A reforma trabalhista sem fim e a “bolsa patrão” do Contrato Verde e Amarelo
Número 221
Fevereiro 2020
A reforma trabalhista sem fim e a “bolsa patrão” do Contrato Verde e Amarelo
A reforma trabalhista sem fim e a “bolsa patrão” do Contrato Verde e Amarelo
A Medida Provisória nº 905, de 2019, em discussão na comissão mista do Con- gresso Nacional, traz ainda mais mudanças na legislação trabalhista. A reforma, que co- meçou em 2017, com as leis nº 13.467 e nº 13.429 (da terceirização), e prosseguiu com a MP da liberdade econômica, convertida na lei nº 13.874/2019, parece nunca ter fim. Desta vez, ganhou a embalagem do Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, promessa de cam- panha do presidente Xxxx Xxxxxxxxx, que pretende criar empregos oferecendo generosa “bolsa empresário”, com desoneração da folha e redução de direitos trabalhistas.
O relator da matéria na comissão mista publicou, em 21 de fevereiro, relatório que amplia o alcance das medidas e aprofunda ainda mais a reforma trabalhista. Esta Nota avalia a MP e as propostas do relator, abordando o Contrato Verde e Amarelo, o impacto no emprego, os elevados custos da “bolsa patrão” que ele representa, bem como o con- junto de medidas que representam a continuidade da reforma trabalhista.
O Contrato de Trabalho Verde e Amarelo
A modalidade de Contrato de Trabalho Verde e Amarelo (CTVA), criada pela MP 905, é um caso específico de contrato de trabalho por prazo determinado que se des- tina à contratação de jovens de 18 a 29 anos de idade, em primeiro emprego, para ativi- dades permanentes ou temporárias da empresa. A MP considera como primeiro emprego inclusive a contratação de jovens que tenham tido vínculo anterior como aprendiz, em contrato de experiência, em contrato intermitente ou como trabalhador avulso. Nessa mo- dalidade, o salário de contratação não pode superar um e meio salário mínimo mensal (R$ 1.567,50, atualmente).
No contrato CTVA, o empregador é desonerado da contribuição para o Regime Geral de Previdência Social, do salário-educação, da contribuição para o Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Senar, Senat, Sescoop e Sebrae) e da contribuição para o Incra. Além disso, o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) cai de 8% para 2% e a multa rescisória, de 40% para 20% sobre o saldo dos depósitos no FGTS. O contrato pode ter duração de até 24 meses e o programa tem vigência até 31 de dezembro de 2022.
A MP fixa requisito mínimo e limite máximo de contratação na modalidade CTVA. Como requisito mínimo, a empresa só pode utilizar esse contrato para empregos adicionais ao número médio de empregados entre janeiro e outubro de 2019 ou se o nú- mero de empregados, em outubro de 2019, tiver sido 30% inferior ao existente no mesmo mês de 2018. Como limite máximo, a empresa pode contratar até 20% do total de empre- gados na folha de pagamento no mesmo mês. Esse máximo pode ser maior – em tese até 100% – no caso de empresas com até 10 empregados, pois elas são autorizadas a contratar dois trabalhadores na modalidade CTVA.
A modalidade CTVA, além da desoneração, dá ao empregador outras vantagens, como a supressão da indenização pelo encerramento antecipado do contrato1. Também permite, mediante acordo individual com o empregado, diluir no pagamento mensal o 13º salário e a gratificação de férias de um terço, o que pode favorecer o rebaixamento dos salários no momento da contratação2. Por fim, o adicional de periculosidade, que é de 30%, é reduzido para 5%, caso haja acordo individual que autorize a substituição desse adicional por um seguro contratado com companhia seguradora privada, o que pode sig- nificar redução de custos com diminuição da cobertura. O adicional passa a ser devido apenas se a exposição ao risco atingir 50% da duração da jornada. Hoje, essa exigência não existe.
O relator da MP na comissão mista do Congresso ampliou significativamente o alcance do CTVA de várias maneiras, com efeitos fiscais aparentemente não projetados. A proposta do relator estende a permissão para este tipo de contratação de pes-
soas com 55 anos ou mais de idade que não tenham tido vínculo formal de emprego há mais de 12 meses. Em outra mudança, propõe ampliação da elegibilidade de jovens para o CTVA, pois exclui do conceito de primeiro emprego o vínculo formal de emprego an- terior com até 180 dias de duração (artigo 1º da MP). Ou seja, foram incluídos no público- alvo os desempregados com idade acima de 54 anos e uma substancial fração adicional de jovens.
O relator acrescentou também o segmento rural do mercado de trabalho, pois autoriza a contratação do trabalhador do campo nessa modalidade, exceto no contrato de
1 Nos contratos por prazo determinado, o encerramento antecipado do vínculo sem justa causa pelo empregador enseja o pagamento de verba indenizatória ao trabalhador em valor igual à metade da soma da remuneração que ele teria direito a receber até o termino do contrato.
2 A diluição do 13º e da gratificação de férias permite aos empregadores contratar empregados por salários menores do que os pagos pelo mercado sem que isso seja percebido.
safra (parágrafo único do artigo 17). Ademais, eleva de 20% para 25% o percentual má- ximo de empregados que a empresa pode contratar na modalidade CTVA (§ 1º do artigo 2º). Permite também que haja mais de uma contratação consecutiva na modalidade CTVA quando o contrato anterior não tiver ultrapassado seis meses de duração (§ 4º do artigo 2º).
Outra mudança proposta pelo relator e que merece destaque diz respeito à prio- ridade aos empregados Verdes e Xxxxxxxx nas ações de qualificação profissional, prome- tida pela MP. O relator fixou prazo de 90 dias para que o Ministério da Economia publique regulamento definindo como se dará essa prioridade. Porém, o tempo que o trabalhador dedicar às atividades de qualificação não será computado na jornada de trabalho, muito menos remunerado, o que tende a tornar inócua tal prioridade. O relator aproveitou para aliviar a perda de arrecadação do Sistema S com a desoneração da folha, ao permitir que as contribuições sejam mantidas se as instituições oferecerem gratuitamente qualificação profissional aos contratados pelo CTVA.
