TAUBATÉ - SP 2022
A EFETIVIDADE E A CONSTITUCIONALIDADE NO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE
TAUBATÉ - SP 2022
A EFETIVIDADE E A CONSTITUCIONALIDADE NO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE
Trabalho apresentado à Universidade de Taubaté como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito sob a orientação do Professor Especialista Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx.
TAUBATÉ – SP 2022
XXXXX XXXXXXXX XXXXXX XX XXXXXXX
A EFETIVIDADE E A CONSTITUCIONALODADE NO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE
Trabalho apresentado à Universidade de Taubaté como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Data: / / 2022 Resultado:
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Dedico este trabalho a toda minha família que sempre me incentivou a prosseguir superando as dificuldades em conciliar família, trabalho e estudo.
Especialmente ao meu pai Xxxxx que mesmo não estando presente, sei que está orgulhoso desta minha conquista e como não poderia deixar de mencionar, minha mãe Xxxxxxx que com seu jeito especial de ser, é um grande exemplo de vida para mim.
A todos os meus professores, mas em especial ao Professor Dr. Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx, Professor Dr. Xxxx Xxxxx Xxxxxx e Professor Dr. Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, que me serviram de exemplo e muito me apoiaram.
Dedico aos meus amigos Xxxxx, Xxxx, Xxxxxxx e Xxxxxxx que desde o início de nossa jornada constituímos uma grande amizade.
A todos os professores que através de seus ensinamentos permitiram que eu pudesse estar concluindo este trabalho.
Agradeço em especial ao professor orientador Dr. Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx que confiou em meu objeto de estudo e muito contribuiu para sua conclusão.
E aos meus colegas que se fizeram presentes nestes cinco anos, com sua amizade e companheirismo.
“A elaboração da regra jurídica depende sempre do desenvolvimento das necessidades sociais. Como estas sempre se alteram, muito embora algumas basicamente pertençam à todos os tempos, as regras de direito também se modificam, modeladas por influência ou tendência de cada época.”
Ruy Rebello Pinho/Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxxx
A reforma trabalhista, responsável pela reestruturação do conceito da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), outorgada pela Lei n° 13.467/2017, representa uma inovação gigantesca nas relações de trabalho. Dentre essas inovações, a mais latente se dá pela inclusão do regime intermitente na legislação trabalhista brasileira. Com a premissa de flexibilizar as relações de trabalho e combater o alto índice de desemprego no país, por meio do estímulo à contratação e combate à informalidade, rege um contrato de trabalho sem remuneração e carga horária definida, estas variando pela demanda do contratante. O presente trabalho tem como objetivo verificar, por meio da legislação e da doutrina, a efetividade do contrato intermitente quanto a flexibilização nas relações de trabalho brasileiras, bem como verificar a compatibilidade das características do contrato com a Constituição. Para tal, a metodologia empregada utilizou o método dedutivo, a pesquisa bibliográfica e a exploratória. Foi possível verificar que, no texto vigente da Lei n° 13.467/2017, o contrato intermitente não cumpre com sua função de combate ao desemprego e flexibilização das relações, ainda possui um potencial de precarização do emprego, bem como configura um desmonte da CLT. Sua efetividade se dá limitada apenas nos índices de empregabilidade dada a criação de diversos vínculos trabalhistas, que não possuem uma garantia de remuneração atrelada, logo, não cumprem com a função social do contrato. Perante o estudo, foram verificadas lacunas na legislação, que permitem uma divergência com o texto da Constituição em sua aplicação.
PALAVRAS CHAVE: Reforma Trabalhista, Constitucionalidade, Contrato de Trabalho, Contrato de Trabalho Intermitente.
The labor reform, responsible for designing the concept of the Consolidation of Labor Laws (CLT), granted by Law No. 13,467/2017, represents a gigantic innovation in labor relations. Among the innovations, the most latent is the inclusion of the intermittent regime in Brazilian legislation. With the mission of flexibilizing the labor relations and combating the country’s unemployment rate, by encouraging hiring instead of informality, it configures a work contract without a defined remuneration and workload, that depends on the demand of the hirer. The objective of this work is to verify, from legislation and doctrine, the capacity of the intermittent contract of flexibilizing the labor relations, as well as the compatibility of the contract with the Brazilian Constitution. To this end, the methodology used is the deductive method, bibliographic and exploratory research. It was verified, in the current text of Law No. 13.467/2017, that the intermittent contract does not fulfill its function of combating unemployment and making relations more flexible, still, it has the potential to pre- carize employment, as well as breaking the CLT concept of the social function of the work contract. In view of the study, gaps in the legislation were verified, which allow a divergence with the text of the Constitution in its application.
KEYWORDS: Labor Reform, Constitutionality, Employment Contract, Intermittent Work Contract.
1. INTRODUÇÃO 12
2. A DIVISÃO TRABALHISTA NO DIREITO 14
3. A CONSTRUÇÃO DAS RAÍZES SOCIAIS DO DIREITO 16
4. AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EMPREGO E SEUS CONSTITUINTES 20
4.1 OS ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO 21
4.1.1 Pessoalidade 21
4.1.2 Onerosidade 21
4.1.3 Alteridade 22
4.1.4 Não-eventualidade 22
4.1.5 Subordinação 22
4.2 O CONTRATO DE EMPREGO 23
4.2.1 O Contrato de Emprego em sua classificação 23
4.2.1.1 Típico (ou nominado) 24
4.2.1.2 Personalíssimo 24
4.2.1.3 Oneroso 24
4.2.1.4 Informal (não solene) 24
4.2.1.5 De trato sucessivo 24
4.2.1.6 Comutativo 25
4.2.1.7 Sinalagmático 25
4.2.1.8 Principal 25
5. O DESMONTE DO CONCEITO DE CONTRATO TRABALHISTA 25
6. OS MODELOS DE CONTRATAÇÃO E A INOVAÇÃO ENTRE ELES 27
6.1 O CONTRATO POR PRAZO INDETERMINADO 27
6.2 O CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO 28
6.3 O CONTRATO TEMPORÁRIO 29
6.4 O CONTRATO POR TEMPO PARCIAL 30
6.5 O CONTRATO DE TELETRABALHO 31
6.6 A NOVA MODALIDADE: O REGIME INTERMITENTE 32
7. O CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE 32
7.1 O CONCEITO DO REGIME INTERMITENTE 33
7.2 O CARÁTER LEGAL DO REGIME INTERMITENTE NO ÂMBITO DA REFORMA 34
7.2.1 A convocação para prestação dos serviços intermitentes e seus encargos
34
7.2.1.1 Quanto a não efetivação do trabalho após o aceite da convocação e o direito ao salário mínimo 35
7.2.1.3 Quanto ao direito de férias e previdência social 36
7.3 AS GARANTIAS PROTETIVAS DO REGIME INTERMITENTE 39
8. AS LACUNAS NA REFORMA TRABALHISTA 40
9. DIREITO COMPARADO 43
10. O CONTRATO INTERMITENTE NA JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA 47
11. A DOUTRINA BRASILEIRA E O TRABALHO INTERMITENTE 50
12. A CONSTITUCIONALIDADE 53
12.1 O conceito da Constitucionalidade e seu procedimento 53
12.2 Os métodos de classificação da Constitucionalidade 55
13. CONCLUSÃO 57
REFERÊNCIAS 60
1. INTRODUÇÃO
A lei n° 13.467/2017, promulgada em 13 de julho de 2017, promoveu a chamada Reforma Trabalhista. Essa inovação é responsável por ter reinventado os contratos de trabalho e como são encarados, bem como a relação de emprego em si.
A reforma trabalhista foi alvo de muitas criticas, dentre elas a introdução do Contrato intermitente na legislação brasileira. Instaurado em prol da flexibilização das relações de emprego, o texto que o rege tem a premissa de promover uma formalização aos trabalhadores em postos informais e combater o desemprego.
Contudo, o texto legislativo aprovado é muito aberto e deixou lacunas quanto aos limites da aplicação do contrato, gerando uma inquietação na doutrina acerca de uma possível precarização do trabalho mediada pelo regime intermitente, bem como uma afronta às garantias já estabelecidas como constitucionais ao empregado.
O trabalho aqui exposto tem o objetivo de explorar o conteúdo que rege o contrato intermitente enquanto teoria e aplicação, levantando o questionamento da constitucionalidade do mesmo, tendo em vista o caráter unitário do Direito. Bem como verificar se é efetivo na formalização dos trabalhadores brasileiros e combate ao desemprego.
Para tal, foi empregado aqui o método dedutivo, a pesquisa bibliográfica e exploratória em artigos, livros e em legislações, tanto do Direito do Trabalho clássico, quanto referentes à Reforma Trabalhista e o Regime Intermitente. Sob a luz dos autores pertinentes, foi realizada uma análise crítica do tema proposto, bem como um estudo comparativo do Direito brasileiro e internacional, mediante o uso de jurisprudências e do direito comparado.
Este estudo tem caráter reflexivo, não pretendendo esgotar as discussões quanto ao tema, principalmente dada à natureza recente deste. É um trabalho relevante dada a análise crítica aqui empregada, levantando o debate acerca da
constitucionalidade de um tema tão polêmico na mídia. Dado isso, se reitera a importância do presente estudo para a fomentação e celebração do debate acerca da aplicabilidade do Contrato Intermitente.
Nesse sentido, o presente trabalho é dividido em doze capítulos, além desta introdução. Sendo o segundo capítulo uma abordagem acerca da necessidade da divisão do Direito enquanto Direito Trabalhista, o terceiro é uma contextualização histórica do Direito do Trabalho Brasileiro. Em seguida, são introduzidos os capítulos de conceituação das relações de trabalho e emprego, bem como seus elementos. No sexto, é explorado o desmonte do conceito clássico de contrato, bem como os contratos clássicos. No sétimo capítulo é aprofundado o contrato intermitente em si, em seguida é tecida uma exploração dos seus parâmetros bem como a apresentação de julgados, Direito comparado e a discussão acerca da constitucionalidade do regime.
Ao final é apresentada a conclusão, com a reflexão do tema apresentado acerca da constitucionalidade do regime intermitente e a sua efetividade enquanto força flexibilizadora das relações de trabalho e combate ao desemprego.
2. A DIVISÃO TRABALHISTA NO DIREITO
Limitar o estudo do direito como uma análise fria da norma escrita é irrelevante, posto em consideração a sua intenção: visualizar o ordenamento normativo junto às instituições e às relações jurídicas geradas pela norma, ou responsáveis pela geração desta. As formas organizacionais nascidas dessas relações dizem intimamente acerca do caráter social pertinente ao estudo do direito. Além da letra fria e dura, há a finalidade da lei, os espaços da conservação dos direitos individuais e coletivos dizem respeito, além da harmonia necessária ao convívio em sociedade, da conquista da formalização das relações sociais e jurídicas, equilibrando os locais de poder.
Xxxxx Xxxxxx, doutrinadora da área, invoca que o sistema de normas compreende as leis de forma que não podem ser visualizadas de modo isolado, sendo elas o produto de um ordenamento jurídico complexo que equilibra os interesses da vida em sociedade. Com isso, temos que o direito é um todo, mas dividido em eixos que facilitam identificar sua finalidade em função do homem como ser social. Xxxxx, chegamos ao direito do trabalho como um dos nichos, sendo este o meio pertencente ao objeto de estudo do presente trabalho. Nessa linha, a autora coloca: “O Direito do Trabalho consiste em um complexo de institutos, princípios e normas jurídicas, que são resultado de um determinado contexto histórico e específico” (BARROS, 2012, p.89).
