EXCELENTÍSSIMO(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA VARA JUDICIAL DA COMARCA DE SÃO SEPÉ/RS.
EXCELENTÍSSIMO(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA VARA JUDICIAL DA COMARCA DE SÃO SEPÉ/RS.
XXXX XXXXXXX XXXXX XXXXXXX, empresário individual rural, inscrito no CNPJ n.º 34.798.910/0001-83, com sede na Estrada Sitio do Meio e Boqueirão, n.º 01, bairro Xxxxxxx xx Xxxxxx, xx xxxxxxxxx xx Xxx Xxxx/XX, XXX 00.000-000, e; XXXXX XXXXXXXX XXXXXXX, empresário individual rural, inscrito no CNPJ n.º 34.798.821/0001-37, com sede na Estrada BR 392, n.º 1401, bairro Vila Block Rural, no município de São Sepé/RS, CEP 97.340- 000, vêm, respeitosamente, por seus procuradores, conforme instrumentos procuratórios em anexo (ANEXO 1), com base no artigo 47 e seguintes da Lei 11.101/2005, propor o presente pedido de
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
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1. DAS CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1.1 DOS REQUISITOS LEGAIS PARA O DEFERIMENTO DO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO EMPRESÁRIO RURAL.
Incialmente, destaca-se que o caput do artigo 47 da Lei 11.101/05 - LRF expõe o objetivo maior da referida legislação, ao regular o procedimento de processamento de recuperação judicial para “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.
Por sua vez, o art. 1º da LRF1 delimita quais são os sujeitos ativos (devedores) ao qual a recuperação judicial – assim como a recuperação extrajudicial e a falência – é destinada. Desse modo, da leitura do regramento contido no dispositivo referido, verifica-se que as disposições recuperacionais – e falimentares – aplicam-se, tão somente, aos empresários e às sociedades empresárias.
A questão quanto à possibilidade de requerimento de recuperação judicial, no que concerne ao ponto subjetivo da demanda, limita-se à demonstração de que o postulante se constitui como empresário ou sociedade empresária, à luz da legislação pátria.
Quanto ao conceito para caracterização do devedor, o Código Civil, no caput do art. 9662, define empresário como “quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços”, consubstanciando no regramento do art. 9673 ser “obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade”.
1 Art. 1º Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da s ociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor.
2 Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
3 Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade.
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No entanto, ressalva é formalizada no que concerne à situação do empresário produtor rural, pois conforme disposição contida no art. 971 do Código Civil4, “O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede (...)”.
Perceba-se que a redação do dispositivo, já em seu início, considera que, muito embora o produtor rural não possua inscrição perante o Registro Público de Empresas Mercantis, é considerado empresário, pois exerce atividade econômica produção e/ou circulação de bens e serviços, sendo faculdade sua a escolha do registro perante ao órgão competente.
Nessa senda, mesmo que ausente qualquer inscrição, o produtor rural é considerado empresário regular, haja vista que a legislação lhe faculta a opção de efetuar – ou não – o registro de sua atividade. Portanto, analisando o art. 971 do CC, verifica-se que o legislador, efetivamente, considerou como empresário aquele cuja atividade rural constitua sua principal profissão, conferindo-lhe, como esclarecido, a possibilidade – mas não a obrigatoriedade – de realizar seu registro perante a Junta Comercial.
No ponto, Xxx Xxxxxxxx afirma que a “falta de registro [...] não impede a qualificação de sua [do produtor rural] atividade como empresarial nem a regularidade desta atividade”5. Referendando o entendimento do doutrinador, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJSP, ao julgar, em 20/02/2019, o Agravo de Instrumento nº 2205990- 27.2018.8.26.0000, de relatoria do Eminente Desembargador Ciampolini, assim manifestou- se:
Recuperação judicial. Ao produtor rural basta a prova do exercício de atividade regular durante os dois anos que antecederam o pedido de recuperação. Inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis. Ato de natureza meramente declaratória e não constitutiva. Interpretação que melhor se harmoniza ao disposto no art. 971 do Código Civil, bem
4 Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro.
5 XXXXXXXX, Xxx. A Viabilidade da Recuperação Judicial do Produtor Rural. Revista do Advogado. Ano XXXVI, out./2016, n. 131, pp. 83/90, 2016, p. 86
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como aos propósitos de uma recuperação judicial. Decisão de primeiro grau mantida. Agravo de instrumento de banco credor desprovido.
Em decorrência dessa faculdade, no que atine ao procedimento recuperacional e seus requisitos objetivos, mostra-se desnecessária a comprovação da inscrição do produtor rural no Registro Público de Empresas Mercantis há mais de 02 (dois) anos, uma vez que, muito embora ausente inscrição pelo mencionado período, o produtor rural já é considerado empresário regular, podendo comprovar sua condição por outros meios que não o registro.
O Ilustre Professor Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx leciona adotando essa linha de raciocínio, conforme se identifica do excerto da obra intitulada “Lei de Recuperação de Empresas e Falências: Lei 11.101/2005 comentada artigo por artigo” de sua autoria:
A questão torna-se curiosa, porém, quando se imagina a situação do ruralista (pessoa ou sociedade simples) que exerce comprovadamente tal atividade durante vários anos, sem inscrição na Junta Comercial e que, optando e fazendo a inscrição, ajuíza pedido de recuperação judicial, antes que complete o prazo de dois anos a contar da inscrição.
O melhor entendimento é aquele que aceita a soma dos anos anteriores à inscrição, durante os quais houve comprovadamente a atividade rural de que fala o art. 971 do CC, para que se tenha por completado o período de dois anos.
Como anotado no item '1' acima, a razão que impede a concessão de recuperação judicial para empresário com menos de dois anos ou seja, inabilidade tão acentuada que em tão pouco tempo leve à situação de crise a desaguar no pedido de recuperação -, aqui não ocorre. No campo da realidade fática, este empresário rural já preencheu prazo superior a dois anos no exercício da atividade, a qual não sofreu qualquer mudança no mundo real, pois apenas houve mudança na conceituação jurídica da mesma atividade, de civil para empresária, que decorreu da inscrição efetuada. Não haveria assim razão para impedir a concessão do pedido de recuperação pelo óbice do art. 48. Insista-se neste ponto que é fundamental para o exame, ou seja: a atividade já estava sendo 'regularmente' exercida por prazo superior a dois anos. A inscrição na Junta Comercial não é elemento regularizador da atividade, é apenas elemento de mudança da conceituação da atividade, que era civil e passa a ser empresária. A natureza jurídica da inscrição não é constitutiva, é
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meramente declaratória, incidindo sobre atividade que já se configurava como regular exercício.6
Desse modo, o exercício regular, há mais de 02 (dois) anos, da atividade empresarial desenvolvida pelo produtor rural pode ser comprovado pelo efetivo e contínuo exercício profissional pelo tempo mencionado, e não, necessariamente, pelo registro da atividade perante a Junta Comercial por aquele prazo, conforme pacífico posicionamento do Tribunal de Justiça de São Paulo:
Recuperação judicial - Deferimento do processamento – Produtor rural – Possibilidade - Documentos demonstrativos do efetivo exercício das atividades há mais de dois anos – Interpretação do art. 48 da Lei 11.101/2005, com a redação conferida pela Lei 12.873/2013 – Grupo empresarial – Reconhecimento – Litisconsórcio ativo configurado - Decisão mantida – Recurso desprovido. (TJSP. Agravo de Instrumento 2103948- 60.2019.8.26.0000; Relator (a): Xxxxxx Xxxxxxx; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Campinas - 1ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 03/07/2019; Data de Registro: 05/07/2019)
Agravo de instrumento – Recuperação judicial – Decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial também aos sócios da recuperanda, na condição de empresários rurais – Credor que alega inobservância dos requisitos legais autorizadores à concessão do pedido em relação aos produtores rurais– Registro perante a Junta Comercial que teria ocorrido às vésperas do pedido recuperacional – Facultatividade do registro – Precedentes jurisprudenciais – Conjunto probatório que atesta o exercício regular de atividade empresarial rural em período superior a dois anos – Atendida a exigência contida no caput do artigo 48 da Lei nº 11.101/05 – Decisão mantida – Recurso não conhecido em parte e desprovido na parte conhecida. (TJSP. Agravo de Instrumento nº 2050846- 26.2019.8.26.0000. Relator: Desembargador Xxxxxxxx Xxxxxx. Data do julgamento: 24/06/2019).
Agravo de instrumento – Recuperação judicial – Decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial também aos sócios da recuperanda, na condição de empresários rurais – Credor que alega inobservância dos requisitos legais autorizadores à concessão do pedido em relação aos produtores rurais – Registro perante a Junta Comercial que teria ocorrido às vésperas do pedido recuperacional – Facultatividade do registro – Precedentes jurisprudenciais – Conjunto probatório que
6 XXXXXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Lei de Recuperação de Empresas e Falências: Lei 11.101/2005 comentada artigo por artigo. 13ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. P. 169.
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atesta o exercício regular de atividade empresarial rural em período superior a dois anos – Atendida a exigência contida no caput do artigo 48 da Lei nº 11.101/05 – Decisão mantida – Recurso desprovido. (TJSP. Agravo de Instrumento 2060289-98.2019.8.26.0000; Relator (a): Xxxxxxxx Xxxxxx; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de São José do Rio Pardo - 1ª Vara; Data do Julgamento: 10/06/2019; Data de Registro: 12/06/2019).
Ainda, o entendimento acima exposto também encontra amparo no §2º, do art. 48, da Lei nº 11.101/05, o qual, expressamente dispõe que em se tratando “de exercício de atividade rural por pessoa jurídica, admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo por meio da Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica - DIPJ que tenha sido entregue tempestivamente”.
Nesse sentido, no julgamento do REsp nº 1.193.115/MT, o Eminente Ministro Xxxxxx Xxxxxx pontou acerca da possibilidade de apresentação de outros documentos, que não a inscrição perante ao Registro Público de Empresas Mercantis e a DIPJ, para se comprovar o exercício da atividade empresarial rural há mais de 02 (dois) anos.