Não menos importante foi a mudança realizada no artigo que permite a troca do adicional de periculosidade por um seguro privado. O novo texto da MP deixa explícito que a redução será aplicada somente para os CTVAs, o que não estava claro na redação original. A esse ponto, cabe comentar que o programa estará subsidiando o emprego de milhares de jovens em atividades perigosas sem que esses tenham qualquer experiência anterior de trabalho, menos ainda sob condições de risco.
O relator manteve diversos itens do texto original, como prazo e duração do pro- grama, pagamento mensal do 13º salário e da gratificação de férias, desoneração da con- tribuição previdenciária patronal e redução do depósito do FGTS, isenção da indenização pelo encerramento antecipado do contrato, elegibilidade do trabalhador ao seguro-desem- prego etc.
Quanto à jornada de trabalho no CTVA, mediante acordo individual, pode-se trabalhar duas horas extras diariamente, que serão pagas com acréscimo de 50%; a com- pensação de horas extras no mesmo mês requer acordo individual que pode ser tácito ou seja, não formalizado, enquanto banco de horas com compensação em seis meses exige acordo individual por escrito. Vale dizer a MP não garante, na rescisão do contrato, pa- gamento das horas não compensadas com o acréscimo de 50%.
Cabe destacar que o relator manteve a prevalência das regras do CTVA sobre convenções e acordos coletivos de trabalho, em gritante contradição com o espírito do
“negociado sobre o legislado” defendido ardorosamente pelos apoiadores da reforma tra- balhista. Ou seja, os sindicatos não poderão estabelecer cláusulas visando garantir, por exemplo, igualdade no depósito de FGTS e na jornada de trabalho ou mesmo de indeni- zação em caso de encerramento antecipado dos contratos.
Os impactos do CTVA na geração de empregos
A justificativa utilizada para a criação do CTVA é a necessidade de combater as altas taxas de desemprego no segmento da população alvo. Nesta seção, serão apresenta- das as estimativas de geração de empregos que o governo espera obter com o CTVA.
De fato, a taxa de desemprego (ou desocupação, como adotado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE) é substancialmente mais alta entre os jovens do que na população com mais de 30 anos de idade. No terceiro trimestre de 2019, a taxa de desemprego era de 20,8% para jovens de 18 a 29 anos e de menos de 8% para quem tinha 30 anos de idade ou mais (Tabela 1). Essa diferença não é conjuntural e sim uma realidade estrutural do mercado de trabalho, não apenas no Brasil.
Outro dado que revela a condição do jovem é a alta taxa de participação, em razão do ingresso no mercado de trabalho se dar nesta faixa etária. Ao lado dessa oferta abundante, é sabido que o jovem demora a obter um emprego, estabelece vínculos mais curtos e experimenta sucessivos episódios de desemprego até se estabelecer numa ocupa- ção de maior duração. O mesmo não se dá entre adultos, que têm inserções mais estáveis (ainda que enfrentando a precariedade crescente no momento atual). Na crise atual do mercado de trabalho, muitos adultos buscam como alternativa ao desemprego a ocupação por conta própria. Este tipo de inserção ocupacional apresenta obstáculos para os jovens, que carecem de experiência, habilidades e recursos materiais e cognitivos, o que ajuda a explicar a mais alta taxa de desemprego.
TABELA 1
Desocupação, taxa de participação e taxa de desocupação por faixa etária – PnadC 3º trimestre de 2019
FAIXA ETÁRIA | Desocupados (mil) | % do total | Taxa de participação (%) | Taxa de desocupação (%) |
Total | 12.766 | 100,0 | 62,1 | 12,0 |
14 a 17 anos | 1.064 | 8,3 | 20,0 | 42,2 |
18 a 29 anos | 5.786 | 45,3 | 74,4 | 20,8 |
30 anos ou mais | 5.916 | 46,3 | 62,7 | 7,8 |
Fonte: IBGE-PnadC
Embora seja grande o número de jovens disponíveis no mercado de trabalho, especialmente num país que está em plena transição demográfica, a justificativa para a criação do CTVA aponta para a demanda por trabalho. Pretende-se atacar uma suposta debilidade na demanda por esses trabalhadores por meio de incentivo tributário (a deso- neração) para que os empregadores decidam contratar jovens. Entretanto, os dados do emprego formal fornecidos pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Ca- ged) não sugerem estar havendo problemas com a demanda por esse tipo de trabalhador. Afinal, em 2019, o saldo entre admissões e desligamentos em contratos celetistas só foi positivo em 644 mil postos de trabalho gerados porque a contratação de jovens superou as demissões em mais de um milhão de vagas formais (Tabela 2). Ou seja, o que sustentou o emprego formal foi justamente a demanda por trabalhadores jovens. Enquanto isso, os trabalhadores adultos perderam postos de trabalho.
TABELA 2
Emprego celetista - Saldo entre admissões e desligamentos no Caged - 2019
FAIXA ETÁRIA | EMPREGOS GERADOS |
ATÉ 17 ANOS | 179.975 |
18 A 29 ANOS | 1.007.983 |
30 A 39 ANOS | -65.694 |
40 A 49 ANOS | -109.537 |
50 A 64 ANOS | -301.741 |
65 ANOS OU + | -66.907 |
TOTAL | 644.079 |
Fonte: Ministério da Economia. Caged Elaboração: DIEESE
O foco do CTVA no primeiro emprego também é questionável, pois já é volu- mosa a contratação de jovens nessa condição. Novamente, usando o Caged como refe- rência, o número de contratações celetistas em primeiro emprego foi, em 2019, de 1,38
milhão, com os jovens representando 1,1 milhão, ou 84% do total. Assim, não parece fraca a demanda por jovens que ingressam no mercado de trabalho. E isso pode ser ob- servado no dia a dia, com jovens aparecendo em obras da construção civil, balcões de lojas, em lanchonetes, shopping centers, empresas de limpeza e atividades terceirizadas de todos os tipos.
