PARECER N.º 1817 GPSG/10
PARECER N.º 1817 GPSG/10
Origem: Agência Goiana de Transportes e Obras Públicas - AGETOP Interessada: Construtora Caiapó Ltda.
Assunto: Contrato - Dispensa de Licitação Conselheiro: Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx: Xxxxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxxxxxxx Xxxxxxx
DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA SITUAÇÃO EMERGENCIAL. BDI TABELADO E EXCESSIVO. PRAZO CONTRATUAL SUPERIOR AO LIMITE LEGAL. PREÇOS SUPERFATURADOS. AQUISIÇÃO "CASADA" DE BENS E SERVIÇOS. CONCESSÃO ILEGAL DE INCENTIVOS FISCAIS. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO CONFAZ. OFENSA AO PACTO FEDERATIVO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA VANTAJOSIDADE PARA A ADMINISTRAÇÃO. RENÚNCIA DE RECEITAS.
I - RELATÓRIO
1. Versam os presentes autos acerca do Contrato para a construção das instalações físicas (prédio industrial) da pessoa jurídica "CAOA Montadora de Veículos S.A.", no município de Anápolis, neste Estado, mediante dispensa de licitação, nos termos do Despacho n.º 003/2004-CPL, às fls. 090/093-TCE.
2. Antes, o Estado de Goiás firmou protocolo de intenções (fls. 005/010-TCE) com a pessoa jurídica "CAOA Montadora de Veículos S.A.", a fim de que esta empresa construísse uma unidade de fabricação e montagem de veículos automotores neste Estado.
3. Para viabilizar o projeto, o Governo Estadual concedeu inúmeros benefícios àquela empresa, tais como a isenção de tributos; créditos presumidos de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços); fornecimento de infra-estrutura (fornecimento de instalações elétricas e de saneamento básico), bem como a doação da área imobiliária e do "prédio pré-operacional" (sic). Assim, as obras de construção das instalações da montadora de veículos motivaram o presente Contrato.
4. Posteriormente, a Inspetoria desta Corte de Contas no município de Anápolis, por meio do Relatório de Inspeção n.º AN-01/2006 (fls. 362/400-TCE), detectou dezenas de irregularidades na celebração do Contrato e na execução das obras. Dentre os principais vícios elencados por aquela representação regional do TCE/GO estão: 1) a ausência de elementos tipificadores da dispensa de licitação; 2) a insuficiência e a ineficácia da planilha orçamentária com a cotação de valores superfaturados e em duplicidade; 3) medições superiores aos serviços efetivamente executados com a constatação de prejuízos ao erário; 4) prorrogação ilegal do prazo de vigência do Contrato, dentre outras.
5. Assim, após a sua devida intimação, a Procuradoria Geral do Estado de Goiás (PGE) apresentou a documentação, às fls. 415/590-TCE, anexando cópia de partes do Edital de Licitação n.º 018/05, referente à pavimentação asfáltica de diversas rodovias estaduais, sem, contudo, justificar a necessidade de juntada de tal procedimento aos autos.
6. Após isto, a Segunda Divisão de Fiscalização de Engenharia, responsável pela supervisão da Inspetoria Regional de Anápolis, considerou que a argumentação trazida aos autos pela PGE não se prestou a afastar as numerosas irregularidades evidenciadas. Desta feita, às fls. 598/629-TCE, aquela Divisão pugnou pela aplicação de multa para cada um dos fatos ilícitos comprovados, com a declaração de nulidade do Contrato analisado, bem como o encaminhamento de cópia dos autos à Procuradoria Geral de Justiça, para que, querendo, promovesse as ações cíveis e penais cabíveis.
7. Por seu turno, esta Procuradoria Geral de Contas, por meio do Despacho n.º 2.606 PGC/2007 (fls. 629/647-TCE), solicitou esclarecimentos acerca de diversas
questões envolvendo a contratação específica e o ajuste entre o Estado de Goiás e a montadora de veículos, com a juntada de documentação pertinente.
8. Em nova manifestação, este Parquet (fls. 2.271/2.289-TCE), após análise da documentação juntada, levantou novos questionamentos acerca do objeto dos autos, pugnando pela aplicação de multa ao responsável legal pela Secretaria da Indústria e Comércio, em virtude do não atendimento das determinações desta Corte de Contas. Dentre as dezenas de ilegalidades cometidas, está a ausência de celebração convênio com o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) para a concessão dos incentivos fiscais por parte do Estado de Goiás.
9. Por fim, após inúmeras diligências, as quais resultaram na juntada de centenas de folhas ao processo, retornam os autos a esta Procuradoria Geral de Contas, para a sua indispensável manifestação.
10. É o relatório.
II - FUNDAMENTAÇÃO
11. Preliminarmente, convém destacar que o presente processo refere-se ao procedimento de dispensa de licitação adotado pela Agência Goiana de Transportes e Obras Públicas (AGETOP), com o fim de contratar empresa especializada para a construção do prédio industrial da pessoa jurídica "Caoa Montadora de Veículos S.A.", no município de Anápolis, neste Estado.
12. Não obstante, constam dos autos diversas informações acerca do protocolo de intenções firmado entre o Estado de Goiás e aquela empresa, para a implantação de uma fábrica de veículos automotores em território estadual.
13. Assim, foram detectadas dezenas de irregularidades na contratação sob análise, bem como na forma de concessão de incentivos fiscais e financeiros à "CAOA Montadora de Veículos S.A.". Desta feita, passa-se em seguida à análise dos vícios presentes nos autos.
1) Da Dispensa Indevida de Licitação
14. A licitação é o procedimento administrativo pelo qual a Administração Pública demonstra a necessidade em contratar com o particular, facultando aos interessados a apresentação de propostas para o oferecimento de bens e de serviços necessários à consecução de seus fins.
15. A Constituição Federal de 1988 estabelece que a licitação é a regra para a Administração Pública, determinando em seu art. 37, inciso XXI, o seguinte:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (...)
16. Percebe-se, da leitura do artigo acima transcrito, que o Constituinte de 1988 permitiu que a lei pudesse criar situações, nas quais não seria obrigatória a realização de procedimento licitatório para a contratação com a Administração Pública.
17. Isto se deve ao fato de que em situações extremas, nas quais a licitação é inviável de ser realizada, não pode a Administração Pública ficar impedida de contratar com o particular, deixando de adquirir bens e serviços necessários aos interesses públicos.
18. Neste sentido, a Lei n.º 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos Públicos) estabeleceu as situações em que a licitação poderá ser dispensada e, ainda, os casos em que ela é inexigível. Assim, o art. 24 da referida Lei prevê o seguinte:
Art. 24. É dispensável a licitação:
I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do
limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)
II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez;
III - nos casos de guerra ou grave perturbação da ordem;
IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;
V - quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condições preestabelecidas;
VI - quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento;
VIII - para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado;
IX - quando houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional;
X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia;
XI - na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em conseqüência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido;
XII - nas compras de hortifrutigranjeiros, pão e outros gêneros perecíveis, no tempo necessário para a realização dos processos licitatórios correspondentes, realizadas diretamente com base no preço do dia;
XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos;
XIV - para a aquisição de bens ou serviços nos termos de acordo internacional específico aprovado pelo Congresso Nacional, quando as condições ofertadas forem manifestamente vantajosas para o Poder Público;
XV - para a aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada, desde que compatíveis ou inerentes às finalidades do órgão ou entidade.
XVI - para a impressão dos diários oficiais, de formulários padronizados de uso da administração, e de edições técnicas oficiais, bem como para prestação de serviços de informática a pessoa jurídica de direito público interno, por órgãos ou entidades que integrem a Administração Pública, criados para esse fim específico;
XVII - para a aquisição de componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira, necessários à manutenção de equipamentos durante o período de garantia técnica, junto ao fornecedor original desses equipamentos, quando tal condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia;
XVIII - nas compras ou contratações de serviços para o abastecimento de navios, embarcações, unidades aéreas ou tropas e seus meios de deslocamento quando em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação operacional ou de adestramento, quando a exiguidade dos prazos legais puder comprometer a normalidade e os propósitos das operações e desde que seu valor não exceda ao limite previsto na alínea "a" do inciso II do art. 23 desta Lei:
XIX - para as compras de material de uso pelas Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante parecer de comissão instituída por decreto;
XX - na contratação de associação de portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão- de-obra, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.
XXI - Para a aquisição de bens destinados exclusivamente a pesquisa científica e tecnológica com recursos concedidos pela CAPES, FINEP, CNPq ou outras instituições de fomento a pesquisa credenciadas pelo CNPq para esse fim específico.