Nisso, tem-se que o direito é uma leitura do tempo em que se encontra, isto posto, dá-se que ele está em constante transformação. Nessa seara, entende-se que o direito trabalhista não foi desde o primórdio como o concebemos hoje. Conforme Xxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxxx, “o direito do trabalho nasceu com a sociedade industrial e o trabalho assalariado. As razões que determinaram o seu aparecimento são econômicas, políticas e jurídicas” (NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2015).
Segundo os autores, sendo o fator econômico a substituição do trabalho escravo, servil e corporativo pelo trabalho assalariado em larga escala, o fator
político se deu pela progressão do Estado Liberal (com liberdade contratual plena) para o Estado Intervencionista (com ação interventiva no limite da ação das partes no contrato de trabalho, prezando pelo equilíbrio de poderes e bem estar social), o que configura uma transcendência do interesse trabalhista da esfera privada para a pública. Por fim, os fatores jurídicos se deram pela ideia da justiça social do Estado englobada nos processos acima citados, conquistando-se o direito de uma legislação firme e regente para o trabalho, prezando pelo princípio da dignidade humana e regendo as relações laborais numa perspectiva coletiva.
O direito do trabalho consolidou-se como uma necessidade dos ordenamentos jurídicos em função das suas finalidades sociais, que o caracterizam como regulamentação jurídica das relações de trabalho que se desenvolvem nos meios econômicos de produção de bens e prestação de serviços. (XXXXXXXXXX x XXXXXXXXXX, 2015).
Ainda na fase atual, o Direito do Trabalho se encontra em construção, dado o caráter transitório temporal do Direito em geral. Contudo, a harmonia e a busca pela harmonização das desigualdades sociais ainda acompanha fortemente e é a sua finalidade primordial. Identificar os locais de poder e colocá-los num estado de igualdade de direito para proteção do bem estar coletivo justifica a sua função no exercício das partes no contrato trabalhista. Porém, os obstáculos a sua execução ainda são latentes, em especial no tocante a respeito do conflito de interesses público e privado, ou do contratante e contratado.
Sendo um questionamento contemporâneo acerca da urgência do direito trabalhista, a doutrina diverge quanto da necessidade deste reger todas as relações laborais, ou apenas aquelas com tom de subordinação, presentes nos contratos mais comuns, incluindo ou não os de caráter autônomo, ou ainda acerca dos conceitos de prestação de serviços e até onde se diferem na esfera trabalhista, como inclusão ou como lacuna no Código Civil.
Posto que configuram um direito conquistado, as leis trabalhistas têm seu cerne fundado em lutas e apelos populares, tendo o Estado a função de representação. Nessa linha, Xxxxx e Xxxxxxxxxx colocam: “o impulso inicial dado ao surgimento do Direito do Trabalho foi obra do próprio operário, e não benevolência
de filantropos, da classe patronal ou do Estado” (XXXXX e XXXXXXXXXX, 2002, p.2). Os referidos autores dissertam acerca da não individualidade do Estado ao olhar pela classe obreira menos favorecida. Sendo a movimentação da massa operária o gatilho para pressionar essa intervenção estatal contra a postura passiva liberal.
Assim, tem-se que o direito trabalhista nasceu pelo estabelecimento de relações jurídicas entre empregador e empregado. Em sua obra Teoria da Xxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxx ressalta “A relação jurídica é caracterizada não pela matéria que constitui seu objeto, mas pelo modo com que os sujeitos se comportam um em face do outro” (XXXXXX, 2005). Assim, o autor discorre que a relação entre norma e relação jurídica se dá de forma causal, mas não que a norma seja jurídica por reger uma relação dessa mesma natureza, mas a relação que se torna jurídica por ser regulada por uma norma desse conteúdo. Assim, reger as relações laborais por um Direito próprio se dá como uma necessidade a partir do momento em que se reconhece um conflito de interesses entre duas partes, que carece de uma manutenção do Estado para regular os locais de poder, não por um ato de benevolência maior, mas por configurar uma obrigatoriedade para o bom funcionamento da sociedade enquanto instituição.
3. A CONSTRUÇÃO DAS RAÍZES SOCIAIS DO DIREITO
Amauri e Xxxxx Xxxxxxxxxx dissertam na obra Iniciação ao Direito do Trabalho: “O direito positivo é dinâmico e se altera na medida em que novas necessidades de regulamentação das relações entre os grupos sociais e as pessoas renovam” (NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2015). A perspectiva dos autores pode ser amplamente visualizada no Brasil, onde a construção e ainda a evolução do Direito Trabalhista tem se dado por meios cruzados entre influências externas e internas, especialmente dado o fato de que o meio jurídico, assim como outras esferas de cunho socioeconômico geralmente abastado, tem em seu cerne de origem uma tentativa de absorção e reprodução de modelos europeus, por influências ainda coloniais. Sendo exatamente esse influxo europeu o cunho externo que inicialmente levou o Brasil a formalizar uma normativa do trabalho. Contudo, são
as influências internas que ditam, dado a mobilização popular, como a legislação se desdobra frente ao avanço dos modelos sociais do país.
A CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) foi inaugurada em 1943 como a primeira legislação trabalhista geral aplicável a todos os trabalhadores brasileiros. Foi precedida pela Lei n. 62 de 05 de junho de 1935, referente às garantias apenas aos empregados da indústria e comércio, em caso de demissão sem justa causa e rescisão do contrato anterior à data estipulada de término do mesmo. A Consolidação das Leis Trabalhistas configurou um marco histórico para o âmbito jurídico, assegurada na Constituição Federal (CF), caracteriza uma preocupação geral acerca da inserção do direito do trabalho como de interesse público e coletivo, sendo assim, é uma reafirmação da realização das normas como uma unidade.
O Direito não pertence à natureza física. Não é uma lei química ou uma lei biológica que o produz, muito menos uma lei mecânica própria do mundo não cultural e dentro de uma infalível inelutabilidade. O Direito, ao contrário, apresenta-se- nos pleno de sentido, de significação, como expressão de uma estrutura de fins e de meios congruentes, como intencionalidade. Nada há na natureza física que se nos apareça como um elemento jurídico. Ao contrário, existe o direito porque o homem procura ordenar a sua coexistência com outros homens, pautando-a por meio de determinadas normas, por ele dispostas, no sentido de evitar um conflito de interesses e realizar um ideal de justiça. (XXXXXXXXXX e NASCIMENTO, 2015)
Isto posto, é impossível falar do direito brasileiro sem levantar as suas raízes histórico culturais, dado que na história nacional é registrado mais tempo de trabalho escravo do que de trabalho assalariado. Nesse contexto, Xxxxxxx invoca: “no Brasil, o Direito do Trabalho teve como relevante antecedente a promulgação da Lei Áurea, a qual deu fim à escravidão no país, possibilitando o surgimento de novas formas de utilização da força de trabalho resultando, assim, nas relações de emprego” (XXXXXXX, 2016, p. 110).
Nesse sentido, Xxxxxx invoca um contexto em que o Direito se concebia de uma forma um tanto obstante ainda a qual é concebida hoje: a urgência da legislação em reger os trabalhadores, desprovidos de um ambiente salubre de
trabalho e submetidos às mazelas da exploração e a carência do mínimo, num momento de transição do trabalho escravo ao assalariado, tecendo as conquistas para a separação entre trabalhador e escravo. O autor, signatário do Partido Operário e célebre em causas penais e sociais de sua época, destaca em sua obra Introdução ao Direito do Trabalho, em 1971, acerca da necessidade da intervenção do Estado na causa trabalhista coletiva: “seria a própria negação da razão de ser da constituição do novo direito: desenganadamente intervencionista a favor de um dos lados da relação, para equilibrá-la e exatamente pela sua posição de inferioridade econômica e social” (XXXXXX, 1971).
Fazendo paralelo novamente com Xxxxxxxxxx e Xxxxxxxxxx, pode-se relacionar a relação de urgência em proteger juridicamente o âmbito laboral também colocado por Xxxxxx, posto que o mesmo se configura ainda como uma relação de poderes, que carece do cuidado do Estado em sua função de administração pública, com o princípio das normas em si, justificando assim a relação de direitos e deveres, tecidas nas relações em sociedade:
O direito do trabalho é expressão do pluralismo jurídico. Combinam-se as leis promulgadas pelo Estado e os contratos coletivos pactuados entre os sindicatos e as entidades patronais. Há um direito estatal e um direito profissional, convivendo, formando um complexo de normas jurídicas que se combinam segundo uma hierarquia própria de aplicação, basicamente apoiada no princípio da prevalência da norma que resultar em maiores benefícios para o trabalhador, expressando-se como o princípio da norma favorável, salvo exceções. (XXXXXXXXXX e NASCIMENTO, 2015)
Não obstantemente, conforme os autores acima citados tem se, que para vislumbrar o cenário da questão trabalhista brasileira, é imprescindível palpar o contexto de luta de poderes que tem fundado as questões sociais do país, conforme foi se citado acerca da razão de ser da constituição enquanto exercício do Estado para o bem estar social. Assim, torna-se de suma importância ressaltar o Brasil como uma ex-colônia escravocrata, sendo ainda o último país da América Latina a abolir a escravatura, e de forma ainda muito rasa, que só ocorreu mediante grande resistência. Configurando assim um maior período de trabalho escravo do que de trabalho assalariado registrado em solo nacional, as leis trabalhistas, inclusive a
CLT, se revelam como diversos direitos conquistados pela classe trabalhadora emergente, não facilidades arquitetadas pelo Estado. Nesse sentido, Xxxxxx Xxxxxx Xxxx disserta em sua tese:
A oposição irreconciliável entre escravidão e liberdade cristalizou-se como um postulado quase sempre inquestionado, e o final do século XIX passou a assim configurar a substituição do escravo (negro) pelo trabalho livre (branco e imigrante), o “período de transição”, da “formação do mercado de trabalho livre” no Brasil. [...] as últimas décadas do século XIX constituem o marco cronológico que separa o conjunto de obras sobre a escravidão daquele sobre o “trabalho livre”: entre os dois há um hiato, quase um abismo — e a história dos trabalhadores do Brasil torna-se cativa de uma ruptura radical. (LARA, 1998)
Isto posto, reitera-se o caráter de direito conquistado das leis trabalhistas brasileiras e, logo, garantidas pelo princípio do bem estar social e do direito adquirido. Nessa seara do conflito de interesses latente no desenvolvimento do país enquanto nação, a mão do Estado tem tido a função de proteger e zelar da forma mais organizacional possível pela integridade e salubridade dos trabalhadores e todo seu ambiente laboral, posto que, configuram a massa que move a economia e os demais aspectos do país.
Vislumbrando que, conforme supracitado, a história brasileira possui mais tempo de trabalho escravo (não assistido) do que de trabalho efetivamente assalariado (assistido e formalizado, o emprego em si), tem-se que a conservação de um código trabalhista se dá como uma expressão do progresso nacional enquanto reconhecimento da necessidade de inserção do trabalhador enquanto cidadão, protegendo-o sob a luz de uma constituição afirmada nos direitos humanos.
Paralelamente, Xxxxxx identifica uma passagem gradual e crescentemente acentuada na seara dos direitos humanos, para uma especialização dos sujeitos titulares de direitos. Transgredindo do conceito cru e abstrato dos sujeitos como homens, para os sujeitos enquanto cidadãos.
Uma coisa é um direito; outra promessa de um direito futuro. Uma coisa é um direito atual; outra, um direito potencial; Uma
coisa é ter um direito que é, enquanto reconhecido e protegido; outra é ter um direito que deve ser, mas que, para ser, ou para que passe do dever ser ao ser, precisa transformar-se, de objeto de discussão de uma assembléia de especialistas, em objeto de decisão de um órgão legislativo dotado de poder de coerção”. (BOBBIO, 1992)
Xxxxxx Xxxxx ressalta ainda, refinando novamente de volta ao Direito do Trabalho, que a importância do próprio não é a mesma para todos, motivo pelo qual se dá como um direito de classe, sendo essa divisão de pessoas que ocupam o local de parte submetida ao contrato uma divisão já classista.
