ESCOLA SUPERIOR DOM HELDER CÂMARA PROGRAMA DE GRADUAÇÃO EM DIREITO Rafael Rocha Teixeira
ESCOLA SUPERIOR DOM HELDER CÂMARA PROGRAMA DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx
CONTRATOS ADMINISTRATIVOS: restrições à oposição da exceptio non adimpleti contractus e o tratamento diferenciado das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Belo Horizonte 2019
Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx
Contratos administrativos: restrições à oposição da exceptio non adimpleti contractus e o tratamento diferenciado das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Monografia apresentada à disciplina Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), da Graduação em Direito pela Escola Superior Xxx Xxxxxx Xxxxxx, como requisito da avaliação final e obtenção de título de bacharel em Direito.
Orientadora: Professora Dra. Xxxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx.
Belo Horizonte 2019
ESCOLA SUPERIOR XXX XXXXXX XXXXXX
Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx
Contratos administrativos: restrições à oposição da exceptio non adimpleti contractus e o tratamento diferenciado das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Monografia apresentada à disciplina Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), da Graduação em Direito pela Escola Superior Xxx Xxxxxx Xxxxxx, como requisito da avaliação final e obtenção de título de bacharel em Direito.
Aprovado em: / /
Orientadora: Professora Dr.ª Xxxxx Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx
Examinador: Professor Dr. Xxxxxxxx Xxxx Xxxxxx
Nota:
Belo Horizonte 2019
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço à Deus por continuar me proporcionando tantas vitórias e conquistas, principalmente quanto ao êxito logrado na confecção desta obra monográfica, realizada com tanto xxxxxxx e amor pelo conhecimento, em que pese tratar-se tão somente de um jovem acadêmico movido a sonhos.
Não tenho dúvidas de que o conteúdo jurídico aqui debatido só foi possível em virtude de 1 (uma) fase dentre as quais me foram proporcionadas pelo Direito. Vivenciei um período único e gratificante entre o ano de 2017 e 2019, qual seja, o estágio não obrigatório realizado no Hospital Governador Xxxxxx Xxxxxxxx do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Estado de Minas Gerais (HGIP/IPSEMG). Esta monografia é fruto dos conhecimentos teórico e prático, pessoal e profissional, lá adquiridos. Sou muito grato aos atos da administração dos quais pude ter contato, quando estagiava tanto pelo Departamento de Gestão de Contratos (DEGEC) quanto pela Diretoria de Planejamento, Gestão e Finanças (DIPGF), em especiais os inerentes aos contratos administrativos. Antes enxergava tão somente uma relação jurídica bilateral oriunda da manifestação de vontades das partes. Hoje sei que é muito, mas muito, além disso. São vários os envolvidos responsáveis pelo funcionamento da máquina estatal. Sem a colaboração de um deles as engrenagens ficam expostas ao risco da estagnação. Nesse sentido, quero deixar formalizado meu enorme agradecimento a todos os colaborares do HGIP/IPSEMG, principalmente aqueles em que tive a honra de conhecer e trabalhar.
Atribuo meus votos de estima à professora Dr.ª Lígia Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx. Tive a oportunidade de ser seu aluno durante dois semestres e privilégio de ser seu orientando para confecção deste Trabalho de Conclusão de Curso. Meu muito obrigado! Aproveito e, em agradecimentos a todos os envolvidos na minha formação acadêmica, deixo meus sinceros votos de satisfação e gratidão em nome da melhor faculdade de Direito do Estado de Minas Gerais: Escola Superior Xxx Xxxxxx Xxxxxx.
Xxxxxxxx também a minha mãe, Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx, e ao meu pai, Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx, por permanecerem ao meu lado independentemente das circunstâncias. Quantas vezes estava estudando para produzir esta monografia ou escrevendo-a e fui interrompido, por minha mãe, tendo em vista suas preocupações quanto ao meu bem-estar. Além do mais, são merecidos os agradecimentos ao meu pai, pois foi ele quem escutou meus inúmeros erros quando treinava a apresentação da monografia ao suposto membro da Banca examinadora e, mesmo sem
entender nada, escutava tudo atentamente. Enfim, meus pais são tudo na minha vida e merecem respeito e agradecimentos diários.
Finalizo, portanto, meus agradecimentos destinando-os a uma pessoa mais que especial. Pode-se dizer que possui papel fundamental na minha vida, principalmente no que se refere ao desenvolvimento acadêmico-profissional com excelência. Ela me motiva dia após dia. Esta monografia também é resultado do seu apoio, especialmente emocional. Xxxxxxx Resende, obrigado por tudo! Te amo!
Os contratos administrativos possuem uma diferença básica quanto àqueles pertencentes à seara cível, qual seja a existência de cláusulas exorbitantes, que são adstritas à natureza de tal negócio jurídico. Nesse sentido, esta monografia teve por objetivo analisar especialmente uma dessas cláusulas, de forma teórica e prática. Os autores, principalmente os de Direito Administrativo, a denominam como restrição ao uso da exceptio non adimpleti contractus (exceção de contrato não cumprido). O seu respaldo jurídico encontra-se atualmente no artigo 78, inciso XV, da Lei Federal nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos), o qual impossibilita o particular contratado de suspender ou rescindir sua prestação do objeto contratual na hipótese do não pagamento devido pela Administração contratante, no prazo legal de 90 (noventa) dias. Muito embora, existe o Projeto de Lei nº 6.814/17, prestes a adentrar no ordenamento jurídico brasileiro, o qual revogará as principais leis licitatórias, em especial o artigo em comento no qual terá seu prazo de 90 dias reduzido à metade (45 dias). Explicar-se-ão as especificidades do referido instituto atual, além de demonstrar suas ocorrências práticas e discussões teóricas, em especial atrelados às microempresas e empresas de pequeno porte. Para a realização deste trabalho, foi verificada a congruência desse instituto com os princípios do interesse público sobre o privado e com o da continuidade dos serviços públicos. Isso posto, foram vários os resultados encontrados, inclusive aqueles os quais indicam que tal prerrogativa do Poder Público pode relativizar-se ainda mais. Principalmente quando tratar-se de microempresas e empresas de pequeno porte, uma vez que possuem tratamento diferenciado em face das demais empresa, sobretudo quando as circunstâncias do caso concreto puderem levá-las à extrema ruína por culpa exclusiva da Administração Pública.
Palavras-chave: Contrato Administrativo. Cláusula Exorbitante. Exceptio non adimpleti contractus. Projeto de Lei nº 6.814/17.
1 INTRODUÇÃO. 07
2 EXPLANAÇÕES PRELIMINARES DOS INSTITUTOS JURÍDICOS 10
2.1 Licitação Pública. 10
2.2 Princípios introdutórios básicos e adstritos à temática em questão 11
2.2.1 – Princípio da legalidade. 12
2.2.2 – Princípio da supremacia do interesse público. 11
2.2.3 – Princípio da continuidade dos serviços públicos. 14
2.3 Contratos administrativos 16
2.4 Cláusulas exorbitantes 18
3 ANÁLISE SOBRE A EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS 21
3.1 Instituto propriamente de Direito Civil 21
3.2 Restrições à oposição da exceptio non adimpleti contractus 22
3.2.1 – Ressalvas em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra 25
3.2.2 – O verdadeiro prazo excepcional de “90 dias” 28
3.2.4 – A necessidade do judiciário referente à suspensão ou à rescisão contratual 31
4 MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (ME e EPP) 35
4.1 Breve conceitos e diferenças 35
4.2 Tratamento diferenciado para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte 36
4.2.1 – Conflito entre normas principiológicas e a preponderância do tratamento diferenciado.
...................................................................................................................................................39
4.3 Quebra da ordem cronológica dos pagamentos 48
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 52
REFERÊNCIAS 55
1 INTRODUÇÃO
A Administração Pública, igualmente às empresas privadas, precisa de materiais e serviços para atingir suas finalidades. A título exemplificativo, necessita de locais para exercer suas atividades, mesas, cadeiras, contratação de pessoal, serviços de internet, telefonia, e uma gama imensurável de outros materiais/serviços.
Quanto aos meios utilizados para se contratar algo, pode-se dizer que são completamente diferentes aos usualmente vistos no âmbito das relações privadas. Se um particular deseja comprar, por exemplo, um remédio para dor de cabeça, basta ir à farmácia, pegar o produto e pagá-lo (típico contrato verbal). Diferente do que ocorre em sede de Poder Público, uma vez que os atos estatais (latu sensu) devem estar em conformidade com o regime jurídico de direito público. A administração pública deve planejar-se antecipadamente e, em regra, prescindir as contratações públicas de procedimento próprio e específico denominado Licitação Pública, de acordo com o mandamento constitucional disposto no art. 37, inciso XXI, da CF/88.
O assunto é complexo e cheio de especificidades do qual Licitação é gênero e várias são suas espécies, estas denominadas modalidades licitatórias que, em geral, geram o contrato administrativo. Nesta introdução, propõe-se destacar pequenas noções que corroborarão para o melhor entendimento ao final deste trabalho.
Em continuidade, a diferença primordial entre um contrato privado e o administrativo é observada nas Cláusulas Exorbitantes. Tais cláusulas são características fundamentais do contrato administrativo, as quais conferem poderes especiais ao administrador sobre o administrado. A Administração Pública é submetida a uma posição de superioridade diante do particular contratado, com fundamentos no princípio do interesse público sobre o interesse particular. Elas são, inclusive, aplicáveis ainda que não expressas (escritas) no instrumento de contrato (MAZZA, 2018).
Vários autores de Direito Administrativo, ao tratar das cláusulas exorbitantes ou poderes especiais da Administração Pública, identificam, em especial, as cláusulas: de alteração unilateral; de rescisão unilateral; de aplicação de sanções; de exigência de garantias; e de restrições à oposição da exceção de contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus).
Ocorre que nem sempre poderá dizer-se que proibir (vedar, limitar, restringir) o particular de suspender ou rescindir a prestação de seus serviços estará em plena consonância
ao interesse público para continuidade dos serviços. E é nesse contexto que propõe-se a responder a seguinte indagação: proibir as Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) de oporem a exceção de contrato não cumprido em face da Administração Pública, em lapso temporal inferior aos 90 (noventa) dias, conforme art. 78, inciso XV, da LLC/93, sem sequer levar em consideração suas especificidades, é atualmente razoável e proporcional quando em análise aos princípios do tratamento diferenciado e da supremacia do interesse público sobre o privado?
Em face do problema levantado, inicialmente formularam-se as seguintes hipóteses:
I) vislumbra-se que o lapso temporal de 90 dias, sob o qual são submetidos todos os particulares contratados, é excessivo, sobretudo quando não avaliam as especificidades negativas de algumas pessoas jurídicas do ramo empresarial, podendo impactar prejuízos excessivos tanto para Administração Pública quanto aos particulares, embora evitáveis; II) no que se refere a esses prejuízos causados aos particulares contratados (principalmente às EPP e às ME), acredita-se que podem ser levados a extrema ruína, desde as advertências administrativas até a “quebra” (falência) empresarial, precedida de desligamentos de funcionários. Ao passo que, para a Administração também existem prejuízos, dentre os quais podem-se citar: a má prestação do serviço público, o preço para as próximas licitações e/ou renovações contratuais com lances/reajustes acima da média de mercado, além do ônus para a seguridade social com prejuízos econômico-sociais;
Ato contínuo, formulou-se mais duas hipóteses: III) essa situação, por consequência, caminha na contra direção aos princípios administrativos norteadores, dentre os quais o favorecimento às ME e EPP quando em colaboração com o Poder Público, a economicidade, o real interesse público, considerando que nem todo serviço público enseja a sua estrita continuidade ininterrupta; e, por fim, IV) a solução para o problema poderia ser vislumbrada com a reforma legislativa cujo efeito cascata seria a retificação de todo ordenamento jurídico no que se refere aos pormenores do tema, principalmente a fim de garantir o tratamento diferenciado e favorecido às EPP e ME. Entretanto, são tão somente hipóteses que serão avaliadas no decorrer desta presente monografia.
A relevância jurídica da presente pesquisa está centrada na análise do instituto da restrição à oposição da exceptio non adimpleti contractus, conforme atualmente encontra-se positivado na LLC/93, bem como estudar especificidades de particulares contratados pela Administração Pública com foco principal nas microempresas e empresas de pequeno porte.
Para tanto, a presente pesquisa se desenvolveu mediante uma abordagem qualitativa, pela qual buscou-se compreender a teoria jurídica cumulada com a prática administrativa referente à cláusula exorbitante em comento. Quanto aos objetivos, a pesquisa é exploratória e explicativa, a fim de avaliar o que já foi dito sobre o assunto e como o instituto é aplicado no âmbito da Administração Pública. Considerando o método hipotético-dedutivo, avaliou se existem lacunas jurídicas e se estas são passíveis de serem solucionadas, principalmente levando em considerações eventual especificidade das ME e EPP, conforme se mostrará. As técnicas adotadas, em especial, foram várias pesquisas bibliográficas por meio de livros, artigos, monografias, periódicos e todo necessário para a melhor compreensão da necessidade de um particular contratado submeter-se às exigências da Administração que desequilibra a relação contratual, bem como foram realizados estudos de casos concretos e demonstrações práticas e exemplificativas.
Foram explorados, respectivamente, alguns conceitos de institutos importantíssimos para compreensão da temática, tais como as noções sobre contratos administrativos e suas cláusulas exorbitantes (item 2 ou segundo capítulo), a análise aprofundada do instituto principiológico da restrição ao uso da exceptio non adimpleti contractus, que encontra-se positivado no art. 78, inciso XV, da Lei de Licitações e Contratos, bem como suas especificidades de âmbito teórico e prático. Posteriormente, foram avaliadas as condições das ME e EPP frente à aplicação do instituto em comento, desde o conceito dessas pessoas jurídicas de direito privado até mecanismos processuais no intuito de tutelar a dignidade desses entes empresariais.
A presente pesquisa apontou que é razoável a existência da restrição ao uso da exceptio non adimpleti contractus, embora, referente ao prazo em que o particular é forçado a continuar prestando o que fora pactuado por meio de contrato de xxxxxx, não parece haver razoabilidade em todos casos. Ressaltou-se que atualmente já existe uma relativização dessa restrição, que antes era absoluta, mas percebeu-se que pode ser ainda mais mitigado sempre a depender da situação fática in casu, principalmente quando se estiver tratando de empresas de pequeno porte ou de microempresas, pois estas possuem um tratamento diferenciado quando contratadas pela Administração Pública. E, uma vez não cumpridos esses privilégios, constataram-se meios processuais pelos quais o particular contratado conseguirá amenizar a situação caótica ocasionada pelo inadimplemento contratual por culpa exclusiva do ente estatal contratante.