XXII - na contratação de fornecimento ou suprimento de energia elétrica e gás natural com concessionário, permissionário ou autorizado, segundo as normas da legislação específica;
XXIII - na contratação realizada por empresa pública ou sociedade de economia mista com suas subsidiárias e controladas, para a aquisição ou alienação de bens, prestação ou obtenção de serviços, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.
XXIV - para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão.
XXV - na contratação realizada por Instituição Científica e Tecnológica - ICT ou por agência de fomento para a transferência de tecnologia e para o licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida.
XXVI – na celebração de contrato de programa com ente da Federação ou com entidade de sua administração indireta, para a prestação de serviços públicos de forma associada nos termos do autorizado em contrato de consórcio público ou em convênio de cooperação.
XXVII - na contratação da coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo, efetuados por associações ou cooperativas formadas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis, com o uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública. XXVIII – para o fornecimento de bens e serviços, produzidos ou prestados no País, que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional, mediante parecer de comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão.
XXIX – na aquisição de bens e contratação de serviços para atender aos contingentes militares das Forças Singulares brasileiras empregadas em operações de paz no exterior, necessariamente justificadas quanto ao preço e à escolha do fornecedor ou executante e ratificadas pelo Comandante da Força.
XXX - na contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou sem fins lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária, instituído por lei federal.
XXXI - nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3o, 4o, 5o e 20 da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação dela constantes.
Parágrafo único. Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas.
19. Apesar das exceções conferidas pela legislação, é importante ressaltar que tal procedimento não é discricionário, não podendo ser deixado ao talante do administrador; a dispensa ou a inexigibilidade de licitação só devem ser utilizadas em situações extremas nas quais efetivamente não exista outra possibilidade, por se tratar de situação excepcional a qual não pode suportar o regime normal de licitação. Como é cediço, as regras excepcionais não devem ter ampliação por parte do intérprete, do
hermeneuta.
20. Assim, ao analisar o presente caso, vê-se que o procedimento de contratação direta fundou-se no art. 24, inciso IV, da Lei n.º 8.666/93, considerando-se a construção da sede industrial da empresa no Estado de Goiás como uma situação emergencial.
21. As "justificativas" para a dispensa de procedimento licitatório estão expostas em diversos pontos nos autos, a exemplo, cita-se o trecho constante às fls. 2.069/2.103- TCE, no qual a Secretaria da Indústria e Comércio, responsável pela celebração do protocolo de intenções com a Montadora CAOA/HYUNDAI, afirma que "o procedimento de dispensa de licitação, objetivando a contratação direta, como o intuito de evitar que, em razão do trâmite burocrático viesse o Estado de Goiás sofrer o prejuízo de não ter instalada em seu território uma montadora de veículos, impedindo, com isto a geração de empregos (...)" (sic).
22. Ora, inicialmente é preciso considerar que a dispensa de licitação, como instituto excepcional, não pode ser realizada sem critérios, atendendo a interesses particulares e a caprichos do administrador. A sua viabilidade deve ser exaustivamente demonstrada nos autos, com a comprovação por meio de estudos prévios, os quais permitam averiguar a legalidade da contratação.
23. No caso da contratação em tela, seria necessária a real demonstração da situação emergencial, comprovando-se o atendimento ao interesse público. Superada esta fase, seria imperiosa a comprovação dos inevitáveis prejuízos a serem suportados pelo Estado de Goiás com a não instalação de uma montadora de veículos neste ente federado. Entretanto, nada foi demonstrado nos autos que justificasse a urgência apontada pelo Estado de Goiás, não se tratando de força maior ou de caso fortuito.
24. Reforçando, ainda, a tese de que a Administração Pública só deve se valer da contratação direta em situações excepcionais, o Tribunal de Contas da União decidiu o seguinte:
[Representação. Terceirização irregular de serviço de atendimento pré- hospitalar móvel de urgência. Dispensa irregular de licitação. Multa e
determinação.] [ACÓRDÃO]
9.4. com fundamento no inciso II do art. 58 da Lei 8.443/1992, aplicar aos três responsáveis [...]multas no valor individual de R$ 8.000,00 [...]; [...]
9.8. determinar à Prefeitura de Barbacena e ao Departamento Municipal de Saúde Pública que:
[...]
9.8.3. observem as condições estabelecidas no inciso IV do art. 24 da Lei 8666/1993 e dispensem a licitação, nas hipóteses de emergência ou de calamidade pública, apenas quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, sendo vedada qualquer prorrogação dos respectivos contratos;
[VOTO]
11. As justificativas apresentadas [...], foram adequadamente analisadas e refutadas pela Secex/MG, cujas conclusões acerca do tema adoto como minhas razões de decidir nesta oportunidade e às quais nada tenho a acrescentar. [RELATÓRIO]
3.16 Neste momento devemos verificar se a contratação poder-se-ia efetivar sobre a guarida da Lei nº 8666/1993, art. 24, inc. IV. O diploma legal dita que, para que a contratação direta possa ocorrer, temos a necessidade da existência de casos de emergência ou de calamidade pública, tornando indispensável à urgência de atendimento à situação. Ainda, podendo ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares. Sempre, restritos aos bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas impreterivelmente em 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade. Finalizando, é vedada a sua prorrogação. Sobre o tema esta Corte de Contas firmou o seguinte entendimento, Decisão TCU-Plenário nº 347/1994 (Ministro-Relator Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx): (...)
2 responder ao ilustre Consulente, quanto à caracterização dos casos de emergência ou de calamidade pública, em tese:
a) que, além da adoção das formalidades previstas no art. 26 e seu parágrafo único da Lei nº 8.666/93, são pressupostos da aplicação do caso de dispensa preconizado no art. 24, inciso IV, da mesma Lei:
a.1) que a situação adversa, dada como de emergência ou de calamidade pública, não se tenha originado, total ou parcialmente, da falta de planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos disponíveis, ou seja, que ela não possa, em alguma medida, ser atribuída à culpa ou dolo do agente público que tinha o dever de agir para prevenir a
ocorrência de tal situação;
a.2) que exista urgência concreta e efetiva do atendimento a situação decorrente do estado emergencial ou calamitoso, visando afastar risco de danos a bens ou à saúde ou à vida de pessoas;
a.3) que o risco, além de concreto e efetivamente provável, se mostre iminente e especialmente gravoso;
a.4) que a imediata efetivação, por meio de contratação com terceiro, de determinadas obras, serviços ou compras, segundo as especificações e quantitativos tecnicamente apurados, seja o meio adequado, efetivo e eficiente de afastar o risco iminente detectado;
3.17 Tal compreensão é pacifica em julgados posteriores do Tribunal de Contas da União [...]. O que notamos é o caráter extremamente limitado para a aplicação legal deste dispositivo, conforme o entendimento deste Areópago [...] [...]
3.23 De acordo com o exposto e dos documentos acostados nos autos, não se pode aceitar as razões de justificativas dos responsáveis de que a terceirização deu-se de forma inatacável e de que se poderia realizar a contratação sob a proteção da Lei nº 8666/1993, art. 24, inc. IV. Assim, estas razões de justificativas devem ser rejeitadas. (Acórdão TCU n.º 2254-42/08-Plenário. Ministro Relator Xxxxxx Xxxxxx. Julgamento 15/10/2008) (grifou-se)
25. De outra banda, ainda que existisse uma situação emergencial no presente caso, seria necessária a avaliação da causa de tal urgência. Isto porque, segundo as diversas orientações do Tribunal de Contas da União a utilização indiscriminada do instituto da contratação direta evidencia não só a má gestão dos recursos públicos, mas, também, a recusa do Administrador Público em respeitar o princípio da legalidade. Neste sentido é o Acórdão n.º 206/2007-Plenário, que determinou o seguinte:
Afirmamos uma vez mais que, partir de imediato para a inexigibilidade porque ‘estou no sertão’, se nos afigura como comodismo, falta de vontade de buscar a preceito legal e falta de planejamento. Além de criar um perigoso precedente: o de legar à discricionariedade do gestor a análise da oferta do serviço pretendido pela administração, com prejuízo ao princípio da isonomia. E análise de oferta não é tarefa das mais simples. Além de se observar condições dos níveis de mercado (local, regional e nacional) deve-se ‘entrar’ na contabilidade de custos de empresas que prestam o serviço pretendido, considerando-as individualmente. É perfeitamente possível, por exemplo, que determinada empresa de Recife ou Natal, tendo em vista parcerias, metodologia de trabalho, possa prestar um serviço de melhor qualidade do que a Fundação contratada por inexigibilidade e por um preço mais baixo. Quem vai determinar se isso é fático é um procedimento licitatório bem elaborado e bem executado. Deixar a análise dessa possibilidade ao alvedrio do gestor é pedir que se banalize o instituto da inexigibilidade, dando oportunidade para
questionamentos e favorecimentos, que o cumprimento da lei pretende evitar. (AC-0278-06/07-2. Ministro Relator Xxxxxxxx Xxxxxx. TCU - Segunda Câmara. DOU de 09/03/2007).