Enquanto existir a sociedade capitalista sob sua forma atual, claramente dividida em classes econômicas, formando uma verdadeira hierarquia na pirâmide da estratificação social, é de todo impossível esvaziar o direito do trabalho deste conteúdo tutelar e ostensivamente protetor. (XXXXXX XXXXX, 1965)
Com isso, perante uma transgressão do direito do trabalho brasileiro no seu cerne até a atualidade, identifica-se como a sua instauração se deu em um tom de conquista, reiterando a correlação direta entre esse avanço e a evolução do país acerca do seu potencial organizacional jurídico e social, onde o trabalhador passou a ser enxergado não apenas pelo seu trabalho, sendo identificado como um cidadão dotado de direitos, inclusive o da empregabilidade.
4. AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EMPREGO E SEUS CONSTITUINTES
Para adentrar na seara trabalhista, é mister explicitar o trabalho, o emprego e as relações que os regem. Xx Xxxxxxxx (2015, p. 153), o trabalho é um gênero que abrange muitas espécies, sendo o emprego uma delas. O emprego é sempre uma forma de trabalho, mas nem todo trabalho é emprego. Não obstante, Xxxxxxx (2016,
p. 295-296) compreende o trabalho como de caráter genérico e "refere-se a dispêndio de energia pelo ser humano objetivando resultado útil”. Com isso, tem-se que o trabalho se refere à contratação do uso da força humana e “englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho
eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de
labor”.
Xxxxxxxx (2015, p.153), disserta que há uma relação efetivamente de emprego quando, além de presentes a prestação e contraprestação de trabalho, identificam-se também na relação os elementos da pessoalidade, da onerosidade, da subordinação jurídica, da alteridade e da não eventualidade. Tais pontos serão explorados a seguir, no próximo tópico.
4.1 OS ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO
Xxxxxxxx (2015) detalha os seguintes elementos como inerentes para a relação de emprego ser identificada como tal:
Caracteriza que não há transferência de obrigação quanto à prestação do serviço contratado. A parte contratada, o empregado, deve ser uma pessoa física prestando serviços de forma personalíssima, de forma que o exercício de suas atividades não possa ser ajustado a outrem, sendo a pessoalidade o determinante pelo qual o empregador seleciona seus empregados.
Caracteriza-se pela contraprestação do empregador ao empregado, acima já supracitada. A contraprestação se dá como o pagamento pela mão de obra empenhada pelo empregado na sua prestação de serviços, de forma que o empregado realiza uma determinada função ao passo que é remunerado por ela. Em suma, é a geração e prestação do ônus.
Se dá, pela premissa de que o empregador assume os riscos gerados pela prestação de labor por ele gerada, e não o empregado que a executa, posto que o mesmo o faz por ordem do empregador. Independente do estado financeiro do empregador e da pessoa jurídica que o próprio representa, há uma garantia de segurança, como o salário, devidas ao empregado, que deve recebê-la. Vide o art. 2º da CLT: “Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assinala e dirige a prestação pessoal de serviço” (BRASIL, 1943).
Diz que a prestação de serviços deve ter uma segurança quanto ao tempo e período a ser exercida, se dando de forma contínua e não eventual. Vide o Art. 3º da CLT: “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário” (BRASIL, 1943). Ainda, não há menção ao trabalho por diárias, mas ao trabalho permanente e habitual, de forma que a prestação se dá de uma forma frequente, como quinzenalmente ou mensalmente.
Se dá, numa perspectiva de hierarquia. Limita a liberdade do empregado quanto a sua prestação de serviços, tendo em vista a sujeição decorrente do poder do empregador em razão dos deveres por ele cumpridos, cabendo a ele a definição do tempo no qual deve ser efetuado o labor, protegido nos limites estabelecidos pela CLT e pela Constituição para os contratos de emprego. Estes, serão explorados no próximo tópico.
4.2 O CONTRATO DE EMPREGO
No art. 442 da CLT consta: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego” (BRASIL, 1943). Xxxxxx (2012, p.185) conceitua como contrato de trabalho o acordo expresso ou tácito firmado entre duas partes (empregado e empregador, ou pessoa jurídica e pessoa física), pelo qual se firmam obrigações jurídicas não eventuais de labor e prestação de serviços, em contraprestação de um salário e subordinação jurídica, sendo essa última o diferencial entre os contratos de trabalho e os de prestação de serviço autônomo. Contudo, outra parte da doutrina discorda veementemente, em especial no que diz respeito ao conceito presente na CLT, afirmando que o mesmo refere-se ao contrato de emprego e não de trabalho, e que a presença de um contrato não corresponde à relação de emprego, mas a cria.
Na discussão do trabalho aqui exposto, os termos “contrato de emprego” e “contrato de trabalho” serão usados de forma irrestrita, para especificar os vínculos da relação jurídica de emprego, dado que os elementos caracterizadores do contrato de trabalho coincidem com os mesmos da relação de emprego: pessoalidade, onerosidade, alteridade, não eventualidade e subordinação.
Ainda, a identificação de todos os elementos é cumulativa, assim, o não cumprimento de algum deles desclassifica o contrato como de emprego, transferindo-o a outro de outra natureza. A seguir, explicitam-se as classificações dos contratos.
4.2.1 O Contrato de Emprego em sua classificação
O contrato de emprego pode ser classificado, segundo Xxxxxx, enquanto típico, personalíssimo, oneroso, informal, de trato sucessivo, comutativo, sinalagmático ou principal (XXXXXXXX, 2015, p. 165; XXXXXX, 2012, p.186). Sendo o intuito dessas classificações, apontar que o contrato é:
O contrato de emprego é tipificado e nominado em lei, ou seja, previsto em norma regulamentadora própria;
O contrato de emprego é intuitu personae em relação ao empregado. A responsabilidade quanto à realização do labor contratado é pertencente e intransferível a este, ao qual o contrato é realizado levando em consideração seus dados pessoais.
Possui a necessidade da existência do ônus remuneratório, ou seja, o trabalho deve ser assalariado.
É o contrato que não possui formalidades, ou seja, não possui vinculação a uma forma específica, podendo ser verbal ou tácito. A execução dos serviços mediante as características de um contrato, mesmo sem a formalização escrita, já o configuram como tal.
Aquele contrato em que a prestação de trabalho se dá de forma sucessiva, não se esgotando com a execução de um ato, mesmo contando com prazo determinado.
Aquele que produz direitos e obrigações equivalentes, sendo essas explícitas desde o ato de realização do contrato.
Aquele em que a prestação e a contraprestação se dão de forma recíproca numa relação de direitos e deveres, partindo do princípio da autonomia da vontade. A cada prestação, há uma contraprestação, de forma que as partes tecem uma relação de obrigações parceladas uma com a outra.
Aquele que existe em função de si mesmo. Não dependendo diretamente de outro contrato complementar.
5. O DESMONTE DO CONCEITO DE CONTRATO TRABALHISTA
Apesar de ser formalmente expresso na jurisdição nas classificações citadas no tópico anterior, o conceito adotado para apontar o contrato trabalhista frequentemente é atualizado em razão de como o próprio trabalho é encarado no momento vigente, tanto no Direito, quanto nas relações sociais em geral.
Conforme as camadas da sociedade, bem como os papéis empregados a elas, se modificaram com o passar do tempo, os processos de trabalho acompanharam juntamente, por consequência ou em razão deles, como o clássico exemplo das revoluções industriais e digitais.
Assim, as leis trabalhistas tiveram que se adaptar aos novos processos laborais, atendendo às novas demandas e exigências do modelo social, invocando
aqui novamente o já supracitado caráter transitório e temporal do direito em si. Dada à modificação das relações de trabalho, é observada uma tendência mundial em buscar pela flexibilização da regência jurídica dessas relações, observando a constante globalização e a decorrente descentralização produtiva da economia.
Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx faz referência a essa flexibilização das condições de trabalho como “o conjunto de regras que têm por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica, política ou social, existentes na relação entre o capital e o trabalho” Xxxxxxx (2002, p. 25). O autor ainda faz alusão a Nassar, na afirmativa de que essa flexibilização consiste ainda em um conjunto de medidas destinadas a dotar o direito laboral de uma capacidade de ajuste à flexibilização dos fatores econômicos e tecnológicos de natureza diversa.
Em tese, a flexibilização abre para as empresas uma maior liberdade para promover alterações na contratação, remuneração, funções e horário de trabalho dos seus funcionários. Já para o trabalhador, abre um leque imenso de imprevisibilidades quanto à sua atividade a ser exercida, que costuma significar a fonte de renda e manutenção da dignidade social para si mesmo e para a sua família, o submetendo a um processo produtivo ainda mais desgastante.
Contudo, no cenário nacional, essa flexibilização se apoia na estimativa de que os contratos de trabalho tradicionais são extremamente onerosos para o empregador brasileiro. Xxxxx invoca o estudo da Escola de Economia da Fundação Xxxxxxx Xxxxxx, onde estima-se que um trabalhador no Brasil custa ao seu empregador, em média, 2,83 vezes o seu salário de carteira, sendo esse adicional cumulativo a soma das despesas com os gastos referentes aos encargos sociais e trabalhistas. Ainda, conceitua-se que esses custos se dividem em quatro vertentes, sendo elas: a primeira, referente ao salário líquido mensal. A segunda, ao recebimento dos adicionais de férias, 13° salário, horas extras, vale alimentação e vale transporte. A terceira, à compensação do empregado, correspondente ao FGTS e suas possíveis multas, à contribuição do INSS, o aviso prévio indenizado e afins. Finalmente a quarta vertente, os demais custos, como o direito a férias, proteção
social, os custos de uma eventual reclamação trabalhista e a capacitação necessária para execução do cargo (XXXXX, 2012).
Nesse sentido, a defesa da flexibilização das relações de trabalho se dá no sentido de diminuir esses custos da contratação, assim facilitando e estimulando o processo da empregabilidade. Assim, entende-se que a justificativa maior para sua instauração no âmbito nacional é combater a rigidez da legislação trabalhista brasileira, para as demandas do mercado ao cenário econômico e social. Assim, há a tendência da geração de novos tipos de contratos, dado que estes são os reguladores das relações de emprego que visam ser flexibilizadas. Tais contratos serão detalhados a seguir, para explanação do trabalho aqui exposto.
6. OS MODELOS DE CONTRATAÇÃO E A INOVAÇÃO ENTRE ELES
6.1 O CONTRATO POR PRAZO INDETERMINADO
Clássicos, a marca desses contratos é serem firmados por tempo indeterminado. Configuram-se como o meio mais convencional de contratação, dado que a preocupação quanto a manutenção do empregado no ambiente de trabalho e as multas que sua dispensa podem ocasionar deixam de ser tão latentes, posto que não é pactuado uma validade da relação de emprego, ela dura enquanto o contrato não for rescindido. São também uma proteção ao trabalhador, dado as garantias que o mesmo recebe frente a interrupção do contrato, como férias, décimo terceiro, FGTS e etc. Segundo Xxxxxxx: “aplicam-se aos contratos a prazo incerto normas jurídicas muito mais vantajosas ao obreiro do que aquelas aplicáveis aos contratos a prazo certo – o que faz com que tal tipo de contrato concretize, de modo franco e induvidoso, em contraposição aos contratos a prazo determinado, o princípio da norma mais favorável”. Ainda, disserta: “a indeterminação do prazo contratual é meio de se conferir concretude ao essencial princípio justrabalhista da continuidade da relação de emprego” (XXXXXXX, 1998, p.17).
