CONTRATOS NO ÂMBITO DO MERCOSUL: UMA ANÁLISE À LUZ DO DIREITO DE INTEGRAÇÃO
CONTRATOS NO ÂMBITO DO MERCOSUL: UMA ANÁLISE À LUZ DO DIREITO DE INTEGRAÇÃO
Contratos en el zona del Mercosur: un análisis desde la perspectiva del Derecho de la Integración
XXXXXXX, Xxx Xxxxxx Xxxxxxxx
Faculdade Jaguariúna
Resumo: Este artigo tem por objetivo investigar as regras vigentes para a realização de contratos no âmbito do MERCOSUL sob a perspectiva do Direito de Integração. Primeiramente será realizada uma explanação acerca da mudança do conceito de soberania e a sua flexibilização em prol do desenvolvimento da economia mundial. Posteriormente serão analisados o Direito de Integração, o MERCOSUL e seus desafios. Ao final, o estudo da legislação dos países fundadores do MERCOSUL no que tange à autonomia da vontade, e se tais dispositivos favorecem o comércio e a integração na área do bloco sul-americano.
Palavras-chave: soberania; integração; MERCOSUL; contratos.
Resumen: Este artículo tiene como objetivo investigar la normativa vigente para la ejecución de los contratos en el MERCOSUR desde la perspectiva de la Ley de Integración. Primero habrá una explicación sobre el cambio de soberanía y su flexibilidad en el apoyo al desarrollo de la economía mundial. Más tarde, la ley se analizará la integración, el MERCOSUR y sus desafíos, y al final el miembro fundador de la legislación del MERCOSUR con respecto a la autonomía de la voluntad, y si tales dispositivos promover el comercio y la integración en el área del bloque sudamericano.
Palabras clave: la soberania; la integración; el MERCOSUR; contratos.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objetivo estudar a celebração dos contratos na área do MERCOSUL, tendo por fundamento a integração entre os países, fenômeno que contribuiu para a flexibilização do conceito de soberania. Explica-se: a soberania estatal não se estabeleceu da forma como hoje a conhecemos, eis que experimentou vários conceitos ao longo da história. Em tempos mais remotos ela era exercida somente pelo monarca, até que a teoria do contrato social lançou as bases do Estado Moderno.
Após inúmeros fenômenos ocorridos nas últimas décadas, como por exemplo, a globalização, os blocos econômicos e a cooperação internacional para a proteção aos direitos humanos, houve uma redefinição do conceito de soberania. Os blocos econômicos, em especial, se tornaram uma tendência
mundial, criando assim os entes supranacionais ou intergovernamentais. Eles promovem o agrupamento entre os Estados membros, e fomentam o comércio, o fluxo de bens e serviços, e também o intercâmbio cultural. A integração entre os países e a flexibilização da soberania estão, portanto, intimamente ligadas, por isso serão estudados esses dois temas antes de adentrar-se à questão dos contratos no MERCOSUL.
O MERCOSUL é um bloco econômico criado no início da década de 1990, por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Será investigado como os países fundadores do MERCOSU legislam no tocante aos contratos internacionais, se estão em consonância e se permitem que as partes escolham a lei que deve ser aplicada ao pacto que estão celebrando. Merece destaque o importante papel exercido pelos contratos, como uma das forças que movem a economia e que tem o poder de gerar riquezas e fazê-las circular.
Espera-se que este singelo trabalho possa, de alguma forma, contribuir para a melhor compreensão do assunto abordado e pesquisado, formulando uma refutação coerente para a seguinte indagação: as normas vigentes acerca da autonomia da vontade nos contratos, nos países fundadores do MERCOSUL favorecem a integração do bloco e a comercialização dos produtos em seu âmbito? É o que passamos a analisar.
A FLEXIBILIZAÇÃO DA SOBERANIA DO ESTADO
Na história da humanidade, os grupos sociais sempre necessitaram de uma forma de controle, imprescindível para a sua continuidade e sobrevivência. Na Antiguidade, tal domínio foi exercido pelas chamadas Cidades-Estados, tais como Esparta e Tróia. A ideia da soberania do Estado foi concebida pela primeira vez por Xxxx Xxxxx, em sua célebre obra Os seis livros da República, onde sustentava que todo o poder do Estado estava concentrado nas mãos do monarca. Vejamos:
“Nada havendo de maior sobre a terra, depois de Deus, que os príncipes soberanos, e sendo por Ele estabelecidos como seus representantes para governarem os outros homens, é necessário lembrar-se de sua qualidade, a fim de respeitar-lhes e reverenciar- lhes a majestade com toda a obediência, a fim de sentir e falar deles com toda a honra, pois quem despreza seu
príncipe soberano despreza a Deus, de Quem ele é imagem na terra.1”
Para Xxxxx, os reis detinham uma supremacia absoluta e ilimitada, pois haviam sido escolhidos por uma entidade superior e divina para exercê-la, por isso tal domínio era inquestionável. Não existia nenhuma outra forma de poder capaz de se sobrepor ao poder do monarca, isso porque as funções legislativa, jurisdicional e legislativa pertenciam exclusivamente a ele. O povo não tinha poder de decisão nas questões do Estado. Contudo, era através dos impostos pagos pela população, especialmente os advindos da atividade mercantil, que possibilitavam à Corte Real manter seu império de privilégios e luxos.
