legislativas em diversas áreas do Direito, inclusive no âmbito do Direito Privado, com o intuito de viabilizar a preservação das relações jurídicas e a proteção dos vulneráveis em um cenário de pandemia. Também se citou o caráter emergencial da crise desencadeada pelo vírus Covid-19 e a transitoriedade do regime jurídico proposto, o qual seria uma resposta a um panorama de caso fortuito ou de força maior. O senador ressaltou que o PL foi elaborado a partir do auxílio de professores e juristas de instituições renomadas – a exemplo da Universidade de São Paulo e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – e que a iniciativa contou com o envolvimento de autoridades como o então presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Xxxx Xxxxxxx, e o ministro do Superior Tribunal de Justiça Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx. Ainda na justificativa, ponderou-se que o PL asseguraria um adequado equilíbrio nas relações privadas por meio da ponderação de interesses, sem deixar de proteger segmentos vulneráveis da população, tendo sido citados especificamente os locatários urbanos que supostamente pudessem sofrer restrições ao direito à moradia (BRASIL, 2020j).
Após o devido trâmite legislativo, o PL 1.179/2020 deu origem à Lei 14.010 de 2020, já mencionada no início desta seção. A referida norma foi publicada no Diário Oficial da União em 12 de junho de 2020. No entanto, o capítulo VI da Lei, o qual trataria das locações de imóveis urbanos, em um primeiro momento tornou-se ineficaz, tendo em vista o único artigo do capítulo aprovado pelo Congresso Nacional (artigo 9º) ter sido vetado pelo presidente da República Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Tal artigo estabelecia a vedação de concessão de liminar (até 30 de outubro de 2020), em ações de despejo, para a desocupação de imóvel nas hipóteses originariamente previstas no artigo 59, § 1º, incisos I, II, V, VII, VIII e IX, da Lei nº 8.245 de
1991 – a qual dispõe acerca das locações dos imóveis urbanos e dos procedimentos a elas pertinentes (legislação também já mencionada) (BRASIL, 2020a).
Para os fins deste trabalho, cabe ressaltar o conteúdo do artigo 59, § 1º, inciso IX, da Lei nº 8.245 de 1991, cuja aplicabilidade teria sido suspensa desde o estabelecimento do RJET se o veto presidencial não tivesse ocorrido. Segundo tal dispositivo, a liminar de despejo pode ser concedida nos casos em que não ocorra a quitação do aluguel e acessórios locatícios na data de vencimento, e estando o contrato desprovido de uma das garantias enumeradas no artigo 37 (caução, fiança, seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento), uma vez que não tenha havido contratação prévia, a garantia tenha sido extinta ou tenha havido pedido de exoneração, independentemente do motivo (BRASIL, 1991).
Na mensagem nº 331, encaminhada ao presidente do Senado Federal, o Presidente da República Xxxx Xxxxxxxxx, após ter ouvido o Ministério da Justiça e Segurança Pública, comunicou o veto ao artigo 9º da lei que estabeleceu o RJET (outros dispositivos da mesma norma também foram vetados na ocasião). Nas razões do veto, consignou-se que a proibição da concessão de liminar nas ações de despejo seria contrária ao interesse público. Na visão da Presidência, a proteção em excesso do devedor por meio da suspensão de um instrumento de coerção ao pagamento (o despejo), por um período considerado longo, representaria um estímulo ao inadimplemento e um desprezo à realidade de locadores que necessitam dos aluguéis como fonte única ou complementar de renda (BRASIL, 2020k). Entretanto, o Congresso Nacional rejeitou o veto ao dispositivo em análise (no total, houve a rejeição ao veto de quatro artigos da Lei 14.010 de 2020), conforme nova publicação ocorrida no Diário Oficial da União em 8 de setembro de 2020, quase três meses após o início da vigência do RJET (BRASIL, 2020l).
Desse modo, ainda que por um curto período, de 8 de setembro de 2020 a 30 de outubro de 2020 (prazo limite previsto na própria Lei 14.010 de 2020), criou-se um cenário jurídico no Brasil em que se suspendeu a possibilidade de concessão de liminar de despejo em caso do não pagamento do aluguel e acessórios quando o contrato de locação não estivesse resguardado por uma das garantias legais – conforme já exposto, a fiança é a garantia legal mais praticada no mercado imobiliário. Paralelamente, continuou vigente a possibilidade de penhora do bem de família do fiador em um contrato locatício residencial resguardado pela respectiva modalidade de garantia. Sob a ótica da constitucionalização do Direito Civil e da promoção do princípio da isonomia, tal conjuntura deve ser problematizada, especialmente quando se considera que
fiadores dessa espécie de contrato também estão sujeitos aos efeitos da pandemia, muito embora não tenham sido contemplados pelo regime jurídico emergencial e transitório criado.