Por conseguinte, é concluso que este gênero de contrato está de acordo com a doutrina do Direito do Trabalho, protegida pela Constituição, logo, é válido quando a garantia das relações de emprego na seguridade do bem estar social e estabilidade do trabalhador.
6.2 O CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO
Também nomeados como Contratos a Termo, que se diferenciam pela pactuação de um prazo de validade do contrato, bem como uma data limite para que se finde a relação de emprego, logo, são exceções ao modelo convencional de contratação. Dado isso, tais contratos devem se encaixar em algum dos casos descritos no artigo 443 da CLT para que se dêem como constitucionais, que diz que o contrato individual de trabalho poderá ser acordado de forma tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou, condição acrescentada pela reforma da Consolidação Trabalhista, para prestação de trabalho intermitente.
No artigo supracitado constam três variáveis que possibilitam a realização do contrato por tempo determinado, sendo elas: quanto à realização de serviços cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo, atividades empresariais de caráter transitório ou ainda no caso do contrato de experiência, que não deve ultrapassar os noventa dias. Ainda, existem os casos excepcionais: os quais permitem a contratação por tempo determinado de atletas de futebol, artistas, empregados domésticos e alguns outros.
Contudo, há o limite de dois anos como tempo máximo para o contrato enquanto prazo determinado, havendo apenas uma renovação. Isto se dá para que não ocorram contratos sucessivos, prezando pela seguridade do contratado. Assim, um contrato por prazo determinado que tem suas atividades estendidas para além do seu prazo se transforma em um de tempo indeterminado. Isso se dá porque, perante a sujeição do contratado a um regime por prazo determinado de forma sucessiva, há a inviabilização da estabilidade das suas garantias como empregado, como as multas rescisórias sobre o FGTS e afins. Assim, esse tipo de contrato deve
ser celebrado para suprir a realização de atividades laborais que condizem com uma determinação de prazo, e não para livrar os encargos do empregador quando estes forem cabíveis.
É alicerçado inicialmente pela Lei nº 6.019/74, que o define como aquele prestado por uma pessoa física contratada por uma empresa de trabalho temporário, que a coloca à disposição de uma empresa tomadora de serviços para atender a uma necessidade de substituição transitória de pessoal permanente, ou a uma demanda complementar de serviços.
Nessa modalidade de contrato, o fornecimento da mão de obra se dá por intermédio de uma empresa de prestação de serviços para a contratante final, a chamada terceirização. Conforme a Lei nº 13.429/2017, que alterou alguns dispositivos da supracitada Lei nº 6.019/74, essa terceirização de mão de obra não deve ultrapassar os cento e oitenta dias, com a possibilidade de prorrogação por noventa dias a mais, e pode reger tanto atividades-meio quanto atividades-fim da empresa tomadora de serviços. Na lei antecessora, a Lei nº 6.019/74, esse tipo de contrato não poderia ser aplicado às atividades-fim, tal mudança foi aplicada pela nova legislação, e sofreu grandes críticas, especialmente de cunho sindicalista.
A principal crítica quanto a esse quesito se dá apoiada no argumento de que a terceirização irrestrita precariza as relações de emprego, reduzindo-as a simples prestação de serviço, desprotegida de várias garantias trabalhistas. Exemplificando, o trabalhador submetido a esse tipo de contrato não tem direito ao recebimento da multa de 40% sobre o saldo do FGTS e ao aviso prévio, mas a uma indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do contrato, correspondente a um doze avos do pagamento recebido em tempo de serviço. Segundo Xxxxxxx, o contrato temporário é uma espécie de contrato por tempo determinado com características específicas. O contrato temporário se aplica nos casos de demanda extraordinária de serviço ou substituição temporária de mão de obra, com jornada de trabalho pré- definida (XXXXXXX, 2002, p.53).
Assim, o contrato temporário deve, em tese, ser aplicado para suprir os casos de demanda extraordinária, sendo esta pré-definida. Ainda, salienta-se que é proibido utilizar de contratação temporária para preencher cargos de trabalhadores em greve, para não ferir o direito a ela, salvo exceções previstas em lei.
6.4 O CONTRATO POR TEMPO PARCIAL
Ainda, há o trabalho de tempo parcial, criado pela Medida Provisória nº 2.164- 41 de 24 de agosto de 2001, que alterou a CLT regulamentado-o. Segundo o art. 58- A da CLT: “Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais” (BRASIL, 1943), contudo, a mais recente Lei nº 13.429/2017, estendeu o regime a tempo parcial para o máximo de 30 horas semanais (BRASIL, 2007).
Desse modo, o contrato por tempo parcial se dá, atualmente, por um prazo de tempo contratual indeterminado e pode ser aplicado, tanto a jornada que não exceda trinta horas semanais, sem a possibilidade da realização de horas extras, quanto a aquela que não exceda as vinte e seis horas semanais, podendo realizar-se até seis horas extras, de forma que a jornada não totalize mais do que trinta e duas horas por semana.
Já o cálculo da remuneração se dá por uma relação entre a carga horária cumprida pelo empregado e o salário padrão daquela função, em uma jornada de trabalho de tempo integral. Os demais direitos condizentes à jornada convencional também devem ser prestados ao empregado por tempo parcial. Esse cálculo relacional se aplica não somente a remuneração, mas também às férias: os empregados nesse regime têm direito a férias após cada período de 12 meses, de forma que a duração desta é proporcional a sua carga de trabalho prestada; têm direito a dezoito dias de férias aqueles com jornada semanal superior a vinte e duas horas e até vinte e cinco horas, dezesseis dias para aqueles com jornada semanal superior a vinte horas e até vinte e duas horas, quatorze dias aqueles com jornada semanal superior a quinze e até vinte horas, doze dias para os com jornada semanal
superior a dez e até quinze horas, dez dias para a jornada semanal superior a cinco e até dez horas e oito dias para os com jornada semanal igual ou inferior a 5 cinco horas. Acrescenta-se que não é possível converter as férias em abono pecuniário nesse tipo de contrato de trabalho. Ainda, é direito do trabalhador desse regime o décimo terceiro salário, aviso-prévio, descanso semanal remunerado (DSR), recebimento de adicionais e benefícios condizentes a sua carga horária.
Assim, esse tipo de contrato deve ser realizado para suprir a necessidade de cargos que não necessitem das quarenta e quatro horas semanais convencionais, de forma que o vínculo empregatício ainda existe e é celebrado da mesma forma.
6.5 O CONTRATO DE TELETRABALHO
Também conhecido como o popular Home Office, não é considerado trabalho externo e é formalizado pela promulgação da Lei nº 13.467/2017. Está descrito no artigo 75-B da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, de acordo com o qual, considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.
Por conseguinte, apesar da prestação do serviço se dar na sua maioridade fora do espaço físico da empresa, na casa do emprego ou em ambientes afins, o trabalho não é considerado externo. Ainda, a eventual realização das funções esporadicamente no ambiente do contratante também não o caracteriza como trabalho presencial convencional. Acerca disso, o parágrafo único do artigo 75-B versa: “O comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho” (BRASIL, 2017).
A popularidade do contrato de teletrabalho é emergente há algum tempo, dada à modernização das tecnologias e o seu custo reduzido para o empregador, que aumenta a rentabilidade do empregador, que muitas vezes paga seus funcionários por rentabilidade e ainda exclui o custeio com transporte e instalações
maiores. A presença desse gênero de contrato, antes mais comum em cargos relacionados à tecnologia, se tornou ainda mais latente em outras esferas com a pandemia do COVID-19. Nesse sentido, Xxxxxx Xxxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxx apontam: “O teletrabalho, home office, já era uma prática em algumas empresas e, com o novo coronavírus, passou a ser uma urgência para todas, atingindo muitos trabalhadores em todo o mundo. O que era exceção virou regra (LOSEKANN e XXXXXX, 2020). Assim, reitera-se como as leis trabalhistas se adaptam ao momento social vivenciado e devem estar em constante observação.
6.6 A NOVA MODALIDADE: O REGIME INTERMITENTE
A Lei nº 13.467/2017 introduziu também a inédita forma de contratação especial no âmbito brasileiro, o contrato de trabalho intermitente. Tal contrato, o objetivo maior da discussão do trabalho aqui exposto, será discutido a seguir.
7. O CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE
Foi incorporado à legislação brasileira por meio da reforma trabalhista, resultante da promulgação da Lei n° 13.467 de 2017, que aponta em seu conteúdo como finalidade:
“Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis n º 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho”. (BRASIL, 2017)
A nova lei revisou mais de uma centena de dispositivos da CLT, com a premissa de modernizar a legislação trabalhista brasileira e flexibilizar a redução dos custos da gestão da mão de obra. De forma bem rápida em relação a sua divulgação, a lei teve seu conteúdo em diversos e notáveis pontos alterado pela Medida Provisória nº 808 de 2017, que perdeu validade por não ter sido submetida pelo Congresso Nacional no prazo necessário, mas que não pode ser desconsiderada em razão dos efeitos que produziu no período em que esteve ativa
e da motivação que levou a eles. Esta acrescentou em sua duração ao artigo 452-A da CLT:
O contrato de trabalho intermitente será celebrado por escrito e registrado na CTPS, ainda que previsto acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva, e conterá: I - identificação, assinatura e domicílio ou sede das partes; II - valor da hora ou do dia de trabalho, que não poderá ser inferior ao valor horário ou diário do salário mínimo, assegurada a remuneração do trabalho noturno superior à do diurno e observado o disposto no § 12; e III - - o local e o prazo para o pagamento da remuneração... (BRASIL, 2017).
7.1 O CONCEITO DO REGIME INTERMITENTE
Nessa modalidade de contratação, não há uma garantia remuneratória para o período em que o empregado passa sem ser convocado a executar sua função e não lhe é permitido o acesso a benefícios sociais relacionados ao desemprego, dado que o vínculo trabalhista é mantido mesmo nos períodos de inatividade. Ainda, é permitido ao empregado celebrar novos vínculos, de cunho intermitente ou não, com outros empregadores nesse período de inatividade, apesar dele ser incerto. Xxxxxxxx disserta que essa viabilidade é apenas teórica, pois essa dualidade de cargos só é acessível se a intermitência for por vários dias ou meses, uma vez que, se a intermitência for durante um período muito longo e o trabalhador estiver ciente disso, pois o empregado não irá arriscar manter vínculos múltiplos caso sua inatividade for de dias ou semanas, para evitar que sua remuneração mensal seja ainda mais comprometida pela perda do vínculo original (XXXXXXXX, 2017, p. 37),
Assim, essa ausência de estabelecimento de prazos representa uma falha na efetividade da legislação, dado que seu conteúdo de propósito não consegue ser alinhado com sua prática e ainda ameaça a existência do contrato por prazo indeterminado convencional.
7.2 O CARÁTER LEGAL DO REGIME INTERMITENTE NO ÂMBITO DA REFORMA
Configurando-se como uma das novas e excepcionais modalidades de contratação, o contrato intermitente foi incorporado à legislação através da lei 13.467 de 13 de julho de 2017, por meio da nova CLT, a qual teve diversos dispositivos alterados, excluídos ou adicionados. Tais mudanças foram duramente questionadas pela comunidade jurídica e pela sociedade em geral, especialmente no tocante a uma possível precarização das relações de emprego, contudo, houve ainda uma parcela concordante com a premissa de flexibilização das contratações em âmbito nacional e superação da informalidade.