26. Ora, a urgência reclamada nos autos não teve origem em qualquer causa externa alheia à vontade do Administrador, pelo contrário, a própria desídia administrativa deu azo à contratação direta ilegal. Tal fato demonstra a total falta de zelo para com a coisa pública, existindo a culpa do agente público, nos termos da Orientação Normativa n.º 11/2009 da Advocacia Geral da União (AGU), a qual dispõe:
A contratação direta com fundamento no inc. IV do art. 24 da Lei n.º 8.666, de 1993, exige que, concomitantemente, seja apurado se a situação emergencial foi gerada por falta de planejamento, desídia ou má gestão, hipótese que, quem lhe deu causa será responsabilizado na forma da lei. Referência: art. 24, IV, da Lei n.º 8.666/93; Xxxxxxx TCU 1.876/2007 - Plenário.
27. Xxxxxxxxx se faz a ressalva de que a Lei n.º 8.666/93 não deixa impune o gestor de recursos públicos que dispensa ou inexige licitação fora das hipóteses previstas no texto legal, ou que o faz em desacordo com as formalidades expressamente definidas na lei.
28. Assim, em seu art. 89, a Lei de Licitações e Contratos Públicos tipifica penalmente a seguinte conduta:
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.
29. Face ao exposto, vê-se que o presente Contrato oriundo de dispensa de licitação está em total desacordo com as disposições da Lei n.º 8.666/93, configurando ofensa, não só ao princípio da legalidade, como também ao da moralidade, ao da impessoalidade, ao da eficiência, ao da isonomia e ao da supremacia do interesse público, devendo o presente ato ser declarado ilegal por esta Corte de Contas.
30. Desta feita, deve o Tribunal de Contas do Estado de Goiás, no exercício de sua missão constitucional de guardião do erário, aplicar as sanções previstas na Lei Estadual n.º 16.128/07 (Lei Orgânica do TCE/GO).
2) Ausência de prévio estudo de mercado e da cotação do valor de referência
31. É cediço que, quando da contratação de serviços e aquisição de bens, a Administração Pública deverá valer-se de procedimento licitatório, devendo fixar os valores máximos admitidos nas propostas, os quais devem ser decorrentes de estudos prévios, não podendo a sua especificação ficar à discricionariedade absoluta do Administrador, mas levar em consideração todas as variáveis e condicionantes do mercado.
32. Ora, se nos procedimentos licitatórios é necessária a realização de pesquisa de mercado para a fixação do valor de referência, nas contratações diretas não poderia ser diferente, dado que não se pode conferir ao Administrador a discricionariedade absoluta da gestão dos recursos públicos.
33. Neste sentido, a Lei n.º 8.666/93, em seu art. 26, apesar de não exigir, expressamente, uma prévia e exaustiva pesquisa de mercado, determina que seja feita a justificativa do preço contratado, dispondo o seguinte:
Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.
Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:
I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;
II - razão da escolha do fornecedor ou executante;
III - justificativa do preço.
IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados. (grifou-se)
34. Ora, a justificativa exigida no inciso III do art. 26, transcrito acima, só poderá ser feita analisando-se, conjuntamente, os preços praticados no mercado e a real necessidade e a urgência do serviço ou do bem. Neste mesmo sentido, o Tribunal de Contas da União já decidiu o seguinte:
REPRESENTAÇÃO. [Prestação de contas. Licitação. Contratação direta. Requisitos. Comprovação da compatibilidade com preços de mercado.] [ACÓRDÃO]
1.5.1. determinar ao Banco Central do Brasil a adoção das seguintes medidas:
1.5.1.1. doravante, quando realizar contratação emergencial ou renovação do instrumento de contrato, observe rigorosamente, além do disposto no art. 24, inciso IV, c/c o art. 26, parágrafo único, incisos I a III da Lei nº 8.666/93, a necessidade de só efetivar contratações diretas de entidades após comprovação da compatibilidade dos preços praticados com os de mercado, mediante pesquisa de preços em pelo menos três empresas do ramo, devendo a documentação pertinente constar do respectivo processo de dispensa ou inexigibilidade; (Acórdão n.º 6.499-41/9-1ª Câmara. Ministro-Relator: Xxxxxx Xxxxxxx. Sessão de 17/11/2009). (destacou- se)
35. Com efeito, não pode a Administração Pública aceitar qualquer valor, apenas por estar configurada uma situação de "emergência" a qual eventualmente justifique a contratação direta. Assim, nota-se que os princípios constitucionais e as regras legais aplicáveis ao caso vêm sendo reiteradamente desrespeitados pelos jurisdicionados, principalmente a AGETOP.
36. Apesar da manifestação da Secretaria da Indústria e Comércio do Estado de Goiás, de que os preços compõem as tabelas da AGETOP, considerados de credibilidade histórica por aquele órgão, a simples afirmação de um fato sem a sua devida comprovação não possui qualquer valor no mundo jurídico, isto porque aquela Autarquia absteve-se de realizar os devidos estudos e de juntá-los aos autos, a fim de que fosse possível apurar a legalidade da dispensa de licitação.
37. Assim, o Tribunal de Contas do Estado, no exercício de sua função constitucional de guardião do erário, deve estabelecer um sistema de controle dos
preços praticados no mercado, tanto para a realização de obras e serviços de engenharia quanto para a compra de bens, com vistas a assegurar a legalidade e a economicidade dos valores praticados nas licitações e nas contratações diretas submetidas ao seu controle, não podendo confiar cegamente nas versões apresentadas pelos órgãos e demais entidades sujeitos à sua fiscalização, sob pena de pactuar com os desmandos praticados.
3) Ausência de especificação de critérios para o tabelamento do valor dos Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) em 36,9% (trinta e seis inteiros e nove décimos por cento)
38. Conforme exposto, se fossem comprovadas todas as exigências legais para a caracterização da dispensa de licitação, o Estado de Goiás teria a obrigação, também, de demonstrar a viabilidade dos preços ofertados pela empresa contratada, com o fito de impedir o superfaturamento no orçamento da obra.
39. Entretanto, com a postura adotada pela AGETOP, nota-se na planilha de composição de preços unitários (fl. 274-TCE) a fixação do índice dos Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) em 36,9% (trinta e seis inteiros e nove décimos por cento), sem qualquer demonstração analítica dos itens que o compõem.
40. Ora, este tabelamento do BDI, além de não estar demonstrado documentalmente, por meio de cotações e planilhas detalhadas, implica em violação ao art. 40, X, da Lei n.º 8.666/93, o que torna inviável a aceitação de preços que são destoantes das regras gerais de mercado, onerando, sem justo motivo, a Administração Pública, de antemão, por ensejar um preço superavaliado dando ensejo a sobrepreço e superfaturamento. Neste sentido, transcreve-se, a propósito, o art. 40, inciso X, da Lei n.º 8.666/93:
"Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para
início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte: (...)
X - o critério de aceitabilidade dos preços unitário e global, conforme o caso, permitida a fixação de preços máximos e vedados a fixação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em relação a preços de referência, ressalvado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 48; (...)"
41. Sobre o BDI, merece destaque o seguinte Acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU):
"Levantamento de Auditoria. Companhia de Saneamento de Sergipe. Obras da adutora do Alto Sertão e Xxxxxxxxx. Embargos de declaração contra acórdão que deu provimento parcial a pedido de reexame, com determinação, entre outras, quanto à fixação de BDI sobre o fornecimento de tubulações, conexões, válvulas, acessórios e equipamentos de, no máximo, 10%, caso ele seja feito sem parcelamento. Ausência da alegada omissão. Conhecimento. Negado provimento. Arquivamento." (Acórdão n.º 163/2004 - Plenário - TCU. Rel. Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx. DOU 15/03/2004).