Pode-se dizer que esse regime déspota teve suas manifestações mais robustas na Inglaterra e na França. No primeiro país destaca-se a dinastia Tudor e seu apogeu, que se deu com o governo da Xxxxxx Xxxxxxxxx X que reinou de 1558 a 16032. No segundo caso, merece destaque o reinado de Xxxx XXX, conhecido como o Rei Xxx, que se tornou um símbolo dessa era. É de sua autoria a seguinte frase: É somente na minha pessoa que reside o poder soberano, é somente de mim que os meus tribunais recebem a sua existência e a sua autoridade; a plenitude desta autoridade3.
Dessa feita, não restam dúvidas sobre as principais características do sistema absolutista: poder total exercido somente pelo monarca, que podia julgar legislar e administrar sem qualquer oposição ou participação de outro órgão ou da população. Foi a partir do descontentamento desta última que começaram a surgir as revoltas que culminaram com o fim do Antigo Regime. Explica-se: a classe conhecida como burguesia produzia a riqueza através de sua principal atividade, o comércio. Arcavam com pesados impostos, sustentavam a ostentação do Império, mas não detinham qualquer direito político. A derrocada final do absolutismo aconteceu com a Revolução Francesa, ocorrida em 1789.
Nesse período, as concepções do suiço Xxxx-Xxxxxxx Xxxxxxxx, especialmente inseridas em sua obra Do Contrato Social, também foram determinantes para a mudança do pensamento acerca do poder no século
0XXXXX, X.; Os seis livros da república apud CHEVALLIER, Xxxx-Xxxxxxx. As grandes obras políticas de Xxxxxxxxx a nossos dias. Rio de Janeiro: Agir, 1976, p. 60.
2Fato histórico notório, que dispensa referência bibliográfica.
3FREITAS, G.; 900 textos e documentos de História, vol. II. Lisboa: Plátano, 1976, p. 201/202.
XVIII. Em primeiro lugar, é relevante asseverar que, para Xxxxxxxx, os homens viviam em um estado de natureza, onde cada um era responsável por seus atos e livre para perseguir seus objetivos do modo que melhor lhe aprouvesse. Evidente que prevalecia a vontade dos mais fortes sobre os mais fracos, e a justiça era feita à maneira que cada um entendesse como a correta. Sobre esse tipo de sociedade primitiva, Xxxxxxxx afirma em seu livro:
“Essa liberdade comum é uma conseqüência da natureza do homem. Sua primeira lei consiste em proteger a própria conservação, seus primeiros cuidados os devidos a si mesmo, e tão logo se encontre o homem na idade da razão, sendo o único juiz dos meios apropriados à sua conservação, torna-se por si o seu próprio senhor4.”
Assim, a indagação torna-se inevitável: um grupo social baseado somente na força, sem nenhuma forma de controle eficaz é viável? A réplica nos salta à vista: não. Provavelmente seus membros acabariam em uma disputa contínua, onde matariam uns aos outros. A solução proposta por Xxxxxxxx está no contrato social, onde cada pessoa deve renunciar a uma parcela de seu arbítrio, de sua liberdade em prol de um ente que se denomina Estado, que seria o garantidor da segurança e da paz social.
Isso significa dizer que do estado de natureza é deixado para trás dando lugar ao estado civil. O Estado é o responsável pela ordem social através de seus três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, que antes estavam concentrados somente na figura do monarca. Esse sistema se distingue do absolutismo, pois a soberania não pode ser exclusiva do rei e de seus desejos, ela agora tem como titular o povo, sendo a vontade geral a formar um todo único, indivisível e inalienável. Por isso nosso regime atende pela nomenclatura de soberania popular. Sobre o tema, eis mais uma lição do filósofo:
“Tão logo se encontre a multidão reunida em um corpo, não se pode ofender um dos membros sem atacar o corpo, menos ainda ofender o corpo sem que os membros disso se ressintam. Assim, o dever e o interesse obrigam igualmente as duas partes contratantes a se auxiliarem de forma recíproca, e os próprios homens
4ROUSSEAU, X.; Do contrato social. Tradução de Xxxxxxx Xxxxx xx Xxxxx. São Paulo: Ridendo Castigat Mores, 2002, p. 11.
