PARENTESCO
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CONTROLE INTERNO – CONTRATAÇÃO
PROCESSO Nº : 425856/20 ASSUNTO : CONSULTA
ENTIDADE : MUNICÍPIO DE IMBAÚ
INTERESSADO : XXXXXX XXXXXXXX XXXXXXXXX, XXXXX XX XXXXXXXX RELATOR : CONSELHEIRO XXXX XXXXX XXXXXXX
ACÓRDÃO Nº 2145/21 - TRIBUNAL PLENO
EMENTA: Consulta. Vedação de participação em procedimento licitatório ou de contratação de empresa que possua como sócio cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de integrante do Controle Interno da entidade licitante. Conhecimento e resposta.
1 DO RELATÓRIO
Trata-se de Consulta formulada pelo então Prefeito1 do Município de Imbaú, Sr.
ACÓRDÃOS
Xxxxx xx Xxxxxxxx, por meio da qual
solicita a verificação da viabilidade de contratação de empresa, por meio de licitação em seus diversos tipos, cujo indivíduo do quadro societário tenha grau de parentesco com servidor integrante do órgão de Controle Interno municipal, ainda que a empresa não seja do mesmo Município licitante.
Houve a juntada aos autos de parecer da procuradoria jurídica2 do Município, com conclusão nos seguintes termos:
(...) conclui-se que, além das vedações legais presentes na Lei de Licitações, o procedimento deverá respeitar a sistemática constitucional para os atos da Administração Pública, dentre eles o princípio da moralidade administrativa (art. 37, “caput”, da Constituição Federal). Nesse ponto específico, os atos administrativos deverão seguir um padrão de aceitação social suficiente a garantir a lisura e ausência de conflito de interesses privados com a satisfação dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Portanto, a vedação prevista no art. 9º, III, da Lei nº 8.666/93 que proíbe a participação de empresas com sócios, dirigentes ou empregados com parentesco, até o terceiro grau, com agentes públicos do órgão ou ente contratante, se o vínculo for mantido com dirigente ou servidor integrante da unidade responsável pela licitação, impõe o dever, à autoridade administrativa competente, de demonstrar que referido servidor (Controle Interno) possui poder de influência sobre o certame.
Assim, se o servidor não atuar no órgão responsável pelo processo licitatório, haveria a viabilidade de contratação, todavia, este não poderá atuar em eventual processo de controle, por suspeição.
1 Gestão 2017-2020.
2 Peça 15.
Por intermédio do Despacho nº 1104/20-GCILB3, foi admitido o processamento da Consulta.
Mediante a Informação nº 77/20-SJB4, a Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca relacionou as decisões sobre o tema encontradas no âmbito deste Tribunal.
A Coordenadoria-Geral de Fiscalização informou que “não há impactos imediatos em sistemas ou em fiscalizações realizadas pelas Coordenadorias” (Despacho nº 943/20-CGF5).
Por meio da Instrução nº 2064/21-CGM6, a Coordenadoria de Gestão Municipal manifestou-se conclusivamente
pela vedação à participação em licitação, ou contratação de empresa, que possua em seu quadro societário cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de integrante do Controle Interno do órgão licitante.
O Ministério Público de Contas corroborou o opinativo técnico (Parecer nº 166/21-PGC7).
É o relatório.
2 DA FUNDAMENTAÇÃO E VOTO
Cumpridos os requisitos de admissibilidade8, ratifico o recebimento da Consulta, para respondê-la em tese.
O questionamento versa acerca da possibilidade de, mediante licitação, contratar- se uma empresa que possua, como sócio, parente de servidor integrante do órgão de Controle Interno municipal, ainda que tal empresa não seja do Município licitante.