Por isso, pode se esperar que centenas de milhares de jovens em primeiro em- prego seriam contratados mesmo que não houvesse incentivo aos empregadores. Porém, com a desoneração da folha, esse contingente será contratado nos termos do CTVA, acar- retando ônus fiscal para o Estado e deteriorando ainda mais o mercado de trabalho, ao rebaixar salários e demais direitos. É provável que o efeito deadweight ou arrasto – sub- sidiar contratos que seriam firmados independentemente do programa – será bastante grande e a eficiência da política, reduzida.
Dada a fraca demanda agregada e a ausência de outros fatores que estimulem o crescimento econômico, o potencial de geração de empregos adicionais para jovens tende a ser pequeno. A própria Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Eco- nomia estima que os empregos adicionais ficarão em 256 mil ao longo dos cinco anos em que o programa terá efeito (3 anos de vigência mais 24 meses de duração máxima dos contratos), o que representa parcela diminuta em relação ao total de empregos gerados para essa faixa etária.
Outro efeito que diminui o potencial de geração de empregos do CTVA é o de substituição de trabalhadores adultos por jovens. Embora as regras da MP condicionem a contratação de empregados acima da média de 2018, é provável que as empresas preferi- rão aumentar o quadro de pessoal com jovens em detrimento de trabalhadores adultos. Isso porque continuará vantajosa para a empresa a contratação de um jovem com pouco ou nenhuma experiência, portanto menos produtivo do que o adulto ou experiente, se o diferencial de produtividade entre esses trabalhadores for menor do que a redução de 25% no custo da folha de salários.
Assim, considerando as projeções de evolução do emprego formal celetista, os parâmetros macroeconômicos oficiais e os efeitos estimados em programas de subsídios ao emprego de jovens encontrados na literatura internacional, a SPE estimou o impacto do CTVA no emprego formal. A Tabela 3 mostra as projeções para o total de trabalhado- res jovens que serão contratados na modalidade CTVA, a parcela desses contratos que
seriam firmados independentemente da criação dessa modalidade e o número que repre- senta o efeito do Contrato de Trabalho Verde e Amarelo na geração de novos empregos para jovens. Os números mostram que, do estoque de quase 1,8 milhão de CTVA, em cinco anos, apenas 271 mil admissões terão sido motivadas pelas regras dos Contratos Verde e Amarelo. Ou seja, de cada 100 contratos que serão desonerados, apenas 15 terão sido criados por esse subsídio.
TABELA 3
Projeção das admissões e do estoque de trabalhadores na modalidade Verde e Amarelo
– 2020 a 2024 – jovens de 18 a 29 anos de idade – 2020 a 2024
Admissões | Estoque | |||||
Participant | Participant es adicionais devido ao Programa | Participant | Participant es adicionais devido ao Programa | |||
Total de | es que | Total de | es que | |||
Ano | participant | teriam sido | participant | teriam sido | ||
es no | contratado | es no | contratado | |||
Programa | s sem o | Programa | s sem o | |||
Programa | Programa | |||||
2020 | 540.273 | 457.179 | 83.094 | 336.557 | 284.854 | 51.703 |
2021 | 592.556 | 502.648 | 89.908 | 531.899 | 450.935 | 80.965 |
2022 | 654.927 | 556.898 | 98.029 | 600.136 | 509.999 | 90.138 |
2023 | - | - | - | 209.391 | 178.055 | 31.336 |
2024 | - | - | - | 14.313 | 12.184 | 2.129 |
Total | 1.787.756 | 1.516.725 | 271.031 | 1.692.296 | 1.436.027 | 256.271 |
Fonte: Nota Técnica SPF/GABIN/SPE/FAZENDA-ME (4960107) SEI 19964.106535/2019-41 / p. 142
A SPE também estimou o impacto do CTVA no emprego de pessoas com 55 anos ou mais3: estoque total de aproximadamente 920 mil empregos, com 245 mil novas ocupações resultantes da política, ao longo de cinco anos. Entretanto, essas projeções foram elaboradas sem considerar as condições propostas pelo relator da MP na comissão mista, notadamente a exigência de período prévio de desemprego de 12 meses.
O que se pode concluir dessa seção é que o desemprego de jovens e adultos “grisalhos” é problema grave. Porém, no caso dos jovens, ao menos, não está suficiente- mente claro que a causa do desemprego está ligada a uma particular deficiência na de- manda, que, na verdade, afeta a todos os segmentos populacionais. Ao contrário, a de- manda por trabalho de jovens é alta e isso tende a enfraquecer a potencialidade do pro- grama, tornando-o extremamente caro e pouco eficiente, como será examinado na pró- xima seção.
3 Ver: Nota Técnica SPF/GABIN/SPE/FAZENDA-ME (4896825). SEI 19964.106535/2019-41. p.
54
A “bolsa patrão” na desoneração da folha do CTVA
No CTVA, o governo recorre à conhecida fórmula de desoneração da folha de pagamentos. Os encargos sociais que incidem sobre a folha são praticamente zerados e mesmo o FGTS, que faz parte da remuneração do trabalhador, é diminuído. E embora a MP tenha imposto a contribuição previdenciária ao beneficiário do seguro-desemprego como medida compensatória, essa fonte não deveria ser considerada substituta da deso- neração da folha, já que cria compromisso de despesas com benefícios futuros para o segurado. Ou seja, a falta de adequada compensação pela perda de arrecadação faz com que o CTVA resulte em renúncia fiscal expressiva, que onerará principalmente a Previ- dência Social.
A Tabela 4 mostra que as contribuições arrecadadas na modalidade CTVA em uma contratação com salário mensal de R$ 1.200,00 mensais4 são de R$ 424,00 a menos do que num contrato padrão CLT5 (Consolidação das Leis do Trabalho). Em 12 meses, a perda de arrecadação para a Previdência Social é de R$ 3,2 mil; para o empregado, de quase R$ 1.000,00; e no total, considerando todos os encargos, de quase R$ 5.100,00.