Nesse contexto, defende-se que a não inclusão, no Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado, de mecanismos de proteção ao bem de família do fiador de contrato locatício residencial representa uma omissão legislativa importante, sobretudo quando se considera a importância da fiança como garantia no âmbito do sistema de locação de imóveis brasileiro. Logo, considera-se ser um caso típico em que o Poder Judiciário poderia vir a suprir essa lacuna legislativa por meio de decisões judiciais. Aliás, cabe destacar que, para Xxxxxxx (2009, p. 14), “normalmente ele [o ativismo judicial] se instala em situações de retratação do Poder Legislativo, de um certo deslocamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva”.
O conceito de ativismo judicial está atrelado ao exercício, pelo Poder Judiciário, da função jurisdicional de modo a extrapolar os limites originariamente impostos pelo ordenamento estatal na separação de poderes. Tal extrapolação acarreta uma incursão no núcleo essencial da função atribuída constitucionalmente ao Poder Legislativo: legislar. O fenômeno ocorre quando o juiz intérprete-aplicador, diante de inconsistências e lacunas legais típicas do positivismo jurídico e orientado pela importância dos princípios constitucionais e pelas possibilidades exegéticas existentes, não se submete passivamente à vontade do legislador. Tal fenômeno pressupõe a valorização de normas principiológicas em um sistema normativo axiologicamente orientado, onde valores e a moderna hermenêutica superam o positivismo clássico no processo decisório dos magistrados. Por meio de uma interpretação segundo a constituição vigente que supera os limites da textualidade, torna-se possível a ampliação dos sentidos das normas, de modo compatível com a ordem jurídica estabelecida (RAMOS, 2015).
Cabe ressaltar que o ativismo judicial é um fenômeno influenciado por fatores de natureza jurídico-cultural, institucional, social e política e verificado não apenas no Brasil, mas também em países como África do Sul, Alemanha, Canadá, Colômbia, Costa Rica, Estados Unidos e Itália. Constituindo uma tendência mundial, tal fenômeno tem reverberado em especial nas cortes constitucionais ou supremas, a exemplo do que ocorre no Brasil pós- promulgação da Constituição de 1988, onde o Supremo Tribunal Federal lidera o debate a respeito da temática – ainda assim, em território brasileiro o ativismo judicial também tem evoluído nas outras instâncias e no Superior Tribunal de Justiça (CAMPOS, 2014).
O ativismo judicial pressupõe uma expansão do papel político-institucional de magistrados e tribunais e normalmente ocorre quando o litígio versa acerca de questões morais ou políticas controversas, ou quando estão em pauta normas constitucionais de elevado grau de indeterminação semântica ou de grande carga axiológica. O fenômeno está associado à existência de práticas decisórias multifacetadas, resultantes da complexidade hermenêutica, das estruturas constitucionais e da dinâmica de funcionamento dos poderes (CAMPOS, 2014).
Assim, no âmbito decisório, o juiz deixa de ser apenas um executor dos comandos legais e se converte em um elaborador de normas jurídicas legítimas, cuja eficácia não é erga omnes, mas que representam a individualização e a concretização de enunciados normativos abstratos e gerais no contexto de resolução de casos concretos (COELHO, 2015). Xxxxxxx (2017) também interpreta a realidade dessa forma e afirma que não se restringe aos países de common law o fato de o juiz contemporâneo, no processo de criação do Direito, ser um coparticipante – em razão de uma imposição da realidade da vida e não de uma opção filosófica ou metodológica.
Tomando-se como base o referencial teórico acerca do ativismo judicial desenvolvido nos parágrafos anteriores, cabe afirmar que a possibilidade de extensão dos efeitos do RJET, no período em que o artigo 9º da Lei 14.010/2020 esteve vigente – de 8 de setembro de 2020 a 30 de outubro de 2020 –, ao fiador de contrato locatício residencial que se encontrasse sob a iminência de ter o seu bem de família penhorado seria factível. O magistrado que aplicasse o referido dispositivo dessa maneira ampliada, por meio de um exercício de hermenêutica jurídica, estaria promovendo uma interpretação conforme a Constituição Federal de 1988 de um regime jurídico excepcional que visava suspender a aplicabilidade de determinados institutos de direito privado, temporariamente. Afinal, o RJET não visava apenas manter o equilíbrio das relações privadas em um cenário pandêmico, mas também promover a dignidade da pessoa humana e em especial de grupos vulneráveis em um período atípico. E, nesse cenário, fiadores que residissem em imóveis objeto de penhora também estariam em situação de vulnerabilidade, embora não tenham sido expressamente contemplados pela legislação em comento.