Por conseguinte, a fim de corroborar com a tese supramencionada, pedindo-se vênia à Vossa Excelência, importante trazer aos autos o resultado dos estudos abordados na III Jornada de Direito Comercial, promovida pelo Conselho da Justiça Federal e Centro de Estudos Judiciários, sob a coordenação geral da Ministra Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxx e coordenação científica geral dos Ministros Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxxxxx, Xxx Xxxxxx xx Xxxxxx, todos integrantes do Superior Tribunal de Justiça, e da Professora Xxx Xxxxxx, realizada no dia 07 de junho de 2019, onde aprovaram o seguinte enunciado:
ENUNCIADO 97 – O produtor rural, pessoa natural ou jurídica, na ocasião do pedido de recuperação judicial, não precisa estar inscrito há mais de dois anos no Registro Público de Empresas Mercantis, bastando a demonstração de exercício de atividade rural por esse período e a comprovação da inscrição anterior ao pedido.
Destaca-se que muito embora esteja pacificado nos Tribunais do país o entendimento acerca da desnecessidade de comprovação do registro do produtor rural perante à Junta Comercial há mais de 02 (dois) anos, para fins de requerimento de recuperação judicial, a referida inscrição precisa ser efetuada em momento anterior à
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distribuição do pedido, nos termos da parte final do art. 971 do Código Civil, o qual dispõe que “depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro” - não sendo relevante, contudo, quanto tempo antes do ingresso da ação aquele foi realizado.
Sobre a matéria, Xxxxx Xxxxx Xxxxxx0 defende referida posição, reconhecendo a viabilidade do deferimento do processamento da recuperação judicial ao produtor rural que solicita seu registro perante a Junta Comercial como meio de possibilitar o pedido de RJ:
[...] o produtor rural pessoa física tem direito à recuperação judicial, mesmo que tenha providenciado o seu registro na Junta Comercial exclusivamente para preencher o requisito relacionado à empresarialidade da atividade econômica em crise.
Respaldando todo entendimento acima exposto, o Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx0 expôs, no recentíssimo julgamento do REsp 1.800.032, julgado em 05/11/2019, de forma pormenorizada o entendimento que prevaleceu no julgamento sobre a possibilidade do produtor requerer recuperação judicial. Na oportunidade, manifestou-se sobre a desnecessidade da inscrição na Junta Comercial por no mínimo 2 (dois) anos pelo seguinte entendimento:
“É que, como visto, o registro permite apenas que às atividades do produtor rural incidam as normas previstas pelo direito empresarial. Todavia, desde antes do registro, e mesmo sem ele, o produtor rural que exerce atividade profissional organizada para a produção de bens e serviços, já é empresário.”
De forma complementar, detalhou quatro diretrizes que deverão ser observadas no procedimento recuperacional, quais sejam: (a) o produtor rural que exerce atividade empresária é sujeito de direito da recuperação judicial; (b) é condição para o requerimento da recuperação judicial pelo produtor rural a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, observadas as formalidades do art. 968 e seus
7 Parecer colacionado aos autos do Agravo de Instrumento nº 0126350-31.2015.8.11.0000, interposto pelo Banco Votorantim S/A em face de José Pupin Agropecuária e Xxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx, cujo trâmite se deu junto à 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso
8 xxxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/Xxxxxxx/00,XX000000,000000-XXXxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx recuperacao+judicial+de <Acesso em 06/11/2019>
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parágrafos; (c) a aprovação do requerimento de recuperação judicial pelo produtor rural está condicionada à comprovação de exercício da atividade rural há mais de dois anos, por quaisquer formas admitidas em direito; e (d) comprovado o exercício da atividade pelo prazo mínimo exigido pelo art. 48 (lei 11.101/05), sujeitam-se à recuperação os créditos constituídos, que decorram de atividades empresariais.
Dessa forma, quanto ao deferimento do processamento da recuperação judicial do empresário individual que exerce a atividade empresarial de produtor rural, conforme fundamentação supra, deve-se observar dois requisitos especificamente (dentre outros que serão abordados no decorrer da exordial): [a] estar inscrito no Registro Público de Empresas Mercantis em data anterior ao ajuizamento da respectiva ação, pouco importando o tempo do registro; e [b] comprovar o exercício de atividade de produtor rural por período igual ou superior à 2 (dois) anos, contados da data do ajuizamento (requisitos estes presentes no caso concreto).
1.2 DA NATUREZA JURÍDICA DE EMPRESÁRIO INDIVIDUAL.
Antes de se adentrar ao mérito do pedido de processamento de recuperação judicial dos requerentes, importante trazer a Vossa Excelência as peculiaridades em que a figura do empresário individual está inserida, abordando os principais reflexos jurídicos originários do exercício cotidiano da respectiva atividade empresarial.
Destaca-se que de modo a possibilitar o ingresso da ação de recuperação judicial dos produtores rurais, esses providenciaram sua inscrição perante o Registro Público de Empresas Mercantis, sendo adotada a espécie empresária do empresário individual, disciplinada pelos arts. 966 e ss. do Código Civil.
Por conseguinte, diferente do que ocorre com a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) e com as Sociedades Empresárias - para as quais existe a distinção do patrimônio de propriedade pessoal do titular ou sócio (CPF), do patrimônio de propriedade da empresa (CNPJ) -, quando tratamos do empresário individual, o que se verifica é a confusão entre o patrimônio da pessoa física e da pessoa jurídica.
Isso ocorre porque, muito embora, quando do seu registro perante à Junta Comercial, seja atribuído ao empresário individual um CNPJ, esse não é constituidor
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de uma personalidade jurídica, continua sendo “a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus bens pelas obrigações que assumiu, quer sejam civis, quer comercial”9.
Sobre a matéria, Xxxxxx Xxxxxxxxx00 esclarece que a razão para não existir a constituição de uma personalidade jurídica em favor do empresário individual é que a própria pessoa física será a titular da atividade desempenhada:
O empresário individual é a pessoa física que exerce a empresa em seu próprio nome, assumindo todo o risco da atividade. É a própria pessoa física que será o titular da atividade. Ainda que lhe seja atribuído um CNPJ próprio, distinto do seu CPF, não há distinção entre a pessoa física em si e o empresário individual.
Abordando, mais especificamente a questão patrimonial atinente ao empresário individual, Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxx ensina que:
O empresário individual não vincula necessariamente todo seu patrimônio no exercício da atividade econômica que desenvolve. Mesmo assim, não é só o conjunto de bens que afetou ao seu negócio que responde pelas dívidas que daí decorrem; por elas respondem todos os bens do devedor, sem distinção, salvo os que a lei expressamente exclui, como os absolutamente impenhoráveis (CPC, art. 649, aí considerado o bem de família (Lei 8.009/1990, art. 1º).
Da mesma forma, se o empresário contrai dívidas alheias à sua atividade, como ocorre com as oriundas da compra de bens para seu conforto ou uso pessoal, o respectivo credor tem no mesmo patrimônio desse empresário, como identificado acima, a garantia do recebimento do seu crédito.
Se a dívida – pouco importando se oriunda de sua atividade ou se de negócio jurídico diverso (de interesse familiar, v.g.) -, não for paga, o respectivo credor pode promover-lhe a execução e obter a penhora sobre qualquer bem do devedor, sendo indiferente que ela recaia nas mercadorias integrantes do estoque de sua loja ou na motocicleta de seu lazer individual.
Para os credores, é bom insistir, não há distinção de bens do patrimônio do devedor para a exação de seus créditos, seja ele empresário ou não.
9 REQUIÃO, Xxxxxx. Curso de Direito comercial. Vol. 1. 25ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2003. X. 00
00 XXXXXXXXX, Xxxxxx. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. Vol. 1. 3ª edição. São Paulo: Atlas, 2011. P. 48.
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Da mesma forma, é o entendimento exarado pelo Superior Tribunal de
Justiça:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMPRESÁRIO INDIVIDUAL. REDIRECIONAMENTO.
1. A controvérsia cinge-se à responsabilidade patrimonial do empresário individual e as formalidades legais para sua inclusão no polo passivo de execução de débito da firma da qual era titular.
2. O acórdão recorrido entendeu que o empresário individual atua em nome próprio, respondendo com seu patrimônio pessoal pelas obrigações assumidas no exercício de suas atividades profissionais, sem as limitações de responsabilidade aplicáveis às sociedades empresárias e demais pessoas jurídicas.
3. A jurisprudência do STJ já fixou o entendimento de que "a empresa individual é mera ficção jurídica que permite à pessoa natural atuar no mercado com vantagens próprias da pessoa jurídica, sem que a titularidade implique distinção patrimonial entre o empresário individual e a pessoa natural titular da firma individual" (REsp 1.355.000/SP, Rel. Ministro Xxxxx Xxxxx, Quarta Turma, julgado em 20/10/2016, DJe 10/11/2016) e de que "o empresário individual responde pelas obrigações adquiridas pela pessoa jurídica, de modo que não há distinção entre pessoa física e jurídica, para os fins de direito, inclusive no tange ao patrimônio de ambos" (AREsp 508.190, Rel. Min. Xxxxx Xxxxx, Publicação em 4/5/2017).
4. Sendo assim, o empresário individual responde pela dívida da firma, sem necessidade de instauração do procedimento de desconsideração da personalidade jurídica (art. 50 do CC/2002 e arts. 133 e 137 do CPC/2015), por ausência de separação patrimonial que justifique esse rito.
5. O entendimento adotado pelo Tribunal de origem guarda consonância com a jurisprudência do STJ, o que já seria suficiente para se rejeitar a pretensão recursal com base na Súmula 83/STJ. O referido verbete sumular aplica-se aos recursos interpostos tanto pela alínea "a" quanto pela alínea "c" do permissivo constitucional. Nesse sentido: REsp 1.186.889/DF, Segunda Turma, Relator Ministro Xxxxxx Xxxxx, DJe de 2.6.2010.
6. Não obstante isso, não se constata o preenchimento dos requisitos legais e regimentais para a propositura do Recurso Especial pela alínea "c" do art. 105 da CF.
7. A apontada divergência deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com a indicação da similitude fática e jurídica entre eles.
8. In casu, o recorrente não se desincumbiu do ônus de demonstrar que os casos comparados tratam da mesma situação fática: empresário individual.
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Ao revés, limitou-se a transcrever ementas e trechos que versam sobre sociedade empresarial cuja diferença em relação ao caso dos autos foi suficientemente explanada neste julgado.
9. Recurso Especial não conhecido.
(STJ. REsp nº 1682989/RS. Relator: Ministro Xxxxxx Xxxxxxxx. Data do julgamento: 19/09/2017)
Destarte, considerando as peculiaridades empregadas ao empresário individual, assim como observando o fato de que os produtores rurais estão subjugados ao regramento àquele aplicável, vez que inscritos perante à Junta Comercial sob essa espécie, imperioso que os atos decisórios desse processo de recuperação sejam pautados à luz da legislação mencionada.