TABELA 4
Estimativa da desoneração da folha no CTVA para salário mensal de R$ 1.200,00 – R$
REMUNERAÇÃO DIFERIDA E ENCARGOS | VALORES MENSAIS | DIFERENÇA EM 12 MESES | ||
CLT | CTVA | DIFERENÇA | ||
FGTS | 106,67 | 26,67 | -80,00 | -959,99 |
INSS | 266,66 | 0,00 | -266,66 | -3.199,97 |
Salário educação | 33,33 | 0,00 | -33,33 | -400,00 |
Incra | 2,67 | 0,00 | -2,67 | -32,00 |
Sistema S | 33,33 | 0,00 | -33,33 | -400,00 |
Sebrae | 8,00 | 0,00 | -8,00 | -96,00 |
TOTAL | 450,66 | 26,67 | -424,00 | -5.087,95 |
Elaboração: DIEESE
A renúncia fiscal para o programa foi estimada pela Secretaria da Receita Fede- ral (RFB), com base nas projeções de número de contratos realizadas pela SPE, em R$ 10,6 bilhões, ao longo de cinco anos (Tabela 5). Cada emprego Verde e Amarelo
4 Valor médio adotado nas projeções realizadas pelo Ministério da Economia.
5 Em empresa não optante pelo Simples Nacional e que não tenha a folha desonerada por outra legislação.
criado custará R$ 1.630,76 por mês (quase R$ 20 mil por ano)6, o que ultrapassa o valor máximo da remuneração autorizado pela MP. Esse dado deveria levar à rejeição do pro- grama, pelo alto custo e baixa eficiência. Vale frisar que a maior parte do custo, R$ 9.740 bilhões, sairá do orçamento da União, entre previdência e salário educação, deixando o Sistema S com perda de R$ 866 milhões.
TABELA 5
Estimativa de renúncia fiscal do Contrato Verde e Amarelo – R$ milhões
ANO | CONT. PREVID. | SALÁRIO EDUCA- ÇÃO | OUTRAS | TOTAL |
2020 | 936 | 117 | 94 | 1.147 |
2021 | 2.202 | 275 | 220 | 2.698 |
2022 | 2.956 | 370 | 296 | 3.621 |
2023 | 2.020 | 253 | 202 | 2.475 |
2024 | 543 | 68 | 54 | 665 |
TOTAL | 8.658 | 1.082 | 866 | 10.606 |
Fonte: Secretaria da Receita Federal/Ministério da Economia
A Instituição Fiscal Independente (IFI, 2019) estima que o custo do programa será um pouco maior, de R$ 11,3 bilhões. A IFI não apresenta o custo do CTVA por emprego gerado, mencionando apenas que utiliza a projeção de 1,8 milhão de contratos a serem firmados nessa modalidade.
Não foram disponibilizadas estimativas para a renúncia fiscal com a ampliação do número de jovens elegíveis para o programa (o critério de primeiro emprego) e a in- clusão de adultos de 55 anos ou mais e do trabalho rural no CTVA, itens propostos pelo relator. Estudos preliminares do Ministério da Economia elaborados na preparação da MP, quando se discutia a inserção dos adultos no programa, apresentam custos adicionais de R$ 5 bilhões, confrontando notas da SPE, ou de R$ 9,6 bilhões, segundo a Secretaria da Receita Federal (SRF). Mas estas estimativas não contemplam as condições de elegi- bilidade propostas pelo relator.
Vale lembrar que as desonerações de contribuições previdenciárias previstas no Projeto de Lei Orçamentária Anual – PLOA 2020 - já alcançam R$ 69 bilhões, represen- tando 0,91% do PIB previsto para o ano. O Simples Nacional, a desoneração pela Lei 12.546/2011, a isenção das entidades filantrópicas e das exportações agrícolas represen-
6 SRF/Ministério da Economia. NOTA TÉCNICA CETAD/COEST Nº 203, DE 11 DE NOVEMBRO DE 2019.
tam a maior parte dessas renúncias. Nota-se o abandono do discurso de que as desonera- ções falharam no intuito de promover crescimento e emprego, que levaram a uma crise fiscal grave, e que a redução do gasto tributário era uma das medidas do propalado ajuste fiscal. Tudo isso é esquecido quando se trata de oferecer uma gorda fatia do orçamento, de R$ 11 bilhões, aos empresários.
A literatura sobre impactos e custos da desoneração da folha
A aposta na desoneração da folha como forma de gerar empregos não encontra respaldo claro na literatura especializada. No caso brasileiro, quase todos os estudos em- píricos que avaliaram retrospectivamente a desoneração da folha, prevista na Lei 12.546/2011, concluíram que os efeitos da medida foram pequenos ou mesmo nulos no emprego e nos salários (FGV, 2013; DALLAVA, 2012; XXXXXXXX et al., 2018). Estu- dos prospectivos utilizando modelos que simulam efeitos de longo prazo da desoneração na economia concluem que o resultado é pequeno tanto no emprego quanto no produto, e ocorrem principalmente quando a desoneração representa redução da arrecadação (FGV PROJETOS, 2013; XXXXX, XXXX e XXXXXX, 2015; FREITAS, 2015; XXXXX, CAR- DOSO e XXXXXXXXX, 2016).
Os estudos sobre políticas de desoneração da folha em outros países também não apresentam conclusão otimista sobre os efeitos no emprego. O estudo mais notório é o de Gruber (1997), sobre a privatização da previdência social no Chile, ação que eliminou quase totalmente as contribuições patronais sobre a folha. Xxxxxx concluiu que a medida não teve resultado algum sobre o emprego. Outros trabalhos foram realizados em países desenvolvidos (BRITAIN, 1971, HAMERMESH, 1979; MELLANDER, BENNMAR-
KER e XXXXXX, 2009) e em desenvolvimento (XXXXXX e KUGLER, 2008; CRUCES, XXXXXXX e KIDYBA, 2010) e chegaram a resultados muito parecidos ou que mostram que efeitos positivos sobre o emprego foram pequenos.
Em relação ao subsídio tributário para o emprego de jovens, é importante desta- car o caso da Suécia que, em 2007, reduziu as contribuições sobre a folha em 11 pontos percentuais e, em 2009, em mais 5 pontos, na contratação de pessoas com 19 a 26 anos de idade. Os estudos que avaliaram essa política constataram que a medida aumentou de 2 a 3% o emprego de jovens, mas o efeito no emprego total foi menor ou nulo (EGE-
XXXX e XXXXXXX, 2014; XXXX, XXXXXXXX e SEIM, 2019). Outro trabalho, de Sken-
diger (2014), concluiu que não houve impacto significativo no emprego de jovens no comércio varejista, segmento no qual se esperava que esse tipo de política surtisse mais efeito. Entretanto, todos os estudos parecem concordar que esse programa teve custos bastante elevados. Para Egebark e Xxxxxxx (2014), o programa teve um custo quatro vezes maior do que o normal para a contratação de jovens, enquanto Xxxxxxxxx (2014) afirma que a desoneração da folha é um método caro de promover o emprego para a juventude. Assim, em 2015, a Suécia abandonou o programa.