devem procurar reunir sob essa dupla relação todas as vantagens que disso dependem.5”
As contribuições do pensador Xxxx-Xxxxxxx Xxxxxxxx para o desenvolvimento do conceito de soberania são de indiscutível valor, e até hoje estudadas e debatidas. Contudo, o mundo foi tomado por marcantes alterações nas últimas décadas, especialmente a expansão comercial. Os países estão cada vez mais integrados e a constituição de uma ordem jurídica internacional é imprescindível para que haja regulamentação das relações existentes entre os Estados, para conferir a estas, equilíbrio e solidez. Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx leciona que soberania do Estado não pode ser estática: tem que ser dinâmica, no sentido de se tornar capaz de adaptar à variedade das circunstâncias que se abrem, constantemente, na vida dos povos6. Nasceu assim, a integração entre os países, objeto de estudo do próximo tópico.
DIREITO DE INTEGRAÇÃO: O MERCOSUL E SEUS DESAFIOS
No posicionamento de Xxxxxxxx Xxxxxxxx X. Xxxxxx, “a noção de soberania, em termos atuais, é oposta à clássica visão de indivisibilidade e inalienabilidade do poder definitivo da soberania. A integração internacional, limitando a esfera da jurisdição doméstica de cada Estado, amplia as possibilidades de colaboração intergovernamental, fortificada por um processo decisório coletivo”7. Os blocos econômicos são um fenômeno que tem origem na globalização mundial. Sobre o tema leciona a eminente doutrinadora argentina Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx:
“La comunidad internacional se encuentra atravesando un período de transformación, particularmente en las esferas jurídicas y económicas. El llamado Nuevo Orden Mundial, motivado por el fin de la Guerra Fría ha provocado, ha estimulado un crecimiento sin precedentes del comercio internacional y de las inversiones extranjeras. Precisamente, se ha pensado que esta especial circunstancia, ha dado lugar a la aparición de la llamada internacionalización, mundialización, globalización la que ha tenido suficiente virtualidad como para llegar hasta el punto de modificar, de cambiar el concepto mismo de soberanía y donde hoy más que
5Ibidem, p. 28.
6PAUPÉRIO, A. M.; O conceito polêmico de soberania. In: XXXXXXX, Xxxxx. União européia e supranacionalidade: desafio ou realidade? Curitiba: Juruá, 2000, p. 76.
7BRANCO, L. G. B., Sistema de solução de controvérsias no MERCOSUL: perspectivas para a criação de um modelo institucional permanente. São Paulo : LTR, 1997, p. 27
nunca, los Estados parecen no ser tan soberanos como lo han sido en el pasado8.”
As empresas deixaram de ser somente nacionais e passaram a ser multinacionais e, tendo como aliados uma tecnologia cada vez mais avançada, a internet, as informações em escala global, tornaram o mercado mundial em algo absolutamente integrado em si. Visando facilitar essa incorporação muitos países se agruparam em blocos com a finalidade de estabelecer medidas que facilitem e incentivem as transações comerciais entre eles.
São exemplos de ações implementadas por tais organizações: as zonas de livre-comércio, que extinguem as taxas alfandegárias na circulação de mercadorias, a união aduaneira, que é o acordo que firma uma tarifa alfandegária única entre os países membros, o mercado comum, que cria uma interação não só em relação a circulação de bens, mas também de serviços, tecnologias, matérias-primas, etc., e por fim a instituição de uma moeda única, como ocorreu com a União Européia quando do lançamento do euro, em 1999. Sobre o assunto, Xxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxx leciona:
“Trata-se, assim, do processo econômico-político entre governos nacionais e soberanos de desagravação, visando a redução, parcial ou total, das barreiras tarifárias ou não-tarifárias que limitam ou entravam o comércio recíproco (...). Outrossim, o processo de integração econômica, sob uma visão objetiva, é o conjunto de medidas de caráter econômico e comercial que tem por objetivo promover a aproximação e, eventualmente, a união entre as economias de dois ou mais países.9”
No entendimento de Xxxxx X. Mellado “el proceso de creación de un espacio económico, político y social por la interpenetración estructural, voluntaria y solidaria de los Estados Parte, a partir de intereses comunes, que tiene como objetivo el desarrollo y cuyos mecanismos e instrumentos quedan definidos en el Tratado que le da origen”10. E para Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx e Xxxx Xxxxxx Xxxx “la concetración econômica que imponen las economias de escala em lós procesos productivos tiene su espejo-reflejo em la coordenación
8CÁRDENAS, S. L. F.; El Mercosur: uma mirada al futuro. Direito Público e Integração: revista jurídica, ano 1, nº 1. Aracaju: Gráfica Editora J. Andrade Ltda., 2009, p. 37.