Pois bem. A Constituição Federal expressamente dispõe9 que a administração pública deve observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
ACÓRDÃOS
3 Peça 16.
4 Peça 18.
5 Peça 22.
6 Peça 23.
7 Peça 24.
8 Lei Complementar Estadual nº 113/2005:
Art. 38. A consulta deverá atender aos requisitos previstos no Regimento Interno. Regimento Interno do TCEPR:
Art. 311. A consulta formulada ao Tribunal de Contas, conforme o disposto no Título II, Capítulo II, Seção VII, da Lei Complementar nº 113/2005, deverá atender aos seguintes requisitos:
I - ser formulada por autoridade legítima;
II - conter apresentação objetiva dos quesitos, com indicação precisa de dúvida;
III - versar sobre dúvida na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de competência do Tribunal;
IV - ser instruída por parecer jurídico ou técnico emitido pela assessoria técnica ou jurídica do órgão ou entidade consulente, opinando acerca da matéria objeto da consulta;
V - ser formulada em tese.
9 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...):
Em atenção aos princípios da impessoalidade e moralidade, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 1310, visando, em síntese, acabar com a prática do nepotismo no país.
Após análise da extensão dos efeitos da Súmula Vinculante nº 13, visando orientar os jurisdicionados quanto à sua aplicabilidade, esta Corte de Contas editou o Prejulgado nº 9, o qual, dentre outros aspectos, dispôs:
1. São nulos os atos caracterizados como nepotismo; (...)
13. As mesmas regras aplicam-se na contratação de prestação de serviços com empresa que venha a contratar empregados com incompatibilidades com as autoridades contratantes ou ocupantes de cargos de direção ou de assessoramento, devendo essa condição constar do edital de licitação;
Já a Lei nº 8.666/93, em seu artigo 9º, inciso III11, previu a impossibilidade de que participe, direta ou indiretamente, de licitação, servidor ou dirigente do órgão ou entidade contratante.
Adicionalmente, mediante o Acórdão nº 2745/10-STP12, respondendo à Consulta formulada por gestor municipal, esta Corte de Contas firmou entendimento:
pela impossibilidade de empresa participar de licitação se o sócio, cotista ou dirigente for servidor do órgão licitante, ou cônjuge, companheiro, parente em linha reta e colateral, consanguíneo ou afim de servidor público do órgão ou entidade licitante, que nele exerça cargo em comissão ou função de confiança, seja membro da comissão de licitação, pregoeiro ou autoridade ligada à contratação.
O fato de este Tribunal ter proferido algumas poucas decisões (isoladas e minoritárias), em que foram relativizadas vedações legais com base nas peculiaridades dos casos concretos - notadamente o pequeno porte de alguns Municípios e ausência de qualquer indício de favorecimento indevido - não possui o condão de afastar a diretriz, com força normativa, estabelecida por referido Xxxxxxx.
Traçado esse panorama, denota-se que a dúvida apresentada tem relação direta com o Sistema de Controle Interno dos Municípios.
A Constituição da República13 conferiu ao Controle Interno a fiscalização
ACÓRDÃOS
10 Súmula Vinculante nº 13: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.
11 Art. 9o. Não poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários:
III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação.
12 Ref. Processo de Consulta nº 228167/10. Relator: Conselheiro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx. Unânime. Votaram também Xxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx e os Auditores Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx.
13 Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, quanto à legalidade, legitimidade e economicidade.
A finalidade primordial de tal controle é assegurar o cumprimento das normas e princípios aplicáveis à gestão pública, a utilização econômica e eficiente dos recursos e o alcance das metas propostas.
Para que se atinja maior efetividade, deve-se priorizar ações de controle que sejam prévios e concomitantes aos fatos.
É imprescindível que o exercente das funções de controle possua autonomia e independência na realização de suas atividades, as quais envolvem notadamente proteção do patrimônio público em face de eventuais erros e irregularidades.
O órgão de Controle Interno possui elevada importância na defesa do interesse público, sendo inclusive responsável, em atuação rotineira, pelo acompanhamento, averiguação e fiscalização da regularidade das licitações e contratos.
Logo, presume-se que os servidores atuantes em tal órgão detêm significativo poder de influência no âmbito dos procedimentos licitatórios.