2 EXPLANAÇÕES PRELIMINARES DOS INSTITUTOS JURÍDICOS
Para compreensão do tema ora proposto, principalmente para aqueles com pouco ou nenhum contato com a presente matéria, faz-se necessário contextualizar os temas referente à licitação, aos princípios introdutórios básicos e adstritos à temática da exceptio non adimpleti contractus, aos contratos administrativos e suas típicas cláusulas exorbitantes.
2.1 Licitação Pública
Em simples pesquisa relativa ao vocabulário jurídico (XXXXX; XXXXXX XXXXX; XXXXX, 2014), encontram-se vários significados para o substantivo “licitação”. Em delimitação prévia do tema, trata-se aqui da licitação no espaço administrativo, sendo assim, vista como procedimento administrativo burocrático (vários atos) que tem por finalidade a celebração de um contrato.
Xxxxxxx Xxxxxxxx (2017), pode-se dizer que Licitação Pública é um ato prévio às contratações públicas. Ainda no entendimento do referido doutrinador, para a gestão da máquina pública não poderia a lei autorizar a plena discricionariedade do administrador sob pena de escolhas impróprias e escusas. Além do mais, seria uma afronta à Constituição Federal de 1988, porque atribuir ao administrador a total discricionariedade para escolher os possíveis contratados poderia dar ensejo à inconstitucionalidade de tais atos, fundamentada no princípio da impessoalidade disposto no art. 37, da Constituição da República Federativa do Brasil de 19881.
Segundo Xx Xxxxxx (2019), a vontade da Administração Pública em seu regime jurídico administrativo decorre da lei. Em outras palavras, trata-se do princípio da legalidade em sentido estrito, em que a atuação estatal depende de uma lei que a ela imponha algo (ideia de atuação vinculada e/ou discricionária) ou o autorize algo. Ressalta-se que “lei” é tida em seu sentido mais amplo, sendo que o administrador não se sujeita apenas à lei formal. Nesses termos, leva- se em consideração todo ordenamento jurídico, os princípios constitucionais e infraconstitucionais.
No Brasil, a base constitucional encontra-se prevista no artigo 37, inciso XXI, da CR/88. Em apertada síntese, essa norma dispõe que a regra para contratação de obras, serviços,
1 CRFB/88, CR/88 ou CF/88
compras e alienações se dá pelo processo prévio de licitação pública adstrito também a outros princípios. Ainda pela CR/88, o dever de legislar genericamente sobre licitações e contratos administrativos é privativo da União (Art. 22, XXVII da CF/88) que sempre o fará por meio de Lei Federal. Atualmente, no ordenamento jurídico brasileiro essa Lei Federal que se encontra em vigor é a Lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993 (Lei nº 8666/93), também conhecida como de Lei de Licitação e Contratos (LLC), muito embora exista o Projeto de Lei nº 6.814/17 que a revogará por completo.
No âmbito jurídico, quando se fala em licitar, a principal legislação que para muitos vem à mente é a Lei nº 8666/93. Isso não está errado, porém, é muito importante ter em mente que existem outras inúmeras legislações (latu sensu) de matéria é licitatória, por exemplo, a Lei Federal nº 10.520 de 17 de julho de 2002, considerada Lei do Pregão. A primeira é norma base aplicável de modo subsidiário às demais. Assim, quando nos outros dispositivos especiais não forem encontradas disposições sobre determinado assunto previsto na L.866/93, esta será aplicada de modo subsidiário.
A título meramente explicativo da complexidade do tema, cita-se a modalidade licitatória instituída pela Lei Federal nº 10.520, de 17 de julho de 2002 (Lei do Pregão), na qual além criar a modalidade do Pregão instituiu a este outras duas subespécies: Pregão Eletrônico e o Pregão Presencial (vide art. 1º e § 2º do art. 2º da legislação referida). Além do mais, essas subespécies foram regulamentadas pelo Governo Federal, por meio dos Decretos nº 3.555 em 8 de agosto de 2000 e Decreto nº 5.450 de 31 de maio de 2005, respectivamente.
Isso posto, deve-se considerar a regra na qual licitação pública é ato prévio à contratação pública (contrato administrativo), mas que, em razão da complexidade e especificidade do tema licitatório, não serão adentrados aos seus pormenores. Requer, todavia e essencialmente, saber da regra geral, qual seja: Contrato Administrativo é oriundo de Licitação Pública (gênero) que possui diversas modalidades e tipos licitatórios.
2.2 Princípios introdutórios básicos e adstritos à temática em questão
Existem princípios norteadores de suma importância quando se fala em contratos - sejam públicos ou privados. No que se refere aos contratos administrativos e à mitigação da exceção de contrato não cumprido, pode-se expor em especial os pertinentes princípios da legalidade, da supremacia do interesse público e o da continuidade do serviço público.
É de grande valia abordar os princípios acima expostos, uma vez que possuem intrínseca relação entre os contratos administrativos e a justificativa para a existência da mitigação da exeptio non adimpleti contractus. Inclusive, insta salientar que antigamente era integralmente vedada a relativização do referido instituto em face do poder público. Ato contínuo, analisam-se os supra princípios a seguir.
2.2.1 – Princípio da legalidade
O princípio da legalidade é dividido em legalidade ampla e legalidade restrita, basicamente. Aqui esse princípio está relacionado à atuação cabível do ente público (contratante).
Assim, de acordo com Xxxxxxxxxxx e Xxxxx (2017), pelo art. 5º, inciso II, da CR/88, tem-se o princípio da legalidade mais genérico (de forma ampla), do qual "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". Esta é a regra para os particulares, oriunda da autonomia da vontade, ao passo que a administração pública não tem vontade autônoma, pois gere coisa alheia.
Noutro norte, tendo em vista que a titularidade da coisa pública é do povo, a administração pública é sujeita à indisponibilidade do interesse público, ou seja, "é necessária a existência de uma lei que imponha ou autorize determinada autuação administrativa" (ALEXANDRINO; PAULO, 2017, p. 233). Este último é o princípio da legalidade estrita, fundamentado no art. 37, caput, da CR/88. Com pertinência, colaciona-se o entendimento dos autores em que:
[...] não é suficiente a ausência de proibição em lei para que a administração pública possa agir [como ocorre entre os particulares]; é necessária a existência de uma lei que imponha ou autorize determinada atuação administrativa para que ela possa validamente ocorrer [(atuação vinculada)]. (XXXXXXXXXXX; PAULO, 2017, p. 233, grifo dos autores).
Ainda assim, o entendimento de Xxxxxxxxx (2016) é o de que os contratos criam lei entre as partes (lex inter partes) e geram o dever de observância obrigatória do que fora pactuado (pacta sunt servanda). Muito embora, hodiernamente, a ideia de que os contratos nascem para serem cumpridos e que o administrador só pode agir conforme um dispositivo mandamental legal isolado vem sendo relativizada com o passar dos séculos, vez que surgiram e surgem vários problemas de ordem prática e teórica, conforme ainda se mostrará.
2.2.2 – Princípio da supremacia do interesse público
Muito se discute sobre o que seria o tão chamado interesse público, ainda mais quando se fala que esse interesse se sobrepõe ao interesse privado. Não se propõe aqui esgotar o tema, até porque não é o melhor momento. Vislumbra-se aqui abordar esse princípio de forma pertinente à temática de contratos administrativos.
Em primeiro lugar, deve-se saber que “interesse público” é um conceito aberto e, conforme Furtado (2009, p. 33), “[...] não se trata de um conceito metajurídico”. Ou seja, que não é possível de análise convencional por meio jurisprudencial. O referido autor informa que quem define isso é o direito positivo, basicamente por meio do legislador que cria a norma e a eleva à condição de interesse público. No mesmo sentido, afirma Xx Xxxxxx ao dizer que “[...] esse princípio está presente tanto no momento da elaboração da lei como no momento da sua execução em concreto pela Administração Pública (2019, p. 215, grifo da autora)”.
Para Di Xxxxxx (2019), uma das distinções a respeito da norma posta leva em consideração o interesse ao qual visa proteger. Para a autora, apesar das críticas ao tema, norma de interesse individual é tutelada pelo direito privado, ao passo que normas de interesse público são protegidas pelo direito público. Conceitua a autora:
O princípio do interesse público está expressamente previsto no artigo 2º, caput, da Lei nº 9.784/99, e especificado no parágrafo único, com a exigência de “atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei” (inciso II). Fica muito claro no dispositivo que o interesse público é irrenunciável pela autoridade administrativa. (DI XXXXXX, 2019, p. 218, grifo nosso).
Ou seja, existe uma desigualdade advinda da lei entre o interesse particular e o interesse público (de toda sociedade – geral), porque, em tese, este interesse público é propriamente a vontade geral, a vontade de todo mundo. Entende-se que o interesse público é oriundo da ficção-jurídica disposta no parágrafo único do art. 1º da CF/88, que prescreve que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente [...]” (BRASIL, 1988). Conforme Meirelles (2016, p. 114), “dada a prevalência do interesse geral sobre os individuais, inúmeros privilégios e prerrogativas são reconhecidos ao Poder Público”, como é o caso as cláusulas exorbitantes no contrato administrativo, uma vez que a Administração tem posição privilegiada em face aos administrados e estes não possuem as
mesmas prerrogativas que o Estado (latu sensu).
Os atos administrativos “gozam de presunção de legitimidade, de autoexecutoriedade e de imperatividade, sendo, respectivamente, morais, legais e verdadeiros até que se prove o contrário, podendo ser praticados independentemente da autorização do Poder Judiciário” (MARINELA, 2018, p.76), isso inclui os que denegam ao particular a suspensão da prestação de seus serviços outrora contratados.
O princípio da indisponibilidade do interesse público é decorrente da supremacia, segundo o qual:
[...] a Administração Pública não pode dispor desse interesse geral, da coletividade, nem renunciar a poderes que a lei lhe deu para tal tutela, mesmo porque ela não é titular do interesse público, cujo titular é o Estado, como representante da coletividade, e, por isso, só ela, pelos seus representantes eleitos, mediante lei, poderá autorizar a disponibilidade ou a renúncia. (XXXXXXXXX, 2016, p. 114).
Portanto, interesse público é um conceito aberto a ser avaliado de acordo com o caso concreto, tanto na fase de elaboração da norma quanto para aplicação da norma, a posteriori, em âmbito administrativo. Entretanto, observa-se que o “interesse público” poderia justificar muitos atos os quais não seriam propriamente originados interesse coletivo, apesar de gozarem de presunção de legitimidade, autoexecutoriedade e imperatividade.
2.2.3 – Princípio da continuidade dos serviços públicos
Para melhor compreensão do princípio da continuidade dos serviços públicos, necessita-se conceituar o que seria esse serviço público. Nesse sentido, Marinela (2018) apresenta que:
[...] é considerado serviço público toda atividade de oferecimento de utilidade e comodidade material, destinada à satisfação da coletividade, mas que pode ser utilizada singularmente pelos administrados, e que o Estado a assume como pertinente a seus deveres e presta-a por si mesmo, ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público, total ou parcialmente. (MARINELA 2018, p. 624).
De forma simplificada e objetiva, Xxxxxxxx Xxxxx (2018, p. 406) conceitua “serviço público como toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade”. Observa-se, portanto, que o conceito de serviço público pode ou não abranger os
diversos serviços realizados pela Administração Pública. Todavia, referente ao princípio da continuidade dos serviços públicos propriamente dito, salienta-se que “ainda que fundamentalmente ligado aos serviços públicos, o princípio alcança toda e qualquer atividade administrativa, já que o interesse público não guarda adequação com descontinuidades e paralisações na Administração” (XXXXXXXX XXXXX, 2018, p. 89).
Segundo o autor supra, além de as descontinuidades e paralisações da Administração não se adequarem ao tão chamado de interesse público, é justificável a continuidade pautada no princípio da eficiência (disposto no art. 37, caput, da CR/88). Em outras palavras, entende o autor que o serviço público deve ser eficiente e, logo, não seria condizente dizer que um serviço que sofre interrupções seja favorável ao interesse dos cidadãos/usuários. Essa afirmação está ligada à característica de adequação, aos resultados positivos e qualitativos.
Assim, o conceito de serviço público e sua relação de continuidade está adstrita “[...] a forma pela qual o Estado desempenha funções essenciais ou necessárias à coletividade, [que] não pode parar” (DI XXXXXX, 2019, p. 224). Para ilustrar, segue abaixo exemplo correlacionado à continuidade dos serviços públicos e, porém, uma noção sobre interrupção/suspensão do “serviço público”.
O Hospital de Pronto-Socorro João XXIII - HPS, localizado no bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte/MG, é um hospital público estadual da FHEMIG2, que operacionaliza o SUS3 em nível estadual, realizando atendimentos de alta complexidade em urgência e emergência e, conforme dados da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, “atua como centro de referência e excelência no atendimento a pacientes vítimas de politraumatismos, grandes queimaduras, intoxicações e situações clínicas e/ou cirúrgicas de risco de morte”(FHEMIG, 2019). Nesse contexto, entende-se que esses serviços prestados pelo referido Hospital, voltados aos pacientes, encaixam-se perfeitamente ao conceito de serviço público e, logo, devem realmente ser protegidos pelo princípio da continuidade em face do interesse público.
É nesse sentido que vários autores expõem “a impossibilidade, para quem contrata com a Administração, de invocar a exceptio non adimpleti contractus nos contratos que tenham por objeto a execução de serviço público” (DI XXXXXX, 2019, p. 224). Ou, nas palavras de Xxxx xxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, que “para evitar a paralisação das obras e serviços, é vedado ao
2 Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG
3 Sistema Único de Saúde - SUS
particular contratado, dentro de certos limites, opor em face da Administração a exceção de contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus)” (XXXXXXXX XXXXX, 2018, p. 80).
Com efeito, como garantia à continuidade, o particular contratado pelo ente estatal tem o dever de manter a prestação do serviço, mesmo diante do inadimplemento da Administração Pública, desde que essa ausência de pagamento não ultrapasse o prazo legalmente estabelecido. Ainda adentrar-se-á no mérito referente aos prazos, além de outras especificidades.
Mas, desde já, deixa-se um questionamento a ser refletido: A máquina de café localizada dentro do hospital e utilizada tão somente pelos funcionários deve ser também tutelada pelo princípio da continuidade dos serviços públicos?
2.3 Contratos administrativos
No que se refere ao conceito propriamente dito de contrato administrativo, Meirelles (2016) leciona que se trata de um acordo entre a Administração Pública, agindo nesta qualidade, e o particular (ou outra entidade administrativa), sempre a fim de atender o interesse público, de acordo com cláusulas estabelecidas de modo unilateral pelo Estado.
Segundo a Lei nº 8.666 de 21 de junho 1993, em seu art. 2º, parágrafo único:
[...] considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada. (BRASIL, 1993).
Relativamente ao conceito de Xxxxxxxxx e ao que está positivado no dispositivo supra pode haver questionamentos, tais como: todo contrato que envolva o Poder Público como parte (contratante) terá cláusulas estabelecidas de modo unilateral pelo Estado? A resposta, como de costume no meio jurídico, é: depende!