9FIGUEIREDO, L. V.; Lições de direito econômico, 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 376.
10MELLADO, N. B.. El Modelo del MERCOSUR. In: Aportes para la Integración Latinoamericana. Instituto de Integración Latinoamericana, Universidad Nacional de La Plata, año I, nº 2, diciembre 1995, p. 33.
integrativa creciente de mercados, em la existência de redes integrativas cada vez más profundas”11. Assim, pode-se conceituar integração da seguinte forma:
“A integração trata-se de um processo de conteúdo polissêmico, que insere um sentido político, cultural, social, jurídico e econômico, ensejando a aproximação entre países, em face das afinidades e respectivos interesses econômicos em comum. Na medida em que ocorre a evolução da aproximação integracionista, alcançando etapas mais avançadas que a zona de livre comércio e união aduaneira, o processo transcende à conotação meramente econômica e busca o desenvolvimento e a harmonização das questões sociais, políticas e culturais de interesse das nações integradas12.”
O direito de integração visa constituir uma ordem jurídica internacional, para regular a união dos países que possuem interesses em comum. Os blocos econômicos podem se agrupar na forma intergovernamental (caso do MERCOSUL) ou supranacional (caso da União Europeia). Sinteticamente pode-se dizer que na intergovernabilidade as decisões são tomadas segundo interesse de cada país, com consulta aos mesmos. Além disso, o direito nacional prevalece sobre o internacional.
Na supranacionalidade, as decisões são tomadas pelo órgão integrador no interesse do bloco, independente da vontade de cada país membro. As características mais relevantes da supranacionalidade são essencialmente duas: a autonomia de seus órgãos em relação aos Estados membros e o imediatismo dos poderes exercidos13. Na intergovernabilidade, o interesse predominante é o resultado da vontade individual de cada Estado-Membro, não estrutura institucional independente destes14.
Em 1991 foi fundado o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), um amplo projeto de integração concebido por Argentina, Brasil, Paraguai, e Uruguai. Trata-se de um bloco intergovernamental. Recentemente, com a ratificação do Protocolo de Adesão da República Bolivariana da Venezuela ao
11GRAHAM, M. A.; XXXX, J. C.; Jerárquia constitucional de lós tratados internacionales.
Buenos Aires: Astrea, 1996, p. 61.
12RAYMUNDO, L. S. M.; Supranacionalidade e intergovernabilidade: uma nova concepção de soberania estatal em face dos processos de integração na União Européia e no Mercosul. Revista da FARN, Natal, v.2, n.2, p. 149 -174 , jan./jul. 2003, p. 150.
13Ibidem, p. 165.
14SALDANHA, J. M. L.; Reenvio prejudicial: uma mecanismo de direito processual a serviço do direito comunitário. Perspectiva para sua adoção no Mercosul. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 10.
MERCOSUL, a Venezuela tornou-se o quinto Estado Parte a integrar o bloco15. Sobre o nascimento do bloco sul-americano, Xxxxxxxx leciona:
“Las motivaciones del nacimiento en el elenco de espacios integrados en esta parte del planeta, tuvieron su origen en la finalidad de revertir lós problemas ocasionados por la deuda externa, el estancamiento del comercio internacional la desinversión y terminar con “la década perdida” de América Latina. No puede ignorarse que la llegada de la democracia también fue sin lugar a dudas un disparador para que Argentina le propusiera a Brasil un acercamiento económico-político entre ambas naciones. Más tarde se incorporaron Uruguay y Paraguay aún sin haber ingresado este último socio en el proceso de democratización16.”
De acordo com o artigo 1° do Tratado de Assunção, tratado constitutivo do bloco, o MERCOSUL implica “a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, através, entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários e restrições não-tarifárias à circulação de mercadorias e de qualquer outra medida de efeito equivalente; o estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados ou agrupamentos de Estados e a coordenação de posições em foros econômico-comerciais regionais e internacionais; a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados Partes - de comércio exterior, agrícola, industrial, fiscal, monetária, cambial e de capitais, de serviços, alfandegária, de transportes e comunicações e outras que se acordem, a fim de assegurar condições adequadas de concorrência entre os Estados Partes; o compromisso dos Estados Partes de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração”17.
Lenice S. Xxxxxxx Xxxxxxxx observa que o “Mercosul encontra-se em período de transição entre Zona de Livre Comércio e União Aduaneira”18. A doutrina majoritária considera o Mercosul como uma União Aduaneira imperfeita19. Entretanto, não se pode olvidar que tal imperfeição também reside
15Informações retiradas da página do governo brasileiro sobre o MERCOSUL. Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxx-xxxx-xxxxxxxxxx-xxxxx-xxxxxxx xxx-xxxxxxxx-x-xxxxxxxx- 0/xxxxx-xxxxxxxxxx-xxxxxxxx-x-xxxxxxxx/. Acesso em 20/02/2013.