A característica principal desse modelo de contrato está na possibilidade de contratações simultâneas com empregadores diferentes, de forma que nenhum deles tem um compromisso a convocar o empregado a cumprir com seu labor e cumprir uma determinada carga horária, de que não o estabelecimento nem a seguridade de uma remuneração mensal fixa ao trabalhador. Ao empregador, propicia a possibilidade de preencher a demanda da empresa com custos reduzidos, de forma que pode variar a convocação e remuneração dos trabalhadores sem violar a legislação trabalhista brasileira, dado que, anteriormente às alterações da CLT, casos como esses se davam de forma informal, os popularmente conhecidos como “bicos”, e a partir da reforma podem ser realizados com a seguridade da lei.
Com isso, tem-se que a reforma veio com a premissa da formalização dos postos informais de trabalho e da diminuição do desemprego, pelo menos no registro e levantamento, tendo em vista que a contratação no regime intermitente não está diretamente atrelada à prestação de serviços e remuneração integral.
7.2.1 A convocação para prestação dos serviços intermitentes e seus encargos
Conforme salientado anteriormente, o marco do contrato intermitente é a presença de um período para convocação para prestação do trabalho e geração da
contraprestação salarial devida por este. A única segurança presente acerca dessa convocação é o período mínimo que deve ser dado entre a comunicação dela e a data prevista para o serviço, sendo ela de três dias de antecedência de comunicação ao empregado, este tendo um dia para confirmação do aceite.
Sendo em razão da não convocação por parte do empregador, ou do não aceite por parte do empregado, os períodos de inatividade durante o contrato não desconfiguram a presença do vínculo empregatício, isto posto, a relação de subordinação permanece.
Com isso, é possível identificar uma liberdade para o empregado poder aceitar ou não prestar seu labor, o que não ocorre num contrato clássico de emprego. Contudo, há a possibilidade dessa negação gerar uma má impressão ao empregador, que tem a liberdade de escolher quais empregados irá convocar. Assim, o trabalhador tende a estar sempre à disposição do contratante. Nesse sentido, autores como Xxxxxxxx (2017) atentam quanto à ausência de uma delimitação por parte da legislação quanto aos limites de convocação e dos meios utilizados para sua notificação, apontando sua ausência como uma lacuna na lei.
Apesar de não haver uma previsão quanto à frequência de convocação do empregado, há uma multa de 50% da remuneração que seria devida pela prestação do serviço caso alguma das partes rompa com a convocação já aceita. É semelhante à multa por rescisão contratual praticada em contratos por tempo determinado rescindidos antes do prazo estipulado e sem justa causa, que aplicam uma multa de 50% do tempo restante também, contudo, salienta-se a discrepância de seguridades experimentadas entre esse tipo de contrato e o intermitente.
Segundo alguns doutrinadores, como é o caso de Xxxxx Xxxxxx, tal previsão se dá como extremamente desvantajosa para o empregado, dada a possibilidade de, após um longo período se submetendo a disposição do empregador sem a sua
convocação, o empregado se desloque até a empresa com o tempo reservado para efetivação do labor e, diante da desistência do empregador, não o conclua e ainda receba apenas a metade da remuneração a qual acreditava que iria receber (SILVA, 2017). Nesse sentido, o autor invoca o parágrafo 1° do art. 462 da CLT, que veda qualquer desconto no salário do trabalhador que não seja proveniente de dano, correlacionando-o com o prejuízo tido pelo empregado em função do descumprimento por parte do empregador do aceite da convocação de trabalho.
Ainda, segundo Xxxxxxxx Xxxxxx, essa perspectiva fere o princípio da isonomia entre os trabalhadores dado que, num contrato convencional de trabalho, caso o empregado faltasse um dia sem justificativa, seria descontada apenas a remuneração referente a esse dia. Já no regime intermitente, o empregado não apenas deixa de receber, mas ainda paga uma multa ao empregador, como se houvesse um encargo rescisório, ainda que a relação de emprego continue existindo. Nesse sentido, é questionado acerca da constitucionalidade da aplicação de uma indenização aos empregados, de forma que estes podem ficar sujeitos a trabalhar para pagar os valores pecuniários devidos ao empregador, ferindo o direito ao salário mínimo (FRANÇA, 2017).
7.2.1.3 Quanto ao direito de férias e previdência social
No regime intermitente, o empregado tem direito a usufruir, um mês de férias a cada doze meses subsequentes de trabalho, não podendo ser convocado a executar serviço ao mesmo empregador nesse período, contudo, não há previsão quanto à prestação para outras pessoas jurídicas.
Essa não determinação acaba gerando uma ameaça ao direito constitucional do repouso, uma vez que o empregado desse regime contratual, dado a sua constante insegurança financeira, irá procurar outros vínculos empregatícios para complementar sua renda. Como a remuneração para o período de férias é baseada na média dos doze meses anteriores, os quais tiveram remuneração variável em razão das convocações arbitrárias do empregador, o direito às férias se torna ameaçado em razão da não previsibilidade da sua contraprestação remuneratória.
Nesse âmbito, Xxxxxxx aponta que tal lacuna fere o direito do trabalhador de ter seu momento de recuperação, de forma que o contrato de trabalho perde sua função social e se transforma numa ferramenta de manutenção apenas da parte da pessoa jurídica, se distanciando da garantia da dignidade da pessoa humana. (PEREIRA, 2017, p.6).
No mesmo sentido, é importante salientar o, artigo 8º, da Lei 13.467 de 2017,
§ 1º, que versa: “O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho”, assim, tem-se a finalidade do bem estar social como primordial na regência dos contratos de emprego (BRASIL, 2017).
No sentido do direito ao repouso, há também a garantia à previdência social. A lei que rege o contrato intermitente prevê que o empregador deve efetuar o recolhimento da contribuição previdenciária e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma da lei, com base nos valores pagos no período mensal, devendo fornecer ao empregado o comprovante do cumprimento dessas obrigações.
Isto posto, na possibilidade de períodos em que a remuneração devida seja menor do que a referente a um período com o salário mínimo, define que o trabalhador deve complementar a contribuição a fim de atingir o recolhimento mínimo mensal do piso da previdência.
Xxxxxx Xxxxx aponta que essa realidade aplicada ao contrato intermitente, no qual o custeio da previdência por parte do empregado pode ser frequente, seria uma ameaça à constitucionalidade do regime. (XXXXX, 2017, p.41).
O autor argumenta que tal medida equipararia o trabalhador ao patamar de autônomo e aliviaria a responsabilidade do empregador, dado que, caso não haja o complemento do recolhimento previdenciário, ocorre a renúncia ao benefício e à contagem do período de carência, conforme previa o artigo 911-A §2ª da CLT:
§ 2º Na hipótese de não ser feito o recolhimento complementar previsto no § 1º, o mês em que a remuneração total recebida
pelo segurado de um ou mais empregadores for menor que o salário mínimo mensal não será considerado para fins de aquisição e manutenção de qualidade de segurado do Regime Geral de Previdência Social nem para cumprimento dos períodos de carência para concessão dos benefícios previdenciários. (BRASIL, 1943)
Ainda, o Ato Declaratório Interpretativo nº 6/2017, definido pela Receita Federal, explicita que a contribuição complementar seria calculada mediante aplicação da alíquota de 8% sobre a diferença entre a remuneração total recebida em todos os seus contratos e o valor do salário mínimo em vigor, o que se mostrava como um procedimento extremamente burocrático para o trabalhador, conforme estabelecido pelo ato:
Art. 1º A contribuição previdenciária complementar prevista no
§ 1º do art. 911-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a ser recolhida pelo segurado empregado que receber no mês, de um ou mais empregadores, remuneração inferior ao salário mínimo mensal, será calculada mediante aplicação da alíquota de 8% (oito por cento) sobre a diferença entre a remuneração recebida e o valor do salário mínimo mensal. § 1º O recolhimento da contribuição previdenciária prevista no caput deverá ser efetuado pelo próprio segurado até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da prestação do serviço. § 2º Não será computado como tempo de contribuição para fins previdenciários, inclusive para manutenção da condição de segurado do regime geral de previdência social (RGPS) e cumprimento de prazo de carência para concessão de benefícios previdenciários, o mês em que a remuneração recebida pelo segurado tenha sido inferior ao salário mínimo mensal e não tenha sido efetuado o recolhimento da contribuição previdenciária complementar prevista no caput. (BRASIL, 2017)
Assim, observa-se como, tanto no tocante ao direito a férias, quando ao da previdência, a responsabilidade da seguridade do empregado que via de regra, deve ser direcionada ao empregador no contrato de trabalho, é transferida ao empregado que, apesar de estar constantemente numa relação de subordinação, tem responsabilidades equiparadas a de um autônomo, gerando uma ameaça a constitucionalidade do regime intermitente. Embora a MP 808/2017, não foi efetivada no ordenamento, o recolhimento previdenciário segue o entendimento do ato declaratório 6/2017 da Receita Federal.
7.3 AS GARANTIAS PROTETIVAS DO REGIME INTERMITENTE
É direito do empregado em regime intermitente que a sua remuneração não seja inferior ao salário mínimo ou o valor horário daqueles que exercem a mesma função mesmo que em outros regimes de contratação pelo mesmo empregador, dado o princípio da isonomia.
Conforme versa o artigo 452-A da CLT:
Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não. (BRASIL, 2017)
Não há uma previsão em lei para uma jornada mínima para o trabalho intermitente, logo, o empregador tem a liberdade de convocar conforme sua demanda. Há apenas um limite máximo para a jornada, que não deve ultrapassar o estabelecido na Constituição Federal de 44 horas semanais e 220 horas mensais. Disso é resultante uma das maiores críticas ao regime intermitente, dado que este em tese garante uma proporcionalidade remuneratória ao salário mínimo, mas não fixa uma jornada mínima, deixando assim o empregado numa grande incerteza remuneratória.
Por conseguinte, é evidenciada uma omissão quanto à proteção do empregado em relação a sua remuneração líquida e a garantia do repouso. Dado que a Constituição estabelece que o salário mínimo previsto em lei, deve atender às necessidades básicas e cumprir com o necessário a manutenção da dignidade humana do empregado e sua família, a ausência de uma jornada mínima no regime intermitente pode significar um afronte a essa constitucionalidade, gerando um desequilíbrio nos poderes das partes envolvidas na relação trabalhista, a qual o Direito do Trabalho se incube de reger.
8. AS LACUNAS NA REFORMA TRABALHISTA
A Lei da Reforma Trabalhista, que alterou os dispositivos da CLT, teve seu conteúdo alterado pela MP 808/2017 durante o seu período de validade, dado que esta não foi submetida pelo Congresso Nacional e perdeu seu poder de regulamentação. No entanto, ainda que sua atuação tenha se dado de forma temporária, seus efeitos são válidos, dada a reprodução e a motivação destes.
Dentre os textos geridos pela MP, houve a revogação temporária do § 4º do artigo 452-A, incluído pela lei 13.467 de 2017, que prevê perante o aceite da convocação de trabalho e posterior não cumprimento sem justificativa por qualquer uma das partes, a possibilidade de exigir uma multa de 50% da remuneração que seria gerada pelo labor. Assim, identificou-se que a Medida Provisória teve a tentativa de remediar o grande êxtase criado pela polêmica da Reforma Trabalhista, contudo, dada a sua não validação, cabe salientar suas motivações.
Assim, o contrato intermitente carrega consigo vários questionamentos por parte da comunidade jurídica quanto a sua aplicabilidade, dado que se dá como uma grande inovação por parte da Reforma Trabalhista e modifica conceitos antes estabelecidos quanto a formalidade e a informalidade do trabalho. Ampliando as modalidades de contratação, a definição do Contrato Intermitente se encontra no § 3º do artigo 443 da nova CLT, que versa:
§3º Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria. (BRASIL, 2017)
No sentido de refinar os limites da aplicação do regime intermitente de trabalho nos limites da lei, o supracitado artigo 452-A da nova CLT prevê que o
contrato dessa modalidade de contratação deve ser celebrado por escrito, com especificação direta do valor da hora de trabalho, esta não podendo ser inferior nem a média aplicada para o salário mínimo estabelecido em lei, nem a aplicada ao salário dos demais empregados do estabelecimento que executem a mesma função em outras formas de contratação, caso haja a presença destes.