2. DAS CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
2.1. DO LITISCONSÓRCIO ATIVO
De outra banda, frisa-se que os empresários individuais, XXXX XXXXXXX XXXXX XXXXXXX e XXXXX XXXXXXXX XXXXXXX, ora requerentes, integram o mesmo núcleo familiar (pois são pai e filho), sempre desempenhando suas atividades empresariais rurais conjugadamente.
Por consequência, todo o resultado financeiro obtido pelo esforço comum, oriundo do exercício da atividade de produtor rural, no decorrer dos anos, sempre foi aplicado no desenvolvimento da respectiva produção econômica agrícola (com a aquisição de novas áreas de terras, máquinas agrícolas etc.) e na própria manutenção das atividades empresárias.
Sabe-se que a recuperação judicial pode ser requerida por uma única entidade devedora ou em litisconsórcio ativo. No presente caso, o litisconsórcio ativo se faz prudente e necessário por inúmeros motivos. Resumidamente, fato é que os requerentes estão intrinsecamente conectados em decorrência dos vínculos familiares, societários e financeiros e, decisivamente, fazem parte de um mesmo grupo econômico interligado.
Importante ressaltar que o vínculo familiar representa os esforços que são empenhados em comum para a salvaguarda de toda a organização, na qual cada parte
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desempenha um papel, que, em conjunto, é orquestrado para a consecução dos objetivos da família – a venda de insumos para o agronegócio nas regiões, principalmente, grãos de soja. Nesse contexto, ao negociar com qualquer dos devedores, os credores, fornecedores ou parceiros sabiam estes que estavam negociando com a família em si. Tratando-se, incontestavelmente, de um único e inseparável negócio familiar.
Outrossim, há intensa e expressiva interligação entre os passivos dos requerentes, originários do exercício da atividade rurícola, na medida em que a cada dívida era contraída por um do ente familiar e o outro figurava na relação comercial como garantidor, configurando as chamadas garantias cruzadas. Assim, não seria prudente, quiçá viável, o processamento separado de recuperações judiciais distintas, sob o prejuízo de uma verdadeira insegurança jurídica.
É certo que no presente caso se verificam efetivamente todas as circunstâncias mencionadas em precedentes judiciais que admitem a recuperação judicial em litisconsórcio ativo, a saber:
a) Atividade empresarial dos requerentes no mesmo setor rural;
b) Mesma estrutura física administrativa, utilização das mesmas terras rurais para o plantio de soja e criação de animais;
c) Compartilhamento de máquinas e insumos agrícolas;
d) Garantias cruzadas: os requerentes garantem em aval e fiança as dívidas um do outro, bem como oferecem bens de sua propriedade para a tomada de crédito em benefício da família, para o custeio da produção;
e) Administração única e conjunta exercida no âmbito familiar.
Salienta-se que o pedido de recuperação judicial apresentado por mais de um devedor em litisconsórcio ativo, embora não tenha regramento específico pela Lei de Falências e Recuperação Judicial, é usual e já se encontra incorporado na prática jurídica do processo recuperacional, seja por construção pretoriana, seja pela aplicação subsidiária do Código de Processo Civil à Lei 11.101/0511.
11 Art. 189. Aplica-se a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei.
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O artigo 113 do Código de Processo Civil, em seus incisos I e II12, elenca as principais hipóteses em que é facultada a plural composição do polo ativo processual no processo de recuperação judicial (por aplicação subsidiária):
a) quando existir a comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide, o que é inerente ao processo de recuperação judicial de grupos econômicos;
b) havendo afinidade de fato ou de direito, sendo certo que no processo de recuperação judicial o objeto fático é o mesmo para todas as empresas do grupo: a crise empresarial e a tentativa da sua superação.
Embora o litisconsórcio formado no polo ativo da recuperação judicial seja facultativo, constituído de acordo com a vontade das partes autoras envolvidas, no caso em tela, é indispensável o processamento litisconsorcial, a fim e que se empregue uma maior segurança jurídica ao próprio processo recuperacional: todos ganham, em especial os credores.
Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já sedimentou o entendimento pelo processamento da recuperação judicial em litisconsórcio ativo, senão vejamos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. LITISCONSÓRCIO ATIVO. POSSIBILIDADE. GRUPO ECONÔMICO. CONFIGURADO. NECESSIDADE DE PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL QUE ATENDA AOS INTERESSES DE CREDORES E DE TODAS AS EMPRESAS ENVOLVIDAS. 1. No
caso em exame a decisão recorrida foi publicada em período compreendido até 17/03/2016. Assim, segundo os enunciados do Superior Tribunal de Justiça sobre a aplicação do novel Código de Processo Civil, há a incidência da legislação anterior, de acordo com o posicionamento jurídico uniforme daquela Corte, que tem a competência para regular a forma de aplicação da lei federal. 2. A interpretação precitada coaduna com os princípios conformadores da atual legislação processual civil, que dizem respeito a não ocasionar prejuízo à parte ou gerar surpresa a esta com a modificação do procedimento em relação aos atos já efetivados, consoante estabelece o art. 9º, caput, e art. 10, ambos do novel Código Processo Civil. 3. No presente feito restou caracterizada a situação de
12 Art. 113. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:
I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide; III - ocorrer afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito.
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grupo econômico de fato, pois o poder de mando e as administrações das sociedades são comuns, sendo o quadro societário integrado pelos mesmos participantes, cuja natureza das empresas participantes é de ordem familiar, sendo que as atividades destas atendem a uma finalidade comum na produção, comércio e transporte de mesmo produto - pneus -, resultando na atuação conjunta para realizarem os seus objetos sociais, cuja repercussão econômico-financeira está interligada e centralizada numa das sociedades empresárias. 4. Desse modo, as sociedades agravantes possuem quadros societário e administrativo comuns envolvendo Xxxxxxx Xxxxx e Xxxxxxxx Xxxxx, as quais são irmãs, demonstrando o cunho familiar da associação, conforme se verifica das atas das assembléias geral e ordinária, bem como extraordinária das recorrentes. 5. Destaca-se que todas as sociedades estão situadas em um único imóvel, de propriedade da agravante Transportadora Fanti S.A. Não obstante isso, esta empresa do grupo é responsável pela contratação de toda a equipe de apoio utilizada pela integralidade das sociedades, demonstrando que aquela exerce ingerência administrativa sobre as demais. 6. Ademais, as atividades desenvolvidas pelas sociedades são complementares, restando demonstrado nos autos que a parte agravante integra o mercado de pneumáticos, realizando as atividades de produção, venda e transporte destes. Por outro lado, ao invés de centralizar todas as atividades realizadas em uma só sociedade, as funções foram partilhadas em três sociedades distintas, mas são realizadas em conjunto. 7. Logo, caracterizado o grupo econômico de fato, restam preenchidos os requisitos para que as agravantes figurem no pólo ativo da recuperação judicial em litisconsórcio, na forma do art. 46, inciso, do anterior Código de Processo Civil, cuja correspondência ocorre com o art. 113, inciso III, da novel legislação processual. 8. Por outro lado, a parte a de recuperação judicial, com a especificidade para cada empresa, em atendimento ao art. 53 da Lei n.º 11.101/05, sob pena de violação do princípio pars conditio creditorum. Dado provimento ao agravo de instrumento. (Agravo de Instrumento Nº 70068577972, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx Xxxx Xxxxx xx Xxxxx, Julgado em 04/04/2016) (grifo nosso)
Portanto, no presente caso a própria efetividade do processo de recuperação judicial está atrelada, necessariamente, à formação do litisconsórcio ativo como proposto, o qual serve de elemento necessário para assegurar a regularidade do processo recuperacional, resguardando-se a competência deste Juízo universal.
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Por fim, frisa-se que a opção dos requerentes pelo litisconsórcio ativo exigirá a apresentação de um plano único de recuperação judicial, submetendo todos os requerentes às consequências decorrentes da sua aprovação ou rejeição.
2.2. DA COMPETÊNCIA DA COMARCA DE SÃO SEPÉ/RS PARA O PROCESSAMENTO DO PLEITO RECUPERACIONAL.
De acordo com o artigo 3º da Lei 11.101/200513, o Juízo competente para processar e deferir o processamento da Recuperação Judicial é aquele do local do principal estabelecimento da(s) Recuperanda(s).
Embora a Lei não tenha sido específica quanto ao conceito de “principal estabelecimento”, a doutrina e a jurisprudência há muito já se pronunciaram acerca desta temática processual, sendo pacífico que se trata do local onde é exercida a gestão geral (administrativa, financeira e de pessoal) da empresa. O doutrinador Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, em seus comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falências14, assim assevera:
Segundo Xxxxxxxx (vol. 1, p.138), o principal estabelecimento é aquele no qual o comerciante tem a sede administrativa de seus negócios, no qual é feita a contabilidade geral, onde estão os livros exigidos pela lei, local de onde partem as ordens que mantém a empresa em ordem e funcionamento, mesmo que o documento de registro da empresa indique que a sede fica em outro lugar.
No mesmo sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado também não destoa:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESA. JUÍZO UNIVERSAL. ART. 76 DA LEI N.º 11.101/05. 1. O Princípio da
indivisibilidade do Juízo concursal está inserido no art. 76 da LRF que estabelece que o juízo da falência e da recuperação é indivisível e competente para todas as ações e reclamações sobre os bens, interesses e negócios do devedor. 2. Há que se ressaltar que o Supremo Tribunal
13 Art. 3º É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil.
00XXXXXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Lei de recuperação de empresas e falências: Lei 11.101/05: comentada artigo por artigo. 8 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 67.