O conceito apresentado na lei trata do contrato administrativo em sentido amplo, conforme conceituação de Xxxxxx Xxxxx (2016). Nesse contexto, para fins teóricos, é importante salientar que a maior parte da doutrina de Direito Administrativo diferencia “Contratos da Administração” e “Contratos Administrativos”. Assim, Mazza (2018) leciona que:
[...] existem contratos celebrados pela Administração Pública que não são considerados contratos administrativos. Por isso, é conveniente diferenciar o gênero contratos da Administração, que são todos aqueles firmados pela Administração
Pública, incluindo os regidos pelo direito privado, e a espécie contratos administrativos, considerados como tais somente os submetidos ao Direito Administrativo. É importante destacar que os contratos privados celebrados pela Administração também sofrem alguma influência do direito público, especialmente quanto ao dever de prévia licitação para escolha do contratado. (MAZZA, 2018, p. 648).
Em outras palavras, “Contratos da Administração” correspondem ao gênero que envolve todos contratos nos quais o Poder Público é parte – por exemplo, um contrato de locação de imóvel cuja propriedade é do particular e o locatário é um Município, sendo que nesse tipo de contrato não há que se falar na aplicação da L.8666/93 (art. 62, § 3º, desta lei) – enquanto que os “Contratos Administrativos” correspondem às espécies do gênero – por exemplo, um contrato de prestação de serviços firmado entre o particular e um Município para fornecimento de medicamentos ao hospital desse Município. Diferente do primeiro exemplo, neste segundo haverá aplicação imediata da Lei de Licitações.
Essa diferenciação faz-se necessária para afunilar a temática pela qual a análise do instituto exceptio non adimpleti contractus será avaliada nos Contratos Administrativos, pois nos Contratos Administrativos é que incidem as “normas reguladoras diversas das que disciplinam os contratos privados firmados pelo Estado” (XXXXXXXX XXXXX, 2018, p. 244).De acordo com o esse autor, essas normas são especiais (ou exclusivas) de direito público. Havendo subsidiariamente a aplicação da Lei nº 8666/93 e, supletivamente, a do Código Civil e/ou outras eventuais normas do direito privado.
Atender o interesse do povo, por meio das cláusulas estabelecidas de modo unilateral pelo Poder Público, requer a conexão e o respaldo do regime jurídico administrativo. Assim, a expressão Regime Jurídico Administrativo é:
[...] reservada tão somente para abranger o conjunto de traços, de conotações, que tipificam o Direito Administrativo, colocando a Administração Pública numa posição privilegiada, vertical, na relação jurídico-administrativa. (DI PIETRO, 2019, p. 203).
A complementação do conceito de contrato administrativo pode ser encontrada nas brilhantes palavras de Marinela, sendo aquele no qual haja
[...] a convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extinguir, entre elas, uma relação jurídica patrimonial, tendo sempre a participação do Poder Público, visando à persecução de um interesse coletivo, sendo regido pelo direito público. É o ajuste que a Administração Pública firma com o particular ou outro ente público, para a consecução de interesse coletivo. O instrumento é regulado pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se a eles, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado. (MARINELA, 2018, p. 551).
Logo, contrato administrativo é “o ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma forma, traduza interesse público” (XXXXXXXX XXXXX, 2018, p. 245). Não obstante, contrato administrativo (espécie) é diferente de contrato da administração (gênero): o primeiro visa ao interesse público e, por isso, possui cláusulas exorbitantes. O conceito é simples, mas dispõe de toda lógica do negócio jurídico administrativo.
2.4 Cláusulas Exorbitantes
Primeiramente, buscou-se o conceito de “Cláusula” sob a ótica da linguagem jurídica. Conforme Xxxxx (2014, p. 457), cláusula é “toda manifestação da vontade imposta em um contrato, ou ato, em virtude da qual se restringe ou se dispõe a respeito das condições em que o mesmo possa exercer seus efeitos em relação às partes que o elaboram e aceitam”. Posteriormente, pesquisou-se acerca do significado de “Exorbitante” e, pelo vocabulário jurídico de Xxxxx (2014), encontrou-se que o substantivo vem do latim exorbitare (ex significa fora e órbita traduz limites), sendo tudo aquilo que vai além, ultrapassa os limites, excede, leva vantagem.
Desse modo, se se considerar apenas o significado dos substantivos e, junto ao tema presente, pode-se conceituar cláusulas exorbitantes como aquelas nas quais ocorrem por meio das manifestações de vontades inseridas em um contrato que produzem efeitos jurídicos, todavia, ultrapassam limites padrões com intuito de se obter vantagem unilateral.
Os doutrinadores, em geral, conceituam as cláusulas exorbitantes ou como consideradas por Marinela, cláusulas de privilégio, sendo “aquelas que extrapolam, excedem e ultrapassam o padrão comum dos contratos em geral, a fim de consignar uma vantagem para a Administração Pública” (2018, p. 553). Na mesma linha de Xxxxxxxx, o autor Xxxxxxxx (2017) também comunga com o entendimento de que se previstos em negócio jurídico de direito privado, tais dispositivos ensejariam a nulidade contratual, uma vez que seriam considerados como abusivos, ilícitos e, portanto, não lidos.
No mesmo entendimento, Amorin (2017) e Xxxxx (2018) dizem que as cláusulas exorbitantes são aquelas que conferem prerrogativas à Administração, ficando esta hierarquicamente superior em relação ao contratado. Inclusive, podem ser aplicadas ainda que não escritas no instrumento. Motivo pelo qual são características adstritas ao contrato
administrativo e é exatamente isso que as diferencia dos contratos da administração, como sendo aquele inerente ao regime jurídico-administrativo.
Dessa maneira, observa-se que não há divergências quanto ao conteúdo do conceito das cláusulas exorbitantes, nome esse preferencialmente chamado pela maioria da doutrina. Senão veja-se o conceito apresentado por Xxxxxxxx (2017):
As cláusulas exorbitantes são aquelas que extrapolam as regras e características dos contratos em geral, pois apresentam vantagem excessiva à Administração Pública. Decorrem da supremacia do interesse público sobre o interesse privado e colocam o Estado em posição de superioridade jurídica na avença. Estas cláusulas são designadas como exorbitantes, haja vista o fato de que sua previsão em contratos privados ensejaria a nulidade contratual. Com efeito, seria leonina e abusiva a cláusula contratual privada que permitisse a uma das partes rescindir o contrato ou alterá-lo unilateralmente, sem a necessidade de oitiva da outra parte. (XXXXXXXX, 2017, p. 548).
Percebe-se que o autor deixa clara a ideia de supremacia do interesse público sobre o interesse privado, princípio norteador do Direito Administrativo. Ou seja, a desigualdade existente nos contratos administrativos não decorre única e exclusivamente do interesse pessoal dos gestores administrativos, até porque seria uma notória violação constitucional. Para o momento, reitera-se que isso jamais poderia permitir o exercício autoritário do Poder Público.
Nesse sentido, Xxxxxxxx (2018) cita os ensinamentos do autor Xxxxxxx, no qual há “um regime de direito público que busca satisfazer interesse público concreto a que o contrato deve servir, sem sacrificar os princípios superiores de justiça e equidade a que todo o Estado deve propender” (XXXXXXX XXXXXXXX, 1988, apud MARINELA, 2018, p. 552). Nota-se, desde já, que o autor fala em interesse público “concreto”.
São várias as cláusulas exorbitantes. O art. 58 da Lei nº 8.666/93 prevê algumas delas:
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - fiscalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. [...] (BRASIL, 1993).
Furtado (2009) nomeia, respectivamente, essas prerrogativas da Administração de Modificações unilaterais; Rescisão unilateral; Fiscalização da execução do contrato; e Aplicações de sanções. No mesmo entendimento, Marinela (2018) ratifica que:
A enumeração das cláusulas exorbitantes está no art. 58 da Lei n. 8.666/93, que legitima à Administração a possibilidade de: modificação unilateral do contrato, rescisão unilateral por parte da Administração, além da fiscalização, da possibilidade de aplicação de penalidades e da ocupação provisória de bens da contratada. (MARINELA, 2018, p. 553-554).
Além das cláusulas descritas no artigo acima, Furtado (2009) também dispõe sobre a existência de outras cláusulas exorbitantes espalhadas pela Lei 8.666/93. O autor aponta as cláusulas seguintes: Retenção de crédito e exigência de garantias, Anulação do contrato e, por último, a Exceção de contrato não cumprido.
Com relação ao conceito, pela ordem das cláusulas supra, e em síntese, o autor pontua que são aquelas as quais atribuem à Administração Pública a possibilidade de executar e exigir garantias contratuais, o poder de anular unilateralmente o contrato administrativo e, quanto à última, trata-se do dispositivo jurídico que impede o particular de opor à exceção de contrato não cumprido em face da Administração. Este é o tema que requer tópico especial a ser apresentado.
3 ANÁLISE SOBRE A EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS
Na presente obra, a todo momento se fala na expressão em latim Exceptio non adimpleti contractus, ou, em português, Exceção de Contrato não Cumprido e, por isso, reservou-se um tópico específico para melhor compreensão do vasto instituto.
3.1 Instituto propriamente de Direito Civil
Primordialmente, salienta-se que é um tema de relevante utilização prático-jurídica de âmbito civilista. E assim, é necessário colacionar conceitos e especificidades do Direito Civil para compreensão no âmbito administrativo. A matéria encontra-se positivada em seção especial do Código Civil de 2002, conforme artigo 476, em especial, in verbis:
Seção III. Da Exceção de Contrato não Cumprido. Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la. (BRASIL, 2002, grifo nosso).
O objeto de análise é o primeiro dispositivo legal – artigo 476 – que consagra o Princípio4 da Exceção de contrato não cumprido. Nesse sentido, o autor Stolze (2017) conceitua o instituto como “meio de defesa, pelo qual a parte demandada pela execução de um contrato pode arguir que deixou de cumpri-lo pelo fato da outra ainda também não ter satisfeito a prestação correspondente” (2017, p. 481, grifo nosso). Nesse conceito, é possível perceber que a “exceção” é matéria de defesa alegável tão somente em contratos bilaterais, nos quais o outro polo da relação contratual deixa de adimplir com sua prestação e, isso sim, enseja que a outra também não cumpra com a contraprestação.
Na tentativa de facilitar o entendimento, tem-se o seguinte exemplo hipotético: Xxxxxxx e Xxxxx firmam contrato de prestação de serviços cuja prestações bilaterais envolvem a obrigação de Xxxxxxx pintar de casa de Lígia e, a esta, há o dever de pagá-lo semanalmente o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) até o término da empreitada. Ocorre que após 3 (três) semanas de perfeito cumprimento contratual, Xxxxx deixa de adimplir sua obrigação de pagar.
4 Nader (2016) trata a exceção de contrato não cumprido como um princípio jurídico.
Xxxxxxx continua a prestar seus serviços, mas na semana seguinte ao inadimplemento, sem recursos financeiros para comprar os materiais necessários (lixas, tinta, selador, etc.), decide suspender o serviço de pintura. Xxxxx, diz que está e ficará sem dinheiro durante algumas semanas, pois não se planejou financeiramente de modo adequado, motivo pelo qual exige a continuidade dos serviços.
Nesse ponto, indaga-se: em face do inadimplemento de Lígia, Xxxxxxx poderia ter suspendido a prestação dos serviços pactuados? A seara civilista aponta que Xxxxxxx tem o direito de suspender a prestação dos serviços, haja vista a ausência inicial da contraprestação, pois sem esta contraprestação há notório desequilíbrio contratual não tutelado pelo Direito Civil, além da exigência infundada de Lígia. Dessa maneira, utiliza-se da exegese do supracitado art. 476, do CC/02: Lígia não poderia exigir o cumprimento da obrigação de Xxxxxxx antes de adimplir sua obrigação (pagar). Veja que Xxxxxxx pode utilizar da exceção de contrato não cumprido como argumento (meio de defesa) para não cumprir o pactuado até que receba seus devidos pagamentos.
Noutro norte, segundo Stolze (2017, p. 482), “trata-se, também, de um instrumento bastante útil para forçar o devedor a cumprir a sua obrigação, uma vez que a recusa de pagamento da obrigação pode compeli-lo a tal fim.”. O que de fato é uma verdade, observe-se que, pelo exemplo acima, Xxxxx é tacitamente compelida a conseguir o dinheiro de outro modo (outra fonte de renda, poupança, emprestado, etc.), sob pena de manter sua casa desorganizada aguardando o término da pintura.
3.2 Restrições à oposição da exceptio non adimpleti contractus
Uma vez compreendida a exceção do contrato não cumprido ou exceptio non adimpleti contractus na seara cível, passa-se a correlacioná-lo com sua aplicação no âmbito administrativo, sob a análise do entendimento ultrapassado até o entendimento mais moderno, embora ainda a mercê da antiguidade.
Os clássicos do Direito Administrativo, de acordo com Furtado (2009), entendiam que o particular contratado pela Administração Pública não poderia opor a exceção de contrato não cumprido contra o supremo Estado sob fundamentação jurídica embasada pelo princípio da continuidade do serviço público e interesse público sobre o privado, em especiais. Corrobora esse entendimento a doutrina de Xxxxxx Xxxxx, ao explanar que “na legislação anterior [à Lei
8.666/93], a situação era diversa e o contrato deveria ser executado normalmente” (2009, p. 823). Ressalta-se que apenas nos casos em que o contratado estivesse à beira da insolvência civil teria o particular o interesse jurídico em utilizar seu “direito” ao meio de defesa, ou seja, deixar de cumprir o pactuado após autorização do judiciário.
Com o tímido amadurecer jurídico, inicialmente jurisprudencial, o entendimento supra foi sendo mitigado na medida em que fora concedida autorização ao contratado para se valer da exceptio non adimpleti contractus. Sem dúvidas, também apenas para formas excepcionalíssimas e muito bem fundamentadas, além do antigo rol numerus clausus (hipótese de insolvência civil), esse é o entendimento de Furtado (2009).
Condizente citar a lição de Xx Xxxxxx (2019), no sentido de que:
O rigor desse entendimento tem sido abrandado pela doutrina e jurisprudência, quando a “inadimplência do poder público impeça de fato e diretamente a execução do serviço ou da obra” (cf. Xxxxxx Xxxxxx, 1986:74); além disso, torna-se injustificável quando o contrato não tenha por objeto a execução de serviço público, porque não se aplica, então, o princípio da continuidade. Permanece, no entanto, o fato de que a lei não prevê rescisão unilateral pelo particular; de modo que este, paralisando, por sua conta, a execução do contrato, corre o risco de arcar com as consequências do inadimplemento, se não aceita, em juízo, a exceção do contrato não cumprido. (DI PIETRO, 2019, p. 594).