Tal interpretação está em consonância com a preservação dos direitos fundamentais à moradia e à saúde. Em uma pandemia como a desencadeada pelo vírus Covid-19, um ato de constrição patrimonial de uma propriedade utilizada como residência pode privar fiadores de se protegerem adequadamente contra a doença, o que não é apenas um problema individual, mas também um problema coletivo, tendo em vista que o isolamento social é uma medida eficaz
e necessária para se evitar a circulação do vírus. Nesse contexto, deve-se destacar que direitos e princípios constitucionais possuem elevada carga axiológica e que especialmente os direitos fundamentais de cunho social – a exemplo do direito à moradia e do direito à saúde – possuem elevado grau de indeterminação semântica, o que confere legitimidade às decisões ativistas de magistrados que ampliem o sentido de legislações ordinárias em prol desses direitos.
O princípio constitucional da isonomia também deve ser ressaltado para justificar eventual decisão de cunho ativista ampliadora dos efeitos do RJET e protetora do bem de família de fiador de contrato locatício residencial contra os efeitos da penhora. Nesse sentido, o que estaria em discussão não seria uma superação do decidido no Recurso Extraordinário 407.688-8/SP. O foco seria a adaptação do regime suis generis estabelecido a uma realidade pandêmica que não afeta apenas locatários cujos contratos estejam desprovidos de garantias, mas também fiadores que viabilizam o bom funcionamento do sistema imobiliário no Brasil. Nesse ponto, deve-se destacar novamente que a fiança é um contrato acessório e que é questionável privar fiadores do direito à moradia e por extensão do direito à saúde, em um ambiente de pandemia, quando o legislador expressamente protegeu locatários (cujos contratos estivessem desprovidos de garantias) contra liminares de despejo.
Entretanto, tal conjuntura de ativismo judicial aplicado à temática deste artigo representa um exercício argumentativo plausível e não uma realidade com amparo na jurisprudência pátria. Conforme exposto anteriormente, o ativismo judicial encontra maiores possibilidades de ser praticado no STF, embora também ocorra em outras instâncias e no STJ. No entanto, não se localizou nenhum acórdão da corte constitucional que tratasse da matéria sob o viés analisado nesta seção. De todo modo, deve-se destacar a improbabilidade de que a pesquisa jurisprudencial revelasse acórdãos recentes da referida corte que estivessem alinhados à tese argumentativa defendida nos parágrafos anteriores. Dois são os motivos que justificam tal fato: (i) o artigo 9º da Lei 14.010, de 2020, o qual daria ensejo à proteção do bem de família do fiador em contrato de locação residencial por meio do ativismo judicial, teve sua vigência por um curto período, de 8 de setembro de 2020 a 30 de outubro de 2020; (ii) recursos dirigidos ao STF frequentemente levam anos para serem julgados, mas apenas se passaram alguns meses entre o fim do RJET e a redação desta seção do artigo.
Também se deve destacar que, no que tange a acórdãos de tribunais de segunda instância que pudessem dialogar com a temática em discussão, selecionou-se o TJSP para a realização de pesquisa jurisprudencial. A escolha pelo referido tribunal se deveu ao fato de o TJSP ser o
maior tribunal do país, o que poderia aumentar o espaço amostral da pesquisa, e ao fato de a corte estar localizada em um estado brasileiro de destaque no cenário econômico, o que também poderia maximizar o número de lides a serem analisadas. A busca focou apenas em acórdãos proferidos no período entre 8 de setembro de 2020 e 30 de outubro de 2020. Todavia, novamente a pesquisa jurisprudencial não evidenciou a existência de acórdãos alinhados aos interesses do artigo. Localizaram-se apenas julgados que aplicaram o artigo 9º da Lei 14.010 de 2020 em sua literalidade, protegendo contra ordem de despejo o locatário – a exemplo do acórdão de Agravo de Instrumento 2207213-44.2020.8.26.0000 (SÃO PAULO, 2020) –, mas não julgados que estendessem os efeitos dessa proteção em um ato de ativismo judicial.
Independentemente da inércia do Poder Judiciário em relação ao fato, o RJET já teve a sua vigência expirada, o que inviabilizaria, em relação a novos litígios que surjam nos tribunais brasileiros, futuros movimentos de interpretação da Lei 14.010/2020 de maneira ampliada. Ainda assim, mesmo após o fim do referido regime jurídico suis generis, a pandemia do vírus Covid-19 não cessou. O portal de notícias G1 (BRASIL, 2021), em reportagem de 19 de fevereiro de 2021, divulgou os seguintes dados levantados por um consórcio de veículos de imprensa a respeito do cenário pandêmico no Brasil: o país havia registrado 1.345 mortes em decorrência da Covid-19 nas últimas 24 horas; a média móvel nacional de óbitos pela doença nos últimos sete dias havia atingido a marca de 1.051 mortes (dez estados estavam com tendência de alta no número de óbitos); dos 10.081.693 casos de Covid-19 diagnosticados em brasileiros desde o início da pandemia, 53.049 haviam sido confirmados nas 24 horas anteriores. Ademais, cabe ressaltar que, embora o RJET tenha perdido a sua vigência em 31 de outubro de 2020, dados divulgados pela Agência IBGE Notícias (DESEMPREGO, 2021) e referentes à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) mostraram que, no trimestre finalizado em novembro de 2020, a taxa de desemprego havia atingido 14,1%: um recorde para o referido trimestre móvel (a série histórica da pesquisa teve início em 2012).