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Federal, em julgamento noticiado no Informativo nº 548, definiu que o denominado juízo universal serve para atrair todas as ações aptas a afetar o patrimônio da empresa, tanto no processo de quebra como no de recuperação judicial. 3. Portanto, aplica-se à recuperação judicial de empresas o Princípio da Universalidade do Juízo, não havendo possibilidade jurídica de prosseguirem as ações e execuções individuais afetas aquele espécie de procedimento as quais deverão ser decididas em juízo único em primeiro ou segundo grau de jurisdição. 4. A respeito da definição do juízo competente para processar e julgar os processos de recuperação judicial e falência, o art. 3º da Lei n.º 11.101/05 define que será aquele do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial da empresa que não tenha sede no Brasil. 5. Cumpre ressaltar que o principal estabelecimento é indicado no estatuto social, não havendo esta é aquele onde se encontra o poder de mando, principais operações econômicas e financeiras, bem como a contabilidade geral, devendo ser analisados estes pontos de acordo com as peculiaridades de cada caso para definição a competência, a qual é absoluta em razão da matéria. 6. Ademais, cumpre ponderar que a questão relativa a existência de um suposto grupo econômico entre a entre empresa postulante e outras eventualmente inseridas será apreciada no curso da recuperação judicial, bastando, neste momento, a verificação da sede da empresa postulante, conforme exigido pela legislação aplicável. 6. Dessa forma, deve ser julgado improcedente o conflito negativo de competência, mantendo a competência do Juízo da Comarca de Ronda Alta para apreciar e julgar a presente recuperação judicial, pois se trata do juízo do principal estabelecimento comercial em sede de recuperação judicial. Julgado improcedente o conflito negativo de competência. (Conflito de Competência Nº 70075788356, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx Xxxx Xxxxx xx Xxxxx, Julgado em 28/03/2018) (grifo nosso)
Logo, tendo-se por base a construção pretoriana e doutrinária, o “principal estabelecimento”, é aquele que agrega dois fatores: [a] congrega o maior volume de negócios realizados pelas empresas; e [b] é o local de onde emanam as principais decisões administrativas e estratégicas da empresa ou do grupo econômico.
Dessa forma, no caso em tela, como os requerentes exercem suas atividades empresarias voltadas ao agronegócio em seus imóveis rurais localizados no município de São Sepé/RS, o principal estabelecimento das recuperandas, onde encontra- se a sede operacional (sede da fazenda) e administrativa (escritórios contábeis), está localizado no município de São Sepé/RS.
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Portanto, é neste município de São Sepé/RS que se localiza o poder de direção, mando e gestão de todas as operações administrativas e financeiras vinculadas a atividade de produtor rural exercida pelos requerentes, para processar e deferir, ao final, a Recuperação Judicial das Recuperandas.
3. DA CONTEXTUALIZAÇÃO FÁTICA.
3.1. DOS REFLEXOS DA ATIVIDADE ECÔNOMICA DESENVOLVIDA PELOS
REQUERENTES.
De início, XXXX XXXXXXX era proprietário de uma empresa que comercializava insumos agrícolas e na dificuldade de recebimento de contas, visualizou uma alternativa. Diante da dificuldade em satisfazer seus recebíveis e não desejando criar atritos com nenhum de seus clientes, recebia em muitos negócios, por dação em pagamento, tratores, máquinas, ou seja, diversos implementos agrícolas.
Em seguida, frente a oportunidade aberta com o recebimento de seus créditos em dação, o empresário XXXX XXXXXXX XXXXX XXXXXXX entrou na atividade agrícola em meados de 1992, na cidade de São Sepé/RS, inicialmente atuando no ramo do plantio de arroz e soja. Ao passar dos anos, diante do ensejo em crescer no ramo, começou a arrendar terras para o plantio de arroz e soja, para que de alguma forma, utilizando os bens recebidos em dação, a terra arrendada e o insumo que a sua empresa comercializava, explorasse um novo ramo para obter lucros a fim de fazer frente às suas atuais dívidas.
Logo após, com o crescimento de seus filhos XXXXX e XXXXXXX (in memoriam), ambos adentraram no ramo agrícola auxiliando seu pai com os negócios, sendo que o filho XXXXX adentrou em meados de 2010 e o filho XXXXXXX (in memoriam) adentrou em meados de 2013. Com o crescer da demanda, os filhos XXXXX e XXXXXXX (in memoriam) tornaram o auxílio que prestavam ao seu pai em objetivo de vida, oportunidade em que evoluíram profissionalmente na intenção de serem capazes de administrarem todo o negócio familiar mesmo em eventual ausência de seu pai, quando passaram não mais a serem coadjuvantes do negócio, mas sim proprietários e administradores que negociavam todas as atividades exercidas pelo grupo familiar.
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Destaca-se que ao longo destes anos os requerentes geraram e ainda geram, a cada safra, aproximadamente 20 (vinte) empregos diretos e indiretos, assim como escoam em torno de 61.500 (sessenta e um mil e quinhentos) sacas de soja e arroz.
Ademais, com o objetivo de contextualizar a criação dos empregos indiretos decorrentes da atividade econômica desenvolvida, salienta-se que nos últimos anos os autores plantaram, em média, 1.000 (um mil) hectares de soja e arroz por safra.
Com isso, frisa-se que o custo operacional para a plantação plena dos referidos hectares é enorme, necessitando, por exemplo, da aquisição de 18.000 (dezoito mil) litros de óleo diesel, 1.800 (um mil e oitocentos) litros de inseticidas, 900 (novecentos) litros fungicidas, 4.500 (quatro mil e quinhentos) litros herbicidas, 3.600 (três mil e seiscentos) quilos de adubo, 2.700 (dois mil e setecentos) quilos de calcário, bem como possuem um adicional com gastos decorrente da manutenção e conserto de maquinas agrícolas.
Dessa forma, os dados acima demonstram a importância da atividade empresarial desenvolvida pelos requerentes, bem como a dimensão do respectivo impacto econômico e social na região, devendo ser assegurado pelo Estado a possibilidade de soerguimento através do instituto da recuperação judicial, nos termos da Lei 11.101/05.
4. DAS RAZÕES DA CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA.
4.1. DO CENÁRIO NACIONAL DO AGRONEGÓCIO.
Antes de adentrar ao mérito das peculiaridades do caso concreto, necessária se faz uma contextualização do panorama do agronegócio no Brasil.
Cumpre ressaltar que o agronegócio brasileiro responde por quase um quarto do PIB do país, empregando aproximadamente 19 milhões de pessoas em todo o território nacional. Para se ter uma ideia da importância do setor na economia brasileira, embora envolto em uma severa crise econômica, em 2017 os resultados dos campos cresceram 13% se comparado à safra de 2016, melhor resultado para o setor desde o início da série histórica do IBGE. Nos últimos 20 anos, a área plantada com grãos cresceu 37% e a produção mais de 176%.
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Nos últimos 40 anos a produção agropecuária brasileira se desenvolveu de tal forma que o Brasil será o grande fornecedor de alimentos do futuro. Somos, hoje, um dos países agro-produtivos mais modernos do mundo, que vem transformando a economia do país como um todo. Produzindo cada vez mais, o agro brasileiro reduziu drasticamente o preço da alimentação, melhorando a saúde e qualidade de vida da população urbana, liberando seu poder de compra para bens produzidos pela indústria e pelo setor de serviços.
O valor bruto da produção do agronegócio alcançou R$536,5 bilhões em 2017. Somente em grãos de soja no mesmo ano foram produzidos R$127,7 bilhões.
Contudo, o produtor rural, a ponta de lança desta cadeia de produção bilionária, que movimenta, como vimos, ¼ do PIB nacional, planta a cada safra sem qualquer garantia de preço do produto ou que irá colher, exposto há um risco que somente ele irá suportar, principalmente, atrelado aos encargos financeiros assumidos todos os anos perante os bancos para viabilizar o plantio.
Nesse contexto, em 2008 o mercado de crédito foi drasticamente afetado pela crise financeira mundial e, em 2011, agravada pela política de represamento dos combustíveis, a crise começou a chegar no Brasil em menores proporções, até assombrar o país com a severa crise em 2015, as quais comprometeram a saúde financeira do setor do agronegócio como um todo.
Com a queda da rentabilidade de praticamente todos os setores da economia, os aumentos das despesas financeiras foram inevitáveis, de forma que resultados líquidos negativos se tornaram recorrentes, o que comprometeu a geração de
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caixa operacional das empresas e dos agricultores, cujas necessidades foram supridas majoritariamente por novos empréstimos a juros cada vez mais altos.
Agravado pelo cenário de instabilidade política e institucional, é certo dizer ainda que o agronegócio é suscetível às externalidades temporais, com safras prejudicadas por questões climáticas adversas – graves secas e estiagens, chuvas demasiadas, frio, granizo etc., o que demanda ainda maiores investimentos por parte dos agricultores e pecuaristas, para manutenção ou recuperação das suas atividades comerciais, como também o achatamento e flutuação dos preços das commodities, determinados pelo mercado internacional.
Nessa senda elenca-se alguns fatores de crise para o agronegócio:
[a] Instabilidade no preço das commodities – Com a importância da exportação para o setor do agronegócio, o produtor rural fica exposto ao mercado externo das commodities, altamente volátil e suscetível às altas e baixas no câmbio, o que pode gerar um desequilíbrio nas contas ao final de cada safra. Além disso, soma-se as políticas de intervenção de preço nas sacas dos grãos e arrobas, que determinam o preço que o produtor rural irá amealhar ao final de cada safra;
[b] Disparada nos preços dos insumos – Uma tônica a cada safra, os insumos que alicerçam as plantações e cultivos do setor agropecuário acumulam aumentos acima da inflação, além de ficarem sempre superiores aos reajustes nas sacas e arrobas dos produtos primários. Há safras em que o produtor rural sequer consegue igualar o preço de venda de seus produtos com o custo de produção por hectare;
[c] Instabilidade climática e a quebra de safra – Intimamente ligada à própria cultura no setor primário, a natureza tem o seu papel fundamental nas crises que oscilam no setor há décadas. De um ano de safra recorde, o produtor rural pode se ver diante de uma quebra total da sua produção agropastoril, ficando à mercê de novos empréstimos apenas para quitar os prejuízos de uma safra negativa, sem falar na necessidade de novos investimentos para a plantação do ano subsequente, que logo se avizinha;
[d] Falta de infraestrutura – Embora não seja uma exclusividade do setor agropecuário brasileiro, a ausência de infraestrutura compõe o preço do custo de produção dos produtos rurais do país;
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[e] Fatores externos – As externalidades ao meio agropecuário que afetam o setor como um todo são inesperadas, como a greve dos caminhoneiros que ocorreu recentemente, deixando às avessas o escoamento de toda a produção, preocupando principalmente os produtores de produtos perecíveis. Não bastasse tudo isso, temos ainda as externalidades que podem causar embargos internacionais, como a última operação da Polícia Federal batizada como “Carne fraca”, que gerou uma série de embargos internacionais aos produtores de carnes e embutidos brasileiros, causando o agravamento da crise no setor;
[f] Agravamento da recessão econômica no país – Há mais de 3 anos o Brasil passa por uma das mais severas crises econômicas pelas quais já incorreu. A instabilidade política e institucional generalizada, vem causando graves prejuízos à economia brasileira como um todo. Embora a crise mundial tenha praticamente sido superada, o país vem engatinhando para sair desse contexto de déficit no PIB, tendo conseguido somente no primeiro semestre de 2018 obter resultados que demonstram que os números começam a reverter para um panorama de melhora da economia, mesmo que de forma tímida.