A contribuição previdenciária dos beneficiários do seguro- desemprego
Para financiar a desoneração da folha dos contratos Verdes e Amarelos, o go- verno incluiu na MP a cobrança de contribuição previdenciária sobre os benefícios de seguro-desemprego, dando direito à contagem do tempo para efeitos de concessão de be- nefícios previdenciários. Com isso, o governo pretendia arrecadar R$ 6,6 bilhões nos três primeiros anos do programa a fim de compensar parcialmente os R$ 6,8 bilhões de im- pacto negativo no orçamento. No primeiro ano do programa, essa fonte nova de arreca- dação superaria os gastos com a desoneração da folha de contribuições previdenciárias e do salário-educação.
Porém, como dito anteriormente, a contribuição do beneficiário do seguro-de- semprego representa despesas com benefícios previdenciários cujo efeito atuarial não é mencionado na justificativa do governo. Embora a previdência social seja gerida em re- gime de repartição, o princípio norteador das políticas é que ela seja equilibrada atuarial- mente.
Não obstante, o relator alterou esse ponto (artigo 42 da MP), afetando o precário equilíbrio proposto pelo governo. Reduziu a potencialidade de arrecadação ao propor que a contribuição seja opcional para o trabalhador, que deverá escolher contribuir ou não no momento da contratação ou em 90 dias da aprovação da MP. Além disso, diminui a alí- quota de contribuição de 7,5% para 5%. Obviamente, isso reduz o financiamento da de- soneração do CTVA e prejudica ainda mais as contas do Regime Geral de Previdência Social.
Deve-se questionar, sobretudo, a justiça de se financiar uma desoneração da fo- lha que transfere R$ 11 bilhões (ou mais) para os empresários, esperando pouco ou ne- nhum efeito no emprego, mediante tributo a ser pago pelo trabalhador desempregado e pelos segurados da previdência social. Comparando com outras políticas de desoneração, além de não haver uma clara compensação por outra fonte de recursos, a fórmula encon- trada é precária e injusta socialmente.
A Reforma Trabalhista 2.0
Além do CTVA, a MP (artigo 27) modifica inúmeros dispositivos da CLT, com supressões, modificações e inclusões no que pode ser chamada de segunda (ou terceira) rodada da reforma trabalhista. Nesse sentido, o relator não apenas confirmou como acres- centou algumas peças a mais na montagem dessa reforma. Várias medidas têm grande impacto nas condições de vida dos trabalhadores e nas relações de trabalho, como é o caso do trabalho aos domingos e feriados. Mas o governo utilizou um instrumento legis- lativo que impõe ritmo acelerado de tramitação, não garante debate aprofundado ou con- sidera os múltiplos impactos das medidas. Os pontos principais são apontados a seguir.
Negociado sobre jurisprudência – A reforma trabalhista, como se sabe, adotou o princípio da prevalência do negociado sobre o legislado como norteador das relações de trabalho7. O parecer do relator sugere um aprofundamento desse princípio, alterando o artigo 8º da CLT de modo que convenções e acordos prevaleçam também sobre súmulas e enunciados de jurisprudência dos Tribunais do Trabalho. Ou seja, o princípio do nego- ciado sobre o legislado é colocado acima da própria interpretação das leis trabalhistas e da Justiça do Trabalho.
Registro profissional – A MP extinguiu a exigência de registro no Ministério da Economia de uma série de categorias profissionais para o exercício da profissão. Em relação a esse ponto, o relator mantém os registros profissionais previstos em lei, mas delega a tarefa aos conselhos profissionais, sindicatos laborais e só excepcionalmente ao Ministério da Economia (artigo 12-B). Porém, reforça no texto que a ausência de registro não impede o exercício da profissão.
7 Ainda que, de forma contraditória, isso não valha para as condições de financiamento dos sin- dicatos de trabalhadores.
Motoboy – O relator incluiu uma mudança no §4º do artigo 193 da CLT para especificar que as atividades de mototaxista, motoboy, moto frete e serviço comunitário de rua que utilizem motocicletas também são atividades perigosas e, por isso, fazem jus ao adicional de periculosidade.
Correção de créditos trabalhistas – A MP alterou o §7º do artigo 879, mu- dando o índice de correção dos valores dos créditos trabalhistas entre a condenação e o cumprimento da sentença, da TR para o IPCA-E. O relator acrescentou a esse índice os juros adicionais aplicados às cadernetas de poupança.
Correção e juros em débitos em ações trabalhistas – O critério é alterado na MP, passando a corresponder ao índice de correção da caderneta de poupança. A legisla- ção atual fala em TR mais juros de 1% ao mês. O relator altera o texto da MP (no artigo 49) para que haja correção pelos juros adicionais da caderneta de poupança. Apenas no caso de débitos constantes de sentença ou acordo judicial na Justiça do Trabalho é que haverá juros de mora com base na correção, mais juros da poupança.
Multas e inspeção do trabalho – Na questão das multas e da inspeção do tra- balho, a MP traz um conjunto bastante grande de dispositivos, que foram mantidos pelo relator com alterações pontuais:
• parágrafo no artigo 29 da CLT determinando a lavratura de auto de infração e anotação em sistema eletrônico, quando não houver registro em carteira de tra- balho, com multa per capita;
• parágrafo no artigo 30 dizendo que o juiz do trabalho vai comunicar a autoridade para a anotação em carteira e aplicação de multa, bem como parágrafo determi- nando que o Ministério da Economia crie sistema eletrônico para que a Justiça faça as anotações diretamente;
• artigo 47, consolidação da multa para casos de emprego sem registro em carteira e exceção ao critério de dupla visita orientadora;
• artigo 47-B, regra que presume mínimo de três meses de relação de emprego quando a inspeção encontrar empregado não registrado.