Sobre a impossibilidade de tabelamento do BDI
42. Segundo a Decisão n.º 225/1999 do Tribunal de Contas da União, o item da planilha de custos denominado bonificação e despesas indiretas (BDI) é o “percentual aplicado sobre o custo para chegar ao preço de venda a ser apresentado ao cliente ”; também, em conformidade com o Acórdão n.º 325/2007 do TCU, BDI é a “relação matemática entre os custos indireto e direto para a formação do preço da obra”.
43. Matematicamente, a relação entre o preço final e o BDI é a seguinte: explicitada pela fórmula PF = CD (1 + BDI) (sendo que PF é preço final e CD é o custo direto). Dado o relevante papel do BDI no orçamento das obras, principalmente as civis, é necessária a correta classificação dos componentes orçamentários em custos e despesas diretos e indiretos, bem como a definição daqueles componentes que devem ou não integrá-lo.
44. Os custos e despesas diretos são aqueles “associados aos aspectos físicos da obra, detalhados no projeto de engenharia, bem como ao seu modo de execução, determinados pela organização operacional e pela infra-estrutura necessária. Assim, custos diretos são aqueles relacionados aos materiais e equipamentos que
comporão a obra, além dos custos operacionais e de infra-estrutura necessários para sua formação no produto final, tais como mão-de-obra (salários, encargos sociais, alimentação, alojamento e transporte), logística (canteiro, transporte e distribuição de materiais e equipamentos) e outros dispêndios derivados, que devem ser discriminados e quantificados em planilhas”.
45. Os "custos e despesas diretos" são objetivos e vinculados à especificação do projeto da obra e suas quantificações (representa o caráter intrínseco da obra).
46. Por "despesas indiretas", entendem-se aquelas “não alocáveis diretamente à execução da obra”, são dispêndios decorrentes das necessidades e obrigações do executor e não diretamente do projeto de engenharia.
47. Os "custos e despesas indiretos" são, em determinados aspectos, subjetivos e associados ao executor, às suas necessidades operacionais ("administração central", "seguros", "garantia", "caixa"), à rentabilidade e às obrigações tributárias (representam o caráter extrínseco da obra).
48. São normalmente considerados custos indiretos: "as despesas financeiras", "a administração central", os "tributos federais" (PIS/COFINS, CPMF), os "tributos municipais" (ISS), os "seguros", os "riscos" e as "garantias".
49. Por sua vez, "despesas financeiras" são gastos relacionados ao custo do capital decorrente da necessidade de financiamento exigida pelo fluxo de caixa da obra e ocorrem sempre que os desembolsos acumulados forem superiores às receitas acumuladas, desde que o executor da empreitada não possua capital próprio para a gestão do negócio.
50. Desse modo, a Administração Pública deve resguardar-se da fixação de taxas de juros abusivas, pois o preço da obra não pode ser onerado por ineficiência operacional do executor. Dessa forma, a taxa de juros referencial para o mercado financeiro mais adequada é a taxa SELIC, taxa oficial definida pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central, que envolve ao mesmo tempo a correção dos efeitos inflacionários sobre a moeda e remunera o capital financeiro.
51. Com efeito, a competitividade nas licitações públicas estimula a vertiginosa
queda dos preços propostos pelas pessoas jurídicas e faz com que as pessoa jurídicas que possuam capital próprio ou acesso a capital de baixo custo obtenham significativa vantagem nas propostas para as obras públicas.
52. Por outro lado, toda pessoa jurídica possui uma estrutura administrativa com custos e dimensões próprios. A representação do BDI no total de uma obra é definida estabelecendo em que proporção esse dispêndio é apropriado como despesa de uma obra. Pode ser de forma integral ou de forma parcial.
53. Por sua vez, sobre os custos de "administração central", diversos fatores podem influenciar as taxas praticadas pelas pessoa jurídicas, dentre elas podem ser citadas: a estrutura da pessoa jurídica; o número de obras que a pessoa jurídica esteja executando no período, a complexidade e o prazo total das obras.
54. Daí, depreende-se que uma pessoa jurídica com maior número de obras deve praticar uma taxa de administração central inferior à pessoa jurídica do mesmo porte com apenas um único canteiro.
55. De outra banda, acerca da não-cumulatividade das contribuições para o PIS e a COFINS, consoante os arts. 10, inciso XX, e 15, inciso V, da Lei n.º 10.833/2003, só será aplicável às receitas decorrentes da execução por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil a partir de 01 de janeiro de 2007, dado que vigoravam as alíquotas de 3% (três por cento) e 0,65% (sessenta e cinco centésimos por cento). Essa não-cumulatividade agora significa a possibilidade de se efetuar descontos dos valores devidos em face de créditos obtidos pela pessoa jurídica, de acordo com o art. 3º da referida norma, sobre os valores resultantes da aplicação das novas alíquotas.
56. Essa mudança na legislação trouxe novas premissas para o cálculo do BDI, já que esses tributos deixaram de ser fixos para assumirem percentuais variáveis conforme o perfil dos dispêndios da pessoa jurídica e a sua forma de escrituração.
57. As pessoa jurídicas que possuem maior participação das operações geradoras de crédito nas suas atividades levam grande vantagem na redução das alíquotas efetivas para fins de recolhimento do PIS e da COFINS.
58. Não há como enquadrar o PIS e a COFINS como custos de produção, pois não
são gastos obtidos no processo de obtenção dos serviços e/ou bens que estão sendo executados ou entregues. Trata-se, pois, de despesas indiretas.
59. Acerca do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), o art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 37/2002, fixou a alíquota mínima do ISS em 2% (dois por cento), ao passo que a alíquota máxima foi fixada em 5% (cinco por cento) pelo art. 8º, II, da Lei Complementar n.º 116/2003. Os municípios gozam de autonomia para fixar as alíquotas do ISS, desde que respeitados esses limites. Seguindo a mesma linha de raciocínio aplicada à classificação do PIS e da COFINS, o ISS é tributo que deve ser considerado como integrantes das despesas indiretas.
60. Por outro prisma, sobre os "riscos", a taxa é determinada em percentual sobre o custo direto da obra e depende de uma análise global do risco do empreendimento em termos orçamentários.
61. Outrossim, questões que podem ser previamente convencionadas no contrato ou ensejarem solicitação de reequilíbrio econômico-financeiro, como a "variação cambial" não podem ser enquadradas no BDI, dada a sua neutralização no preço final contratado.
62. Por sua quadra, a "garantia contratual" está prevista ordinariamente no art. 56 da Lei n.º 8.666/1993, que estatui o poder de Administração Pública exigi-la. As "garantias" e os "seguros" das obrigações contratuais são custos que resultam de exigências contidas nos editais de licitação e só podem ser estimadas caso a caso, mediante avaliação do ônus econômico-financeiro que poderá recair sobre o licitante.
63. "Margem de lucro", por sua vez, é a parcela que “complementa a formação do Preço de Venda, sem que possa ser considerada como item de custo, ela é, na verdade, uma parcela destinada a remunerar os fatores da produção do Executor que intervêm na obra, tais como: custo de oportunidade do capital aplicado nos equipamentos mobilizados na obra; capacidade administrativa e gerencial para a administração do contrato e a condução da obra, representada pelas estruturas organizacionais da pessoa jurídica e pelo conjunto de normas e procedimentos de que
se utiliza; conhecimento tecnológico adquirido através de experiências pregressas e pelo investimento em formação, treinamento de pessoal e compra de ‘know how’ e, finalmente, o risco do negócio. A margem é, assim, um excedente sobre o custo orçado, através do qual o Executor buscará realizar seu Lucro, bem como prover recursos para pagamento de impostos sobre o resultado”.
64. Mais importante que estabelecer a limitação de lucros é definir adequadamente os itens que devem integrar o BDI, bem como assegurar que o procedimento licitatório permita a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública, dentro dos critérios de razoabilidade.
65. É importante evitar a inclusão de itens inadequados no BDI, cujas características predominantes determinem a sua classificação como custos diretos ou não se classifiquem como custos diretos ou indiretos, como os tributos sobre o lucro e a renda, que não devem ser computados no preço da obra.
66. Como se depreende dos já lançados conceitos de custos diretos e indiretos, a distinção entre eles é essencial nesse método de formação de preço de obra, pelo qual se utiliza o BDI.
67. A "administração local", "a mobilização/desmobilização" e a "instalação do canteiro", por exemplo, são itens que, embora não representem serviços unitários, são custos mensuráveis e devem ser apropriados como tais no orçamento da obra, pois decorrem diretamente da sua execução.