Apesar das tentativas de formalização, uma parte significativa da doutrina aponta que a reforma trabalhista, em especial no tocante ao regime intermitente, atuou na precarização de relações já marginalizadas de trabalho. Isso se dá em razão da incerteza remuneratória que tal contratação reproduz no empregado, que não tem garantia quanto a quando poderá ser convocado pela parte empregadora e, por conseguinte, qual será seu ônus salarial, de forma que pode ou não receber o condizente com o salário mínimo, que é estabelecido levando em consideração as condições mínimas para uma vida salubre, e pode ainda carecer das contribuições previdenciárias para garantir seu direito a afastamentos e prejudicar a possibilidade de uma aposentadoria digna, como é previsto na legislação como uma garantia constitucional de dignidade humana.
O regime intermitente de contratação ainda permite a manutenção de vínculos múltiplos, de forma que o trabalhador pode assinar contrato com diversos empregadores. Em tese, isso viabiliza uma formalização maior do trabalho. Contudo, manter vários contratos se torna uma tarefa difícil, tendo em vista a preocupação de conseguir ou não arcar com as demandas, que são imprevisíveis. Ainda, torna a perspectiva de um possível afastamento por doença ou afins, ainda mais precária, de forma que o empregado se torna refém de uma carga horária inexistente.
Ainda, existem diversas discussões acerca do possível impedimento ao direito a férias. A legislação pós reforma pauta que, no regime de trabalho intermitente, o trabalhador adquire o direito a um mês de férias após cada doze meses sequenciados de prestação de labor. Nesse período, o empregado não pode prestar serviço ao mesmo empregador que propiciou as férias. No entanto, esse gênero de contratação incita a manutenção de vínculos múltiplos para complemento da remuneração do empregado. Com isso, a possibilidade do trabalhador gozar de férias é extremamente limitada, posto que muito dificilmente os vínculos de emprego
estarão em convergência e a convocação nesse período por outro empregador sempre será possível. Assim, o direito ao lazer, uma das garantias fundamentais garantidas no artigo quinto da constituição federal, se torna comprometido.
Xxxxx Xxxxxxxxxx salienta a necessidade latente de uma redução das jornadas de trabalho ao mínimo possível e que as jornadas extensas são pertencentes a um cenário já superado. O autor afirma que a realização de uma carga não prevista, gerando períodos de trabalho extra, configura uma repressão jurídica ao trabalhador, que necessita da mão do Estado pela defesa de uma norma que garanta uma execução delimitada do trabalho para proteção da dignidade humana. Ainda, aponta acerca da unidade da norma jurídica, não podendo assim ser discrepante com o todo constitucional, que deve prezar pela proteção social (PROSCURSIN, 2003, p.320).
O autor ainda aponta que a flexibilidade mutualizada cumpre um meio para suprir as demandas de trabalho do empregador, sendo a redução da jornada um meio também de promoção da responsabilidade social, de forma que insere uma nova visualização acerca dos modelos trabalhistas, facilitando a competitividade sem a agravação de custos e atuando como uma alternativa para a empregabilidade e formalidade.
Nesse sentido, as críticas da doutrina ao contrato intermitente se dão no apoio da premissa de que este rompe com as obrigações contratuais no âmbito do Direito do Trabalho, posto que, gera uma não obrigatoriedade da oferta de trabalho e renda, mesmo mediante a criação de um vínculo trabalhista. Assim, entra em discrepância com a função do contrato de trabalho, que é a seguridade da prestação de serviço sob a contraprestação da remuneração salarial, garantia do exercício da cidadania.
Xxxxx Xxxxx ressalta que essa modalidade de contratação reafirma uma subordinação do contratado diretamente às vontades do contratante, e não ao contrato, postas as lacunas que este proporciona. Para o autor, esse tipo de contrato de trabalho entra em divergência com os requisitos previstos para a configuração de um contrato afirmativo como relação de emprego, explicitados em tópico anterior a
este, que são a subordinação, a pessoalidade, a onerosidade e, em especial, a habitualidade, gravemente não praticada no contrato intermitente, dando que a previsão é de que todos esses requisitos devem ser seguidos a risca e mutuamente para a conservação de um vínculo empregatício (XXXXX XXXXX, 2017, p.85).
Ainda, segundo o autor, a reforma trabalhista tem duas intenções: uma com cunho político estatístico, dado que viabiliza o registro de diversos vínculos de trabalho intermitente, que configuram novos empregados e uma consequente redução do índice de desemprego, mesmo que a realização do trabalho não seja devidamente efetuada e remunerada; e outra com a intenção real de proteção dos direitos trabalhistas, amparado os trabalhadores antes informais numa relação de emprego prevista em lei.
Contudo, ressalta ainda que essa segunda intenção só pode ser efetuada com o preenchimento das lacunas constitucionais que a Reforma Trabalhistas abre, por meio de decretos ou até uma nova reforma. Do contrário, se torna necessária uma intensa atividade integrativa da jurisprudência sobre o funcionamento prático do trabalho intermitente.
Nessa seara, Xxxxx Xxxxx salienta que o Direito do Trabalho tem por premissa a mediação de poderes entre as partes, de forma que as relações humanas são valorizadas em prol da relação de trabalho, e não de encontro a esta. Assim, o trabalho humano deve ser protegido na ótica jurídica pela manutenção do Direito do Trabalho enquanto atuante perante a sua finalidade, que é a premissa do equilíbrio de poderes das partes na pactuação da força produtiva pelo bem estar social coletivo (XXXXX, 2004, p.134).
9. DIREITO COMPARADO
O regime de trabalho intermitente é inédito em solo nacional, contudo, foi aplicado baseando-se em modelos contratuais de logística equivalente administrados em outros países, embora em contextos sociais e econômicos completamente diferentes.
Um desses casos é o da Lei Biaggi, implementada na Itália em 2003. O chamado lavoro intermitente foi lavrado por meio do Decreto Legislativo nº 276/2003 (ITÁLIA, 2003). O objetivo da lei foi aumentar o índice de formalidade no país, segundo Xxxxxxxxx Xxxxxxx, a Reforma Biaggi teve grande importância para o Direito Italiano, uma vez que, a partir dela as relações laborais passaram a ser dotadas de “[...] intensas doses de flexibilidade” (COLUMBU, 2017). Ainda, a Lei Biaggi sofreu alteração dos seus dispositivos, assim como a Lei da Reforma Trabalhista brasileira, e foi parcialmente revogada pelo Decreto Legislativo 81/2015, nomeado Jobs Act.
Ainda segundo a autora, o decreto firma a redefinição do trabalho intermitente em solo italiano quanto a sua intenção, de modo que pode ser identificada uma similaridade quanto a justificativa do modelo contratual na reforma trabalhista brasileira:
O trabalhador se coloca à disposição de um empregador que pode utilizar a prestação de trabalho deste de forma descontínua ou intermitente, segundo as exigências indicadas pela contratação coletiva, com referência também à possibilidade de desempenhar as prestações em períodos pré- estabelecidos ao longo da semana, do mês ou do ano. (COLUMBU, 2017).
Assim, o regime intermitente brasileiro e italiano, condizem no tocante à prestação do trabalho pelo empregado de forma descontínua e eventual, de forma que o empregador que controla quando irá convocar a efetivação do serviço conforme sua demanda. No entanto, a versão italiana do regime é mais afunilada e restrita em sua aplicação do que a brasileira. Possui restrição de idade para o contratado, este tendo que ter entre vinte e cinco e cinquenta e cinco anos na contratação, sendo a razão de ser, ou a ratio legis, a intenção de promover a formalidade trabalhista para essa faixa etária, dado que é onde se encontra o maior nível de desemprego no país.
O contrato deve ser escrito e ainda há a possibilidade de manter uma eventualidade predeterminada para a execução dos serviços, podendo ser semanal,
mensal ou anual. Na falta de uma negociação coletiva, o Ministério do Trabalho Italiano entra com a verificação da constitucionalidade do pacto. Caso o empregado efetue a prestação de trabalho por um período superior a quatrocentos dias em um intervalo de até três anos para o mesmo empregador, o contrato se transforma em integral por prazo indeterminado, com exceção aos empregados em setores de turismo, exercício público e entretenimento, que são mais esporádicos e podem superar esse período. Sendo esse controle uma forma de evitar a marginalização do trabalhador quanto ao vínculo empregatício.
Portugal também possui o registro do trabalho intermitente, implantado pelo Código do Trabalho de 2009, com a regulamentação do regime presente nos artigos 157 e 160. Semelhante ao reproduzido na versão brasileira, o código aponta:
Artigo 157.º Admissibilidade de trabalho intermitente 1 - Em empresa que exerça atividade com descontinuidade ou intensidade variável, as partes podem acordar que a prestação de trabalho seja intercalada por um ou mais períodos de inatividade. 2 - O contrato de trabalho intermitente não pode ser celebrado a termo resolutivo ou em regime de trabalho temporário. (PORTUGAL, 2009)
Contudo, o código português possui mais medidas protetivas ao trabalhador, de forma que este recebe uma compensação nos períodos de inatividade, motivando o empregador a manter uma fidelidade na convocação dos seus empregados:
Artigo 160.º Direitos do trabalhador 1 - Durante o período de inactividade, o trabalhador tem direito a compensação retributiva em valor estabelecido em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou, na sua falta, de 20 % da retribuição base, a pagar pelo empregador com periodicidade igual à da retribuição. 2 - Os subsídios de férias e de Natal são calculados com base na média dos valores de retribuições e compensações retributivas auferidas nos últimos 12 meses, ou no período de duração do contrato se esta for inferior. 3 - Durante o período de inatividade, o trabalhador pode exercer outra atividade. 4 - Durante o período de inatividade, mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes que não pressupõem a efetiva prestação de trabalho. 5 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto nos n.os 1 ou 2. (PORTUGAL, 2009)
Assim, observa-se uma maior preocupação em assegurar a efetividade do regime intermitente contra o desemprego e seus efeitos sociais não de forma estatística, mas efetuada pela manutenção das relações humanas e de trabalho, de modo que o empregado esteja menos sujeito a uma incerteza remuneratória.
No Reino Unido também há a presença do regime intermitente para flexibilização das relações de trabalho, instaurado por meio do chamado zero hour contract, ou contrato zero hora, sendo este o modelo mais semelhante ao aplicado no Brasil.
Segundo Xxxx Xxxxx e Xxxxxx Xxxxxx, a expressão “contrato zero hora” é um termo coloquial para um contrato de trabalho sob o qual o empregado não tem garantia de efetiva-lo e é pago apenas pelo trabalho realizado, o qual não pode prever ou decidir, de forma que o empregado está sempre a disposição do empregador, mas sem nenhuma garantia de emprego (PYPER e HARARI, 2013).
Segundo Xxxxxxxx Xxxxx, dado que o Reino Unido possui o modelo intermitente mais semelhante ao adotado pelo Brasil e um contexto socioeconômico latentemente diferente, percebe-se como tal adoção precariza as relações de trabalho e pode ser ainda mais prejudicial em solo brasileiro, posta as ausências de garantias remuneratórias ao empregado. A autora aponta ainda que o modelo mais viável para o Brasil, visando promover uma maior seguridade ao empregado, seria o modelo Português, onde o trabalhador é dotado de uma garantia mínima assegurada pelo contrato quanto a sua atuação e, por conseguinte, sua remuneração (KALED, 2019).