Embargo e interdição – No que tange ao embargo de obra ou interdição de atividade, estabelecimento, máquina, equipamento etc., o relator suprimiu o §2º do artigo 161 da CLT que permitia ao sindicato requerer tal ação do Superintendente Regional do Trabalho. Pela nova redação, a autoridade regional máxima da inspeção só poderá tomar tal atitude se houver um relatório de agente de inspeção.
Dupla visita – A dupla visita passa a ser obrigatória (artigo 627) nos primeiros 180 dias de vigência de novas leis, regulamentos ou instruções normativas; nos primeiros 180 dias de funcionamento de novos estabelecimentos; na fiscalização de micro e peque- nas empresas, pequenas cooperativas e estabelecimentos com até 20 trabalhadores (sem prazo); em caso de infrações leves; e em visitas de instrução previamente agendadas. Para que seja possível autuar uma infração, a segunda visita só poderá ser feita após 90 dias da primeira, e o critério de dupla visita se refere a cada item inspecionado. Caso essas condições não sejam cumpridas, o auto infracional será nulo (§4º). Entre as exceções à dupla visita (§2º), a MP listava itens como não registro em carteira, atraso de salário e de FGTS, fraude, entre outros. O relator incluiu nessa lista o descumprimento de interdição ou embargo e especificou que, em acidente de trabalho fatal (e não qualquer acidente), deve haver apuração por procedimento fiscal e a autuação se limitará às irregularidades diretamente relacionadas com as causas do acidente.
Termos de Ajustes de Condutas (TACs) – O relator preservou as mudanças que a MP faz no artigo 627-A da CLT, que trata dos termos de compromisso firmados em ações de orientação da fiscalização do trabalho, bem como os termos de ajuste de conduta em matéria trabalhista. A MP fixa prazo de validade de dois anos para esses termos, que pode ser renovável com base em relatório técnico. Também estipula que as penalidades serão relacionadas aos valores de multa definidos pela MP e proíbe que sejam firmadas em duplicidade.
Fiscalização preventiva – O relator também manteve a inclusão do artigo 627- B na CLT, que trata de projetos especiais de fiscalização setorial para prevenção de aci- dentes de trabalho, doenças ocupacionais e irregularidades trabalhistas. Nessas ações, se for constatada irregularidade, não poderão ser emitidos autos de infração, muito embora as ações sejam motivadas por “irregularidades reiteradas ou elevados níveis de acidenta- lidade ou adoecimentos ocupacionais em determinado setor econômico ou região geográ- fica” (§1º). Isso dá margem à perda de efetividade na fiscalização mesmo em situações de conhecida incidência de acidentes e/ou contumaz violação de direitos.
Domicílio eletrônico – A MP no artigo 628-A da CLT cria o Domicílio Eletrô- xxxx Xxxxxxxxxxx, para a comunicação e troca de documentos entre o empregador e a au- toridade trabalhista, dispensando publicações no Diário Oficial e troca de correspondên- cia postal.
Valoração das multas trabalhistas – A valoração das multas fixadas em diver- sas leis trabalhistas foi consolidada no artigo 634-A da CLT, que especifica valores para infrações sujeitas a multas variáveis conforme o porte econômico do infrator ou de acordo com o número de empregados. As multas serão classificadas como leves, médias, graves e gravíssimas, por um regimento a ser publicado pelo Ministério da Economia. O relator não alterou esse ponto da MP, mas incluiu as cooperativas nas hipóteses em que o valor das multas é reduzido pela metade, junto a empresas de micro e pequeno porte, empresas com até 20 empregados e empregadores domésticos. Por outro lado, no artigo 29 da MP, introduziu um dispositivo pelo qual a multa por atraso de salário deverá ser classificada também conforme o tempo de atraso. Os valores das multas fixados na CLT passam a ser corrigidos pela inflação em bases trimestrais. Ou seja, além da discricionariedade conce- dida ao Ministério da Economia para a classificação das multas, o relator atenuou a san- ção a empresas pequenas e cooperativas.
Carf trabalhista – Foi criada uma instância administrativa para o recurso contra multas trabalhistas, que terá composição tripartite com representantes de trabalhadores, empregadores e auditores fiscais do trabalho (artigo 635). O prazo para o recurso aumen- tou de 10 para 30 dias, a multa passa a ser devolvida e a autuação será suspensa durante o recurso. Se não houver recurso, a multa será reduzida em 30%, ou 50%, em caso de micro e pequena empresa, empresa com até 20 empregados e cooperativas com receita bruta até o limite da micro e pequena empresa.
Trabalho aos domingos e feriados – A ampla possibilidade de trabalho aos domingos foi ainda mais alargada pelo relator. Seguindo o texto original, pelo artigo 67 da CLT, o domingo deixa de ser o dia do descanso semanal remunerado - DSR (regra geral que admitia exceções segundo conveniência pública ou necessidade imperiosa) para ser apenas o dia preferencial do descanso. A lei 605/1949 é alterada no mesmo sentido. Assim, suprime-se a necessidade de autorização prévia para trabalho aos domingos e fe- riados, conforme nova redação do artigo 68 da CLT. A coincidência entre DSR e domingo passa a ser garantida uma vez a cada quatro semanas para o comércio e serviços e uma vez a cada sete semanas para a indústria e os demais setores. O relator na comissão mista estendeu a regra da indústria a toda a cadeia produtiva, o que significa que, também em empresas de serviços, o descanso no domingo só precisará ocorrer a cada sete semanas
(§2º do artigo 68). Para o trabalhador, além da perda do domingo como dia de socializa- ção, haverá um efeito redutor na remuneração, pois será eliminado o pagamento de ho- norários em dobro nos domingos trabalhados.