68. Há também elementos que, por sua natureza, não devem estar embutidos no preço da obra e, portanto, não podem compor o BDI. Entre eles estão o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
69. Nesta seara, a Receita Federal do Brasil (RFB), utiliza a repercussão econômica em seus estudos e trabalhos, para a classificação dos tributos:
"A teoria econômica abriga a tradicional classificação dos tributos, segundo a incidência efetiva da taxação, em diretos e indiretos. Na incidência direta o gravame financeiro imposto pelo Estado é direta e integralmente assumido pelo contribuinte, que tem sua renda reduzida pelo exato valor da exação. Na
incidência indireta, surge a figura de um intermediário (contribuinte de direito) que, embora se encontre na obrigação de apurar e antecipar o pagamento do tributo devido, não o suporta, pois tem a faculdade de reaver de outro agente econômico (contribuinte de fato) o valor repassado aos cofres públicos.
O tributo paradigmático do primeiro caso (incidência direta) é o imposto de renda das pessoas físicas."
70. Os tributos IRPJ e CSLL apresentam o fato gerador semelhante, bases de cálculos parecidas e possuem a mesma natureza tributária, quando se trata da repercussão econômica. Por serem tais tributos diretos, não permitem a transferência do seu encargo financeiro para outra pessoa, ou seja, a pessoa legalmente obrigada ao seu pagamento suporta efetivamente o ônus. Dessa forma, considera-se inadequada a inclusão do IRPJ e da CSLL na composição do BDI.
71. Também, cabe ressaltar que o TCU já se pronunciou sobre a inclusão indevida desses dois tributos na composição do BDI, como, por exemplo, no Acórdão n.º 1.595/2006-Plenário transcrito abaixo:
"9.5. determinar à Petrobras que:
(...)
9.5.11. exclua dos seus orçamentos parcelas relativas ao IRPJ e à CSLL, bem como oriente as licitantes, em seus editais, que tais tributos não deverão ser incluídos no BDI, por se constituírem em tributos de natureza direta e personalística, que onera pessoalmente o contrato, não devendo ser repassado ao ofertado, conforme, inclusive, conclusões do setor jurídico da estatal, mediante o DIP SEJUR/DITRIB 37216/97 e DIP/Jurídico/JFT 4391/03."
72. Por sua vez, a "administração local" consiste nas despesas incorridas para a manutenção das equipes técnica e administrativa e da infra-estrutura necessárias para a consecução da obra. Entre as despesas que normalmente são alocadas nesse item, encontram-se: gastos relativos a pessoal (engenheiros, mestres, encarregados, almoxarifes, vigias, pessoal de recursos humanos e demais não computados nas planilhas de custos unitários dos serviços) e as despesas administrativas (contas de telefone, luz e água, cópias, aluguéis), dentre outros.
73. De maneira restrita, pode-se considerar os custos e despesas diretos como aqueles em que estão inseridos os serviços que integrarão o produto final. De forma
ampla, o custo direto, além dos custos anteriormente descritos, englobará aqueles que, apesar de não especificamente associados ao produto final, estão diretamente ligados à execução dos serviços de construção civil como um todo.
74. No mesmo sentido, em estudo apresentado pelo Sinduscon-SP (‘Nova Conceituação do BDI’) foi proposto que o item "administração local" não mais integrasse o BDI:
"1 – ADMINISTRAÇÃO LOCAL – Propõe-se passar a compor a planilha de Custo Direto e não mais o BDI.
Todas as despesas havidas ou incorridas direta ou indiretamente em torno do ambiente da obra para a consecução do produto final serão considerados CUSTOS DIRETOS.
A Administração Local compreende as seguintes atividades básicas: Chefia da obra – engenheiro responsável; Administração do Contrato; Engenharia e Planejamento; Segurança do Trabalho; Produção – mestre de obra e encarregados; Manutenção dos equipamentos; Gestão de Materiais; Gestão de Recursos Humanos; Administração da obra.
Assim, as despesas da Administração Local e a sua manutenção, Alimentação e Transporte do pessoal administrativo e de produção da obra, EPI e uniformes, controle tecnológico e ensaios, ferramentas e equipamentos não contemplados na composição de custos unitários, deverão fazer parte da Planilha de Orçamento e não mais na composição do BDI.
Essas despesas farão parte da Planilha de Orçamento em itens independentes da composição de custos unitários, especificados como Administração Local, podendo-se adotar as seguintes alternativas: Preços compostos analiticamente; Custo mensal ou horário de mão-de-obra administrativa ou técnica; Custos mensal reembolsável; Custo mensal ou total de manutenção do canteiro de obras; Verba; Módulo de Verba."
75. Como se percebe, a inclusão da "administração local" ou de algum elemento que a devesse integrar eleva artificialmente o percentual do BDI, o que, em casos de repactuação de preços ou de mudanças de especificação de algum item da obra, eleva sem justificativa o preço da obra de forma lesiva ao contratante e ao interesse público.
76. Como os itens de "instalação de canteiro e acampamento" e "mobilização e desmobilização" são passíveis de serem orçados analiticamente e como, contabilmente, são gastos incorridos no processo de obtenção de bens e serviços destinados à venda, podem ser inseridos no custo direto, em um item independente da composição dos
custos unitários.
77. Valem as mesmas observações tecidas à "administração local" quanto ao impacto de uma eventual repactuação de preços ou mudança na especificação de algum material/equipamento valem para a "instalação de canteiro e acampamento" e a "mobilização e desmobilização", casos esses itens sejam considerados no BDI.
78. Situação peculiar quanto à aplicação do BDI, surge na aquisição de bens (equipamentos e materiais) que correspondam a um percentual significativo do preço global da obra, na qual a incidência da mesma composição de BDI paga para serviços gera distorções no preço final do insumo, razão pela qual se considera que a composição de BDI aplicável, neste caso, deve ser mais restrita que aquela referente à prestação de serviços.
79. É importante, primeiramente, durante os estudos de viabilidade e anteprojetos, ou seja, antes mesmo de se realizar a licitação para contratação do empreendimento, o gestor público deve estudar a possibilidade de adquirir os equipamentos em separado com o objetivo de proceder ao parcelamento lícito do objeto previsto no art. 23, § 1º, da Lei n.º 8.666/1993. Esse dispositivo legal dispõe o seguinte:
"(...)
§ 1º As obras, serviços e compras efetuadas pela administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala. (...)"
80. Sobre esse tema, o Tribunal de Contas da União - TCU já se pronunciou diversas vezes, como se pode notar nos Acórdãos n.º 159/2003-Plenário, n.º 446/2005-Plenário e o n.º 1.601/2004-Plenário, in verbis:
"(...) constitui irregularidade grave a falta de licitação autônoma, sem o parcelamento do objeto da licitação quanto à compra de equipamentos, conforme preconizado no art. 23, § 1°, da Lei n.º 8.666/1993(...)."
81. Assim, quando existir parcela de natureza específica que possa ser executada por pessoa jurídicas com especialidades próprias e diversas ou quando for viável técnica e economicamente, o parcelamento em itens se impõe, desde que seja vantajoso para a Administração. Uma das vantagens que se pode apontar é que a administração estará evitando pagar BDI em "cascata", ou seja, as despesas indiretas da pessoa jurídica fabricante de equipamentos/materiais e o da pessoa jurídica construtora que incidirá sobre aquele (“bis in idem”); outro benefício é que, realizando uma licitação autônoma para a aquisição de equipamentos/materiais, haverá ampliação da competitividade e a Administração Pública terá a possibilidade de obter preços muito mais vantajosos.
82. Caso tal parcelamento não se comprove técnica ou economicamente viável, com base em estudos devidamente fundamentados, a aquisição dos equipamentos e materiais poderá ser realizada juntamente com a execução da obra. Neste caso, o administrador público no seu orçamento deve adotar para compra dos equipamentos/materiais uma taxa de BDI diferenciada em relação aos adotados para os serviços de engenharia e deve exigir dos licitantes a composição das suas taxas para a comparação com o que foi orçado previamente.
83. No que tange aos itens do BDI passíveis de serem cobrados, no caso da aquisição de equipamentos/materiais por intermédio dos empreiteiros, inicialmente cabe uma ressalva em relação aos tributos. Primeiramente porque pessoas jurídicas construtoras não se enquadram como contribuintes do ICMS, conforme se depreende dos artigos 3º, V, e 4º da Lei Complementar n.º 87/1996. Além disso, o valor deste tributo já está embutido no custo dos equipamentos/materiais a serem adquiridos, ou seja, a administração ao pagar à empreiteira pelo bem, o valor do ICMS já está inserido no preço pago.