16CÁRDENAS, Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx. El Mercosur: uma mirada al futuro. Op. cit. p. 44. 17TRATADO DE ASSUNÇÃO. Artigo 1º. Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx /tratados-e- protocolos/tratado-de-assuncao-1. Acesso em 20/02/2013.
18RAYMUNDO, Xxxxxx X. Moreira. Op. cit. p. 170.
19Ibidem. p. 170.
na sua conformação de Zona de Livre Comércio, já que permanece vigorando a substancial Lista de Exceções ao Princípio da Eliminação das Restrições Quantitativas, apregoada pelo artigo 4º o do Tratado de Assunção20.
O que ocorre é que o MERCOSUL enfrenta inúmeros desafios no que diz respeito à sua consolidação. Para o diplomata Xxxxxxx Xxxxxxxxxx, “as crises financeiras de Brasil e Argentina se tornaram crises sistêmicas do MERCOSUL. Além de paralisar um processo que por natureza deve ser dinâmico, a instabilidade de um dos parceiros incide imediatamente – em razão de um aumento da interdependência provocada pelo próprio processo – nos demais”21. Obviamente, com a criação dos blocos econômicos, os países- membros estabelecem entre si um elo que visa a promoção econômica e social de todos os envolvidos. Isso significa que, quando um dos Estados é atingido por dificuldades financeiras, as transações comerciais, cerne de todo o acordo, pode sair abaladas, afetando todos os países que fazem parte de um determinado bloco.
Ainda de acordo com Xxxxxxxxxx, “desde seus primórdios ficou claro que o MERCOSUL encontrava dificuldades para ser aceito com um verdadeiro projeto nacional. Havia uma percepção de que o processo interessava, sobretudo, aos Estados e Províncias mais desenvolvidas dos países membros”22. Em muitas situações, o MERCOSUL não recebe apoio de inúmeros organismos da sociedade ou mesmo dos governos, o que entrava sua consolidação. Seintenfus cita o caso de um candidato à presidência do Brasil, que em sua campanha eleitoral, em 2002, disse que o MERCOSUL era um erro23.
Esses problemas nos conduzem para inevitáveis indagações: o MERCOSUL realmente traz benefícios aos países membros? Segundo o portal Classificados MERCOSUL, o bloco vem contribuindo para a criação de um clima receptivo de expansão do comércio, uma vez que aumentou de US$
4.1 bilhões em 1991 para cerca de US$ 20 bilhões em 1998. Ao mesmo tempo, as importações dos países do MERCOSUL provenientes do resto do mundo
20Ibidem. p. 170.
21SEITENFUS, R.; Os desafios externos do MERCOSUL e as relações com a ALCA. Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxxx-xxxxxxxx-xxxxx sul.pdf, p. 5.
22Ibidem. p. 6.
23Ibidem, p. 5.
cresceram de forma expressiva. Como resultado, a participação do MERCOSUL no total das importações mundiais triplicou, passando de 29,296 bilhões de dólares em 1990 a 98,763 bilhões de dólares em 199824. O MERCOSUL tem ainda uma importância sob o ponto de vista diplomático, conforme aponta o diplomata Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxx.
“O Mercosul pode contribuir de forma relativamente importante para a ação diplomática do Brasil em determinados foros negociadores internacionais, assim comoele pode contribuir, ainda que de maneira não decisiva, para o encaminhamento de algumas modalidades de políticas setoriais internas (não necessariamente integradoras, em sua totalidade), assim como para aspectos complementares dos ambientes regulatório 14 e normativo em várias áreas da organização econômica e administrativa brasileira. Ele não pode, contudo, resolver os problemas de desenvolvimento econômico e tecnológico, de desequilíbrio regional, de correção das tremendas desigualdades sociais internas, de desemprego, de educação, de justiça social, enfim, deve-se reconhecer que o Mercosul é extremamente limitado em sua capacidade transformadora do Brasil e que não se pode fazê-lo assumir papéis para os quais ele não está institucionalmente mandatado ou “estruturalmente” preparado (nem poderia estar)25.”
Desse modo, entendemos que o MERCOSUL trouxe sim inúmeros benefícios, mas ainda possui problemas que dificultam o seu desenvolvimento como bloco econômico. Mas para Xxxxxxxx, “es imprescindible que se siga construyendo el área, superando las dificultades, atenuando las asimetrías, limando asperezas políticas porque el xxxxxx xx xx xxxxxxxxxxx, xx xx xxxxx si bien no es el más rápido, es el más pleno, perdurable”26. Concordamos com a professora e entendemos que essas dificuldades devem ser tidas como desafios a serem vencidos, pois o MERCOSUL poderá trazer ainda mais benesses, desde que unidas forças de todos os envolvidos para que tal objetivo se concretize. Porém, fazemos o seguinte questionamento: seria a
24CLASSIFICADOS MERCOSUL. O MERCOSUL e o mundo. Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx. xxx.xx/xxxxxxxx_xxxx/xxxxxxxx00.xxx. Acesso em 02/03/2013.
