DOAÇÃO FEITA AO NASCITURO E AO EMBRIÃO
DOAÇÃO FEITA AO NASCITURO E AO EMBRIÃO
XXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx.1 XXXXXX, Idivania Xxxxxxxx xx Xxxxxx.2
XXXXXXXX, Xxxxx.3
RESUMO:
O presente artigo científico aborda sobre os contratos de doação destinados aos nascituros e embriões. Denota-se que para que um contrato de doação ter sua eficácia, precisa-se de elementos já estabelecidos pela legislação vigente. Assim, à luz das leis constantes no nosso ordenamento jurídico, as doações ao nascituro ou embrião podem obter implicações e particularidades na atualidade, tendo em vista as constantes inovações tecnológicas e também no âmbito da medicina.
PALAVRAS-CHAVE: Doação, nascituro, embrião.
ABSTRACT:
This scientific article addresses donation contracts intended for unborn children and embryos. It is important to note that for a donation contract to be effective, it must include elements already established by current legislation. Thus, in light of the laws present in our legal system, donations to unborn children or embryos may have implications and particularities in the present day, considering the ongoing technological innovations and advancements in the field of medicine.
KEYWORD: Donation; Unborn child; Embryo.
1. INTRODUÇÃO
A doação realizada ao nascituro ou embrião é um tema de relevante discussão no Direito Civil, tendo em vista que há constantes inovações sociais e jurídicas que destacam a importância da compreensão da tutela dos direitos do nascituro, além de permitir reflexões sobre a possibilidade de doação também ao embrião.
À luz das leis constantes no ordenamento jurídico do Brasil, cabe esclarecer quais as possíveis implicações jurídicas que podem na realização destas doações. Nesse sentido, surgem cada vez mais questões sobre direitos patrimoniais e legitimidade das doações realizadas aos que ainda não são nascidos, tendo em vista que o Código Civil estabelece em seu Art. 2° que apenas adquire-se a personalidade com o nascimento com vida, todavia, a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção.
1Estudante do Curso de Direito do Centro Universitário FAG. E-mail: xxxxxxxxxx@xxxxx.xxx.xxx.xx 2Estudante do Curso de Direito do Centro Universitário FAG. E-mail: xxxxxxxxx@xxxxx.xxx.xxx.xx 3Docente Orientador do Centro Universitário FAG. E-mail: xxxxxxxxxxxxx@xxx.xxx.xx
Diante disto, portanto, busca-se esclarecer e analisar, conforme a medicina e a tecnologia reprodutiva avançam, como o Judiciário, além de tutelar estes possíveis direitos emergentes através da legislação vigente, também deve considerar as possíveis particularidades e implicações que envolvem este ato.
Dessa maneira, a presente pesquisa abordará a problemática apontada através da conceitualização doutrinária, bem como, do entendimento jurisprudencial. A contribuição de autores trará o esclarecimento dos fatos e esclarecerá a legitimidade e o modo que as doações podem ser realizadas, examinando-se, ainda, a repercussão jurídica do ato.
2. DOAÇÃO FEITA AO NASCITURO OU EMBRIÃO
Para compreender a temática abordada neste trabalho acadêmico, é importante conceituar e classificar o que se entende por nascituro, bem como os principais pontos característicos das doações. Essa abordagem visa esclarecer a relação existente entre os dois pontos, apontando as percepções que surgem quando bens são destinados àqueles que não possuem a plena personalidade jurídica.
2.1 DO NASCITURO E EMBRIÃO
Conforme Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (2024), considera- se como nascituro um ente que já foi concebido, isto é, tem-se a presunção da fusão dos gametas (junção do espermatozoide com o óvulo, formando o zigoto ou embrião), e nidado, qual seja implementado nas paredes do útero, mas que ainda não nasceu. Classifica que o significado etimológico da palavra nascituro é “o que está por nascer”.
Em alinhamento, Xxxxx Xxxx defende que "Nascituro é o ser humano que se desenvolve no ventre feminino. Sua existência, para os fins do direito civil, tem início com a implantação uterina efetiva, por meios naturais ou artificiais, e se encerra quando nasce com vida ou morto." (2024, p.126). Ademais, complementa que o nascituro não é pessoa, mas se o direito determinasse poderia ter seu reconhecimento como um sujeito de direito (Lôbo, 2024).