Como bem ressaltado pela Coordenadoria de Gestão Municipal14:
ACÓRDÃOS
Nesse ponto, é questionável se haveria imparcialidade na análise de licitações e contratos envolvendo parentes próximos. Assim, o impedimento em relação a esses servidores deve ser tido como absoluto.
Nessa senda, convém destacar o que dispõe a Lei nº 14.133/21 (nova lei de licitações e contratos administrativos):
Art. 14. Não poderão disputar licitação ou participar da execução de contrato, direta ou indiretamente: (...)
IV - aquele que mantenha vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista ou civil com dirigente do órgão ou entidade contratante ou com agente público que desempenhe função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato, ou que deles seja cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, devendo essa proibição constar expressamente do edital de licitação; (...)
Art. 169. As contratações públicas deverão submeter-se a práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo, inclusive mediante adoção de recursos de tecnologia da informação, e, além de estar subordinadas ao controle social, sujeitar-se-ão às seguintes linhas de defesa: (...)
I - primeira linha de defesa, integrada por servidores e empregados públicos, agentes de licitação e autoridades que atuam na estrutura de governança do órgão ou entidade;
II - segunda linha de defesa, integrada pelas unidades de assessoramento jurídico e de controle interno do próprio órgão ou entidade;
III - terceira linha de defesa, integrada pelo órgão central de controle interno da Administração e pelo tribunal de contas.
14 Instrução nº 2064/21-CGM, peça 23.
Nesse contexto e à luz dos dispositivos acima transcritos, infere-se pela inadmissibilidade de, mediante licitação, determinado Município contratar empresa que tenha como sócio indivíduo que possua vínculo familiar com qualquer servidor integrante do órgão de Controle Interno municipal.
A partir desse entendimento, afigura-se irrelevante o debate acerca de aludida empresa ser ou não do Município licitante; por evidente que, não tendo origem ou não estando situada no mesmo Município, também é inviável sua contratação.
Previne-se, assim, o surgimento de indesejados conflitos de interesses, capazes tanto de violar princípios como os da isonomia e moralidade, como de comprometer a higidez dos certames.
2.1 DO VOTO
Ante o exposto, acompanhando as manifestações uniformes, VOTO pelo conhecimento da presente Consulta para, no mérito, respondê-la nos seguintes termos:
ACÓRDÃOS
É vedada a participação em licitação ou a contratação de empresa que possua em seu quadro societário cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de integrante do Controle Interno da entidade licitante.
Após o trânsito em julgado, encaminhe-se à Escola de Gestão Pública para as devidas anotações, ficando, na sequência, autorizado o encerramento do feito e seu arquivamento junto à Diretoria de Protocolo.
3 DA DECISÃO
VISTOS, relatados e discutidos, ACORDAM OS MEMBROS DO TRIBUNAL PLENO do TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO PARANÁ, nos termos do voto do Relator, Conselheiro XXXX XXXXX XXXXXXX, por unanimidade, em conhecer a presente Consulta para, no mérito, respondê-la nos seguintes termos:
I - é vedada a participação em licitação ou a contratação de empresa que possua em seu quadro societário cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de integrante do Controle Interno da entidade licitante; e
II - determinar, após o trânsito em julgado, o encaminhamento à Escola de Gestão Pública para as devidas anotações, ficando, na sequência, autorizado o encerramento do feito e seu arquivamento junto à Diretoria de Protocolo.
Votaram, nos termos acima, os Conselheiros XXXXXX XXXXXXXX, XXXXXXX XX XXXXXX XXXX, XXXXXXXX XXXXXXX XXXXX XXXXXXXXX, XXXX XXXXX XXXXXXX e XXXX XXXXXX XXXXXX XX XXXXXX e o Auditor XXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX.
Presente a Procuradora Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, XXXXXXX XXXXX.
Tribunal Pleno, 1 de setembro de 2021 – Sessão Ordinária (por Videoconferência) nº 28.
XXXX XXXXX XXXXXXX
Conselheiro Relator
XXXXX XX XXXXX XXXXXXX
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