25ALMEIDA, P R.; O Brasil e o processo de formação dos blocos econômicos: conceito e história, com aplicação aos casos do MERCOSUL e da ALCA. In: Globalização e o comércio internacional no direito da integração. Organização de Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx e Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxx. São Paulo: Aduaneiras, 2005. p. 13.
26CÁRDENAS, S. L. F.; El Mercosur: uma mirada al futuro. Op. cit. p. 52.
celebração dos contratos entre pactuantes de países diferentes na área do MERCOSUL mais um entrave? É o que passamos a estudar.
CONTRATOS NO ÂMBITO DO MERCOSUL
Como se sabe, os contratos possuem alguns elementos que lhe são essenciais: é necessário que as partes sejam civilmente capazes de celebrarem tal compromisso, sendo elas livres para ajustarem o acordo da forma que melhor lhes convierem. Não podem, entretanto, derrogar normas de ordem pública, tampouco prejudicar terceiros. Concluindo, o contrato vincula as partes, constituindo verdadeira lei entre elas. Segundo Irineu Strenger, são contratos internacionais do comércio
“Todas as manifestações bi ou plurilaterais das partes, objetivando relações patrimoniais ou de serviços, cujos elementos sejam vinculantes de dois ou mais sistemas jurídicos extraterritoriais, pela força do domicilio, nacionalidade, sede principal dos negócios, lugar do contrato, lugar de execução, ou qualquer circunstância que exprime um liame indicativo de Direito aplicável27.”
O princípio da autonomia da vontade é o poder das partes de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica . O princípio envolve, além da liberdade de criação do contrato, a liberdade de contratar ou não contratar, de escolher o outro contraente e de fixar o conteúdo do contrato, limitado pelas normas de ordem pública, pelos bons costumes e pela revisão judicial dos contratos28. Nesse sentido, é posição do Supremo Tribunal Federal:
“A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos
27STRENGER, I.; Direito internacional privado, São Paulo: XX, 0000, p. 286.
28DINIZ, M. H.; Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, vol. III, 24˚ ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 23.
particulares, no âmbito de suas relações privadas em tema de liberdades fundamentais29.” (grifo da autora)
Em 1994, no México, países integrantes da OEA (Organização dos Estados Americanos) reuniram-se na 5ª Conferência Especializada Interamericana sobre Direito Internacional Privado (CIDIP V) convocada pela Assembleia Geral da OEA. Uma das convenções concebidas neste encontro foi a Convenção sobre o Direito Aplicável aos Contratos Internacionais. Trata-se de diploma moderno que permite a eleição pelas partes, expressa ou tácita, do direito aplicável ao contrato (art. 7o.). Caso as partes não tenham exercido a faculdade de escolha, a lei aplicável será aquela que possua vínculos mais estreitos com o contrato (art. 9o.).
A “Convenção Interamericana sobre Direito Aplicável aos Contratos Internacionais”30 deixa claro a importância de prosseguir com o desenvolvimento e codificação do direito internacional privado entre Estados membros da Organização dos Estados Americanos e a conveniência de harmonizar as soluções para as questões relacionadas com o comércio internacional. Lembra também que a interdependência econômica dos Estados tem propiciado a integração regional e continental e que, para estimular esse processo, é necessário facilitar a contratação internacional removendo as diferenças que seu contexto jurídico apresenta.
O artigo 1º estabelece que um contrato é internacional quando as partes no mesmo tiverem sua residência habitual ou estabelecimento sediado em diferentes Estados Partes ou quando o contrato tiver vinculação objetiva com mais de um Estado Parte. Segundo o artigo 7º, o contrato rege-se pelo direito escolhido pelas partes. O acordo das partes sobre esta escolha deve ser expresso ou, em caso de inexistência, de acordo expresso, depreender-se de forma evidente da conduta das partes e das cláusulas contratuais, consideradas em seu conjunto. Essa escolha poderá referir-se à totalidade do contrato ou a uma parte do mesmo. A eleição de determinado foro pelas partes não implica necessariamente a escolha do direito aplicável.
O artigo 8º garante que as partes poderão, a qualquer momento, acordar que o contrato seja total ou parcialmente submetido a um direito
29SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Trecho do acórdão do Recurso Extraordinário 201.819, do Rio de Janeiro, constante do informativo nº 405 do Supremo Tribunal Federal.
30CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBRE DIREITO APLICÁVEL AOS CONTRATOS INTERNACIONAIS. Artigos 1º, 7º, 8º, 9º.
distinto daquele pelo qual se regia anteriormente, tenha este sido ou não escolhido pelas partes. Não obstante, tal modificação não afetará a validade formal do contrato original nem os direitos de terceiros. O artigo 9º dispõe que tendo as partes escolhido o direito aplicável, ou se a escolha do mesmo resultar ineficaz, o contrato reger-se-á pelo direito do Estado com o qual mantenha os vínculos mais estreitos.
O tribunal levará em consideração todos os elementos objetivos e subjetivos que se depreendam do contrato, para determinar o direito do Estado com o qual mantém os vínculos mais estreitos. Levar-se-ão também em conta os princípios gerais do direito comercial internacional aceitos por organismos internacionais. Além disso, se uma parte do contrato for separável do restante do contrato e mantiver conexão mais estreita com outro Estado, poder-se-á aplicar a esta parte do contrato, a titulo excepcional, a lei desse outro Estado. A Convenção já está em vigor desde 1996, porém apenas para México e Venezuela. Brasil, Bolívia e Uruguai também assinaram a convenção, porém ainda não a ratificaram31.
No Brasil, o artigo 9º da Lei 9.657/42, a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, determina que “para qualificar e reger as obrigações, aplicar- se-á a lei do país em que se constituírem”. Trata-se de consagração ao princípio lex loci celebrationis, ou seja, aplica-se a lei do país onde a obrigação foi constituída. Conforme o entendimento do doutrinador Xxxx Xxxxxxxx Rodas “ao se analisar o referido artigo, não se pode dizer que no Brasil existe autonomia da vontade para se eleger a lei aplicável”32. Percebe-se assim que, em matéria de Direito Internacional Privado, o Brasil não contemplou a autonomia da vontade.
Na Argentina, o artigo 1.205 do Código Civil estabelece que “los contratos hechos fuera del territorio de la República, serán juzgados, en cuanto a su validez o nulidad, su naturaleza y obligaciones que produzcan, por las leyes del lugar en que hubiesen sido celebrados”. O artigo 1.216 determina que “si el deudor tuviere su domicilio o residencia en la República, y el contrato debiese cumplirse fuera de ella, el acreedor podrá demandarlo ante los jueces
31ANDRADE, I. P.; XXXXXXXXX, X. X.; Lei aplicável nos contratos internacionais no MERCOSUL. Revista Brasileira de Direito Internacional, Curitiba, v.2, n.2, jul./dez.2005, p. 49- 50.
32RODAS, J. G.; Elementos de conexão do direito internacional privado, relativamente às obrigações contratuais. In: Contratos Internacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 1/36.
de su xxxxxxxxx, x xxxx xxx xxx xxxxx xxx xxxxxxxxxxxx xxx xxxxxxxx, xxxxxx el deudor no se hallase allí”.
E o artigo 1.209 coloca que “los contratos celebrados en la República o fuera de ella, que deban ser ejecutados en el territorio del Estado, serán juzgados en cuanto a su validez, naturaleza y obligaciones por las leyes de la República, sean los contratantes nacionales o extranjeros”. Nesta linha, o artigo 1209 do Código argentino determina que se a execução do contrato der-se na Argentina, aplicar-se-á esta lei na sua regência33. De acordo com Xxxxxxxx, el Código Civil argentino no contiene una disposición que expresamente consagre la libertad de contratación en el orden internacional, entendida ésta como la facultad de las partes de preseleccionar la ley aplicable a los contratos internacionalesl34.
No Uruguai, a autonomia da vontade nunca foi pacificamente aceita. O doutrinador Xxxxxxx Xxxxxxx entendia que o Direito Internacional Privado deveria ter como objetivo a resolução de conflitos de soberanias, o que retiraria dos particulares a liberdade de determinar a lei e jurisdição que gostariam que vigorassem em relações contratuais internacionais35. Segundo o artigo 2.399 do Código Civil Uruguaio “los actos jurídicos se rigen, en cuanto a su existencia, naturaleza, validez y efectos, por la ley del lugar de su cumplimiento, de conformidad, por otra parte, con las reglas del interpretación contenidas en los artículos 34 a 38 inclusive del Tratado de Derecho Civil de 1889”.
Já o artigo 2.403 determina que “las reglas de competencia legislativa y judicial determinadas en este Título, no pueden ser modificadas por la voluntad de las partes. Ésta sólo podrá actuar dentro del margen que le confiera la ley competente”36. Trata-se de um artigo que limita a liberdade das partes contratantes, conforme se nota. Nos últimos anos, entretanto, o Professor Xxxxxxx Xxxxxxxx informa que “a tendência uruguaia modificou-se, graças a sua participação na Conferência de Haia em 1985. A partir desse marco, o
33ANDRADE, I. P.; XXXXXXXXX, X. X.; Op. cit. p. 43.