84. Quanto à "administração central" e ao "lucro", nesta situação, entende-se que seus percentuais devem ser inferiores em relação aos estabelecidos para a execução da obra, tendo em vista que a natureza desta operação tem complexidade menor, exigindo menos esforço e tecnologia para sua realização do que os demais serviços prestados.
Assim sendo, o BDI resultante calculado para a aquisição de equipamentos será menor que o calculado para a prestação de serviços.
85. Portanto, o gestor público deve avaliar a forma mais vantajosa de adquiri-los, se diretamente, junto ao fabricante ou fornecedor, ou através da intermediação da contratada, a fim de identificar qual alternativa revela-se técnica e economicamente mais adequada. É importante esclarecer que a discricionariedade fica bastante reduzida quando uma das alternativas apresentar-se-á mais onerosa para a Administração.
86. Por sua vez, o critério de aceitabilidade, observando pela ótica da contratação pública, é um termo empregado pela Lei de Licitações para atuar como mais um instrumento de controle da eficácia dos procedimentos de licitação e execução dos contratos realizados pela administração pública. É um atributo de controle dos atos do gestor público.
87. Lembramos que a Lei n.º 8.666/1993 estabelece várias regras, em especial quanto aos contratos de obras, para controle dos preços de contratação e acompanhamento de sua execução. Desde a necessidade de projeto básico e orçamento detalhado em custos unitários (artigo 7º) até a fixação de critérios de aceitabilidade dos preços unitários e global (artigo 40, inciso X), as regras visam a que a Administração estime bem os valores que serão contratados.
88. Quando se trata de critérios de aceitabilidade, o gestor orienta-se a partir de um orçamento-base, onde o BDI responde por uma parte considerável da formação dos preços. Portanto, não se pode tratar de orçamentação de obra e aceitabilidade de preços sem calcular analiticamente o BDI assim como se faz com os custos diretos.
89. Esse controle se estende desde o início do processo licitatório até a prestação de contas do objeto do contrato. Ao ter como objetivo acolher a proposta mais vantajosa para a administração na licitação, é importante certificar, após essa etapa, que a vantagem inicialmente obtida manter-se-á até o final da execução do contrato. A aceitabilidade dos preços irá repercutir no acompanhamento contratual e em eventuais alterações nos seus quantitativos. A cada variação dos quantitativos, é afetado o custo direto do contrato, refletindo no preço final pela incidência do BDI. Daí a importância
de se avaliar o BDI da mesma forma que se examina os outros componentes do orçamento da obra.
90. Estimar o BDI dos proponentes na formação de preços para apresentação das proposta é tarefa complementar para avaliação do orçamento. Considera-se como parte mais objetiva dessa avaliação: a cotação dos valores dos insumos, dos equipamentos e da mão-de-obra (dados vinculados diretamente à parte de engenharia); a questão mais subjetiva é a relativa à estimativa do BDI (valores atribuídos ao lucro, administração financeira e operacional e encargos tributários da pessoa jurídica).
91. Se considerarmos que a parte de engenharia deve ser similar entre as concorrentes, por se tratar de especificação técnica, relacionada ao projeto da obra, a parte relativa ao BDI não segue, em regra, uma homogeneidade entre as pessoa jurídicas proponentes.
92. Diferentemente dos custos e despesas diretos de engenharia, o BDI tem menos a ver com o projeto e mais com as características pessoais da empresa executora e com a legislação tributária aplicada, considerando-se a opção de tributação escolhida pelo empreendedor. O que vai preponderar para a formação do BDI, além dos encargos tributários definidos por lei, são as características da pessoa jurídica, tais como a sua estrutura gerencial, logística, tecnológica, financeira e a estratégia escolhida de mercado, especificamente para a obra pretendida.
93. Dessa forma, pelas características de cada pessoa jurídica, apresentam-se seus custos administrativos, capacidade financeira, estratégias e necessidades de lucratividade em cada contrato.
94. Em razão da formação dos critérios de aceitabilidade ser uma atribuição do contratante e ter influência direta e particular do projeto da obra, não se pode estabelecer parâmetros para o BDI, de forma genérica, tabelada, para que estes substituam os critérios de aceitabilidade das despesas indiretas em uma contratação. A rigor, o que se pretende é encontrar uma variação de referência (intervalo de magnitude) dos componentes do BDI para que sirva de parâmetro às análises de adequabilidade dos critérios de aceitabilidade a serem praticados em cada contrato e
fiscalizados pelos órgãos de controle da Administração e pelos cidadãos, que são aqueles que suportam o ônus de contratações desvantajosas.
95. Como se nota, o tabelamento do valor do BDI, dando ensejo a sobrepreço e a superfaturamento das obras, como procedeu a AGETOP é lesivo ao interesses do Estado e causa dano ao erário, devendo ser repudiado pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás, com a cominação de sanções e de recomendações à Autarquia Estadual.
4) Da Instrução Normativa n.º 974/2009 da Secretaria da Fazenda Estadual
96. A composição do BDI é tema de grande complexidade e importância dentro da sistemática de despesas com obras de engenharia por parte do Estado, haja vista ser o fator de maior onerosidade dos contratos públicos, não podendo, portanto, a sua fixação ser deixada ao talante do administrador.
97. Por este motivo, após reiteradas manifestações deste Parquet, acerca da importância da limitação do BDI, a Secretaria da Fazenda editou a Instrução Normativa n.º 974/2009-GSF, por meio da qual fixou os valores máximos admitidos para as obras e os serviços de engenharia, rodoviários e civis, em todo o Estado de Goiás.
98. Importante destacar os esforços da Secretaria da Fazenda Estadual no sentido de buscar um parâmetro limite (máximo) para o BDI, haja vista que a prática nos mostra que a sua utilização ocorre de forma desordenada, sem métodos e sem estudos prévios, com a escolha do percentual ao acaso, situação que eleva em muito os gastos da máquina estatal.
99. Ressalta-se que, embora os valores fixados na mencionada Instrução Normativa ainda estejam acima do ideal, estes foram determinados como sendo os percentuais máximos admitidos. Assim sendo, as autarquias e órgãos públicos estaduais, responsáveis pelas obras e serviços de engenharia, rodoviários e civis, devem realizar estudos detalhados e apresentar planilhas de custos, com a composição do BDI, abstendo-se de utilizar indiscriminadamente os valores máximos permitidos .
100. Desta feita, este Tribunal de Contas do Estado de Goiás, atento à sua missão de auxiliar do Poder Legislativo no controle das contas públicas, deve repelir quaisquer contratações que fixem valores fora dos padrões estabelecidos pela Instrução Normativa n.º 974/2009-GSF, o que não exime os administrados de demonstrarem analiticamente todos os valores que compuseram o total do BDI.
5) Aquisição "casada" de serviços distintos superfaturados
101. Noutro ponto da planilha de custos apresentada pela Contratada (fl. 273-TCE) consta o valor a ser pago por "veículo de passeio para fiscalização", na importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por mês.
102. Tal situação, também, não está em consonância com o objetivo basilar de toda contratação, que é o de alcançar sempre a melhor proposta para o emprego de verbas públicas, dado que as empresas do ramo de construção civil não são especializadas em locação de veículos, não podendo concorrer em condições de igualdade com as locadoras de automóveis, onerando indevidamente os cofres públicos.
103. A AGETOP deveria fracionar licitamente o objeto da contratação dentro da mesma modalidade licitatória exigida para o caso, separando-se em itens ou lotes a contratação para execução dos serviços de engenharia do fornecimento de veículos automotores com motoristas, nos termos dos artigos 15 e 23 da Lei n.º 8.666/93, já transcritos acima.
104. Mostra-se claro que a melhor opção para o Estado de Goiás é realizar uma licitação, exclusivamente, para a locação dos veículos necessários à fiscalização de suas obras (atividades-fim do órgão), conseguindo-se uma proposta mais vantajosa dentre os concorrentes especializados no oferecimento desse tipo de serviço (locadoras de automóveis), tanto mais que a AGETOP intencionalmente adiciona tal contratação em todas as obras que licita, em quantidade bem superior à necessária para cada obra, para fins não descortinados nos autos.
105. A locação de veículos atrelada à execução dos serviços de engenharia mostra-se
danosa ao erário, haja vista que gera BDI (benefícios e despesas indiretas) da empreiteira sobre BDI da locadora de automóveis ("bis in idem").
106. Demais disso, as despesas com locação de veículos com motorista são consideradas despesas de "custeio e de pessoal", segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, enquanto que as obras civis enquadram-se em despesas sob a rubrica orçamentária de "investimentos", contrariando a Lei n.º 4.320/64 e a Lei Complementar n.º 101/2000 (LRF).