Hodiernamente, a relativização da antiga vedação praticamente integral quanto à possibilidade de opor a exceção de contrato não cumprido encontra-se positivada na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 (Lei de Licitações), pelo art. 78, inciso XV, localizado à Seção V que trata da inexecução e da Rescisão dos Contratos, conforme se vê abaixo:
Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato: [...] XV - o atraso superior a 90 (noventa) dias dos pagamentos devidos pela Administração decorrentes de obras, serviços ou fornecimento, ou parcelas destes, já recebidos ou executados, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, assegurado ao contratado o direito de optar pela suspensão do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação; [...] (BRASIL, 1993, grifos nosso).
Assim, dentre outros motivos que justificam a rescisão do contrato administrativo, elencados no art. 78 da Lei nº 8.666/93, tem-se a interpretação do inciso XV em que, a priori, o particular não pode rescindir a prestação dos seus serviços enquanto não se completarem 90 dias de mora (não pagamento) por culpa da Administração. A maior parte da doutrina de Direito Administrativo considera essa imposição de relativização, restrição ou mitigação à oposição da exceptio non adimpleti contractus. Dessa maneira, se é uma cláusula normativa em benefício
notadamente superior à Administração Pública (ou ao interesse público) em detrimento dos particulares, que, em outras palavras, os obrigam a sustentar o desequilíbrio contratual, é notória Cláusula Exorbitante.
O dispositivo, porém, é rico em informações que requerem bastante atenção. Observe, pois, que o caput do art. 78 fala em rescisão, mas no final do inciso XV diz “assegurado ao contratado o direito de optar pela suspensão do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação”. Ou seja, autoriza o particular não somente a rescisão do contrato administrativo, mas também a faculdade de suspender a sua prestação pactuada.
Ainda assim, atente-se que há ressalvas que obrigam o particular contratado a continuar adimplindo sua prestação contratual, mesmo na eventualidade de ficar sem receber pagamentos por tempo superior a 90 (noventa) dias, quais sejam os casos de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra. Conceitos indeterminados que serão explanados no subtópico próximo.
Furtado (2009) contextualiza que:
Se o contratado atrasa o cumprimento de sua obrigação, a Administração tem o direito de não pagar o que lhe seria devido, além de puni-lo administrativamente; se a Administração não paga o que é devido, o contratado somente poderá deixar de executar o contrato, seja por meio do pedido de rescisão, seja pela suspensão da execução do contrato, após o decurso de prazo superior a 90 dias. A única efetiva conseqüência do pagamento efetuado com atraso pela Administração será o da atualização monetária desses valores. (XXXXXXX, 2009, p. 466).
Em outras palavras, a Administração pode ficar em mora (atrasar os pagamentos devidos) por praticamente 3 (três) meses, enquanto, dentro desse prazo, o particular deve normalmente continuar arcando com o convencionado. Teoricamente, seria o risco da atividade empresarial cumulado com o princípio da continuidade dos serviços públicos em prol do interesse coletivo.
Didaticamente e em interpretação aos conceitos expostos, aplicando-os aos aspectos de ordem prática, vislumbra-se um hospital público (autarquia estadual) cujo principal bem constitucional tutelado é a vida. Neste, sem dúvidas, há diversos contratos administrativos. Pois bem, na eventualidade de a Administração Pública atrasar o pagamento de um dos seus fornecedores de material médico-hospitalar, mora verificada em 55 (cinquenta e cinco) dias, poderá o contratado adotar alguma medida de imediato?
Há de se ressaltar que pelo exemplo acima houve nítido rompimento do equilíbrio contratual, onerando excessivamente uma das partes (contratado), vez que sustenta
unilateralmente a prestação por quase 2 (dois) meses sem receber a contraprestação contratual. De início e hipoteticamente, se a análise fosse tão somente entre particulares,
considerar-se-ia a relação jurídica bilateral, os princípios da função social dos contratos, da justiça contratual, da equidade e do equilíbrio dos contratos para valer-se da regra civilista disposta no art. 476, do Código Civil de 2002, pela qual o inadimplente não teria o direito de ver o cumprimento forçado da prestação de entrega dos materiais médico-hospitalares enquanto não adimplisse sua obrigação (pagar). Ou seja, o contratado oporia a exceptio non adimpleti contractus.
Ressalta-se, ainda, que a Teoria Geral dos Contratos, positivada no CC/02, é subsidiária aos Contratos Administrativos. Nestes, o que os diferem dos contratos particulares, é o aspecto do interesse público, que fundamenta a quebra da equidade contratual pelas admitidas Cláusulas Exorbitantes, iluminando-se assim a nítida e legal relação de verticalidade em que o particular se encontra abaixo.
Desse modo, considerando o caso prático exposto, em regra, o particular (fornecedor dos materiais médico-hospitalares à Administração) não poderá opor a exceção de contrato não cumprido, uma vez que existe regra especial prevista na Lei de Licitação (art. 78, IX, da L.8666/93). Logo, deverá manter a prestação dos seus serviços normalmente e, no máximo, aguardar mais cerca de 35 (trinta e cinco) dias para que analise a possibilidade de suspender seus serviços, sob pena de sanções contratuais.
3.2.1 – Ressalvas em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra
Conforme anteriormente pontuado, os casos de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, são fundamentos jurídicos suficientes para obrigar o particular contratado a manter a prestação das suas obrigações contratuais por prazo muito superior aos 90 (noventa) dias legais, sem receber qualquer pagamento da Administração, desde que essas ocorrências imponham a paralisação antes do prazo limite.
No início do ano de 2019 foram vários os estados que se autodeclararam em situação de calamidade pública, sob a justificativa de suposta crise financeira. Xxxxxxx Xxxxxxxxx, por meio do jornal “O Estado de São Paulo”, em 17 de janeiro de 2019, relatou a seguinte notícia:
Seis Estados brasileiros declararam situação de calamidade financeira. Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Mato Grosso declararam estado de calamidade pública financeira. [...] Com a nova onda de decretos de calamidade financeira deflagrada por novos governadores que tomaram posse neste ano, já são seis os Estados que oficialmente assumem não terem condições de cumprirem seus compromissos. E embora a penúria das contas públicas nesses locais impeça até mesmo o pagamento dos salários dos servidores, esses Estados não estão aptos a receberem ajuda da União. (XXXXXXXXX, 2019, grifo do autor).
Com isso, embora a norma seja excepcional, parece que se tornou natural ou fora do incomum, inclusive por tratar-se, nesse caso, de ato administrativo normativo de competência exclusiva do Chefe do Executivo Estadual (Governador), que o faz por meio de Decreto com previsão constitucional no art. 84, inciso IV, da CF/88 e, ainda, segundo critérios de oportunidade e conveniência (mérito administrativo). Competência discricionária, porém, vinculada. Optou-se por não aprofundar nessa especificidade e, para o momento, vale o entendimento do Dr. Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxx, professor de Direito Administrativo e Procurador da Fazenda Nacional:
[...] a discricionariedade não pode ser usada como um instrumento para a realização de atos abusivos pelos administradores públicos. É preciso que essa prática seja coibida. Afinal, o sistema normativo brasileiro é um todo indissociável. Os atos administrativos precisam estar de acordo com as leis e estas e aqueles em concordância com os preceitos impostos pela Constituição Federal. Desse modo, ao realizar o juízo de conveniência e oportunidade, a intelecção de conceitos indeterminados, a apreciação do fato sensível a partir de conceitos de valor, a autoridade administrativa não atua de acordo com o seu querer, com seus desejos, pois está manejando atribuições públicas e, sendo assim, deve buscar sempre o melhor para o atendimento do interesse público. [...] Desse modo, mesmo quando se diz estar diante de uma competência discricionária do administrador público, este, em última análise, irá atuar em consonância com a lei, vez que, apesar desta lhe conferir certa liberdade de escolha, o faz estipulando certos limites previamente delineados no ordenamento jurídico, os quais não pode ultrapassar sob pena de incorrer em ilegalidade ou abuso de poder. (XXXXX XX XXXXXXXX, 2012).
Referente aos casos de calamidade pública, traz-se à tona o caso de ordem pública do Estado de Minas Gerais (MG), conforme acima pontuado. Por meio do Decreto Estadual nº 47.101, de 05 de dezembro de 2016, atualizado em 24 de agosto de 2018. O Governador de MG, à época, Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, decretou situação de calamidade financeira para todo o estado. É o conteúdo do artigo 1º:
Art. 1º. Fica decretada a SITUAÇÃO DE CALAMIDADE FINANCEIRA no âmbito do Estado em razão do crescente déficit financeiro decorrente do histórico crescimento de despesas para as quais as receitas originárias, derivadas e transferidas têm sido insuficientes dado o severo momento econômico mundial e nacional que
compromete a capacidade de investimento e o custeio para a manutenção dos serviços públicos.. (MINAS GERAIS, 2016)
Em consonância com o tema desta monografia, traz-se a demanda jurídica proposta por uma empresa de medicamentos (contratada e autora) 5 em face do Estado de MG (contratante e réu). Os fatos abrangiam a necessidade da contratada em suspender suas prestações contratuais haja vista uma dívida apurada em quantia superior a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) por tempo superior aos 90 dias de mora pelo contratante.
Primeiramente, houve decisão interlocutória contrária à pretensão do particular contratado (autor), pois foi indeferida a tutela de urgência cuja finalidade era, basicamente, obrigar a Administração contratante (réu) a abdicar-se da prática de todo e qualquer ato tendente a penalizar a autora em razão da suspensão das prestações contratuais por parte do contratado. Em sede de Agravo de Instrumento, o particular contratado reverteu a situação.
Ressalta-se, todavia, que a parte ré fez-se valer de todos os meios recursais cabíveis, pautando- se no entendimento de suposta violação do art. 78, XV, da LLC/93, pelo magistrado, quando autorizou a suspensão da prestação contratual sem supostamente observar que o Estado de Minas Gerais se encontrava em situação de calamidade pública. Nesse sentido, veja a parcial fundamentação:
[...] O debate em questão trata da negativa de vigência do art. 78, XV, da Lei nº 8.666/93 no caso em tela. Assim dispõe o aludido artigo: (...)Assim, tem-se que o acórdão recorrido não atentou para a ressalva existente no referido artigo, uma vez que o Estado de Minas Gerais se encontra em grave estado de calamidade pública, o que impede a arguição da exceção de contrato não cumprido pela contratada. É público e notório que o Estado de Minas Gerais decretou estado de calamidade pública de ordem financeira, Decreto Estadual nº 47.101, de 05/12/16, provocado pelo desnível de fluxo financeiro. Vejam que, só nas despesas de pessoal nos últimos 10 anos, acumulou-se o percentual de 252,98%, enquanto a receita corrente líquida no mesmo período chegou a praticamente metade disso: 137,50%. Destarte, diante desse quadro, desde dezembro de 2016, encontra-se o Estado em situação de calamidade financeira (Decreto Estadual 47.101, de 05 de dezembro de 2016), atraindo a incidência da ressalva contida no art. 78, inc. XV da Lei 8.666/93. (MINAS GERAIS, 2019, grifos nosso).
Salienta-se que no juízo de admissibilidade foi negado seguimento ao Recurso Especial (RE) e, em posteriores atos processuais, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu do agravo de instrumento em recurso especial para não conhecer do RE.
Diante de todo exposto, vislumbrou-se que os casos de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, de acordo com a literalidade do art. 78, inciso XV, da
5 Expressa Distribuidora de Medicamentos Ltda.
Lei de Licitações e Contratos, são motivos jurídicos supostamente justificáveis para que o Poder Público exija do particular a continuidade das prestações contratuais, mesmo que sem receber quaisquer pagamentos por prazo muito superior aos 90 (noventa) dias, embora os Tribunais possam entender de modo contrário.
3.2.2 – O verdadeiro prazo excepcional de “90 dias”
É razoável que o particular contratado, sem experiência no âmbito licitatório, questione o porquê da contagem dos 90 dias não se iniciar na data da entrega do produto ou no dia da efetiva prestação do serviço, uma vez que existem duas datas referentes ao recebimento. São os chamados recebimento provisório e o recebimento definitivo.
Xxxxxxxx (2018), quando leciona sobre as regras para entrega do objeto contratual, diz que o contratante recebe “provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação e, em definitivo, após a verificação da qualidade e quantidade do material e consequente aceitação” (MARINELA, 2018, p. 576).
Essa diferença entre recebimento provisório e definitivo é bastante importante, inclusive para saber quando o contratado poderá exigir o pagamento, uma vez que a LLC (1993) garante à Administração o prazo para pagar em 30 (trinta) dias corridos após recebimento definitivo. Ou seja, se não pagar estará juridicamente em mora apenas após 30 (trinta) dias.
É também o entendimento de Xxxxxx (2017), que, sobre o tema, indica as regras e formalidades dispostas no art. 73 da Lei de Licitações. Ainda no que se refere às compras e locações de equipamento, cita o inciso II, do referido dispositivo, qual seja:
Art. 73. Executado o contrato, o seu objeto será recebido: [...] II - em se tratando de compras ou de locação de equipamentos: a) provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação; b) definitivamente, após a verificação da qualidade e quantidade do material e consequente aceitação. [...] (BRASIL, 1993, grifo nosso).
Em outras palavras, o contratado entrega o material e a Administração recebe-o provisoriamente, a fim de verificar se o material entregue condiz com as especificações do contrato administrativo (prazo de entrega, quantidade, qualidade, data de validade, etc.). Posteriormente, se não se adequar às hipóteses de rejeição do material (art. 76, da Lei nº 8.666/93), o contratante atesta que o fornecimento executado (obra ou serviço) está de acordo com o contratado e logo o recebe definitivamente. Isso também serve para que seja liquidado o
direito adquirido do contratado para posterior pagamento. Nesse sentido, colaciona-se a exemplificação por Harrison Leite (2016):
Quando, por exemplo, se contrata a aquisição de medicamentos do tipo x, deve-se verificar, no momento do cumprimento do contrato, se os medicamentos entregues são iguais aos licitados (tipo x), a fim de que não haja burla, ou que se contrate um bem e se receba outro distinto. Aqui há a importante figura do liquidante, pessoa responsável por assinar o processo de liquidação e atestar que recebeu o material exatamente como licitado, ou que conferiu a entrega da obra, nos termos do contrato. (LEITE, 2016, p. 268).
Todavia, no que se refere às compras ou locação de equipamentos, não se encontrou prazo legal máximo estabelecido para que a Administração receba definitivamente o objeto, mesmo porque depende das especificidades individuais de cada pacto administrativo (por exemplo, um material muito técnico que demande vários testes de qualidade). Consequentemente, não se inicia a contagem dos prazos, tanto de 30 dias para que a Administração pague quanto para a possibilidade de o particular opor como meio de defesa à exceptio non adimpleti contractus.