34CÁRDENAS, S.; L. F.; Derecho internacional privado: parte especial. Buenos Aires: Editorial Universidad, 2000, p. 358.
00XXXXXXXX, X.; Las normas de aplicación immediata em la doctrina y el em derecho positivo.
In: Revista de La Facultad del Derecho, nº 08, 1995, p. 75.
36CÓDIGO CIVIL URUGUAIO. Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxx/ codigocivil/2002/L4p2tfa.htm. Acesso em 03/02/2013.
Uruguai teria passado a se posicionar a favor do princípio da autonomia da vontade”37.
No Paraguai, o Código Civil em seu artigo 297 determina que “sin perjuicio de lo dispuesto en este Código sobre la capacidad o incapacidad de las personas, y sobre la forma de los actos, éstos serán exclusivamente regidos, sea cual fuere el lugar de su celebración, en cuanto a su formación, prueba, validez y efectos, por las leyes de la República, cuando hubieren de ser ejecutados en su territorio, o se ejercieren en él acciones por falta de su cumplimiento”. No artigo 669 lê-se que “los interesados pueden reglar libremente sus derechos mediante contratos observando las normas imperativas de la ley, y en particular, las contenidas en este título y en el relativo a los actos jurídicos”.
Por fim, temos o artigo 670 onde o legislador redifiu que “las reglas de este título serán aplicables a todos los contratos. Los innominados se regirán por las disposiciones relativas a los nominados con los que tuvieren más analogía. Xxxxxx entende que a lei paraguaia não contemplou de forma expressa a autonomia da vontade, já que o artigo 297 somente fala dos contratos a serem executados no território paraguaio, enquanto o artigo 669 somente diz respeito ao conteúdo da contratação e não à lei aplicável38.
Xxxxxx entende também que “da análise da legislação dos países membros que não há no MERCOSUL uma posição uniforme, adotada por todos os seus integrantes, no que diz respeito à determinação da lei aplicável aos contratos internacionais, em face da diversidade legislativa encontrada nos quatro países”39. E a conclusão de fato, não poderia ser outra. Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai não estão em consonância no que tangem às regras contratuais, o que dificulta as transações comerciais e o desenvolvimento do MERCOSUL.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo teve por objetivo investigar a celebração dos contratos no âmbito do MERCOSUL, sob a perspectiva do Direito de Integração. Antes de
00XXXXXX, X.; Op. cit., p. 87.
38Ibidem, p. 88.
39Ibidem, p. 90.
falar sobre integração, foi necessário investigar a redefinição da soberania. Pudemos observar que, há alguns séculos, a soberania se concentrava unicamente na figura do monarca, sendo incondicional e ilimitada. O rei teria sido escolhido por uma ordem divina e superior para exercer tal função. Foi o Contrato Social, obra-prima de Xxxxxxxx, que modificou esse panorama. Com a teoria do estudioso suíço, o poder saiu das mãos do rei e passou a ser exercido pelo povo, o que se conhece como a soberania popular.
Especialmente a partir do fenômeno da globalização, os países passaram a se unir em prol do desenvolvimento, flexibilizando a soberania do Estado. E dessas uniões nasceram os chamados blocos econômicos e o Direito de Integração. O MERCOSUL é um bloco criado no início da década de 1990, por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Trouxe alguns resultados positivos, mas ainda enfrenta inúmeros desafios para sua consolidação e bom desenvolvimento.
Buscou-se investigar se a realização de contratos no âmbito do MERCOSUL, com pactuantes de países diferentes, seria um obstáculo a ser vencido. A resposta a que se chegou é afirmativa. Os países fundadores do bloco sul-americano não possuem regras iguais no que tangem aos contratos internacionais e à autonomia da vontade, tampouco existe uma norma internacional única, seguida pelos membros do MERCOSUL. Isso faz com que não se tenha uma solução concreta para qual legislação a ser adotada.
Dessa forma, à luz do Direito de Integração entre os países, trata-se de um entrave a ser superado, em prol do desenvolvimento do comércio internacional no âmbito do MERCOSUL. Terminamos, assim, com a lição da Professora Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, que diz que “a medida que un grupo de países decide crear una zona de libre intercambio para un número determinado de productos (...), habrán de saber que están gestando la creación de uma estructura, de un espacio que además de económico, es un espacio en el que deben existir, reinar reglas legales, normas jurídicas”40.
40CÁRDENAS, Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx. El Mercosur: uma mirada al futuro. Op. cit. p. 40.
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