Por conseguinte, como a pandemia não teve fim e os seus efeitos econômicos negativos também não, talvez surja a necessidade de implementação de um novo regime jurídico suis generis no Brasil que novamente suspenda a aplicabilidade de determinados institutos de Direito Privado – embora ainda não tenha havido uma movimentação efetiva do Congresso Nacional nesse sentido. Nesse contexto, espera-se que, caso tal hipótese se concretize, a imprescindibilidade de proteção do bem de família do fiador de contrato locatício residencial devido ao período de pandemia seja levada em consideração pelos parlamentares. Subsidiariamente, espera-se que, diante de nova omissão legislativa em relação ao tema, o
Poder Judiciário adote uma postura mais ativa e que garanta a proteção desse tipo de bem nesse período excepcional – o que estaria em consonância com a constitucionalização do Direito Civil e com a necessidade de promoção da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Considerações finais
Por meio do raciocínio desenvolvido nas seções deste artigo, pôde-se depreender que, diante do contexto excepcional vigente, é sim possível uma nova interpretação acerca da penhora do bem de família do fiador em contrato locatício residencial. Tal interpretação está alinhada à preservação dos direitos fundamentais à moradia e à saúde, e ao princípio da isonomia, sob o fundamento da dignidade da pessoa humana. A resposta ao problema de pesquisa, portanto, está em conformidade com a Constituição Federal de 1988. Ademais, a conclusão adotada está de acordo com os modernos marcos do Direito Civil, cujas bases interpretativas não mais estão restritas apenas aos ditames do positivismo jurídico.
O Direito não é estático e deve, consequentemente, oferecer novas possibilidades de análise diante de situações inesperadas que impactam a vida em sociedade e acarretam consequências jurídicas à população. Assim, em um cenário pandêmico, pesquisas como a que originou a elaboração deste artigo possibilitam importantes reflexões acadêmicas acerca de problemas jurídicos contingentes, para os quais o Estado ainda não apresentou uma resposta efetiva e condizente com as necessidades sociais. No que tange a essa conjuntura, ressalta-se que foi adotada uma resposta ao problema de pesquisa que está em consonância com as bases do ordenamento jurídico vigente. Porém, assim como se deve introduzir a pauta no meio acadêmico do Direito, também é importante observar movimentações reais dos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo (alinhadas à proteção de grupos vulneráveis em uma realidade emergencial e transitória, a exemplo de fiadores de contratos locatícios residenciais que possam ser privados da segurança de seus lares em meio a uma pandemia).
Logo, considerando-se uma projeção de permanência da pandemia do vírus Covid-19 no Brasil pelos próximos meses ou anos, sugere-se aos operadores do Direito que tenham interesse nessa linha de pesquisa desenvolverem novos trabalhos científicos focados em eventuais avanços legislativos e jurisprudenciais em relação ao tema. A crise sanitária e econômica desencadeada pelo vírus ainda não teve fim. Desse modo, permanece a situação de vulnerabilidade de determinados grupos sociais, o que poderá dar ensejo a uma mudança em relação ao contexto jurídico descrito neste artigo.
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SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (33ª Câmara de Direito Privado).
Agravo de Instrumento 2207213-44.2020.8.26.0000. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE
SENTENÇA – Locação – Ação de despejo por falta de pagamento cumulada com pedido de cobrança – Sentença de procedência – Interposição de apelação – Decisão que autorizou a expedição de mandado de desejo – Descabimento – Lei nº 14.010/2020, que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19) – Impossibilidade de despejo liminar até 30.10.2020 para ações propostas a partir de 20.3.2020 – Ademais, controvérsia sobre o débito, inclusive para a purga da mora – Hipótese excepcional para a concessão de efeito suspensivo à apelação – Decisão reformada. Agravo provido. Agravante: Xxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx.
Agravado: Xxxx Xxxxx Xxxxx. Relator: Desembargador Xx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx. Julgado em: 7 de outubro de 2020. Publicado em: 12 de outubro de 2020. Disponível em:
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