107. Não bastasse isso, os valores praticados são tão absurdos que, com a duração de 03 (três) meses da obra, seria possível à Administração a aquisição de um veículo novo com os gastos com a locação, o que acresceria ao patrimônio público ao invés de dilapidá-lo sob o título de emergência.
108. Da leitura do art. 25 da Lei de Licitações, em seu § 2º, percebe-se que havendo superfaturamento na contratação proveniente de dispensa de licitação, responderão solidariamente pelos danos causados o agente público e o prestador de serviços. Tal dispositivo determina o seguinte:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
(...)
§ 2º Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis. (...) (grifou-se)
109. Ora, não considerar a situação aqui demonstrada como ato ilícito é deixar as rédeas do erário ao exclusivo arbítrio dos agentes administrativos lotados na AGETOP, sem qualquer controle e fiscalização, permitindo o atendimento de interesses particulares com a utilização de verbas públicas.
110. Desta feita, o Tribunal de Contas do Estado de Goiás não pode se furtar a declarar a lesividade das condutas praticadas, uma vez que, comprovadamente, acarretaram inúmeros prejuízos diretos aos cofres públicos, com a contratação direta de obras superfaturadas e com a inclusão de itens indevidos para fins diversos dos
interesses públicos.
6) Da duração máxima dos contratos decorrentes de Dispensa de Licitação
111. Importante ressaltar que o já mencionado art. 24, da Lei n.º 8.666/93, em seu inciso IV, ao prever a possibilidade de dispensa de licitação nos casos de urgência ou calamidade, limita o prazo de vigência do Contrato em 180 (cento e oitenta) dias, determinando o seguinte:
Art. 24. É dispensável a licitação:
(...)
IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos; (...) (grifou-se)
112. Ora tal limitação funda-se no fato de que no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, caso a situação emergencial cesse, o Poder Público disporá de lapso temporal suficiente para a realização de procedimento licitatório específico para atender às suas necessidades.
113. Não obstante as graves irregularidades demonstradas anteriormente, o Contrato decorrente de dispensa de licitação, firmado pela AGETOP, acabou por permitir a prorrogação do prazo de vigência por tempo muito superior ao limite de 180 (cento e oitenta) dias previsto na legislação.
114. O Tribunal de Contas da União, por diversas vezes, determinou a observância aos prazos máximos estabelecidos para as contratações de emergência, alertando que em caso de ser extrapolado o limite de 180 (cento e oitenta) dias, deverá haver a comprovação de que o fato impeditivo está fundado em causa estranha à vontade das
partes, o que não ocorreu no caso concreto. Neste sentido, o TCU já decidiu o seguinte:
[Sumário]
É possível, em casos excepcionais, firmar termo aditivo para prorrogar contrato oriundo da dispensa de licitação prevista no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/1993, por período adicional estritamente necessário à conclusão da obra ou serviço, além do prazo máximo fixado nesse dispositivo legal, desde que essa medida esteja fundamentada na ocorrência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que impossibilite a execução contratual no tempo inicialmente previsto.
[...] [VOTO] [...]
6. Tal procedimento, excepcional, estaria plenamente justificado pelo contexto específico que cercou a execução do objeto do contrato sob exame, visto que o atraso na conclusão da restauração foi ocasionado pelo 'tempo instável' e pela 'impossibilidade de fornecimento de CBUQ [concreto betuminoso usinado a quente] pelas usinas', fornecedoras desse material à empresa [contratada], conforme registrado no relatório da equipe da Secex/RJ.
[...] [ACÓRDÃO] [...]
9.1. determinar ao [...] DNIT que, ao firmar contratos com base na dispensa de licitação prevista no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/1993, caso haja necessidade de prorrogação contratual além do prazo máximo fixado nesse dispositivo legal - '180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade' -, formalize, em caráter excepcional, termo aditivo com a contratada por período adicional estritamente necessário à conclusão da obra ou serviço, desde que essa medida esteja fundamentada na ocorrência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que impossibilite a execução contratual no tempo inicialmente previsto;
9.2. alertar o DNIT que a adoção indevida do procedimento indicado no subitem precedente deste acórdão pode implicar na responsabilização daqueles que derem causa a prorrogações contratuais que representem injustificada inobservância do prazo máximo indicado no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/1993; (Xxxxxxx TCU n.º 1.941-39/7-Plenário. Ministro-relator: Xxxxxxxx Xxxxxx. Sessão de 19/09/2007) (grifou-se)
115. Ora, as "justificativas" apresentadas no autos limitam-se a afirmar a ocorrência de chuvas, as quais acarretaram o atraso nas obras. Entretanto, os prazos para conclusão dos serviços contratados pela Administração Pública não podem ser fixados aleatoriamente, sem a realização de estudos técnicos os quais considerem não apenas a
execução dos serviços, mas também a interferência de fatores naturais. Além disso, as chuvas ocorrem, invariavelmente, nos mesmos meses todos os anos (situação previsível), não se configurando em situação eventual que enseje dilação de prazo e o acréscimo na obrigação contratual.
116. Xxxxxxx é a gravidade da presente situação que a Lei n.º 8.666/93, em seu art. 92, tipifica tal conduta como criminosa e estabelece a pena de detenção aos que assim agirem, dispondo o seguinte:
Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei: Pena - detenção, de dois a quatro anos, e multa.
Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais.
117. Desta feita, observa-se nos autos uma situação extremamente grave, na qual todas as regras atinentes à realização de despesas públicas foram desrespeitadas, sejam os princípios e normas insculpidos na Constituição Federal sejam as demais legislações ordinárias, com a prática de condutas danosas e atentatórias aos recursos públicos.
7) Da ausência de convênio do Confaz para concessão de benefícios fiscais
118. É cediço que o Estado para cumprir as suas funções para com a sociedade carece de recursos financeiros, os quais são adquiridos mediante as chamadas receitas públicas. Dentre estas, a principal fonte de arrecadação do poder estatal está na chamada tributação.
119. O art. 3º do Código Tributário Nacional define tributo do seguinte modo:
Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
120. Ressalte-se que o poder de tributar é uma prerrogativa constitucionalmente atribuída às pessoas de direito público interno dotadas de autonomia, ou seja, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, como uma forma de arrecadar recursos financeiros para a consecução de seus fins. Neste sentido, a Constituição Federal de 1988 estabelece o seguinte:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
§ 2º - As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.
121. Não obstante a importância dos tributos no orçamento dos entes federados, existem hipóteses em que poderão ser concedidos benefícios fiscais a determinadas pessoas físicas ou jurídicas, as quais sejam liberadas da obrigação de contribuir. Para tanto, devem ser rigorosamente obedecidas as diretrizes constitucionais e legais aplicáveis a cada caso. Neste sentido, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 150, § 6º, estabelece as seguintes determinações:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o
correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (...)
122. Ainda, o art. 000, § 0x, XXX, x, xxxxxxxxxx que cabe à Lei Complementar o estabelecimento das regras para a concessão e a revogação de isenções, incentivos e benefícios fiscais, dispondo o seguinte:
Art. 155 (...)
§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...)
XII - Cabe à lei complementar:
(...)
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. (grifou-se)
123. Assim, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n.º 101/00), em seu artigo 14, dispõe o seguinte:
Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;
II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.
§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.
§ 3o O disposto neste artigo não se aplica:
I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do
art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1o;
II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.
124. No tocante às renúncias de receitas relativas ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), imperioso se faz a observância das determinações estabelecidas na Lei Complementar n.º 24/1975, a qual dispõe o seguinte:
Art. 1º - As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei. (...)
Art. 2º - Os convênios a que alude o art. 1º, serão celebrados em reuniões para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo federal.
§ 1º - As reuniões se realizarão com a presença de representantes da maioria das Unidades da Federação.
§ 2º - A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.