Óbvio que o particular não pode ficar à mercê da discricionariedade ilimitada do contratante, muito menos da remota possibilidade de procrastinação administrativa. Desse modo, verificou-se o que a doutrina chama de “Recebimento Implícito”, conforme disposto no art. 73, §4º da Lei de Licitações e Contratos. Amorin (2017), em comento ao dispositivo, diz que o objeto contratual reputar-se-á recebido definitivamente após 15 (quinze) dias do comunicado administrativo que eventualmente optou por fazer o contratado à Administração contratante, a fim de que providenciem a verificação das conformidades do material entregue com o contrato.
Para melhor compreensão desse prazo de “90 dias”, apresenta-se um exemplo teórico-prático. Desde já, importante aduzir que a finalidade desse exemplo é demonstrar a existência de certa complexidade no momento de avaliar (conferir) se o material entregue condiz com o que fora contratado. Nesse sentido, vislumbra-se a existência de um contrato administrativo de prestação continuada, tendo como partes de um lado a Administração Pública contratante e do outro o particular contratado, cujo objeto trata-se de kit de agulhas cirúrgicas com quantidade anual limitada em 100.000 (cem mil) unidades, sendo que cada caixa possui 8 dessas unidades.
Para tanto, tem-se que a Administração contratante solicitou ao contratado a entrega de 752 (setecentos e cinquenta e duas) unidades do material médico-hospitalar (94 caixas), para
serem entregues na data de 01 de março de 2019 (sexta-feira). Nestes exatos termos, foi cumprido pelo contratado.
Desse modo, pergunta-se: a partir dessa data, em que o particular entregou as 94 caixas do material (01/03/2019), é que inicia a contagem do prazo de 90 dias para eventual oposição do instituto da exceção de contrato não cumprido? Veja que, se a resposta for “sim” e a Administração contratante não pagar dentro do período estipulado, o contratado poderá optar por suspender o contrato a partir de 31 de maio de 2019 (nonagésimo primeiro dia). Entretanto, conforme acima se expôs, a resposta não é tão simples assim, uma vez que o contratado depende do recebimento definitivo. Recebimento este que só será emitido após a análise do material entregue ou, se inerte a Administração contratante, após passados 15 dias do prévio comunicado por escrito (Recebimento Implícito – presunção de que a Administração recebeu definitivamente).
Pressuponha que não houve qualquer comunicado realizado pelo contratado à Administração, sendo que esta contratante atestou o material (recebeu definitivamente) no dia 01 de abril de 2019 (segunda-feira), ou seja, 31 (trinta e um) dias após a data na qual o particular efetivamente entregou os materiais médico-hospitalares. Destaca-se que pode haver discussões sobre a excepcionalidade desses prazos muitos superiores à entrega do objeto contratual, todavia, pode acontecer e, inclusive, não é algo muito anormal tratando-se da habitual morosidade do Estado.
Ocorre que é tão somente a partir dessa data (01/04/19) que iniciará a contagem dos prazos. Ou seja, nesse exemplo, a Administração contratante deverá pagar o contratado até 01 de maio de 2019 (prazo de pagamento de até 30 dias) e, não o fazendo, restar-se-á em mora pelo inadimplemento contratual. Já no que se refere ao contratado, este somente poderá se recusar a cumprir o que fora pactuado a partir de 01 de julho de 2019 (segunda-feira, nonagésimo primeiro dia após o recebimento definitivo), o que, na realidade, significam 122 (cento e vinte e dois) dias após a efetiva entrega do objeto contratual. Portanto, nesse caso teórico-prático, o particular contratado sustentou o ônus contratual por 4 (quatro) meses ininterruptos de modo totalmente unilateral.
Nesse exposto, pode-se dizer que o termo inicial do prazo legal para eventualmente opor a exceção de contrato não cumprido não é o da imediata entrega do objeto à Administração, salvo se a contratante imediatamente proceder ao ateste do material segundo o estabelecido contratualmente. Se assim não o fizer, não há prazo legal que a obrigue a cumprir a verificação
em tempo hábil, entretanto, entende-se que pode o particular, inclusive na data da entrega, deixar expresso o comunicado para o efetivo ateste em 15 dias, sob pena de presunção do recebimento definitivo.
3.2.3 – A necessidade do judiciário referente à suspensão ou à rescisão contratual
Existiam discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca do seguinte questionamento: ultrapassado o prazo legal de 90 dias de mora da Administração, poderia o particular contratado automaticamente suspender a prestação dos serviços, ou seja, sem a necessidade de provocar o Poder Judiciário?
Antes disso, vale ressaltar que sobre o descumprimento contratual sem motivo justificável incidem diversas sanções administrativas, tal como dispõe o art. 87 da LLC/93:
Das Sanções Administrativas [...] Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: I - advertência; II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato; III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos; IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior. [...] (BRASIL, 1993, grifos do autor e nosso).
Mesmo na ausência de dispositivo legal específico para resposta à indagação introdutória, jurisprudencialmente a divergência parece ter sido sanada. A resposta para a pergunta pode ser obtida por meio do julgado em Recurso Especial, nº 910802, proferido pela segunda turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando analisou a temática. Veja a parcial do acórdão:
[...] Com o advento da Lei 8.666/93, não tem mais sentido a discussão doutrinária sobre o cabimento ou não da inoponibilidade da exceptio non adimpleti contractus contra a Administração, ante o teor do art. 78, XV, do referido diploma legal. Por isso, despicienda a análise da questão sob o prisma do princípio da continuidade do serviço público. 5. Se a Administração Pública deixou de efetuar os pagamentos devidos por mais de 90 (noventa) dias, pode o contratado, licitamente, suspender a execução do contrato, sendo desnecessária, nessa hipótese, a tutela jurisdicional porque o art. 78, XV, da Lei 8.666/93 lhe garante tal direito. (BRASIL, 1993, grifo nosso).
Nesse diapasão, uma vez ultrapassado o prazo de 90 (noventa) dias do não pagamento (mora por culpa da Administração Pública), o particular possui autonomia para
interromper sua obrigação contratual sem a necessidade de romper a inércia do judiciário. Lado outro, o autor Xxxxxxx Xxxxx (2016) ressalva a razoabilidade em notificar o ente estatal contratante acerca da paralisação das atividades pactuadas, com fundamento no art. 78, inciso XV, da Lei de Licitações, por ser uma medida/dever de cautela. Essa notificação, embora legalmente não obrigatória, é devida para garantir maior segurança jurídica ao particular contratado e corroborar a relação saudável dos contratantes, embora haja o não pagamento.
Nota-se, ainda, que a decisão do STJ faz referência tão somente à suspensão da prestação contratual. No que se refere à rescisão do contrato, por iniciativa do contratado, a autora Xxxxxxxx (2018) entende que a lei autoriza apenas a suspensão do contrato pelo qual poderia o particular tão somente deixar de cumprir sua obrigação contratual. Ao passo que, nesse caso, se o particular desejar a rescisão contratual, deverá recorrer à via judicial. Nesse seguimento, a autora faz menção ao julgado do STJ nº 879046, em sede de Recurso Especial, quando a primeira turma, com relatoria da desembargadora e ministra Xxxxxx Xxxxxx, se referiu à regra da proibição da oposição da exceção de contrato não cumprido. Para tanto, veja:
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] 10. O Superior
Tribunal de Justiça consagra entendimento no sentido de que a regra de não-aplicação da exceptio non adimpleti contractus, em sede de contrato administrativo, não é absoluta, tendo em vista que, após o advento da Lei 8.666/93, passou-se a permitir sua incidência, em certas circunstâncias, mormente na hipótese de atraso no pagamento, pela Administração Pública, por mais de noventa dias (art. 78, XV). A propósito: AgRg no REsp 326.871/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Xxxxxxxx Xxxxxxx, DJ de 20.2.2008; RMS 15.154/PE, 1ª Turma, Rel. Min. Xxxx Xxx, DJ de 2.12.2002. Além disso, não merece prosperar o fundamento do acórdão recorrido de que as empresas necessitariam pleitear judicialmente a suspensão do contrato, por inadimplemento da Administração Pública. Isso, porque, conforme bem delineado pela Ministra Xxxxxx Xxxxxx no julgamento do REsp 910.802/RJ (2ª Turma, DJe de 6.8.2008), "condicionar a suspensão da execução do contrato ao provimento judicial, é fazer da lei letra morta" [...] (BRASIL, 2009, grifo nosso).
Note-se, porém, que a jurisprudência acima não versou sobre a necessidade de ajuizar ação nos casos de rescisão contratual. Pelo contrário, valeu-se do entendimento da ministra Xxxxxx Xxxxxx, que demonstra a consequência de exigir-se a decisão do judiciário, qual seja: “fazer da lei letra morta”. É pertinente essa interpretação, pois, pela leitura do caput do art. 78 e, logo em seguida, a leitura do seu inciso XV, a priori, não se verifica qualquer motivo para vincular uma decisão judicial ao cumprimento da norma objetiva contida na lei federal (Lei nº 8.666/93).
Em consonância a esse entendimento, o autor Xxxxxx Xxxx Xxxxxxx (2011) sustenta
seu entendimento:
que a partir do momento que exista um motivo para rescisão, a contratada poderia, de forma unilateral, comunicar o fato e considerar rescindido o contrato, vez que é um direito que lhe cabe. Tal conduta tem justificativa no fato de que não se pode esperar que a Administração, de livre e espontânea vontade, rescinda o contrato quando ocorrer a hipótese do artigo 78, XV, mesmo porque, a Administração pode não promover a rescisão, manter o atraso e, ainda assim, querer punir a empresa pela suspensão do contrato. A empresa contratada não é obrigada a financiar a Administração Pública, principalmente porque na proposta vencedora da licitação observava-se uma equação econômico-financeira bem como condições de execução contratual que deveriam ser respeitadas pelas partes. (XXXX XXXXXXX, 2011).
Em pesquisas nos mais diversos tribunais, encontraram-se várias jurisprudências de casos pertinentes ao tema. Nesses julgados, a conclusão é que os contratados, com a nítida finalidade de solucionarem os conflitos oriundos da manutenção na prestação contratual por prazo de até 90 dias (total desequilibro do negócio jurídico), primeiro tendem a comunicar a Administração contratante sobre a suspensão contratual, com fundamentos no art. 78, inciso XV, da LLC/93, e, logo de imediato, interrompem/suspendem a prestação contratual. Posteriormente, ajuízam a ação, tanto com o pedido de rescisão contratual quanto o de pagamento das verbas que foram inadimplidas. A título exemplificativo, cita-se a jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo em recente decisão (datada em 27 de março de 2019):
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO PROCEDIMENTO COMUM RESCISÃO DE CONTRATO E COBRANÇA - CONTRATO ADMINISTRATIVO INADIMPLEMENTO DA ADMINISTRAÇÃO RESCISÃO
CONDENAÇÃO NO PAGAMENTO DA DÍVIDA. 1. Pretensão à rescisão de contrato administrativo e à cobrança de valor inadimplido pelo Município. Admissibilidade. Inadimplemento demonstrado por prova documental, testemunhal e pericial. Pagamento devido. Rescisão contratual declarada em sentença. Observância do art. 79, III, da Lei nº 8.666/93. 2. Cuidando-se de condenação oriunda de relação jurídica não tributária, aos encargos da mora deve ser aplicado o entendimento assentado pelo C. STF no julgamento definitivo do Tema nº 810 e pelo
C. STJ no julgamento do Tema nº 905. Pedido procedente, em parte. Sentença mantida. Recurso desprovido. (SÃO PAULO, 2019, grifo nosso).
Todavia, em uma interpretação inicial, exigir o ajuizamento da demanda para esses casos de rescisão contratual (com motivo justificável), não parece ser o melhor entendimento, mesmo considerando que o contrato administrativo é título executivo extrajudicial, sendo apto ao procedimento da execução que salta a fase de conhecimento. Isso porque a judicialização pode gerar consequências negativas para o interesse público, lido aqui como “interesse da coletividade brasileira”. Claramente, dependerá de caso a caso.
Por exemplo, as lides que envolvam direito líquido e certo de fácil constatação e tutela pelo Poder Judiciário. Além da remessa necessária ao Tribunal competente, resultará nos consequentes honorários advocatícios à parte adversa, além da incidência de correção monetária e juros moratórios. Inclusive, o particular contratado, a depender do caso concreto, pode pedir a atualização do preço conforme indexador econômico pactuado (ex.: IPCA-E ou INPC), lucros cessantes, perda de uma chance, os danos emergentes e até dano moral. Em outras palavras, haverá ônus muito superior à Administração, que poderia resolver a lide de modo menos burocrático, tal como pela rescisão de modo unilateral (uma das cláusulas exorbitantes que decorrem da lei), tendo em vista sua autonomia para tal, de acordo com o mérito administrativo.
Verificou-se também que pode haver certa vantajosidade para o Estado, uma vez que o pagamento oriundo da decisão judicial é efetivado, geralmente, por meio do RPV (Requisição de Pequeno Valor) ou do Precatório, sempre a depender do valor de alçada. Conforme se vê na prática jurídica, impactam em certa demora para concretizar o recebimento de um direito pelo particular contratado. Ou seja, prejudicial ao particular e favorável ao Poder Pública.
Dessa forma, quanto à suspensão contratual, percebeu-se que pode o particular contratado suspender, imediatamente, após completado o xxxxx xx 00 xxxx xx xxxx por culpa da Administração, desde que, por dever de cautela e pela saudável relação contratual, comunique a Administração. Já para a rescisão do pacto, o entendimento atual, salvo melhor juízo, é pela exigência do prévio ajuizamento da demanda cumulado, por economia processual, com o pedido de cobrança do valor inadimplido. O que, todavia, não significa dizer que seria mais vantajoso à Administração Pública e, consequentemente, para o interesse público, porque certamente gerará ônus maior ao Estado.
4 MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (ME e EPP)
Discorre-se, neste capítulo, o conceito de Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) e suas diferenças. O objetivo, porém, não é conceituá-las de modo aprofundado, tal como é feito em materiais de direito empresarial. A finalidade, aqui, é demonstrar algumas principais características que são coerentes aos institutos de direito administrativo neste trabalho elencados. No último subitem, apresenta-se um interessante subterfúgio para essas pessoas jurídicas.
4.1 Conceitos e diferenças
Microempresas e Empresas de Pequeno Porte ou ME e EPP são pessoas jurídicas de direito privado cujas capacidades econômicas são menores em face das demais empresas, visto que exercem atividades empresariais de menor porte. Necessitam de tratamento estatal desigual (determinados incentivos) para que possam competir de modo mais igualitário dentro do mercado, conforme o princípio da isonomia.
Existem, porém, diferenças entre Microempresas e Empresas de Pequeno Porte. Xxxxxxx e Xxxxx (2017) dizem que quem as diferenciou foi o legislador, por meio de critérios objetivos, tais como faturamento, número de empregados e regiões geográficas do território nacional. Ressalta-se que, ao mencionarem o legislador, os autores fazem menção em especial ao art. 3º, da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que se encontra junto ao segundo capítulo dessa lei quando define Microempresa e EPP.