No entanto, a doutrina brasileira no geral se divide quanto ao regime intermitente. Existem argumentos favoráveis e desfavoráveis a sua aplicação, divergindo tanto em relação à presença ou não da constitucionalidade na reforma, quanto a divergência entre a presença de uma precarização, ou de uma flexibilização das relações de trabalho, o que será abordado no próximo tópico.
10. O CONTRATO INTERMITENTE NA JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA
É possível visualizar diversos julgados demandados por empregados brasileiros em regime intermitente, especialmente no tocante à reivindicação de garantias trabalhistas e pedidos de descaracterização do contrato, enquanto tal modalidade e adequação do mesmo a contrato convencional. Isso se dá devido a abertura de brechas possibilitadas pelo texto que rege a legislação do próprio regime intermitente.
Postas as não previsões de algumas garantias trabalhistas e a divergência com o garantido em relação a outras na constituição, a aplicação desse gênero de contrato pode ser desprovida de uma equidade de poderes das partes, dificultando a regência do Direito Trabalhista em seu âmbito.
Conforme colocado anteriormente, o Direito tem em seu cerne a aplicação enquanto unidade. Sendo a Constituição Federal a norma máxima da legislação nacional, todas as normas menores devem ser regidas em sua abrangência, assim, matérias divergentes da norma constituinte não têm potencial de aplicabilidade. Isto posto, os direitos e deveres garantidos na CF não podem ser retroagidos por normativa menor alguma.
Dado a identificação de possíveis divergências da aplicação prática do contrato intermitente com as garantias constitucionais, processos judiciais têm sido criados neste sentido desde a implementação do regime intermitente na legislação brasileira, conforme se observa na ementa do Processo TRT/SP, Nº 1000806- 40.2020.5.02.0065, 13ª Turma, com origem na 65ª Vara do Trabalho de São Paulo:
CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE (ART. 452-A DA CLT). AUSÊNCIA DE REQUISISTOS LEGAIS. NULIDADE. O
ART. 452 -A da CLT determina como requisito legal necessário que o contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito, com indicação do valor da hora trabalhada. No caso, tal documento não foi juntado aos autos. Dessa forma, o contrato de trabalho intermitente deve ser considerado como contrato de
trabalho celebrado por prazo indeterminado, pois ainda vigente. Recurso ordinário em rito sumaríssimo da reclamada ao qual se nega provimento. (SÃO PAULO, 2021)
Na peça citada, a reclamante alegou que, apesar do contrato ser de regime intermitente, sua prestação de serviços como operadora de caixa era dada de forma contínua e sem períodos de inatividade. Dado a mesma ter se tornado gestante, requereu a nulidade do contrato intermitente para contrato indeterminado e o pagamento dos salários referentes à estabilidade gestante:
Narra a exordial que a reclamante foi contratada em 01/04/2020 para laborar como Operadora de Caixa, na modalidade de contrato de trabalho intermitente. Aduz que foi convocada nos meses de abril e junho, todavia, no início de julho descobriu que estava grávida desde meados de maio de 2020, não tendo sido mais convocada para o trabalho. (SÃO PAULO, 2021)
A contratante reclamada contrapôs a nulidade do contrato pactuado entre as partes, alegando que a legislação não prevê parâmetros temporais para a inatividade, mesmo que a contratada não tenha sido mais convocada após o conhecimento de sua gravidez. Contudo, foi negada a solicitação da reclamada:
Ab initio, ressalto que nos termos do art. 452-A da CLT o contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito, com indicação do valor da hora trabalhada, contudo, tal documento não foi juntado aos autos. Ademais, não é razoável que uma empresa registre um empregado de forma intermitente e deixe de convocá-lo para o labor, ad eternum, pelo tempo que lhe aprouver [...] Pelo exposto, considero que o contrato de trabalho celebrado foi por prazo indeterminado. (SÃO PAULO, 2021)
Contudo, é importante salientar que nem sempre o empregado tem a possibilidade de recorrer judicialmente, dado as amarras financeiras que o impossibilitam de poder cogitar interromper seu posto de trabalho. Quando recorre, em razão das brechas que a nova CLT deixa em relação ao regime intermitente, nem sempre terá êxito em sua reclamação. Assim, subentende-se uma subnotificação de trabalhadores em situação de subemprego, como é identificado na
ementa do Recurso Ordinário nº 1000492-31.2021.5.02.0204, com origem na 1º Vara de Cotia, Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo:
O regime jurídico do trabalho intermitente, embora não fixe tempo máximo de inatividade, não autoriza que o empregador mantenha o contrato indefinidamente, sem nunca convocar o empregado para prestar serviços, sob pena de abusar da liberdade de convocação, conforme sua conveniência e oportunidade e, com isso, causar dano moral ao empregado, que, em virtude da boa-fé objetiva, se mantém na eterna expectativa de ser convocado. (SÃO PAULO, 2021)
Nesse caso, a reclamante exigiu a rescisão indireta do seu contrato, posto que este foi celebrado e nunca houve uma convocação para efetuar o labor. Apoiada na brecha que a legislação do regime intermitente abre quanto a não delimitação dos períodos de inatividade, a reclamada alegou que não era obrigada a convocar todos os funcionários contratados nesse regime e que estaria protegida pela legislação vigente, contudo, o Ministério decidiu pelo pagamento do valor devido pela rescisão indireta, bem como uma indenização por danos morais por parte da reclamada:
A Juíza entendeu que a reclamada, ao não convocar a reclamante para trabalhar, descumpriu as obrigações do contrato ( CLT, art. 483, d) e, por isso, acolheu o pedido de rescisão indireta (fls. 400/405 - Id 229bf5d). Por consequência, também condenou a reclamada a pagar indenização por dano moral. (SÃO PAULO, 2021)
Com isso, evidencia-se uma indagação acerca do papel social do contrato de trabalho no regime intermitente, gerando divergências acerca da interpretação na limitação da aplicabilidade do seu texto.
Dado os julgados acima invocados, reitera-se o questionamento acerca da constitucionalidade do regime intermitente, este em seus moldes atuais. Nesse sentido, o próximo tópico invoca os posicionamentos de alguns doutrinadores brasileiros nessa seara.
11. A DOUTRINA BRASILEIRA E O TRABALHO INTERMITENTE
Nessa modalidade de contrato, a prestação de serviços não se dá de uma forma contínua, apesar de haver uma relação de subordinação do empregado ao empregador, dado que a relação de emprego se mantém nos períodos de ociosidade, diferindo a descontinuidade da não eventualidade.
Ao empregador, há a possibilidade de manter uma gama de contratados, convocados e remunerados conforme sua demanda, gerando uma redução de gastos. Assim, o modelo de contratação intermitente serve para suprir os casos em que há uma demanda imprevisível de trabalho, promovendo a formalização dos envolvidos nesse âmbito. Caso a demanda seja previsível, o contrato convencional deve ser aplicado.
Conforme Xxxxx Xxxxx (2018), na legislação da reforma trabalhista a preocupação se deu em manter um registro de vínculo formal de emprego contínuo, mesmo que o trabalho não o seja. Assim, a lei do contrato intermitente gere intrinsecamente a existência de períodos de inatividade e rigorosamente trata esses períodos como suspensão contratual e não de ruptura, já que não incumbe ao empregador nenhuma seguridade ao empregado durante a inatividade.
Já Xxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxxxxx (2017), ressaltam que tal modalidade contratual, da forma que foi estruturada na legislação brasileira, viola os princípios basilares do direito do trabalho, que são a noção de duração do trabalho e da jornada e a noção de salário propriamente dito, as seguridades que o trabalhador recebe em troca da sua mão de obra prestada.
Ainda conforme os autores, o anseio pela reforma trabalhista se configura enraizado há muito tempo no cenário do empresariado brasileiro, porém não concretizado em outrora por uma falta de força política disposta a arcar com as repercussões negativas em cunho popular. Contudo, com as lacunas abertas diante de um momento político conturbado vivenciado durante a sua instauração,
conseguiu ser aprovada, dado que provavelmente que com outro cenário político, não seria.
Segundo os autores, o contrato intermitente mediado pela reforma confere um rebaixamento do valor do trabalho na economia e na sociedade brasileira, reduzindo as relações de emprego a uma prestação de serviços crua, sem a caracterização de uma relação humana. Ainda ressalta que a nova modalidade de contratação gera uma concorrência desleal no mercado, e pode incitar empregadores a abandonarem cada vez mais os contratos convencionais, com uma assistência maior ao empregado, para acompanharem seus concorrentes com o uso do regime intermitente de forma discriminada, gerando uma crise esquematizada do Direito do Trabalho Brasileiro.
Já, Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxx, o regime intermitente atinge diretamente a categoria dos trabalhadores do lazer, que já possuem jornadas excessivas e informais, como em bares e restaurantes, agravando sua instabilidade salarial e ainda os motivando a estabelecer vínculos empregatícios múltiplos no esforço de gerar uma base de seguridade ao próprio sustento (LIMA e LIMA, 2017, p.63).
Os mesmos autores ainda atentam para a ameaça de direitos constitucionalmente garantidos, como 13º salário, férias, fundo de garantia por tempo de serviço e repouso semanal remunerado, que, dada a carga horária de trabalho não ser garantida e previsível, também se tornam incertos, dando que são equivalentes ao tempo trabalhado. Assim, a imprevisibilidade remuneratória e da seguridade acarretam uma incerteza ao trabalhador, que não pode se planejar e está sempre refém dos seus vínculos.
Nesse sentido, Xxxxx Xxxxx (2018), aponta a desestruturação do tempo de serviço na assinatura do contrato intermitente em carteira. Dado que o vínculo se mantém e o contrato não é rompido no seu registro, porém a convocação ao trabalho não é obrigatória, bem como a remuneração e o recolhimento previdenciário pelo empregador também não, a seguridade previdenciária se torna marginalizada, posto que o próprio registro do tempo de serviço se dá de forma abstrata.
Nessa seara, Xxx Xxxxxxx aponta o princípio da proteção como o mais importante dos pilares do Direito Trabalho quanto à intervenção pela tutela do trabalhador, e identifica nas flexibilizações não pesadas, como a da Reforma Trabalhista, uma ameaça a essa garantia. Segundo o autor, a competitividade entre empresas gerada pelo baixo custo desse gênero de contratação implica em um corte de gastos que é demandado do trabalhador, a parte mais fraca do contrato. Assim, numa perspectiva neoliberal, a intermitência propõe um livre jogo de mercado, mas não auxilia na resolução do desemprego, apenas o precariza no tocante às relações trabalhistas (BELTRAN, 2003, p.195).
Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxx (2017), aponta que a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho se posiciona contra o contrato de trabalho intermitente, em vista da ausência de garantia do recebimento do salário mínimo legal e execução da função contratada, violando o artigo 7º, inciso IV da Constituição Federal, que dispõe que os trabalhadores urbanos e rurais têm direito ao salário mínimo fixado em lei, nacionalmente unificado, que deverá ser suficiente para prover as necessidades vitais básicas tanto do trabalhador, quanto de sua família.
Na perspectiva do mesmo autor, o trabalho intermitente iguala o trabalhador a uma máquina, que é ligada e desligada conforme a demanda.
Dessa forma, o risco da atividade, que em tese é responsabilidade do empregador, é transferida ao empregado, ofendendo a Constituição Federal, que estabelece como fundamento do Estado Democrático de Direito o valor social do trabalho, versando que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, e ainda o artigo 170 do mesmo diploma, que prevê o princípio da valorização do trabalho humano, em que se funda a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, que tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.