§ 3º - Dentro de 10 (dez) dias, contados da data final da reunião a que se refere este artigo, a resolução nela adotada será publicada no Diário Oficial da União. (...) (grifou-se)
125. Não obstante a Lei Complementar n.º 24 ter sido editada em 1975 e, portanto, sob a égide da Constituição Federal de 1967, tal norma foi recepcionada pela CF/88 e a sua aplicação é obrigatória, nos termos de inúmeras decisões do Supremo Tribunal Federal, dentre as quais destaca-se a seguinte:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DECRETO N. 989/03, EDITADO PELO GOVERNADOR DO ESTADO DO MATO GROSSO. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SENADO FEDERAL PARA FIXAR A ALÍQUOTA DO ICMS, NOS TERMOS DO PRECEITO DO ARTIGO 155, § 2º, INCISOS IV E V, DA CB/88. ICMS. IMPOSTO NÃO-CUMULATIVO. A CONCESSÃO UNILATERAL DE BENEFÍCIOS FISCAIS, SEM A PRÉVIA CELEBRAÇÃO DE CONVÊNIO INTERGOVERNAMENTAL, AFRONTA AO DISPOSTO NO XXXXXX 000, § 0x, XXX,
X, XX XXXXXXXXXXXX XX XXXXXX. 1. O decreto n. 989/03, do Estado do Mato Grosso, considera como não tendo sido cobrado o ICMS nas hipóteses em que a mercadoria for adquirida nos Estados do Espírito Santo, de Goiás, de Pernambuco e no Distrito Federal 2. O contribuinte é titular de direito ao crédito do imposto pago na
operação precedente. O crédito há de ser calculado à alíquota de 7% se a ela efetivamente corresponder o percentual de tributo incidente sobre essa operação. Ocorre que, no caso, a incidência dá-se pela alíquota de 12%, não pela de 7% autorizada ao contribuinte mato-grossense. 3. Pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a concessão unilateral de benefícios fiscais relativos ao ICMS, sem a prévia celebração de convênio intergovernamental, nos termos do que dispõe a LC 24/75, afronta ao disposto no artigo 155, § 2º, XII, g, da Constituição Federal". Precedentes. 4. Ação direta julgada procedente para declarar inconstitucional o decreto n. 989/2003, do Estado do Mato Grosso. (ADI n.º 3.312-MT. Min. Relator: Xxxx Xxxx. DJ de 09/03/2007) (grifou-se)
126. Do exposto acima observa-se que o procedimento da renúncia de receitas é extremamente complexo e perpassa pelos interesses dos demais entes públicos, isto porque é decorrente do próprio Pacto Federativo, estando a sua realização adstrita ao princípio da legalidade estrita.
127. No caso ora analisado, o Estado de Goiás concedeu a isenção de parte do ICMS à pessoa jurídica "CAOA Montadora de Veículos S.A.", como um incentivo para que aquela empresa instalasse no município de Anápolis uma unidade de fabricação de veículos automotores. Tais benefícios foram concedidos unilateralmente mediante a Lei Estadual n.º 13.194, de 26 de dezembro de 1997, sem a prévia celebração do Convênio aludido na Lei Complementar n.º 24/1975.
128. Ao ser indagada acerca da ausência de Convênio com o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), a Secretaria da Fazenda Estadual, à fl. 1.472-TCE, manifestou-se da seguinte forma, confessando a ilicitude perpetrada:
"A política tributária estadual, em especial com relação ao ICMS, é estruturada de acordo com o cenário econômico, levando em consideração as bases de produção e circulação de mercadorias, a conformação geográfica do Estado em relação a outros estados da Federação, a vocação econômica regional, a carga tributária genérica adotada pelo Estado em seu Código Tributário e as normas gerais que regem os impostos no âmbito nacional. Dessa forma, existem benefícios fiscais concedidos no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ - e por meio de leis estaduais. No caso em tela, o benefício foi concedido por autorização legislativa, sem, contudo, haver prévia autorização do CONFAZ." (grifou-se)
129. Ora, a concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS necessariamente deve
ser um ato multilateral e, conforme as determinações legais e constitucionais transcritas acima, deve ser precedida da autorização dos demais entes federados. Frise- se, ademais, que tais benefícios, após a autorização de concessão por meio do Convênio com o CONFAZ, devem ser ratificados mediante Lei Estadual.
130. Importante destacar, ainda, as determinações contidas no artigo 8º da Lei Complementar n.º 24/75, o qual determina o seguinte:
Art. 8º - A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente:
I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria;
II - a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente.
Parágrafo único - As sanções previstas neste artigo poder-se-ão acrescer a presunção de irregularidade das contas correspondentes ao exercício, a juízo do Tribunal de Contas da União, e a suspensão do pagamento das quotas referentes ao Fundo de Participação, ao Fundo Especial e aos impostos referidos nos itens VIII e IX do art. 21 da Constituição federal. (grifou-se)
131. A situação evidenciada nos autos não necessita de maiores esclarecimentos, uma vez que as exigências constitucionais e legais, bem como as determinações do Supremo Tribunal Federal, para a concessão de isenção de ICMS foram totalmente desrespeitadas, havendo a confissão (fl. 1.472-TCE) do descumprimento das regras atinentes ao caso.
132. Além disso, o art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal determina que, ao serem concedidos isenções, benefícios ou créditos fiscais, deverá haver a compensação da diminuição na entrada de receitas, seja pelo aumento da alíquota, com a ampliação da base de cálculo, pela majoração ou pela criação de novos tributos. Visando a dar cumprimento a esta determinação legal, o Estado de Goiás afirmou que a compensação na diminuição das receitas, proveniente do crédito de ICMS outorgado, viria do próprio aumento da comercialização dos veículos produzidos pela Montadora.
133. Entretanto, as previsões não se confirmaram, havendo nos autos manifestações da Secretaria da Fazenda Estadual demonstrando a ocorrência de problemas, a exemplo do documento acostado às fls. 1.868/1.869-TCE, no qual aponta-se que a
"CAOA Montadora de Veículos S.A." estava apropriando-se do crédito mensal de ICMS outorgado sem, contudo, realizar a comercialização necessária para tal. Ou seja, a montadora apropriava-se do crédito de produtos os quais não comercializava. Em seguida, às fls. 1.872/1.873-TCE, outra divisão da Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás considerou normal a situação e determinou a continuidade do ajuste.
134. Tal fato não evidencia apenas a apropriação indevida de recursos públicos por parte da pessoa jurídica, mas, também, a complacência da Administração Pública para com a situação ilegal, o que acarreta a responsabilidade da pessoa jurídica e de todos os agentes envolvidos no caso concreto.
135. Veja-se que os argumentos aqui expostos não se traduzem na tese da Procuradoria de Xxxxxx, ou na interpretação da legislação por parte de seus membros, mas são decorrentes da leitura direta e literal do texto da Lei e das determinações do Supremo Tribunal Federal, não podendo, portanto, serem rejeitadas pela simples liberalidade do Administrador, do Tribunal de Contas ou de quem quer seja.
III - CONCLUSÃO
136. Diante todo o exposto, esta Corte de Contas no uso de suas atribuições constitucionais deve declarar a ilegalidade do ato de Dispensa de Licitação e do Contrato derivado, aplicando-se as sanções previstas no art. 112, incisos II e III, da Lei Estadual n.º 16.168/07 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Goiás), para cada um dos fatos ilícitos aos responsáveis.
137. Além disso, este Parquet pugna pelo seguinte:
I) determinar à AGETOP que não dispense licitação fora das hipóteses previstas em lei e que nos casos fundados no inciso IV, art. 24, da Lei n.º 8.666/93, seja comprovada documentalmente a real situação emergencial;
II) determinar àquela Autarquia que respeite os prazos máximos de vigência dos contratos emergenciais, previstos na Lei n.º 8.666/93;
III) recomendar à AGETOP a realização de procedimento licitatório distinto para a contratação de serviços relativos a veículos automotores para fiscalização de suas obras;
IV) declarar a ilegalidade da fixação do BDI em 36,9% (trinta e seus inteiros e nove décimos por cento), sem que tenham sido procedidos cálculos analíticos, ocasionando sobrepreço e superfaturamento;
V) recomendar a observância às orientações do Tribunal de Contas da União;
VI) advertir ao Controle Interno sobre a sua responsabilidade solidária, prevista na CF/88 (art. 74, §1º); Constituição Estadual (art. 29, § 1º); e na Lei Orgânica do TCE/GO (art. 43), em face da existência de tantos vícios aparentes, de fácil constatação;
VII) expedir recomendações à AGETOP para que não se repitam os atos ilícitos elencados, haja vista já terem sido alvo de análise deste Parquet por centenas de vezes.
VIII) deve-se encaminhar cópia das principais peças dos autos para o Ministério Público Estadual, a fim de se apurar a configuração de improbidade administrativa e de crimes licitatórios, a exemplo dos tipos previstos nos arts. 89 e 92 da Lei n.º 8.666/93.
É o Parecer.
Goiânia, de agosto de 2010.
Ao Serviço de Comunicações e Protocolo do MP: entranhe-se; registre-se; numerem-se; e rubriquem-se.
Por fim, encaminhe-se ao Eminente Conselheiro-relator, com cordiais saudações.