Todavia, nessa ocasião é necessária apenas a compreensão econômica desses entes privados com intuito de perceber que giram receitas pequenas em face das outras empresas (por exemplo as sociedades anônimas). Para isso, se vale do conceito apresentado pelo legislador, em análise ao art. 3º e tão somente até o §1º:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que: I - no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais); e II - no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais). (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016) § 1º Considera-se receita bruta, para fins do
disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos. [...] (BRASIL, 2006, grifo nosso).
Nota-se que a principal diferença entre elas é a receita bruta referente ao ano- calendário, o qual para microempresa não pode ultrapassar R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais), ao passo que para as EPP deve ser superior ao limite da microempresa, mas desde que não ultrapasse R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais). Ou seja, ao se considerar o teto desses valores, pode-se dizer que, de maneira informal, as ME podem obter a título de receita bruta mensal quantia de até R$ 30.000,00 (trinta mil reais). No que se refere às EPP, a quantia é de até R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais). Ou seja, são os valores máximos.
Pode-se dizer que as empresas desse porte com receita bruta beirando o limite legal máximo, o qual mantém a condição de ME ou EPP, são minoria no Brasil. Isso porque a maioria dessas empresas encontram-se em sérias dificuldades financeiras, o que impacta diretamente na saúde empresarial. Xxxxxxx e Xxxxx (2017, p. 121, grifo nosso), dizem que “as atividades de pequeno porte, [...] representam 80% da nossa economia pujante e encontram sérias dificuldades de financiamento [...]”. É por esse e outros motivos, que o Estado possui interesse em tutelar as microempresas e empresas de pequeno porte. Nesse sentido, essas empresas possuem (ou deveriam possuir) direitos a tratamentos diferenciados, efetivos, com intuito de favorecê-las em prol do princípio da isonomia.
4.2 Tratamento diferenciado para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Em continuidade ao tópico anterior, cabe destacar a obrigatoriedade, oriunda do mandamento constitucional (artigos 170, inciso IX, e 179, ambos da CFRB/88), em favorecer as ME e EPP. Essa natureza mandamental, segundo Xxxxxxxx (2016), se justifica na medida em que é uma das formas de se proteger o desenvolvimento do país, tendo em vista que tais empresas geram mais empregos e, consequentemente, mais renda para federação brasileira. Assim, veja os dispositivos à Magna Carta:
TÍTULO VII. DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA. CAPÍTULO I. DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA. Art. 170. A ordem
econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] IX - tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. [...] Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei. (BRASIL, 1988, grifo nosso).
Xxxxxx (2011) ao interpretar à Constituição Federal, pelo artigo 179 supracitado, entende que o tratamento diferenciado é
[...] no sentido de simplificar o atendimento às obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, podendo a lei, inclusive, reduzir ou eliminar tais obrigações. O objetivo dessa norma é o de incentivar tais empresas, criando as condições para o seu desenvolvimento. (XXXXXX, 2011, p. 55).
Assim, para alcançar o objetivo da norma constitucional em incentivar tais empresas, foi editada a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, também chamada de Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, ou meramente “LC 123”. Criou condições mais vantajosas para o desenvolvimento das Microempresas e EPP, como por exemplo a adoção do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional), conforme art. 12 da LC 123. Veja o art. 1º dessa lei:
CAPÍTULO I. DISPOSIÇÕES PRELIMINARES. Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere: I - à apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação, inclusive obrigações acessórias; II - ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive obrigações acessórias; III - ao acesso a crédito e ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão. IV - ao cadastro nacional único de contribuintes a que se refere o inciso IV do parágrafo único do art. 146, in fine, da Constituição Federal. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014) [...] (BRASIL, 2006, grifo nosso).
Ressalta-se que o art. 3º, em seu § 4º, traz as hipóteses nas quais a pessoa jurídica não pode se beneficiar do tratamento jurídico diferenciado, tal como aquela “cujo capital participe outra pessoa jurídica” ou “cujos titulares ou sócios guardem, cumulativamente, com o contratante do serviço, relação de pessoalidade, subordinação e habitualidade”, de acordo com os incisos I e XI desse dispositivo (BRASIL, 2006). Todavia, não implica perda da definição com ME ou EPP. Apenas não podem gozar de tal procedimento favorecido.
Nesse contexto de aplicar a igualdade material, a Lei de Licitações e Contratos foi
acrescida de um importante artigo, em 2014 pela Lei Complementar nº 147/14, que inclusive será retomado em breve, qual seja o art. 5º-A. Destaca-se que a LLC estipula a regra na qual “As normas de licitações e contratos devem privilegiar o tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte na forma da lei.” (BRASIL, 1993).
Dentre outros, tem-se ainda o Decreto nº 8.538, de 6 de outubro de 2015, que regulamenta o tratamento diferenciado dessas pessoas jurídicas no âmbito da Administração Pública Federal cujos objetivos podem ser vislumbrados nos incisos do primeiro artigo do diploma:
Art. 1º Nas contratações públicas de bens, serviços e obras, deverá ser concedido tratamento favorecido, diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte, agricultor familiar, produtor rural pessoa física, microempreendedor individual - MEI e sociedades cooperativas de consumo, nos termos deste Decreto, com o objetivo de: I - promover o desenvolvimento econômico e social no âmbito local e regional; II - ampliar a eficiência das políticas públicas; e III - incentivar a inovação tecnológica. [...] (BRASIL, 2015, grifo nosso).
Insta salientar que essas empresas são imprescindíveis no cenário econômico brasileiro, uma vez que além de representarem 80% da economia brasileira, estão reiteradamente presentes nas Licitações Públicas e, posteriormente, vinculadas à Administração por meio dos contratos administrativos. Corroboram esse entendimento Xxxxxxx e Xxxxx (2017), quando afirmam que essas empresas são parcelas significativas do produto interno bruto brasileiro e, consequentemente, geram notório fortalecimento econômico das regiões sazonais do Brasil.
Verifica-se que o Estado preza, ou, ao menos, tenta prezar, pelo tratamento diferenciado às ME e EPP. Existem, porém várias críticas com relação à verdadeira aplicação desse tratamento diferenciado aos particulares, por exemplo quanto à recuperação judicial das pequenas empresas. Sobre este assunto, Xxxxxxx e Xxxxx (2017) dizem que:
A série de exigências que se oferece ao pequeno empreendedor, consoante dados das entidades representativas e do próprio Sebrae, não comungam do pensamento da ordem constitucional, mostrando-se refratário ao dinamismo e ao espírito criativo do empresário. Balizada a matéria, quando o legislador ordinário cuidou da recuperação de pequenas empresas, também de modo pouco animador, deu-lhe tratamento no mínimo insustentável, qual seja, sem qualquer privilégio, concedendo prazo de três anos para soerguimento da atividade, impondo juros de 12% ao ano, em resumo, nada de especial para arrebanhar o grande volume de negócios centrados em atividades dessa natureza. Com efeito, a disciplina tocante à recuperação de pequenas e microempresas, sem sombra de dúvida, veio tratada do art. 70 até o art. 72 da Lei nº 11.101/05, mais grave ainda, resvalando apenas e tão somente nos credores quirografários, quando na maioria das vezes as dívidas tributárias e socais
representam a grande massa prejudicial ao pequeno empreendedor. (XXXXXXX; XXXXX, 2017. p. 121, grifo nosso).
Além disso, é de grande relevância observar que embora exista a presença em massa desses entes privados tanto como inicialmente participantes de procedimentos licitatórios quanto aqueles já contratados da Administração Pública, não se encontrou nenhum dispositivo legal expresso cuja finalidade seria relativizar a forma pela qual é exigida das ME e EPP o cumprimento contratual, quando na hipótese de inadimplência do ente estatal contratante.
Dessa maneira, nota-se que as regras administrativas atinentes à oposição da exceção de contrato não cumprido em face da Administração contratante são idênticas para todo e qualquer tipo de empresa, fazendo com o que todos “caiam na mesma vala”. A princípio, tratá-las de forma tão somente igual às demais (igualdade formal) parece ser nítido desrespeito ao princípio constitucional aqui explicitado, ou seja, o tratamento diferenciado com fundamento na isonomia constitucional (igualdade material).
4.2.1 – Conflito entre normas principiológicas e a preponderância do tratamento diferenciado
O tratamento diferenciado conferido às ME e EPP é considerado um princípio geral da ordem econômica brasileira, inclusive por ter sido positivado na CFRB (art. 170, IX). Coadunam com esse entendimento vários autores, em especial Lira (2016), Xxxxxxxx, K. (2014) e Xxxxxxx e Xxxxx (2017). A título exemplificativo, veja o entendimento destes dois últimos autores:
Atividade Econômica e Garantia Constitucional – A Constituição Federal de 1988, em vigor há duas décadas, procurou configurar, no seu Título VII, capítulo dedicado à ordem econômica e financeira, abrangendo os princípios gerais da referida atividade, buscando tratamento diferenciado para pequenas e microempresas. (XXXXXXX; XXXXX, 2017, p. 121, grifo nosso)
Em tópico inicial6, o qual discorreu-se sobre as especificidades da exceptio non adimpleti contractus, restou demonstrado que a exceção de contrato não cumprido também se refere a um princípio jurídico, especialmente segundo o autor Xxxxx Xxxxx (2016). Ocorre, todavia, que a restrição à sua oposição em lapso temporal inferior aos 90 dias, para as
6 Tópico 3.1 “Instituto propriamente de Direito Civil”
microempresas e empresas de pequeno porte, parece conflitar com a principiologia constitucional referente ao tratamento diferenciado.
Veja que, conforme demonstrado, a restrição à exceção de contrato não cumprido segundo as regras contidas na Lei de Licitações possui amparos jurídicos diversos, especialmente com respaldo nos princípios da continuidade dos serviços públicos e no interesse público sobre o privado. Sua finalidade é tutelar o interesse coletivo e, quanto a isso, não há consideráveis divergências. Em termos práticos, é dizer que, mesmo diante da manutenção do inadimplemento por culpa do poder público (mora da Administração), desde que por até 90 dias, é proibido ao particular interromper a prestação contratual, vez que, em tese, prejudicará a sociedade dependente daquele objeto contratual.
Lado outro, demonstrou-se também que é dever do poder público a garantia do tratamento diferenciado e favorável às ME e EPP, a fim de tratá-las de maneira isonômica. Pode-se dizer que esse tratamento não é uma espécie de regalia ou “benefícios” no sentido de favorecê-las por interesses particulares ou por simples e mero favorecimento. Pelo contrário, é um direito dessas entidades por questões de equidade constitucional e de acordo com estudos prévios que demonstraram ser necessário garantir tal direito.
Essa tratativa de modo desigual em relação às demais empresas se justifica na medida em que se vislumbra tutelar o interesse da coletividade brasileira. Nesse ciclo, o Estado garante melhores condições a essas pessoas jurídicas para, em tese, ter retornos favoráveis. É o exemplo das menores exigências aos pequenos empreendedores quanto aos documentos exigidos nas fases licitatórias, pois a finalidade é a garantia efetiva da igualdade material a fim de gerar, em especial, mais empregos e, consequentemente, mais renda à população brasileira. Entretanto, parece que há um choque principiológico quando tais princípios se encontram em um mesmo caso concreto.
Veja que tanto o princípio do tratamento diferenciado às ME e EPP quanto a restrição ao uso da exceptio non adimpleti contractus visam notoriamente proteger o dito interesse público. Ocorre que são conflitantes entre si. Isso porque a norma do primeiro obriga a favorecê-las, ao passo que a norma do segundo gera ônus excessivo que nada as favorecem.
A despeito desse ônus excessivo, vale-se de um artigo acadêmico oportuno e bem elaborado sobre o tema. É o autor Xxxxxxx Xxxxx (2016), em especial, quem escreveu um artigo criticista ao fato de que a Administração Pública é contumaz, reincidente no que tange aos
inadimplementos contratuais quanto ao pagamento ao particular contratado7.
Nesse artigo, o pesquisador demonstra, além de outros prejuízos sustentados de modo unilateral pelo particular contratado, que a Administração Pública se vale do princípio da restrição à exceptio non adimpleti contractus para evitar que o contratado interrompa sua prestação contratual, vez que possui a seu favor um largo e confortável espaço de tempo para a efetivação dos pagamentos aos contratados, estes que, muitas das vezes, encontram-se em notório desesperado e à beira da ruína empresarial. Traz-se à tona também a menção, pelo próprio autor, do acadêmico pesquisador Xxxxxxx Xxxxx das Neves que em suas palavras diz:
Chega-se ao cúmulo de algumas entidades estabelecerem um procedimento extraoficial para pagamento de seus fornecedores/prestadores de serviço já considerando como natural o prazo de 90 (noventa) dias como o limite máximo possível para atraso. Isso porque, de acordo com o inciso XV do artigo 78 da Lei nº 8.666/93, é causa de rescisão contratual ou suspensão das obrigações pelo contratado o atraso dos pagamentos devidos pela Administração superior a 90 (noventa) dias. Com efeito, ao se aproximar o limite de tempo disposto em norma para pagamento em atraso ao contratado sem ensejar a rescisão ou suspensão do fornecimento ou serviço, a Administração efetua o pagamento. E tudo isso, diga- se, na maior parte das vezes sem qualquer atualização monetária dos valores pagos em atraso. O inadimplemento por parte da Administração Pública deveria ser algo excepcional, não usual e, essencialmente, temporário, e não em subterfúgio para exercício de um alegado controle dos gastos públicos. Se o serviço ou fornecimento foi licitado é porque existia, minimamente, a previsão de dotação orçamentária e/ou planejamento financeiro prévio para seu custeio (XXXXX, 2015, apud XXXXXXX XXXXX, 2016, p. 17, grifos do autor).
Claramente, tal ação não é condizente aos princípios norteadores do direito administrativo. Pertinente também reiterar que esse prazo de 90 dias pode ser, na realidade, muito superior, conforme já se dissertou referente ao “recebimento definitivo” do objeto contratual e sobre os casos de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra. Entretanto, valendo-se tão somente da mora administrativa por prazo de 90 dias, já se consegue imaginar alguns dos problemas empresariais e sociais, tais como o ciclo negativo que as dívidas criam (demissão de funcionários, aumentos dos preços com o fim de conseguir sustentar o negócio empresarial, empréstimos bancários com os típicos juros altíssimos, venda de bens da empresa, entre uma infinidade de outros pormenores negativos).
Assim, embora não seja objetivo desta pesquisa monográfica apresentar as consequências empresariais caso a caso, é clarividente que uma empresa de pequeno porte ou microempresa, cuja receita bruta anual é ínfima ao lado das outras empresas do ramo
7 Trata-se do artigo cujo tema envolve “A proteção do particular contratado diante da inadimplência contumaz da Administração Pública no âmbito dos contratos administrativos” (XXXXXXX XXXXX, 2016).
empresarial, pode ser levada ao extremo estrangulamento financeiro ao sustentar a manutenção do contrato administrativo. Manutenção esta que, pelo atual dispositivo legal, ainda se justifica frente à culpa exclusiva do Estado que não paga em tempo esperável.