[g] Investimento na produção – Um dos fatores que exigem cada vez mais investimentos no agronegócio é a necessidade de acompanhar as novas tecnologias do agrotec. Máquinas e implementos agrícolas cada vez mais sofisticados são indispensáveis para se manter uma produção em rota de alta, ao encontro da agricultura de precisão. Ao mesmo tempo, os insumos cada vez mais desenvolvidos demandam maiores investimentos do produtor rural em matéria prima de alta tecnologia.
Por outro lado, destaca-se que, projetando o cenário do agronegócio para o corrente ano, a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul - FARSUL apresentou números que estimam a quebra na safra do ano frente às projeções feitas no início da mesma. No levantamento realizado consta que as lavouras de arroz, soja e milho vão sofrer uma perda de aproximadamente 1.759.840 toneladas, o equivalente a R$2,022 bilhões em prejuízo aos produtores rurais, isso apenas por consequência dos problemas climáticos que afetaram o Rio Grande do Sul no primeiro mês de 2019.
Enumera-se abaixo os maiores volumes de perdas por total de grãos:
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Dom Pedrito | 155 mil toneladas |
São Gabriel | 134 mil toneladas |
Uruguaiana | 125 mil toneladas |
Alegrete | 95,6 mil toneladas |
Itaqui | 63 mil toneladas |
Xxxxxxxxx xx Xxx | 00 xxx xxxxxxxxx |
Xxx Xxxxxxx xx Xxx | 53 mil toneladas |
Refere-se, por oportuno, que não é apenas o produtor que contabilizou perdas com o clima. O prejuízo no campo se estende para os outros setores que tem relação direta com as lavouras. Indústrias, serviços e distribuição também são impactadas, fazendo com que a queda no PIB do Rio Grande do Sul seja de R$ 6.678 bilhões.
4.2. DAS DIFICULDADES ENFRENTADAS PELOS RECUPERANDOS.
Insta consignar que a atividade empresarial desenvolvida pelos autores depende, além de uma economia estável, de fatores climáticos que a favoreça, ou seja, se qualquer destes elementos, econômico e climático, oscilarem, mesmo que forma inexpressiva aos olhos comuns, poderá gerar grandes reflexos no agronegócio, positivos ou negativos.
Ao longo dos anos, as intempéries sempre foram um grande problema aos requerentes, visto que, se temos uma longa estiagem, a soja não desenvolve, por outro lado, se temos grandes precipitações em um curto espaço de tempo, a lavoura de arroz (que na maioria das vezes é plantado em várzeas beirando rios) sofre com enchentes, que diminuem drasticamente a produtividade.
Dito isto, o aumento de custos com insumos e a busca por tecnologia avançada, definem a atividade com de alto risco, visto que se desembolsa um montante elevadíssimo sem ter a certeza de uma produtividade desejada que possa equilibrar as contas ao final da safra. A situação nunca foi fácil, altos investimentos, preços de combustíveis e insumos em escala crescente, preço do arroz abaixo do seu custo de produção, o preço da soja bateu o menor preço dos 10 (dez) anos anteriores, enfim, todos esses fatos corroboraram para que na safra 2016/2017 a curva de rentabilidade começasse a ficar negativa.
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Para agravar ainda mais a situação, uma chuva de 200mm numa noite de outubro de 2016 em São Sepé destruiu cerca de 150 hectares de arroz recém semeados e adubados, assim como arrebentou as taipas do açude, destruindo as valetas e despejando toda a água para dentro da lavoura, causando um dano irreversível e um prejuízo instalado. O mesmo incidente também danificando outras duas lavouras do mesmo cereal, que ficavam um pouco mais distantes. Essa intempérie causou uma redução drástica na produtividade da safra, revertendo ganhos de anos anteriores, ou seja, os requerentes tiveram que usar suas reservas advindas de anos anteriores para adimplir com suas obrigações.
Na safra 2017/2018, as intempéries novamente danificaram drasticamente a estrutura financeira dos requerentes. Com a queda na produtividade e perda de reservas financeiras na safra 2016/2017, a lavoura de arroz teve que ser ampliada para que ao final suprisse a péssima safra anterior, recuperando a saúde financeira dos requerentes. A área de soja também fora aumentada para tentar consolidar esse crescimento. Em contrapartida, para ampliar a área de plantio, necessário se fez o aumento de investimento, a fim de dar conta da demanda. Como naquele momento os requerentes conseguiam buscar crédito no mercado para essas aquisições, realizou-se a implementação.
Além de um custo operacional maior, um aumento com despesas de empregados, os requerentes precisavam dispor de mais crédito para manter a estrutura funcionando e seus empregados recebendo em dia.
Na tabela abaixo é possível visualizar os valores de empréstimos contraídos durante os anos de 2011 a 2019. Conforme mencionado é notável o aumento dos empréstimos durante a safra de 2016/2017 se comparado aos anos anteriores.
Ano | Valor |
2011 | R$ 139.450,00 |
2012 | R$ 143.100,00 |
2013 | R$ 611.392,85 |
2014 | R$ 585.500,00 |
2015 | R$ 325.027,52 |
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2016 | R$ 232.000,00 |
2017 | R$ 1.045.908,38 |
2018 | R$ 1.733.305,00 |
2019 | R$ 2.759.413,63 |
Contudo, xxxxx xxxxx as chuvas começaram em setembro e foram amenizar somente no final de outubro, forçando os requerentes a ficarem dois meses sem conseguir entrar na lavoura para semear arroz e soja. Em virtude desse contratempo, os requerentes tiveram que plantar 1.700 (um mil e setecentos) hectares em 3 (três) meses, quais sejam: novembro, dezembro e janeiro, sendo que a janela de plantio de arroz acaba no meio de novembro e a de soja no meio de dezembro.
Plantio sem capricho, luta contra o tempo, maquinário quebrando, aumento drástico no preço do óleo diesel contribuíram para o agravamento da situação financeira dos requerentes. Para liquidar com o cenário de dificuldade já estabelecido, novamente, parou de chover em 20 de novembro de 2017 e voltou a chover somente no dia 15 de janeiro 2018, resultando em uma estiagem jamais vista na região da Vila Block. Xxxx recém semeada morrendo, escassez de água pois os açudes estavam secando pelo volume maior de água despendida pela falta de chuva. Por fim, o resultado de tudo isso foi uma perda de 28.000 (vinte e oito mil) sacas de soja e de 40.000 (quarenta mil) sacas de arroz. Já operando em prejuízo, os requerentes conseguiram quitar os arrendamentos, contudo, os demais compromissos acabaram virando alvo de renegociação, na intenção de obter o postergamento de seus pagamentos, entretanto, essas renegociações só trouxeram um aumento dos juros anteriormente fixados, fato que no final das contas, somente prejudicou ainda mais a situação financeira dos requerentes.
Todos estes fatos narrados causaram grande impacto nas contas da empresa, conforme se demostra no gráfico de faturamento15 abaixo, onde é notável a baixa de faturamento da safra de 2016/2017 para 2017/2018.
15 Faturamento gerencial: tem início em junho e final em maio do ano seguinte, considerando o ano agrícola da cultura.
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A safra de 2018/2019 representou um grande desafio em meio a dificuldades. Foram rescindidos 7 (sete) contratos de trabalho e houve redução da área de plantio do arroz e da soja.
Sem fluxo de caixa para honrar com os pagamentos, até mesmo de salários, foi necessário buscar ajuda através de fornecedores parceiros para que houvesse o plantio. Os valores para pagamentos de salários e custos operacionais foram retirados dos pró-labores, venda de maquinários e empréstimos de pessoas físicas, que culminou na quitação das contas da safra atual, porém o passivo das safras passadas aumentou devido a incidência de juros moratórios e multas.
Com a redução de faturamento, aumento dos custos e a necessidade de manter o plantio, determinados fatos tiveram um grande reflexo nos seus resultados, que diminuíram o lucro obtido ao final da safra.
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No ano de 2017/2018 é visível a redução drástica de 150% (cento e cinquenta por cento) do total do faturamento em relação a 2016/2017 devido a todos os fatos ocorridos entre as safras. Em 2018/2019 o faturamento tem uma pequena variação de 13% (treze por cento) se comparado a safra do ano anterior.
Em relação aos custos e despesas, esses representaram 90% (noventa por cento) do faturamento na safra de 2018/2019, sendo que o custo mais relevante é com agrotóxicos e adubos, seguido por arrendamentos que são custos inevitáveis no setor agrícola, visto que a produção/safra depende destes elementos.
Os custos para pagamento dos empréstimos contraídos devido à situação em que os requerentes se encontram tem alto impacto nos valores desembolsados anualmente, conforme demonstrado no gráfico a seguir:
Dessa forma, o instrumento da recuperação judicial se mostra viável para os requerentes, considerando que a através da equalização dos custos financeiros, medida possível dentro do processo, os mesmos terão condições de soerguimento diante do seu passivo.
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5. DAS RAZÕES DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL, DA VIABILIDADE DA EMPRESA E DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS.
5.1. DA NECESSIDADE DO PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
A exposição fática resgatada nos itens precedentes apresenta perfeita adequação ao preceito legal resguardado no art. 47 da Lei n. 11.101/2005, que trata da viabilidade e dos objetivos perquiridos pela Recuperação Judicial, in verbis:
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Ou seja, o princípio básico norteador da Lei de Recuperação Judicial, instituída no país com o advento da Lei 11.101/2005, é justamente o da preservação da empresa, entendendo esta como uma fonte de renda, de geração de empregos e arrecadação de tributos, sendo, portanto, indispensável ao regular desenvolvimento da atividade econômica do país.