Dados os posicionamentos dos doutrinadores acima, subentende-se que uma das soluções para minimizar os impactos negativos, do contrato de trabalho
intermitente, dada a sua premissa de flexibilização e incentivo ao emprego, seria prever uma garantia mínima de salário ou de número de horas trabalhadas no texto legal, como ocorre na norma trabalhista portuguesa, gerando uma previsibilidade e seguridade ao empregado, que não ficaria refém da demanda do empregador e seus interesses obstantes.
Com tal previsão, os poderes das partes seriam mais bem equilibrados, cumprindo com a função do Direito do Trabalho na manutenção das relações de emprego e com a premissa da reforma de flexibilizar e reduzir os custos de contratação, de forma que a segurança jurídica teria uma maior atuação tanto para o trabalhador, quanto para o contratante.
12. A CONSTITUCIONALIDADE
Para tecer a exposição acerca da análise da constitucionalidade do contrato intermitente, é inexorável explorar os parâmetros que definem o controle desta. Isto posto, no próximo tópico do presente trabalho seguem o conceito da constitucionalidade, bem como os instrumentos utilizados pelo Estado para sua determinação, tendo em vista a legislação brasileira.
12.1 O conceito da Constitucionalidade e seu procedimento
Entende-se por constitucional aquilo que trabalha da forma regida pela constituição. Na perspectiva de Xxxx Xxxxxx, a constituição pode ser entendida como a norma maior do Estado, sendo ela a validação das normas menores e inferiores. Segundo o autor, a legalidade de uma norma é definida tendo em mente a validade das outras normas existentes, prezando assim pelo princípio da hierarquia, de forma que a norma maior valida as inferiores a ela (KELSEN, 2009).
Nesse sentido, há a norma fundamental, a lei de grau mais elevado e de validade inquestionável em seu solo. No Brasil, essa norma é a Constituição Federal. Sendo ela a norma positiva fundamental, é o parâmetro de validade das leis
ordinárias, sendo as apontadas nos tópicos anteriores algumas delas. Assim, tem-se que todas as leis infraconstitucionais devem ser interpretadas sob a luz do ordenamento jurídico como um todo unitário, sendo este regido pela Constituição.
Salienta-se que já houve outras constituições no Brasil, dado o caráter temporal do Direito, estas tiveram seu conteúdo atualizado devido os momentos político-sociais vivenciados no país. A Constituição em vigência atualmente teve sua promulgação em 1988 e foi popularizada como a Constituição Cidadã, dado seu caráter de redemocratização do país quando promulgada. Ainda, para alterá-la é necessário uma emenda constitucional aprovada em dois turnos pelas duas casas do Congresso Nacional.
Segundo Pravato, essa rigidez adotada quanto a possíveis atualizações é uma tendência nas constituições mais recentemente promulgadas como uma ação dos legisladores em prol da defesa do Estado Democrático de Direito, de forma que mesmo eles só podem alterar a norma fundamental por meio de um processo solene, garantindo a democracia representativa. Assim, combatem-se os imperialismos e as ditaduras, de forma que os direitos fundamentais dos cidadãos são incorporados a sua Constituição regente. (PRAVATO, 2017, p. 3)
Nesse sentido, dada a unidade do ordenamento jurídico, tem-se que os atos administrativos inconstitucionais devem ser anulados assim que o seu caráter é atestado, sendo esse controle uma manutenção da supremacia da Constituição. Conforme Maluf, quando houver conflitos normativos entre a lei ordinária ou ato administrativo, de forma expressa ou implícita, o disposto no conteúdo constitucional prevalece, declarando-se as leis ordinárias incongruentes como inconstitucionais e, logo, nulas (MALUF, 2012).
Tais discordâncias podem acontecer quando há a criação de uma lei sem que se atente ao processo legislativo constitucional, ou ainda por meios materiais, quando o conteúdo ou a ação da lei ordinária entra em incongruência com os preceitos protegidos constitucionalmente.
12.2 Os métodos de classificação da Constitucionalidade
Conforme Peghini, no Brasil é possível vislumbrar dois métodos para o controle da constitucionalidade: o difuso e o concentrado. Sendo o primeiro aquele que pode ser exercido por qualquer magistrado de primeiro grau ou tribunal de forma incidental. Ou seja, frente a determinada demanda judicial, o tribunal ou juiz analisa o teor da constitucionalidade antes de analisar o objeto principal do julgado quando usando do controle difuso, pesando se afasta ou aplica a norma no caso em específico, tendo em vista a finalidade da lei. Nesse sentido, invoca-se o princípio da supremacia da Constituição, dado que sua norma é juridicamente superior às demais, invocando assim o poder de análise das demais normas inferiores criadas e editadas (PEGHINI, 2018).
Na perspectiva de Xxxxxx, esse modelo gera críticas acerca de uma ameaça à segurança jurídica, de forma que a abertura para apontamentos de inconstitucionalidade a juízes de primeiro grau gera uma incerteza jurídica acerca da aplicação da norma. Contudo, salienta que tais interpretações aproximam o cidadão do reconhecimento do seu direito em sua própria comarca, sem ter que se submeter a aguardar o Supremo Tribunal Federal, assim, aproxima o Direito de sua aplicação social (PASSOS, 2014).
Já no método do controle concentrado, não há a necessidade de um caso concreto para análise comparativa da inconstitucionalidade da lei ou ato normativo. Diferentemente do controle difuso, que faz a invalidação da norma em uma especificidade, o controle concentrado declara a nulidade e retirada da norma tida como inconstitucional de todo o território de atuação do sistema jurídico em questão, retirando todo o seu poder de aplicação.
Alguns doutrinadores como Xxxxxxxx Xxxxxx o quão importante é o controle de constitucionalidade não aguardar a aprovação e atuação da lei, devendo ser feito antes da sua elaboração ainda, de forma preventiva, por meio da Comissão de Constituição e Justiça no congresso, ou ainda pelo chefe do executivo através de vetos, em casos de irregularidades identificadas (XXXXXXXX XXXXXX, 2012).
Caso a ação preventiva não seja perspicaz o suficiente, entra a ação repressiva: a declaração de inconstitucionalidade do Poder Judiciário. Contudo, dado que cabe ao Supremo Tribunal Federal julgar o controle concentrado, sua atuação se dá em leis e atos normativos federais e estaduais, cabendo apenas o controle difuso às normativas municipais, assim, o autor aponta como o sistema tende a afunilar a análise da norma, de forma que se enquadre dentro da unidade do ordenamento jurídico
Quando não há o devido controle de constitucionalidade da lei e esta se torna dotada de lacunas, constantemente ocorrem entraves entre seu texto e sua aplicação. Assim, por mais que a letra da lei possa não estar explicitamente em choque com a CF, sua aplicação pode gerar atos inconstitucionais, com isso, se torna imprescindível versar a finalidade da norma jurídica. Conforme citado anteriormente, quando há divergência da legislação em seu material prático com o conteúdo constitucional, seus efeitos devem ser anulados.
Assim, os julgados são realizados por uma análise da finalidade da lei e do Direito em si, conforme colocado nas jurisprudências supracitadas acerca do Contrato Intermitente, material de estudo do trabalho aqui exposto. Isto posto, conclui-se que houve um controle da constitucionalidade por parte dos magistrados, mediante a análise dos limites da aplicação do contrato, em resposta a uma ofensa às garantias trabalhistas dos empregados.
13. CONCLUSÃO
O objetivo do presente trabalho foi analisar o texto legislativo referente ao trabalho intermitente, na ótica da preservação do Direito enquanto unidade e da constitucionalidade da Reforma Trabalhista, indagando acerca da finalidade social da lei.
O estudo realizado mediante o aporte teórico permite concluir que, na legislação atual, o regime intermitente brasileiro participa mais enquanto agente precarizante das relações de trabalho, do que como solução a baixa empregabilidade. Sendo apenas um paliativo para os índices de desemprego, mediante a pseudoformação de vínculos trabalhistas em relações de subemprego, desequilibra a atuação do Direito do Trabalho na mediação das partes, de forma que gera uma subordinação por parte do empregado, sem uma garantia de contraprestação por parte do empregador.
Apesar de configurar uma facilidade para a contratação por parte das empresas, não significa diretamente que haverá uma maior oferta de prestação de serviço. Ainda, fere várias garantias constitucionais inerentes ao Direito Trabalhista, de forma que dá um tom de formalização ao emprego informal, mas sem a contraprestação envolvida nesse processo. Rompe com a previsibilidade da duração da jornada de trabalho e da remuneração, gerando uma incerteza salarial e da própria convocação ao trabalho. Ainda, cria o conceito de tempo à disposição do empregador sem os efeitos jurídicos do tempo à disposição conforme previsto na CLT (XXXXXXX e DELGADO, 2017, p.154-155).
Por ser um novo modelo de contratação, seus efeitos podem ser maiores ainda no que diz respeito a outros gêneros de contrato. Isto porque pode levar empregadores do modelo convencional a adotarem o regime intermitente em razão da ameaça provida pelos seus concorrentes optantes pelo modelo. Assim, põe em cheque o valor do trabalho e as garantias constitucionais do trabalhador, que se torna refém de um vínculo sem ônus garantido (XXXXXXX e XXXXXXX, 2017, p.156).
A parcela defensora do regime intermitente invoca que o mesmo formaliza os trabalhadores que vivem na informalidade, provendo a eles uma gama de garantias e seguridade. De fato, para os que já laboram sob convocação descontínua, é um grande avanço ter a proteção da lei. Contudo, salienta-se que, dada a possibilidade de transgredir postos de trabalho tradicionais a trabalho por convocação, a previsão da remuneração do trabalhador pode se tornar cada vez mais incerta.
Conclui-se que o texto regente do contrato intermitente não é aplicável a sua finalidade, a flexibilidade das relações de emprego em prol do seu estímulo de criação, dado que gera vínculos trabalhistas às custas das desvalorização do direito ao trabalho enquanto preservação da dignidade do cidadão, o que configura uma normalização do subemprego. Baseado especialmente no modelo do Reino Unido, o contrato intermitente se frustra em solo brasileiro em suas condições socioeconômicas extremamente discrepantes, posto o não estabelecimento de delimitações ao empregador e garantias ao empregado, como praticado no contrato Português, que é o modelo notoriamente mais indicado a realidade brasileira.
Contudo, a necessidade de uma Reforma Trabalhista no Brasil se mostra latente, dada a modernização das relações de trabalho. Com isso, conclui-se que o regime intermitente necessita de uma revisão em seu texto legislativo, de forma que sua aplicação possa ser afunilada e garanta os direitos individuais das partes envolvidas no contrato, para que a subordinação contratual não adquira um caráter autoritário. Ainda, reitera-se a necessidade da participação da sociedade nesse processo, especialmente das representações coletivas e sindicais, dado seu potencial enquanto interlocutores.
Dos pontos necessários de revisão, se frisa o estabelecimento de uma quantidade mínima de horas pagas de forma semanal ou mensal, de forma que casos de não convocação e frustração da expectativa de trabalho, como as jurisdições supracitadas, não sejam recorrentes. Também é necessário um período máximo estabelecido para a prestação de trabalho intermitente a um mesmo empregador, de forma que, caso este seja superado, o contrato se transforme em indeterminado, como é estabelecido em contratos por tempo determinado que superem seu prazo. Ainda, é imprescindível que o labor prestado em regime
intermitente não seja contínuo, garantindo assim que o mesmo não gere uma ameaça à empregabilidade plena.
A relação de emprego não pode perder a valorização do trabalho, garantindo ao trabalhador uma previsibilidade salarial e de carga horária, para a manutenção da sua dignidade enquanto cidadão. A flexibilização da legislação não deve impedir os direitos conquistados e garantidos na constituição de serem consumados, cabendo ao legislador prezar pelo fim social da lei, bem como a proteção do empregado, reiterando o Direito do Trabalho em sua finalidade e o Direito em sua unidade.
REFERÊNCIAS
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