Nesse cenário empresarial negativo, Xxxxxxxx Xxxxx (2017) aduz que o particular tem direito a se defender, antes mesmo do prazo legal do art. 78, XV, da Lei de Licitações. Para isso, veja-se:
O dispositivo, como se vê, parece considerar que, antes de 90 dias, não possa o particular reclamar do atraso nos pagamentos. Entendemos, entretanto, que, em situações especiais, se o prejudicado, mesmo antes desse prazo, ficar impedido de dar continuidade ao contrato por força da falta de pagamento, tem ele direito à rescisão do contrato com culpa da Administração. Fora daí, é admitir-se a ruína do contratado por falta contratual imputada à outra parte, o que parece ser inteiramente iníquo e injurídico. Ocorrendo tal situação excepcional, o interessado pode recorrer à via judicial e, por meio de ação cautelar, formular pretensão no sentido de lhe ser conferida tutela preventiva imediata, com o deferimento de medida liminar para o fim de ser o contratado autorizado a suspender o objeto do contrato, evitando-se que futuramente possa a Administração inadimplente imputar-lhe conduta culposa recíproca. Segundo nos parece, esse é o único caminho a ser seguido para impedir que a Administração, que está descumprindo obrigação contratual, se locuplete de sua própria torpeza. (XXXXXXXX XXXXX, 2017, p. 352, grifo nosso).
Raciocínio muito bem fundamentado, mas que merece ser complementado, mesmo que seja apenas por argumentar. Assim, frisa-se que existem também outros meios a serem seguidos cujo escopo é o pagamento ao particular contratado antes que seja alcançado por todas consequência negativas frente ao não pagamento, tal como a falência da empresa.
Um desses meios, que a princípio pode parecer frágil para solução da problemática em sua origem, vê-se na chamada quebra da ordem cronológica para o pagamento como subterfúgio ao particular contratado. Reservou-se, porém, o próximo tópico exclusivo para essa finalidade, sempre em prol de garantir uma melhor compreensão da proposta.
Noutro norte, recorreu-se também ao Direito Econômico, a fim de compreender os princípios básicos que, porventura, protejam o particular contratado. O autor Xxxxxxxxxx xx Xxxxxxx (2017), ao lecionar sobre os princípios e regras no campo do Direito Econômico, sustenta seus estudos sob a égide da existência de princípios específicos direcionadores para a formação das regras e para a aplicação delas no campo peculiar ao Direito Econômico.
Nesse entendimento, o autor demonstra que a norma iuris deve garantir a segurança nas relações jurídicas e para isso que deve servir o Direito cuja finalidade é a busca de tal segurança. O autor ressalta que, em primeiro lugar, deve o Direito garantir a segurança propriamente do indivíduo concebido como cidadão, digno de garantias fundamentais. A partir
de então deve a norma tomar como ponto de partida a realidade econômica dos contratados. Segundo o autor, essa segurança nas relações jurídicas vem atrelada a dois princípios constitucionais: princípio da legalidade e o princípio da igualdade.
É importante lembrar que ambos os princípios possuem duas faces. O primeiro (legalidade) possui sua vertente orientativa da autonomia privada da vontade, sendo, a grosso modo, a possibilidade de o particular fazer tudo que não seja proibido por lei, e, sua vertente atrelada à atuação vinculada da administração pública, que a Administração só pode agir conforme autoriza o ordenamento jurídico. Lado outro, o segundo princípio, da igualdade, subdivide-se em formal e material. Este último, leia-se equidade ou isonomia.
Xxxxxxxxxx xx Xxxxxxx argumenta que:
A segurança individual não pode vir a estar subordinada à segurança pública. Esta, sim, é uma consequência daquela. Se não se der ao cidadão a garantia da vida, e de uma vida digna, a garantia de um salário suficiente para satisfazer adequadamente a todas as suas necessidades básicas, a garantia de uma assistência à saúde, de uma educação de elevado nível, a tranquilidade de uma velhice ao amparo das incertezas, não se poderá nunca dizer que existe segurança coletiva. (FONSECA, 2017, p. 55, grifo nosso).
Quanto a realidade econômica, entende o autor que o aplicador da lei deve se valer daquelas normas as quais o legislador editou com base em seu conteúdo econômico, adstrito à realidade econômica que tem como uma de suas principais características a mutabilidade. Assim,
A realidade econômica passou a ter influência fundamental na elaboração e na aplicação da lei. O legislador e o aplicador da lei não podem desconhecer a realidade econômica em que vivem e que pretendem normatizar e direcionar. Não basta conhecer os textos da Constituição, que muitas vezes são até mesmo ignorados, não basta ter lido alguma vez os textos legais que criam instituições e lhes atribuem competências [Ou seja, legalidade tão somente formal. É necessário também conhecer a realidade e viver a realidade a que se referem aqueles textos. (FONSECA, 2017, p. 56, grifo nosso).
Desse modo, em análise ao art. Art. 78, inciso XV, da Lei nº 8.666/93, observa-se que o dispositivo é taxativo quanto à delimitação do tempo (90 dias) para o qual poderia o particular suscitar a exceção de contrato não cumprido. Questiona-se: deve haver a aplicação estrita dessa norma também às EPP e ME sem que seja levado em consideração suas características/especificidades e direitos a elas conferidos, em especial o princípio constitucional do tratamento diferenciado?
Inicialmente, veja-se que no caso de o questionamento ser positivo, ou seja, que deve o aplicador da lei se vincular tão somente ao artigo 78, XV, da LLC, afastar-se-á de modo cabal o entendimento protecionista do professor Xxxxxxxxxx xx Xxxxxxx. Em outras palavras, seria igualmente dizer que o aplicador da lei desconhece ou atua de forma vendada (“às cegas”) à realidade econômica em que vivem esses entes privados. Resultado disso, é que, diante de tal entendimento vinculado a lei apartada, não há que se falar em segurança coletiva no paralelo acima colocado.
Uma outra vertente é pensar como se dá a relação jurídica, principalmente contratual, das microempresas e empresas de pequeno porte quando a consequência é o inadimplemento econômico contratual por culpa exclusiva da Administração Pública.
Pensa-se que parte dos entes estatais agem conforme a lei (princípio da legalidade), mas em sua faceta apenas e tão somente estrita (igualdade formal), que teoricamente protegeria o interesse público. Agem conforme o dispositivo jurídico apartado, sem uma interpretação jurídica de todo ordenamento, e, ao invés de tratar de modo desigual aqueles desiguais na medida de suas desigualdades (igualdade material) a fim de garantir a segurança coletiva, atribuem tratamento idêntico a todas as empresas. Consequentemente, gera impactos negativos sociais e economicamente prejudiciais.
Acredita-se ainda que tal atuação é desarrazoada e desproporcional, uma vez que autorizar essa visão/atuação estritamente literal é ferir de morte os princípios constitucionais, em especial: da isonomia, do tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte, da proporcionalidade, da razoabilidade, da economicidade, da eficiência. Assim, em consonância ao entendimento do autor de Direito Econômico, inexistiria nesse caso a denominada segurança coletiva, pois o aplicador da lei se esquece, se abstém, da realidade econômica das ME e EPP vendando-se a existência protecionista das normas jurídicas criadas e desenvolvidas para esses pequenos empreendedores.
Além do mais, esse prazo de 90 dias exigido para todas as pessoas jurídicas de direito privado contratadas da Administração Pública parece ser excessivo, ainda mais para as ME e EPP. Nesse sentido, em pequenos parênteses, faz-se o comentário de que existe um projeto de lei (PL) ainda em tramitação no legislativo brasileiro que, quanto ao prazo para opor a exceptio non adimpleti contractus, é favorável aos particulares contratados.
Trata-se do PL nº 8.814/2017, apensado ao PL 1.292/1995, que tem como objetivo a reforma de toda legislação licitatória e contratual administrativa. Assim, disse o Deputado
Federal Xxxx Xxxxxxxxx (PT/CE):
De acordo com sua ementa, o Projeto de Lei nº 6.814/2017, da Comissão Temporária de Modernização da Lei de Licitações e Contratos do Senado Federal, visa instituir normas para licitações e contratos da Administração Pública e revogar a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e dispositivos da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. (BRASIL, 2018).
Ou seja, revogar todas normas atinentes a matéria licitatória com a inovação de nova legislação. Ocorre que nesse Projeto de Lei há um capítulo especialmente voltado para as hipóteses de rescisão contratual e, de acordo com o art. 102, §2º, inciso IV, cumulado com o
§3º do mesmo dispositivo, o prazo atual de 90 (noventa) dias será dividido pela metade, ou seja 45 (quarenta e cinco) dias.
Relembra-se por oportuno que o Estado, nos contratos administrativos, vedava por completo ao particular de opor a exceptio non adimpleti contractus, e que, posteriormente, houve a relativização dessa restrição com o art. 78, XV, da LLC. Agora, nota-se que o Estado parece ter interesse em relativizá-lo ainda mais. É o que se pode ver pelo dispositivo passível de ingressar no ordenamento brasileiro:
Art. 102. [...]§ 2º O contratado terá direito à rescisão do contrato nas seguintes hipóteses: IV – atraso superior a 45 (quarenta e cinco) dias, por parte da Administração, dos pagamentos ou de parcelas dos pagamentos devidos por obras, serviços ou fornecimentos já recebidos ou executados; [...] § 3º As hipóteses de rescisão a que se referem os incisos II a IV do § 2º: I – não serão admitidas em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, bem como quando decorrerem de ato ou fato que tenha praticado, do qual tenha participado ou para o qual tenha contribuído o contratado; II – asseguram ao contratado o direito de optar pela suspensão do cumprimento das obrigações assumidas até que seja normalizada a situação. (BRASIL, 2017, grifo nosso).
Destaca-se que, para mais aprofundamentos, houve inúmeras tentativas de se encontrarem as motivações jurídicas fundamentadoras da redução do atual prazo à metade. Todavia, sem êxito. Acredita-se, mesmo que seja apenas por argumentar, ser o atual prazo de 90 dias excessivo e desproporcional, principalmente com relação aos entes privados, quais sejam: as microempresas e as empresas de pequeno porte.
A notícia mais recente, atualizada em 25 de junho de 2019, é a do professor Xxxxxx Xxxxxxx (ALMEIDA, 2019), que publicou, pelo sítio de cursinho preparatório para concursos públicos (Estratégia Concursos), resumidamente o seguinte: a Lei 8.666/93 está “com seus dias contados”, uma vez que o projeto foi aprovado no Plenário da Câmara dos Deputados. Todavia,
salienta que “[...] haverá um período de transição. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados prevê que a Lei 8666/93 ainda poderá ser utilizada pelo prazo de dois anos” (ALMEIDA, 2019).
Além de todas essas considerações, requer levar em consideração que se trata de “Projeto de Lei”, ou seja, que pode ainda sofrer significativas alterações. Inclusive, mesmo que vigente, possuirá prazo de vacatio legis de 2 anos após sua promulgação. Mesmo assim, se o dispositivo adentrar ao ordenamento jurídico brasileiro e vigorar nos exatos termos acima, acredita-se que será um avanço significativo do Direito Administrativo, o qual se distancia ainda mais do arcaico pensamento clássico administrativista de que o particular contratado submetia-se a proibição em lapso temporal ad aeternum para defender-se por meio da exceptio non adimpleti contractus.
Retomando o conflito entre a atual legislação em vigor, Lei nº 8.666 de 1993, e toda sua principiologia na forma pela qual se encontra no ordenamento jurídico brasileiro como um todo, diz-se que existem dois princípios jurídicos, os quais, embora tenham escopo em comum de tutelar o interesse público, conflitam entre si.
Fala-se do choque direto decorrente da principiologia do tratamento diferenciado conferido às ME e EPP em face da restrição à principiologia adstrita à exceção de contração não cumprida por prazo inferior aos longos 90 dias.
Assim, em especial, em razão da ordem principiológica positivada na Constituição (artigos 170, inciso IX, e 179, ambos da CFRB/88) que obriga o poder público a conferir tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte, além de todas normas infraconstitucionais, que tanto em termos legais quanto em termos doutrinários e jurisprudenciais justificam o tratamento isonômico, deverá prevalecer a norma geral (art. 78, XV, da LLC/93) pela qual descarta-se a possibilidade do particular contratado, especialmente das ME e EPP, de opor ao princípio jurídico da excepcio non adimpleti contractus antes de atingidos os 90 dias, sendo verdadeiro tratamento igualitário às ME e EPP em face das demais? E qual seria a melhor interpretação jurídica para solucionar esse conflito teórico-prático?
Apenas pelo amor ao debate, afirmar o prevalecimento do instituto do artigo 78, XV, da Lei Federal nº 8.666/93 em oposição ao princípio constitucional do tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte, considerando o caso concreto que demonstre real necessidade, é, mais uma vez, violar os princípios constitucionais, inclusive no que concerne ao interesse público que restará prejudicado na medida em que trabalhadores poderão perder seus empregos em razão da falência dessas empresas. Veja, ainda, a título de
exemplo, que haveria a oneração demasiada do poder público quando se cogitar que esse trabalhador, o qual for dispensado sem justa causa, fará jus aos seus direitos trabalhistas, em especial a multa de 40% referente ao Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) e o direito ao Auxílio Seguro-Desemprego, nos termos da Lei Federal 7.998, de 11 de janeiro de 1990.
Sem a intenção de esgotar o debate jurídico, vale-se, a priori, da teoria do alemão Xxxxxx Xxxxx, o qual criou a técnica do sopesamento entre os princípios conflitantes. Não adentrar-se-á nos pormenores teóricos da técnica do sopesamento difundida mundialmente. Mas, para contextualizar, veja o entendimento do alemão Xxxxx (2015):
Se dois princípios colidem - o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta. Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com o maior peso têm precedência. (XXXXX, 2015, p. 94).
Para tanto, tem-se o princípio que obriga o tratamento diferenciado às ME e EPP em face do princípio que proíbe a oposição da exceptio non adimpleti contractus por determinado lapso temporal. Ambos, entre si, são conflitantes. Pergunta-se: qual deve prevalecer? Ou seja, qual é o melhor entendimento: submeter às microempresas e empresas de pequeno porte ao prazo legal padrão, e, assim, tratá-las de forma igualitária frente às demais? Ou, do contrário, afastar o entendimento principiológico da LLC/93 em prol do entendimento principiológico da CF/88?