A doutrina sintetiza tal princípio básico da seguinte forma:
A nova Lei, fundada nos princípios constitucionais de valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, de garantir o desenvolvimento nacional e promover o bem de todos, reconhece a função social da empresa e institui o processo de sua recuperação judicial, tendo em vista salvaguardá-la, com saneamento da crise que a envolve, a permitir o prosseguimento da atividade empresarial, com a manutenção do emprego de seus trabalhadores e atendimento dos credores, fornecedores e financiadores. Tanto o empresário, pessoa natural, quanto a sociedade empresária, exercem atividade organizada para a produção ou a circulação de bens e de serviços, que compreende um complexo envolvente de múltiplos interesses, convergentes não só ao êxito empresarial, mas também a função social da empresa, em consonância com o bem comum, a ordem pública, os interesses gerais da coletividade, o bem-estar social e a ordem econômica, nos termos preconizados pelos arts. 1º, 3º e 170 da Constituição Federal, tendo em vista a justiça social. Portanto, deve ser, tanto quanto possível, preservada e mantida, motivo pelo qual a Lei 11.101,
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de 2005, instituiu a recuperação com o objetivo de resguardá-la dos males conjunturais e mantê-la em benefício de todos.16
Não resta dúvida de que a Recuperação Judicial, atualmente positivada no direito brasileiro, apresenta-se como legitimo e necessário instrumento à preservação das empresas, refletindo, inclusive, o art. 47, previamente transcrito, os princípios constitucionais de estímulo à atividade econômica, justiça social, pleno emprego (art. 170, III e VII, da Constituição Federal de 198817) e função social da propriedade (art. 5º, XXIII, também da CF/8818).
Outrossim, a partir da identificação da crise econômica, os requerentes estão implementando estratégias administrativas e gerenciais que culminarão na sua recuperação econômica e financeira.
Nada obstante os demandantes estarem atravessando um momento conturbado, apresenta viabilidade de reorganização e consequente recuperação, a fim de reestabelecer o equilíbrio de suas contas e honrar os compromissos assumidos.
Conforme já dito alhures, o preço atrelado a venda da soja e do arroz sofreram um forte decline nos últimos anos e em contrapartida o câmbio do dólar atingiu patamares jamais vistos anteriormente, fazendo com que os requerentes chegassem a praticamente empatar o resultado da produção, isto é, a venda do plantio ao final servia apenas para cobrir os valores pagos aos insumos.
Dados expostos em jornais econômicos demonstram a linha do tempo do preço do arroz e da soja, sendo visível que a saca de arroz era vendida em média à R$ 50,00 (cinquenta reais) no ano de 2016 e que no ano de 2018 o preço médio de saída foi de R$ 35,00 (trinta e cinco reais), ou seja, uma deflação de 30% (trinta por cento). Já o preço da soja em 2017 atingiu a marca do valor médio em R$ 55,00 (cinquenta e cinco reais), quando
16 XXXXXXX, Xxxx xx Xxxxx, Processo de Recuperação Judicial Extrajudicial e Falência. Editora Forense, 2ª edição, pg.113.
17 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: III - função social da propriedade;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
18 Art. 5º. (...)
(...) XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
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na verdade o preço médio atrelado a saca de soja gira em torno de R$ 70,00 (setenta reais), conforme se verifica abaixo:
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Ademais, segundo se verifica pelo fluxo de caixa projetado e o gráfico que expõe os pagamentos que deverão ser realizados nos próximos anos, constata-se que a única saída para os requerentes fazerem frente às dívidas é mediante a Recuperação Judicial, pois o acumulo na deflação dos preços da soja e do arroz somente aumentaram a iliquidez momentânea dos requerentes.
Como sabido, a Recuperação Judicial, além de criar um ambiente propício para que se instaure a negociação entre os devedores e seus credores, transpõe o episódio da instabilidade econômico-financeira até então constante, possibilitando a criação de um novo cenário para estruturar o pagamento do seu passivo, visando primordialmente a preservação da atividade empresarial.
O deferimento do processamento da recuperação judicial contribuirá para que os recuperandos, após negociação com os credores sujeitos ao processo recuperacional, possam negociar formas distintas de pagamento de suas obrigações, baseando essas tratativas na realidade atual dos produtores e em elementos econômico- financeiros compatíveis, interligados ao resultado operacional, custos e amortização do passivo.
Nesta senda, apesar das adversidades que atualmente se fazem presentes, ratifica-se que a operação dos empresários individuais é viável e passível de recuperação, tanto do ponto de vista jurídico, quanto do econômico e financeiro.
Pelo exposto, pelo que se depreende da atual situação enfrentada pelos recuperandos, o instituto da recuperação judicial proporcionará a possibilidade de reinicio de uma nova etapa de desenvolvimento, com a preservação da atividade econômica, dos postos de trabalho e dos interesses dos credores, em consonância com o princípio da função social da empresa.
5.2. DA ATUAL POSIÇÃO FINANCEIRA DOS EMPRESÁRIOS INDIVIDUAIS E DA SITUAÇÃO PATRIMONIAL.
Salienta-se que relatar a composição do passivo das empresas requerentes, de modo geral, é de suma importância para retratar a crise econômico- financeira e conferir a análise da viabilidade da Recuperação Judicial.
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Boa parte do endividamento das empresas está localizado no curto prazo, causando reflexos na sua liquidez e constante necessidade de capital de giro, aumentando ainda mais seu endividamento.
Em decorrência dos sucessivos problemas narrados, as requerentes obrigaram-se a requerer novos empréstimos e em volumes cada vez maiores, aumentando percentuais acima de 450% (quatrocentos e cinquenta por cento) dos créditos tomados por empréstimo, elevando o percentual de pagamento dos empréstimos em mais de 300% (trezentos por centos) para os próximos anos, como se visualiza nos gráficos que seguem:
Da análise dos contratos ativos, verifica-se não serem contratos de longo prazo, ou seja, comprometem de forma direta o fluxo de caixa do período seguinte, e por este motivo, trouxe verdadeiro crescimento do endividamento das requerentes que em decorrência da falta de concretização da colheita planejada, inviabilizam o cumprimento dessas obrigações, que dentro de 2020 chegariam a mais de R$ 1,2 milhões.
O passivo total dos requerentes monta, nesta data, em R$ 5.927.469,30 (cinco milhões, novecentos e vinte e sete mil, quatrocentos e sessenta e nove reais e trinta centavos), a seguir se expõe os valores e percentuais das dívidas sujeitas e não sujeitas à presente ação:
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O passivo não sujeito a recuperação judicial, que corresponde a 6% (seis por cento) do total do endividamento, parcela irrisória frente ao endividamento global da empresa, está relacionado aos contratos de empréstimos e financiamentos com garantias dispostas pelo artigo 49, Parágrafo 3º da LFRE, bem como obrigações tributárias.
Já o gráfico a seguir demonstra a composição do passivo SUJEITO À RECUPERAÇÃO JUDICIAL (tendo em vista, quanto à atualização dos créditos sujeitos aos efeitos da Recuperação Judicial, os critérios constantes dos artigos. 9º, inciso II, e 49 da LRF), o qual monta, nesta data, em R$ 5.556.976,67 (cinco milhões, quinhentos e cinquenta e seis mil, novecentos e setenta e seis reais e sessenta e sete centavos), estando distribuídos da seguinte forma entre as requerentes:
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Sendo formado por créditos que se enquadram nas classes definidas no artigo 41, inciso I, II e III da Lei 11.101/05:
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Todos os créditos anteriormente listados estão arrolados de modo individualizado na relação que instrui a presente inicial (ANEXO 3), em atendimento ao disposto no artigo 51, inciso III da LRF.
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Ainda, verifica-se que a situação patrimonial bem espelha o histórico da crise relatada, uma vez que o passivo apresenta crescente evolução, notadamente diante do endividamento financeiro e, por outro lado, não se verifica igual progresso quanto ao ativo da empresa.
De outra banda, os fatos narrados anteriormente acabaram por engendrar a deterioração dos indicadores de liquidez, endividamentos e rentabilidade da empresa.
Houve um excessivo desgaste das condições de liquidez da empresa no decorrer dos últimos anos. O indicador de liquidez corrente revela que as posições circulantes da empresa se reduziram de maneira expressiva até o último ano.
6. DO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL – PREENCHIMENTO AOS REQUISITOS DOS ARTIGOS 48 E 51 DA LEI 11.101/2005.
O artigo 48 da Lei 11.101/2005 fixa os requisitos para o devedor pleitear sua recuperação judicial. Em relação às vedações impostas pelo referido artigo, é de se salientar que os requerentes exercem suas atividades empresariais há mais de 02 (dois) anos, bem como não se enquadram em nenhuma das hipóteses indicadas nos incisos I, II, III e IV, do dispositivo legal mencionado (ANEXO 9).
De outra banda, instrui o pedido, com base no artigo 51 da Lei 11.101/05, os seguintes documentos:
(i) As demonstrações contábeis relativas aos 03 (três) últimos exercícios, balanço patrimonial; demonstração de resultados acumulados; demonstração do resultado desde o último exercício social; relatório gerencial de fluxo de caixa e projeção do fluxo de caixa (ANEXO 2);
(i.a) Cumpre ressaltar que o produtor rural e o pequeno empresário estão dispensados de seguir “um sistema de contabilidade mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico”, obrigatoriedade esta aplicada de forma geral aos demais empresários e as sociedades empresárias, conforme se
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depreende da leitura dos art. 970 , 1.179, caput e § 2º , do Código Civil.
(ii) A relação nominal completa dos credores, identificados com endereço, natureza do crédito, origem, classificação e valor (ANEXO 3);
(iii) A relação integral dos empregados, com indicação de função, salário e data de admissão (ANEXO 4);
(iv) A certidão de regularidade da devedora no Registro Público de Empresas e última alteração do Contrato Social (ANEXO 5);
(v) A relação dos bens particulares do sócio controlador e administrador da devedora (ANEXO 6);
(vi) Os extratos atualizados das contas bancárias da devedora emitidos pelas respectivas instituições financeiras (ANEXO 7);
(vii) Certidão do cartório de protesto situado na comarca do domicílio da devedora, certidões de regularidade perante a Receita Federal e à Receita Estadual (ANEXO 8);
(viii) A relação, subscrita pela devedora, de todas as ações judiciais em que estas figuram como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados (ANEXO 9).