Jornada dos bancários – No artigo 224 da CLT, o relator modifica a proposta original da MP, embora preserve aquilo que ela tem de essencial, que é o aumento da jornada dos bancários e a permissão do funcionamento das agências aos sábados. Na MP original, a jornada dos bancários deixa de ser de seis horas diárias ou 30 semanais e passa a ser de 8 horas diárias, sendo extraordinárias as horas que ultrapassarem esse limite diá- rio (§3º do artigo 224). O tempo de trabalho é mantido em seis horas apenas para os caixas bancários, mas, mesmo para eles, acordos individuais ou coletivos podem ampliar a jor- nada sem estabelecer limite máximo. O relator mudou o texto do artigo 225 da CLT, fixando o limite máximo de jornada em 8 horas diárias e 40 semanais, aplicável apenas aos caixas e não a todos os bancários, como é hoje. Por outro lado, aumentou de 30% para 40% o percentual de gratificação para os demais bancários, como remuneração das séti- mas e oitavas horas de trabalho, para que a estes não se apliquem a jornada de seis horas diárias (§2º do artigo 224). Por fim, incluiu novo parágrafo 226-B na CLT para autorizar o trabalho aos sábados, domingos e feriados, em caráter permanente, a uma ampla gama de atividades bancárias ou relacionadas aos bancos, como automação, telemarketing etc.
Remuneração – O texto da MP altera a redação do §5º do artigo 457 da CLT para deixar claro que alimentação fornecida pelo empregador não tem natureza salarial nem sofre incidência de tributos sobre a folha ou sobre a renda. A mesma mudança é reforçada com mudança de redação no artigo 458, excluindo a alimentação da definição de remuneração. O relator manteve esses dispositivos.
Xxxxxxxx – O relator manteve o texto da MP para o artigo 457-A da CLT, que trata das gorjetas e introduz os dispositivos da Lei das Gorjetas. O texto deixa explicito que a gorjeta é remuneração do trabalhador e o rateio é definido em acordo ou convenção coletiva de trabalho. O texto também trata do lançamento em nota fiscal, da retenção dos encargos sociais e trabalhistas, anotação na CTPS, incorporação ao salário mensal, entre outros.
Participação nos Lucros ou Resultados – O relator não acatou o texto da MP que suprimia a obrigatoriedade da participação do sindicato na comissão que negocia a PLR (artigo 50 da MP). Entretanto, propõe que o Sindicato tenha prazo máximo de sete
xxxx para indicar representante sindical na comissão, que, a partir de então, poderá iniciar o processo negocial da PLR.
Prêmios – Na lei da PLR, a MP regulamenta as condições para pagamento de prêmios, sem incidência de encargos e tributos, desde que vinculados a desempenho e em no máximo quatro vezes por ano e uma vez por trimestre.
Certificação de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) – Alterou a re- dação da MP original nas revisões do artigo 167 da CLT, que dispõe sobre a certificação dos equipamentos de proteção individuais e normas para inspeção de caldeiras e vasos de pressão.
Acidente de trajeto – O relator alterou o texto da MP para que acidente no tra- jeto casa-trabalho (ou vice-versa), em veículo do empregador, quando há dolo ou culpa deste ou dos prepostos, continue sendo acidente de trabalho. A MP tinha suprimido essa condição.
Outras questões
A MP 905 trata, ainda, de muitos outros dispositivos legais. Alguns deles estão comentados a seguir.
Contribuição adicional em demissões sem justa causa – O relator suprimiu da MP o artigo 25 (da redação original), que previa a extinção da contribuição de 10% sobre o saldo do FGTS em caso de demissão sem justa causa. A contribuição já havia sido eliminada pela MP da Liberdade Econômica.
Programa Especial – O relator manteve o Programa Especial que concede bo- nificação para análise de revisão de benefícios administrados pelo INSS.
Pagamento dos benefícios do seguro-desemprego e do abono salarial – Na MP original, esses pagamentos deixam de ser centralizados na Caixa Econômica Federal e poderão ser feitos por bancos privados.
Parcela do proprietário da terra nas parcerias rurais – O relator sugere mu- danças no Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964) para, entre outras coisas, flexibilizar os percentuais máximos de participação do proprietário da terra nos resultados da parceria agrícola, que passariam a ser convencionados livremente entre as partes (parceiro e pro- prietário). Também permite que o proprietário desconte do parceiro agrícola, além do
custo de fertilizantes e inseticidas, hoje já previsto em lei, o gasto com sementes, trans- porte, assistência técnica, equipamentos de proteção e combustível.
Programa de Habilitação e Reabilitação Física e Profissional, Prevenção e Redução de Acidentes de Trabalho – O relator manteve o Programa (artigo 19), bem como a atribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pelas ações a serem executadas. A MP (artigo 21) vincula a este programa as receitas originadas de multas por descumprimento de acordo judicial, termo de ajustamento de conduta ou termo de compromisso, danos morais decorrentes de acordos judiciais ou de termo de ajustamento de conduta, inclusive firmados pelo Ministério Público, e multas por descumprimento da cota para pessoas com deficiência. Esses recursos não serão destinados a fundo especí- fico, mas à conta única do Tesouro, e ficam vinculados por cinco anos. É possível enten- der que, se não houver o gasto desses recursos no Programa, transcorridos os cinco anos, eles poderão ser direcionados para outras finalidades.
A composição do Conselho do Programa (artigo 22) foi alterada e ampliada. Haverá agora participação de um representante do Ministério da Saúde, um da comissão mista de orçamento do Congresso Nacional, um dos empregados e um dos empregadores no lugar de dois representantes da sociedade civil. Porém, no § 7º do artigo, a indicação é mantida nas mãos do Ministério da Economia, sem menção às centrais sindicais reco- nhecidas. A paridade no tripartismo continuou ignorada na composição do Conselho.
Crédito à população de baixa renda – O artigo 25 introduz na lei 10.735/2003, que trata desse tipo de crédito, um parágrafo que permite isentar parte das instituições financeiras da obrigação de destinar recursos para a população de baixa renda. E se os recursos não forem aplicados nessa finalidade, em vez de serem depositados no Banco Central, como acontece hoje, podem as instituições serem penalizadas com custo finan- ceiro a ser definido pelo CMN.