O posicionamento desta pesquisa, encontra-se em benefício das ME e EPP, uma vez que parece ser o melhor entendimento sopesar os princípios conflitantes no caso concreto. Para que, restando demonstrado os prejuízos às microempresas e empresas de pequeno porte, bem como a todos envolvidos (por exemplo os trabalhadores, a própria empresa e indiretamente a sociedade), o princípio do tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte possa preponderar sobre o princípio restritivo atinente à oposição da exceptio non adimpleti contractus atualmente positivado no art. 78, inciso XV, da Lei Federal de Licitações e Contratos. Esse é o entendimento, sem que, porém, estejam esgotadas futuras discussões jurídicas.
4.3 Quebra da ordem cronológica dos pagamentos
Dentre outros detalhes, deixou-se claro que na hipótese de inadimplemento contratual por culpa exclusiva da Administração contratante, que não realiza o pagamento de direito ao particular contratado, este particular deverá absorver para si o ônus do negócio jurídico sob verdadeira sustentação unilateral financeira durante longos 90 (noventa) dias.
Momento oportuno para rememorar o instante em que se dissertava sobre a possibilidade de opor a exceptio non adimpleti contractus em prazo inferior aos 90 dias e citou- se Xxxxxxxx Xxxxx (2017), que entende parecer o “único caminho” a ser trilhado pelo particular contratado, quando se vê em verdadeiro desespero em face da mora estatal, qual seja: romper a inércia do Poder Judiciário por meio de ação cautelar.
Aqui demonstra-se o porquê não concordar integralmente com Xxxxxxxx Xxxxx (2017), pois entende-se existir outro meio, embora facultativo, pertinente para a tentativa de solucionar a lide por método administrativo (extrajudicial), já que demonstrou-se ser o ajuizamento da ação desfavorável ao interesse público (honorários advocatícios, correção monetária, juros de mora, RPV ou precatórios, etc.).
Pertinente também ressaltar que mesmo tratando-se das hipóteses que poderiam ser de competência dos Juizados Especiais Cíveis, o particular também só poderia “optar” pelo rito processual comum, uma vez que de acordo com o caput do art. 8º da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 (Lei dos Juizados Especiais), “Não poderão ser partes, no processo instituído por esta Lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.” (BRASIL, 1995, grifo nosso). Ou seja, não há dúvidas quanto a exigibilidade do crédito do particular contratado, mas na prática jurídica, principalmente se considerar a atual morosidade judiciária, o contratado se sujeita ao prazo do art. 78, IX, da L. 8.666/93, impactando-se diretamente na saúde empresarial, trabalhista e, inclusive, administrativa, em especial.
Trata-se aqui, portanto, de corroborar a dignidade das pessoas jurídicas de direito privado, fazendo-se valer da denominada “Quebra da ordem cronológica dos pagamentos”, com previsão interpretativa pela Lei de Licitações e Contratos em seu artigo 5º-A, referenciado quando abordou-se o tratamento diferenciado (item 4.2).
Salienta-se que, de acordo com o caput art. 5º da Lei nº 8.666/93, a Administração
deve “[...] obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades [...] (BRASIL, 1993, grifo nosso). E antes de compreender a “quebra” dessa estrita ordem cronológica, recorreu-se ao Direito Financeiro, em especial pela doutrina de Leite (2016) que apontou existirem três fases sobre o tema de despesas públicas: empenho, liquidação e o pagamento.
A partir do estudo dessas fases, pode-se dizer, em apertada síntese, que empenhar é deduzir determinado valor da dotação orçamentária adequada à despesa, gerando em regra a nota de empenho (título executivo extrajudicial) que autoriza o particular entregar o material. Por outro lado, a liquidação é aquela na qual o fiscal contratual verifica se o contratado cumpriu a prestação conforme pactuado no contrato administrativo. Por fim o pagamento, que é “o ato pelo qual a Administração, percebendo que o credor faz jus ao recebimento do numerário, o entrega, recebendo a devida quitação.” (LEITE, 2016, p. 277).
Nesta última fase, didaticamente, o particular contratado entra em uma verdadeira fila de credores ansiosos para o pagamento. E é por isso que deve ser respeitada a estrita ordem cronológica, no sentido de vedar ao administrador público agir com parcialidade e pessoalidade para não beneficiar quaisquer uns dos credores. Esta é a regra, muito embora Leite (2016) aponte haver notório e habitual desrespeito disso pelo sistema estatal brasileiro. O autor indica, porém, que existem normas coercitivas para esses administradores, tanto no sentido de penalizar o administrador público com pena de detenção de dois a quatro anos mais multa administrativa (descrita no art. 92 da Lei n.0 8.666/93), quanto no sentido de punir por exemplo os Prefeitos Municipal por crime de responsabilidade, nos termos do art. 1°, XII, do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967. Em palavras simplórias, é vedado ao administrador público beneficiar um dos credores no sentido de que receba na frente daqueles que já se encontrava à frente, por motivos óbvios.
Entretanto, e aqui é o ponto chave, o acima citado trata-se da regra do art. 5º da LLC. E, tendo em vista que no Direito quase sempre há uma exceção, aqui não é diferente. Entende-se que essa estrita ordem cronológica para os pagamentos pode, sim, ser relativizada. Há fundamentos jurídicos para que o administrador público, pelo mérito administrativo (oportunidade e conveniência), “quebre” (mitigue) a ordem dos pagamentos sem que haja eventual punição administrativa ou judiciária por crime de responsabilidade. A fundamentação para tal encontra-se no próprio caput do art. 5º (parte final) e, ainda, para a ME e EPP cumula- se com o art. 5º-A, ambos da Lei nº 8.666/93. Vejam-se os dispositivos:
Art. 5o Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada. [...] Art. 5o-A. As normas de licitações e contratos devem privilegiar o tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte na forma da lei. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)
Ou seja, se o caso fático do particular contratado, pela exegese da norma legal, encaixar-se nas circunstâncias justificáveis para que a Administração não obedeça a estrita ordem cronológica dos pagamentos, deverá assim demonstrar. Nesse sentido, no intuito de contextualizar a necessidade de certos particulares contratados, retomam-se aqui alguns problemas ocasionados a estas pessoas jurídicas, nas palavras de Xxxxxxx Xxxxx (2018):
[...] o não recebimento de suas faturas, acarreta, em muitas ocasiões, a quebra da empresa e a consequência de não cumprir seus compromissos trabalhistas, fiscais e comerciais, prejudica ainda terceiros diretamente afetados pelo calote do Estado. Do outro lado, mesmo sem estar tão evidente à primeira vista, a administração também sofre com seu próprio inadimplemento. Inicialmente, pelo fato de os licitantes que poderiam oferecer propostas mais vantajosas, não o fazerem, justamente por vislumbrar a ocorrência de desequilíbrio econômico-financeiro insustentável ao longo do contrato. Acabam optando, portanto, por não concorrer ou mesmo oferecer preço que já contemple compensações por eventuais prejuízos, ou seja, em razão de não honrar seus compromissos bem como pela ausência de credibilidade, a administração, em regra, paga mais caro. (DALLE, 2018)
Desse modo, conforme a explanação do autor, entende-se aqui que esses credores têm justo motivo para passar à frente daqueles cuja necessidade é, de plano, menor. É o caso, por exemplo, de uma microempresa que pactuou com o Estado a entrega de carimbos (ou qualquer material de valor ínfimo que condiz com as características das ME e EPP) em face de uma sociedade anônima internacional que pactuou com a Administração Pública a prestação de serviços de telefonia móvel. Percebe-se que ambos são credores, mas no caso concreto pode restar-se demonstrado que a microempresa tem mais necessidade que a sociedade anônima.
Desse modo, entende-se ser um subterfúgio ao particular contratado a fim de evitar o judiciário, pelas razões já expostas, sendo assim peticionar administrativamente em face da Administração contratante, pela demonstração das razões pelas quais não consegue cumprir o objeto contratual sem que haja prejuízos de âmbito empresarial, fiscal, trabalhista e todos outros eventuais que violem a dignidade dessas pessoas jurídicas de direito privado. A fundamentação jurídica, em especial, pode ser vista na parte final do caput do art. 5º da LLC cumulado com o
art. 5º-A, também da Lei Federal nº 8.666/93, além do princípio da ordem constitucional econômica (tratamento diferenciado), conforme disposto nos artigos 170, inciso IX, e 179, ambos da CF/88.
Noutro norte, se a Administração Pública entender que não há “relevantes razões de interesse público” e indeferir o pedido do particular contratado, coaduna-se com o entendimento de Xxxxxxxx Xxxxx (2017) que afirma parecer ser o único meio disponível ao contratado valer-se da tutela do Poder Judiciário. E, para tal, ajuizar a ação pelo rito processual comum cumulado com a tutela de urgência, inclusive de natureza antecipada, nos termos do art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015, e dentre vários pedidos cabíveis, pedir a imediata suspensão contratual, mesmo que antes dos 90 (noventa) dias, sob pena de proteger a extrema ruína do contratado por culpa exclusiva da pessoa jurídica de direito público.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O meio para aquisição de materiais e serviços pela Administração Pública é a Licitação Pública. Desta é pactuado um contrato de adesão denominado contrato administrativo. Este possui cláusulas exorbitantes, dentre as quais quedou-se a esmiuçar o instituto e princípio jurídico administrativo da restrição à exceptio non adimplet contractus, conforme atualmente positivado no art. 78, XV, da Lei Federal nº 8.666 de 1993, que veda ao particular contratado suspender os efeitos contratuais por eventual paralisação da sua obrigação contratual mesmo em face do não pagamento por prazo de até 90 (noventa) dias.
Após longa análise de seus princípios atinentes, suas ressalvas e seu verdadeiro prazo na prática administrativa, verificou-se que o prazo de 90 (noventa) dias atribuídos de modo geral é muita das vezes excessivo, na medida em que impacta prejuízos evitáveis tanto à Administração Pública quanto aos particulares. O que, consequentemente, viola o interesse público. Para isso, a presente pesquisa analisou o Projeto de Lei nº 6.814/17 que confirma a tese de que o prazo, na maneira em que se encontra, é excessivo, pois, diante de toda reforma das normas licitatórias que estão prestes a acontecer, há a mitigação do prazo de 90 dias para sua metade, isto é, 45 (quarenta e cinco) dias. Todavia, ainda se aplica a Lei nº 8.666/93, embora esteja o PL em trâmites legislativos finais para ser implementado no ordenamento jurídico brasileiro.
No que se refere aos prejuízos ocasionados a ambos contratantes, restou-se demonstrado que o particular retalhado até à beira da ruína empresarial, quando recorre ao Poder Judiciário, prejudica o interesse público, pois a Administração Pública, se condenada, deve arcar com os ônus adstritos à parte perdedora do processo, muito embora esses valores sejam pagos por meio de RPV ou Precatório. Além do mais, apresentou-se que existe a possibilidade daquele particular contratado ser tacitamente condicionado a tal ponto de ter que desligar seus funcionários, contratados em regime celetista (CLT), sem justa causa (extinção do contrato de trabalho imotivada), a fim de conseguir sustentar o ônus contratual, sem que sofra as sanções administrativas. Observou-se que o desligamento do obreiro sem justa causa, gera impactos para a seguridade social, tendo em vista que o trabalhador dispensado fará jus aos seus direitos, em especial do Auxílio Seguro-Desemprego, apresentando-se, assim, notória consequência negativa ao interesse público.
Verificou-se também que há autores críticos à Administração Públicos. Em virtude do atual cenário político-econômico brasileiro, o poder público reiteradamente não efetiva o devido pagamento às pessoas jurídicas de direito privado. Apontam, esses autores, que a contumácia no inadimplemento fere de morte o empresário, que certamente deixará de realizar negociações comerciais com o Poder Público ou, se optar por fazer, elevará os preços de suas mercadorias e/ou serviços.
No que diz respeito às microempresas e empresas de pequeno porte, vislumbrou-se que houve, sim, uma evolução do ordenamento jurídico brasileiro com relação à garantia de condições mais vantajosas ao desenvolvimento das Microempresas e EPP, a fim de colaborarem o desenvolvimento mais sustentável do país, com mais empregos e mais renda para população brasileira. Percebeu-se justificadamente que a finalidade é, de fato, beneficiar essas pessoas jurídicas em virtude de suas desigualdades fáticas. Em especial, com a simplificação das suas obrigações administrativas atrelando condições isonômicas mais incentivadoras para colaborarem com o Poder Público na notória relação dúplice e saudável que existe (ou deveria existir) entre as partes contratuais.
Entretanto, as pesquisas aqui apontadas demonstraram existir uma incoerência entre a restrição ao uso do princípio da exceção de contrato não cumprido que é aplicado de modo igualmente formal às pessoas jurídicas contratadas da Administração Pública, conforme art. 78, inciso XV, da atual Lei de Licitações e Contratos, principalmente levando-se em consideração que, a priori, não levam em consideração princípios constitucionais relevantes como bem conceituado o princípio geral da ordem jurídica econômica brasileira: o tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte, consubstanciado especialmente no art. 178, inciso IX, da Constituição Federal de 1988.
Para tanto, acredita-se ser uma alternativa a aplicação da teoria do sopesamento entre os princípios conflitantes, criada pelo alemão Xxxxxx Xxxxx, que, neste caso, visa tutelar o interesse público voltado a um viés protecionista das microempresas e emprestas de pequeno porte. Noutro norte, se não for levada em consideração as características das ME e EPP, obrigando-as a adimplir a obrigação de modo completamente unilateral por prazo de até 90 dias, o que, inclusive, demonstrou-se ser na prática prazo muito superior aos 90 dias, parece ser atuação administrativa às cegas. Ou seja, uma atuação administrativa fechada, vendada, que não se utiliza do ordenamento jurídico como um todo. O que, embora seja uma atuação vinculada e lícita, não é uma interpretação jurídica mais inteligente, sendo que existem
mecanismos para favorecer o pequeno empresário prezando-se assim pelos princípios constitucionais em especial do tratamento diferenciado, da eficiência, da efetividade, da isonomia, sempre a fim de favorecer, de modo impessoal, o interesse coletivo.
A título de futuros aprofundamentos, apontam-se pontos a serem teoricamente enfrentados. Um de longuíssimo prazo, trata-se de toda reformulação do modelo administrativo estatal, que parece encontrar-se estagnado no tempo ao lado de vários avanços tecnológicos e teórico-jurídico, em especiais. Outro ponto é a análise da atuação dos órgãos competentes sobre o funcionamento administrativo vinculado a todos os atos reflexos dos contratos administrativos, a exemplo da atuação do Tribunal de Contas e do Ministério Público, sobretudo na responsabilização do mal gestor público.
Por fim, acredita-se que a presente pesquisa colabora, ou ao menos tentou colaborar, com as pessoas jurídicas de direito privado contratadas da Administração Pública que se encontram em situação de preocupação ou até desespero em face do inadimplemento contratual por culpa exclusiva da entidade estatal que não efetiva o pagamento no prazo contratual e legal, principalmente quando referir-se às microempresas e empresas de pequeno porte. Essas ações, por certo, não coadunam com o interesse público.
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