Os recuperandos, de acordo com os documentos previamente relacionados e apresentados (em anexo), diante da exposição das razões da crise econômico-financeira (consignadas no capítulo “4” desta inicial) e das causas concretas da sua situação patrimonial, apresentadas no capítulo 5, cumpriram todos os requisitos necessários para o ajuizamento do pedido de recuperação judicial, devendo ser deferido o seu processamento, nos termos e limites da Lei Especial, como garante a jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA. INDEFERIMENTO DA INICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONTROLE DAS QUESTÓES DE MÉRITO PARA O DEFERIMENTO DO PEDIDO. VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS FORMAIS. INTELGIÊNCIA DOS ARTS 48 E 51 DA LEI Nº 11.101/05. NECESSIDADE DO DEFERIMENTO DO PROCESSAMENTO. ART. 52 DA LRF.
1. O princípio da preservação da empresa, insculpido no art. 47 da Lei 11.101/2005, dispõe que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação daquela,
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sua função social e o estímulo à atividade econômica. 2. Ressalte-se que a Lei nº 11.101/05 estabelece os critérios formais para se deferir o processamento do pedido recuperatório, especificamente nos artigos 48 e 51 do referido diploma legal, relativamente à legitimidade e à apresentação da documentação exigida a esse respeito. 3. A lei de recuperação defini expressamente quais seriam os legitimados a proporem o pleito em questão, da mesma forma que estabeleceu qual a documentação necessária a ser apresentada com a inicial para análise preliminar, a fim de deferir o processamento do feito. Portanto, se preenchidas as exigências legais precitadas, o Magistrado terá de deferir o processamento, nos termos do art. 52, caput, da Lei de Recuperação Judicial e Falência. 4. Portanto, atendidos os requisitos legais para o processamento, como a legitimada da parte postulante e apresentada a documentação necessária para tanto não pode o magistrado que preside a causa obstar o seguimento do feito até a realização da assembleia geral. 5. Releva ponderar, ainda, que atendidos os requisitos legais para processamento da recuperação de empresa, de sorte a renegociar suas dívidas com eventuais deságios ou estendendo o prazo para pagamento destas, não podendo ser obstado o objetivo fundamental da recuperação judicial, que é o soerguimento da empresa sujeita a este procedimento, estabelecido no art. 47 da Lei nº 11.101/05. 6. Assim, o controle da viabilidade econômico- financeira para concessão da recuperação judicial é feito pelos credores e não pelo Judiciário, ao menos nesta fase processual, não podendo ser indeferida a inicial com base no juízo de valor quanto a efetiva necessidade e condição econômica da empresa se submeter ao procedimento em questão, como procedido pelo Magistrado a quo, de sorte que o deferimento do processamento é a medida que se impõe. Dado provimento ao apelo e desconstituída a sentença. (Apelação Cível Nº 70078402575, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx Xxxx Xxxxx xx Xxxxx, Julgado em 29/08/2018) – Grifou-se
APELAÇÃO CÍVEL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. LEI 11.101/05. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. OBSERVADOS REQUISITOS PREVISTOS NOS ARTS. 48 E 51 DA LEI 11.101/05. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. 1) Trata-se
consoante sumário relatório de pedido de recuperação judicial veiculado por DROGARIA AAL LTDA ME, asseverando estar em crise, ostentando débitos no equivalente a R$240.449,92(...), sustentando a necessidade do uso do regime de recuperação judicial, julgado extinto, fulcro no art. 485, inciso I do CPC/15. 2) Consoante o disposto na Lei nº 11.101/2005, a qual regulamenta Falência e Recuperação de Empresa, na fase preliminar do pedido de recuperação judicial, incumbe ao Magistrado analisar, tão somente, o cumprimento dos requisitos formais, a legitimidade ativa da parte requerente, bem como a instrução da petição inicial de acordo com o disposto nos artigos 48 e 51 da Lei nº 11.101/05, sem qualquer apreciação
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aprofundada do direito da empresa, o que futuramente será apreciado ao longo da fase deliberativa. 3) No caso telado, vislumbra-se estarem preenchidos os pressupostos dispostos no art. 48 e instruída a petição inicial como determinado pelo artigo 51, ambos da Lei 11.101/05 (Lei de Falências e Recuperação Judicial), devendo ser deferido o processamento da recuperação judicial perquirida, independentemente do número de credores. 3) Assim, inadequada a extinção do feito fulcro no art. 485, inciso do CPC/15. Sentença Desconstituída. Precedentes desta Corte. APELAÇÃO CÍVEL PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70075803668, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, Julgado em 22/02/2018) – Grifou-se
Dessa forma, uma vez atendidos os requisitos expostos nos artigos 48 e
51 da Lei 11.101/05, observando as peculiaridades do produtor rural e do empresário individual expostas no tópico “1”, a medida que se impõe é o imediato deferimento do processamento da recuperação judicial dos requerentes, nos termos do art. 52 da referida lei19.
7. DA SUSPENSÃO DAS AÇÕES E EXECUÇÕES CONTRA OS REQUERENTES E AS PESSOAS FÍSICAS DOS PRODUTORES RURAIS.
Disciplina o art. 52, inciso III, da Lei nº 11.101/05, que, quando do deferimento do processamento da recuperação judicial, o Juízo deverá ordenar “a
19 Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:
I – nomeará o administrador judicial, observado o disposto no art. 21 desta Lei;
II – determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, exceto para contratação com o Poder Público ou para recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, observando o disposto no art. 69 desta Lei;
III – ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6º desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1º , 2º e 7º do art. 6º desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3º e 4º do art. 49 desta Lei;
IV – determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores;
V – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento.
§ 1º O juiz ordenará a expedição de edital, para publicação no órgão oficial, que conterá:
I – o resumo do pedido do devedor e da decisão que defere o processamento da recuperação judicial;
II – a relação nominal de credores, em que se discrimine o valor atualizado e a classificação de cada crédito;
III – a advertência acerca dos prazos para habilitação dos créditos, na forma do art. 7º , § 1º , desta Lei, e para que os credores apresentem objeção ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor nos termos do art. 55 desta Lei.
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suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6º desta Lei (...)”.
Sobre a questão, quanto aos empresários individuais (CNPJs), nenhuma ressalva há de ser feita. Todavia, no que se relaciona às pessoas físicas dos produtores rurais, muito embora a Lei nº 11.101/05 não possibilite o regime recuperacional a essas, no caso específico dos autos, necessário que a disposição contida no art. 52, inciso III, lhes sejam estendidas, pelos motivos abaixo delineados.
Conforme amplamente demonstrado no primeiro ponto da presente petição, o produtor rural, ainda que não inscrito no Registro Público de Empresas Mercantis, é considerado empresário regular, eis que a legislação civilista20 lhe concede a faculdade de realizar – ou não – sua inscrição na Junta Comercial.
Da mesma forma, consoante explicado, o registro da atividade empresarial desenvolvida pelo produtor rural possui caráter meramente declaratório, não se caracterizando como constitutivo da condição de empresário.
Inclusive, evidencia disso é o reconhecimento pelos Tribunais do país - assim como pela própria legislação recuperacional21, que, para requerer recuperação judicial, o empresário rural não precisa comprovar sua inscrição, há mais de 02 (dois) anos, perante o órgão competente; bastando que demonstre, por meio de documentos outros, o exercício da atividade empresarial pelo mencionado período de tempo.
Ou seja, o produtor rural, devidamente inscrito na Junta Comercial como empresário, possuidor de um CNPJ, pode, quando do pedido de processamento da sua recuperação judicial, comprovar o exercício da atividade empresarial há mais de 02 (dois)
Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as
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formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro.
21 Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:
(...)
§ 2º Tratando-se de exercício de atividade rural por pessoa jurídica, admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo por meio da Declaração de Informações Econômico-fiscais da Pessoa Jurídica - DIPJ que tenha sido entregue tempestivamente.
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anos através de documentos que firmou quando ainda ausente qualquer registro como empresário.
Desse modo, a comprovação da condição acaba sendo feita por meio de documentos que foram assinados através do CPF do produtor rural.
Nesse ponto, importante ressaltar que, no caso dos autos, embora a inscrição dos produtores rurais XXXX XXXXXXX e XXXXX, perante o Registro Público de Empresas Mercantis, foi realizada neste ano, o desenvolvimento da atividade empresarial rural vem ocorrendo há mais de 27 anos.
Assim, fica evidente que muitos contratos firmados em decorrência do desenvolvimento da atividade rurícola e que, por consequência, sujeitam-se ao presente processo recuperacional22, estão vinculados ao CPF do empresário rural – o que pode dar ensejo a que os credores busquem a satisfação do crédito por meio de ações de cobrança e execuções individuais, intentadas contra a pessoa física e não contra o empresário – mesmo que antes do seu registro, quando assinados os contratos, o produtor rural já fosse considerado como tal pela legislação pertinente, doutrina e precedentes jurisprudenciais.
Outra razão de extrema importância para que seja acolhido o pedido de suspensão das ações e execuções também quanto as pessoas físicas é que, de acordo com a explicação exposta no segundo item dessa petição, ambos os produtores rurais adotaram a espécie de empresário individual.
Consoante exaustivamente demonstrado, no mencionado tipo empresarial, existe confusão patrimonial entre os bens da pessoa física e da pessoa jurídica, o que acaba por possibilitar que os credores particulares da pessoa física se valham dos bens do empresário para satisfazer os seus créditos.
Essa situação vai de encontro ao princípio instituído no art. 47 da Lei nº 11.101/05 da preservação da empresa, o qual possui a seguinte redação:
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a
22 Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.
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manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Se não obstado a que as ações e execuções propostas contra as pessoas físicas dos produtores rurais prossigam, o patrimônio do empresário individual, o qual é utilizado no desenvolvimento da atividade rural que se busca recuperar, pode ser esvaziado.
Dessa forma, haja vista a responsabilidade ilimitada dos empresários individuais, postula-se, desde já, a suspensão de todas as ações ou execuções contra os autores, seja contra a pessoa física ou jurídica, na forma do art. 6º do mesmo diploma legal, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.
8. DA IMPOSSIBILIDADE DE OCORRER BUSCA E APREENSÃO DOS BENS ESSENCIAIS A MANUTENÇÃO DA ATIVIDADE DOS REQUERENTES.
Como já mencionado, a Lei n.º 11.101/05 prevê em seu artigo 6º, Parágrafo 4º, que com o deferimento do processamento da recuperação judicial, ocorrerá, pelo prazo mínimo de 180 (cento e oitenta) dias, a suspensão do curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face das recuperandas. Trata-se, na espécie, do chamado stay period.