Considerações finais
A elevadíssima taxa de desemprego dos jovens brasileiros é um problema que merece ser enfrentado com medidas adequadas, que combinem oportunidades de trabalho seguro e decente, formação profissional e boas condições para a formação dos futuros adultos. Para tanto, as políticas precisam ser eficientes, ou seja, devem atingir os objetivos
de proporcionar desenvolvimento pessoal e profissional com custos compatíveis. O Con- trato de Trabalho Verde e Amarelo, pelas evidências apresentadas nesta Nota, não preen- che esses requisitos. Estima-se que a geração de empregos será muito pequena, a solução não enfrenta o problema da oferta de mão de obra, os custos serão maiores do que outras alternativas possíveis e o financiamento recairá sobre desempregados e a Previdência So- cial.
Um debate mais esclarecido sobre esse problema poderia ter a coragem de colo- car a questão da profissionalização e da qualificação profissional na perspectiva de um futuro do trabalho que exigirá cada vez mais educação e conhecimento. Se o Estado está disposto a investir tantos bilhões nos jovens, o que é meritório, por que não destinar tais recursos à permanência da juventude nos bancos escolares e no ensino profissionalizante? Os interesses econômicos imediatos dos empresários não deveriam estar à frente de ob- jetivos realmente alinhados com os desafios do futuro.
Além de cativar o empresariado com substancial desoneração, a MP adota me- didas ainda mais radicais na legislação trabalhista. Permitir irrestritamente o trabalho em domingos e feriados poderá ser contraproducente, pois não gera empregos e reduz a renda dos trabalhadores. O aumento da jornada dos bancários é outra medida que caminha no sentido contrário da geração de empregos pela redução da jornada. As mudanças na sis- temática de fiscalização do trabalho tendem a favorecer a burla e o relaxamento da im- plementação de regras. O sindicato perde ainda mais prerrogativas enquanto os empresá- rios se fortalecem. A reforma trabalhista, após três anos de vigência, não surtiu os efeitos positivos que foram alardeados na época em que ela foi aprovada, em 2017. Ao contrário, o alto desemprego, a enorme subutilização, o gritante desalento e a relutante estagnação dos salários abonam a previsão de que o enfraquecimento da proteção ao trabalho não geraria empregos nem melhoraria as condições de vida da maioria da população.
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ANEXO
Remuneração e encargos sociais entre contrato padrão da CLT e Contrato Verde e Amarelo – salário mensal de R$ 1.200,00
COMPONENTES DA REMUNERAÇÃO E ENCARGOS | CLT | CTVA | REDUÇÃO | |||
ALÍQUOTA | R$ | ALÍQUOTA | R$ | R$ | % | |
Salário contratual | 1.200,00 | 1.200,00 | 0,00 | 0,0% | ||
13º e Grat férias | 11,11% | 133,32 | 11,11% | 133,32 | 0,00 | 0,0% |
FOLHA MENSAL | 1.333,32 | 1.333,32 | 0,00 | 0,0% | ||
FGTS | 8,0% | 106,67 | 2,0% | 26,67 | -80,00 | -75,0% |
Multa 40% s/ FGTS | 40,0% | 42,67 | 20,0% | 5,33 | -37,33 | -87,5% |
REMUNERAÇÃO TOTAL | 1.482,65 | 1.365,32 | -117,33 | -7,9% | ||
INSS | 20,0% | 266,66 | 0,0% | 0,00 | -266,66 | -100,0% |
Seguro-Acid. Trabalho | 2,0% | 26,67 | 2,0% | 26,67 | 0,00 | 0,0% |
Salário-Educação | 2,5% | 33,33 | 0,0% | 0,00 | -33,33 | -100,0% |
Incra | 0,2% | 2,67 | 0,0% | 0,00 | -2,67 | -100,0% |
Sesi ou Sesc | 1,5% | 20,00 | 0,0% | 0,00 | -20,00 | -100,0% |
Senai ou Senac | 1,0% | 13,33 | 0,0% | 0,00 | -13,33 | -100,0% |
Sebrae | 0,6% | 8,00 | 0,0% | 0,00 | -8,00 | -100,0% |
TOTAL DE ENCARGOS | 27,8% | 370,66 | 2,0% | 26,67 | -344,00 | -92,8% |
REMUN + ENCARGOS | 1.853,31 | 1.391,99 | -24,9% | |||
Encargos s/ Remun. | 25,00% | 1,95% |
Elaboração: DIEESE
Xxx Xxxxxx, 000 – 0x xxxxx XXX 00000-000 Xxx Xxxxx, XX
Telefone (00) 0000-0000 / fax (00) 0000-0000
E-mail: xx@xxxxxx.xxx.xx xxx.xxxxxx.xxx.xx
Presidente: Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx
Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde no Estado de São Paulo – SP
Vice-presidente: Xxxx Xxxxxxx xx Xxxx
Sindicato dos Comerciários de São Paulo – SP
Secretário Nacional: Xxxxx Xxxxxxx xxx Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de Máquinas Mecânicas de Material Elétrico de Veículos e Peças Automotivas da Grande Curitiba - PR
Diretor Executivo: Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Material Elétrico de Osasco e Região - SP
Diretor Executivo: Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Materiais Elétricos de Guarulhos Arujá Mairiporã e Santa Isabel - SP
Diretor Executivo: Xxxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxx
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica de São Paulo – SP
Diretora Executiva: Xxxx Xxxxx xx Xxxxxx Xxxx
Sindicato dos Servidores Públicos Federais do Estado de Pernambuco - PE
Diretora Executiva: Xxxx Xxxxx Xxxxxx
Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramentos Perícias Informações Pesquisas e de Fun- dações Estaduais do Rio Grande do Sul - RS
Diretora Executiva: Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx
Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de São Paulo Osasco e Região - SP
Diretor Executivo: Nelsi Xxxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxxx xxx Xxxxxxxxxxxx xx XXX - XX
Diretor Executivo: Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxx de Xxxxx Xxxxx
Sindicato dos Eletricitários da Bahia - BA
Diretor Executivo: Sales Xxxx xx Xxxxx
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Material Elétrico de São Paulo Mogi das Cruzes e Região - SP
Diretora Executiva: Xxxxxxx Xxxxxxx
Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo – SP
Direção Técnica
Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx – Diretor Técnico
Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxx – Diretor Técnico Adjunto Xxxxxxxx Xxxxxxxxx – Diretora Técnica Adjunta
Equipe técnica
Clóvis Scherer
Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx (revisão)