Dos ensinamentos do Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, extraídos do Resp nº 1374259-MT, aprende-se que:
“A razão de ser da norma que determina a pausa momentânea das ações e execuções – stay period – na recuperação judicial é a de permitir que o devedor em crise consiga negociar, de forma conjunta, com todos os credores (plano de recuperação) e, ao mesmo tempo, preservar o patrimônio do empreendimento, o qual se verá liberto, por um lapso de tempo, de eventuais constrições de bens imprescindíveis à continuidade da atividade empresarial, impedindo o seu fatiamento, além de afastar o risco da falência.” (grifo nosso)
Ainda, a vedação de expropriação de bens essências para a atividade da empresa no stay period é estendida também para os créditos de natureza extraconcursais
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(os que não se submetem ao procedimento recuperacional), nos termos do art. 49, Parágrafo 3º, da Lei Federal nº 11.101/0523.
O que se defende aqui é que durante o stay period todos os credores das recuperandas (sem distinções) estão impossibilitados de exercerem eventuais garantias visando qualquer constrição de bem essencial para atividade da empresa, oportunizando às recuperandas uma espécie de “fôlego” momentâneo para a sua reorganização administrativa e econômica, preservando a atividade empresarial, a sua função social, os postos de trabalhos e a circulação de produtos e serviços.
Frisa-se que com o deferimento do processamento da recuperação judicial, aos credores fiduciários recai o ônus da vedação à retirada dos bens essenciais, aos credores concursais o ônus de se sujeitarem ao plano de recuperação e ao devedor incumbe “agir de maneira transparente e de boa-fé, manter os postos de trabalho, recolher tributos, produzir e fazer circular produtos e serviços e, enfim, preservar os benefícios econômicos e sociais que são buscados com a manutenção da atividade empresarial”, como assevera Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx00.
Destaca-se que os maquinários utilizados nas lavouras são de suma importância para as recuperandas alcançarem o objetivo do stay period, qual seja, sua reorganização administrativa, financeira e empresarial.
Em casos análogos, sobre a possibilidade de abstenções de busca e apreensão de bens dados em alienação fiduciária durante o stay period, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul tem adotado a seguinte entendimento:
23 Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.
§ 3o Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6odesta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.
24 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. Reflexões sobre os processos de insolvência: divisão equilibrada de ônus, superação do dualismo pendular e gestão democrática de processos. In XXXXX, Xxxx Xxxxx (coord.). 10 anos da Lei de Recuperação de Empresas e Falências: reflexões sobre a reestruturação empresarial no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 94.
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APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. AÇÃO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL PENDENTE. STAY PERIOD. BEM ESSENCIAL À ATIVIDADE DA EMPRESA. ARTIGO 49, §4º, DA
LEI Nº 11.101/2005. Enquanto estiver vigendo o prazo de stay period, não há falar em concessão de liminar de busca e apreensão em relação a bem essencial à atividade da empresa em recuperação. A indisponibilidade de recuperação dos bens é momentânea, portanto, não prejudica o interesse processual do credor. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.(Apelação Cível, Nº 70080065683, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Julgado em: 27- 06-2019) (grifo nosso)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. BEM ESSENCIAL À MANUTENÇÃO DE SUA ATIVIDADE FIM. SUSPENSÃO DO CURSO
PROCESSUAL. POSSIBILIDADE. Deferido o processamento da recuperação judicial da empresa, que atua no ramo varejista de combustíveis, e cuidando-se de bem essencial ao desempenho de sua atividade, cabível, na fase, a suspensão do trâmite da ação expropriatória, tendo em vista a prorrogação do prazo de suspensão nos autos da recuperação judicial. Excepcionalidade prevista pelo § 3º do art. 49 da supracitada Lei. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70077298941, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx, Julgado em: 24-05-2018) (grifo nosso)
Dessa forma, imperiosa se faz a necessidade de, em sede de tutela de urgência, que o juízo universal recuperacional determine que os credores fiduciários se abstenham de realizar a busca e apreensão dos maquinários essências ao desenvolvimento das atividades pelos devedores durante o stay period, quais sejam:
BEM | CONTRATO | CREDOR FIDUCIÁRIO |
PULVERIZADOR AGRICOLA DE BARRAS CORAL AM-14 | Contrato n.º427781 | Bradesco |
SEMEADOR ADUBADORA DE ARRASTO PANTHER SM | Contrato n.º 427785 | Bradesco |
CHEVROLET S10 | Contrato n.º 896733757 | Banco do Brasil |
CABINE AGRICOLA PARA TRATOR | Contrato n.º 427783 | |
COLHEITADEIRA DE GRÃO NEW | Contrato n.º 457412 | Bradesco |
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HOLLAND TC 5090 | ||
PLATAFORMA DE CORTE NEW HOLLAND RIGIDA DE 20 PES NG 20 | Contrato n.º 457412 | Bradesco |
PLATAFORMA DE CORTE DE GRAOS NEW HOLLAND 25 PES | Contrato n.º 457412 | Bradesco |
CHEVROLET TRACKER | Contrato n.º 888386275 | Banco do Brasil |
XXXXXX XXXXXX MODELO BH145 4X4 | Contrato n.º 0422251-2 | Bradesco |
XXXXXX XXXXXXXX MARCA VALTRA MODELO BH180 4X4 HIFLOW ANO 2016 | Contrato n.º 489225 | Banco Lage |
9. DAS CUSTAS JUDICIAIS. DA POSSIBILIDADE DO PARCELAMENTO DAS CUSTAS INICIAIS.
Como de praxe, após o ajuizamento das demandas judiciais, é imposto ao requerente que realize o adimplemento das custas judiciais iniciais como requisito de validade para distribuição do processo à vara competente, e posterior apreciação do magistrado de piso.
Em contrapeso, no procedimento de recuperação judicial – quando as empresas formulam o pedido de concessão do instituto – compete interpretar que as dificuldades econômico-financeiras já excederam os limites para sustentar a produtividade da empresa, o que inviabiliza, na maioria esmagadora das vezes, assumir as custas judiciais iniciais de imediato. Nesse particular, à luz dos princípios da preservação e função social da empresa, por vezes, são conferidos prazos para o adimplemento ou parcelamento de tais despesas.
Logo, a fim de viabilizar o acesso à justiça aos requerentes, a concessão do parcelamento das custas processuais com base no artigo 98, §6º, do Novo Código de Processo Civil é medida que se impera, a fim de se homenagear o devido processo legal, eis que a crise econômico-financeira dos requerentes se encontra exacerbada. Sobre o tema e, colacionando caso semelhante ao presente, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul assim consignou:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRANSPORTE. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PARCELAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. PESSOA JURÍDICA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. Hipótese em que se
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mostra possível deferir-se o benefício do parcelamento das custas processuais à agravante, considerando, primeiro, o alto valor a ser adimplido, e, segundo, a comprovada dificuldade financeira da empresa, que se encontra atualmente em recuperação judicial. Haja vista não ter a agravante especificado em seu arrazoado o número de parcelas em que pretende o parcelamento, fixa-se, na hipótese versada, o adimplemento das custas processuais em 6 (seis) vezes de igual quantia. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. UNÂNIME.(Agravo de Instrumento, Nº 70080126428, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx, Julgado em: 25-04-2019)
Portanto, sendo o objetivo do processo de Recuperação Judicial reestabelecer a atividade econômica e garantir a manutenção da produção dos requerentes, comprovada a necessidade, é de ser deferida o parcelamento das custas de distribuição em 10 (dez) parcelas, com base no artigo 98, § 6º do Código de Processo Civil, haja vista ser garantia constitucional de acesso ao Poder Judiciário prevista no artigo 5º, XXXV e LXXIV, da Constituição Federal.
10. DOS PEDIDOS.
Ante o exposto, nos termos da Lei 11.101/05, requer se digne Vossa Excelência deferir o processamento da presente Recuperação Judicial para, nos termos do artigo 52 da Lei 11.101/05, no mesmo ato:
a) Nomear Administrador Judicial idôneo e capacitado para o exercício do encargo, mantendo o atual Administrador da requerente no exercício de suas funções;
b) Determinar o cumprimento às demais providências previstas no artigo 52 da Lei 11.101/05, como:
I) A dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades;
II) Ordenar a suspensão de todas as ações ou execuções contra os autores, seja na pessoa física ou jurídica, haja vista a responsabilidade ilimitada conferida aos empresários individuais, na forma do art. 6º do mesmo diploma legal, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias;
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III) Determinar a intimação do digno representante do Ministério Público para que tenha conhecimento da tramitação do presente processo;
IV) Ordenar a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal, Estadual e Municipal;
V) Determinar a publicação no DJE do edital previsto no art. 52, §1º, e art. 7º, §1º, da Lei 11.101/05;
VI) Determinar a impossibilidade de ocorrer a busca e apreensão dos bens essenciais à atividade dos requerentes, com base no artigo 49, Parágrafo 3º da Lei 11.101/05, descritos no quadro do item “8”;
c) Deferir o prazo de 60 (sessenta) dias para apresentação do plano de recuperação judicial, contados da publicação da decisão que deferir o processamento da presente;
d) deferir o parcelamento do pagamento das custas de distribuição deste feito em 10 (dez) prestações;
e) Por fim, após apresentado o plano de recuperação judicial, no prazo legal, com ausência de objeção pelos credores ou sua aprovação em assembleia, requer a concessão da Recuperação Judicial da empresa, com a consequente novação dos débitos anteriores ao pedido e seu pagamento sob a forma das condições previstas no plano de recuperação apresentado aos credores, até seu integral cumprimento, conforme disposto nos artigos 58 e 59 da Lei 11.101/05.
Protesta e requer pela apresentação de eventuais documentos que, a juízo de Vossa Excelência, não acompanharam a inicial ou se mostram insuficientes, bem como outras provas que se façam necessárias.
Dá-se à causa o valor de R$ 5.556.976,67 (cinco milhões, quinhentos e cinquenta e seis mil, novecentos e setenta e seis reais e sessenta e sete centavos).
Nestes termos, pedem deferimento.
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Porto Alegre/RS, 11 de novembro de 2019.
Adv. XXXXXXXXX XXXXXXX OAB/RS 60.105 | Adv. XXXXXX XXXXXXX XXXXXX OAB/RS 94.672 |
Adv. XXXXXX XXXXX XXXXXXXX OAB/RS 80.362 | Adv. XXXXXXXX XXXXXX XX XXXXXX OAB/RS 104.450 |
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