Para adquirir a personalidade jurídica, Xxxxxxxxx (2023) explica a concepção do dispositivo legal, pelo qual considera-se que o surgimento de uma pessoa decorre com o nascimento com vida. Conforme ele:
No instante em que principia o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Xxxxxx, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a falecer minutos depois. Ao menos aparentemente esta teria sido a opção do legislador brasileiro, na medida em que tradicional corrente doutrinária defende a denominada teoria natalista (Gangliano, 2023, p. 218-220).
Desse modo, cumpre salientar sobre a teoria natalista, que é adotada pelo atual Código Civil. Essa teoria é uma corrente doutrinária que defende que o nascituro não possui personalidade jurídica, mas expectativas de direitos. Para Xxxxxxxx Xxxxxxxxx (2020, p. 147) “embora não seja ainda dotado de personalidade em sentido subjetivo, ou seja, de aptidão genérica para ser titular de direitos e obrigações, o nascituro tem alguns de seus interesses (futuros e eventuais) protegidos, desde logo, pela ordem jurídica”.
Ao remeter-se ao nascituro, é importante abordar as questões condizentes aos embriões a fertilização in vidro. Para alguns doutrinadores, a concepção ocorre no momento da fecundação, isto é, quando o espermatozoide penetra no óvulo, independentemente de esse processo acontecer dentro ou fora do corpo da mulher. Contudo, essa percepção pode ser questionada, já que muitos embriões gerados por fertilização in vitro acabam sendo descartados, dado que os pais optam por não ter mais filhos (Xxxx, 2024). Além disso, a fim de explicar o que são os embriões Lôbo, define que "embrião é o ser humano durante as primeiras semanas de seu desenvolvimento intrauterino, ou em proveta e depois no útero, nos casos de fecundação in vitro" (2024, p.130).
Nesse contexto, cumpre mencionar que conforme o art. 2º, do Código Civil, a personalidade civil de uma pessoa inicia-se a partir do nascimento com vida. Entretanto, a lei põe a salvo, desde a sua concepção os direitos do nascituro.
Sobre essa perspectiva, Tartuce (2023) ressalta sobre um possível contraditório presente nesse dispositivo legal (art. 2º, CC). Em sua primeira parte, estabelece que os nascituros não são pessoas, e, portanto, sem direitos. Contudo, na segunda parte há uma controvérsia ao garantir determinados direitos ao nascituro, mesmo sem ser uma pessoa em sentido jurídico completo.
Outrossim, remetendo-se a esse dispositivo, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx expõe a corrente de que os embriões não estão abrangidos pelo art. 2º. Conforme ela defende, "Se nascer com vida adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer nenhum direito patrimonial terá" (Diniz, 2024, p.399). Assim, nota-se, através do viés doutrinário, que apenas após o nascimento com vida, a pessoa torna-se sujeito de direitos e adquire personalidade jurídica, sendo que se não houver vida, não haverá direitos patrimoniais.
Já para Xxxxxx Xxxxxx (2023), pela razão de ter-se grande avanço genético, busca-se também proteger o embrião, gerando de certa maneira polêmica, dado que ele não apresenta ser uma forma de vida sempre viável. Dessa forma, cabe a ciência fornecer aos juristas a exata concepção da dimensão dos embriões como titulares de direitos. Ele ainda afirma que “Há tentativas legislativas no sentido de ampliar essa proteção ao próprio embrião, o que alargaria em demasia essa ‘quase personalidade’. Aguardemos o futuro e o que a ciência genética nos reserva” (Venosa, 2023, p. 228). No que diz respeito a temática, destaca-se o estudo de Silmara Juny de Abreu Chinellato, que trouxe uma relevante percepção ao tema, posicionando-se de forma alternativa à inclusão expressa
do embrião no art. 2º, do Código Civil.
Segundo a autora, a fim de esclarecer sobre os nascituros e os embriões:
Nascituro é a pessoa por nascer, já concebida no ventre materno. Tratando-se de fecundação in vitro, realizada em laboratório, há necessidade de implantação do embrião in anima nobile, para que se desenvolva, a menos que se o congele ou criopreserve, conforme nos ensinam os especialistas em reprodução humana assistida (Chinellato, 2008, p. 158).
Dessa maneira, Silmara Chinellato (2008) define que nascituro é aquele que está para nascer e está concebido no ventre da mãe. Já os embriões, de maneira indireta, podem ser conceituados como o ser concebido fora do corpo materno (fertilização in vitro), pelo qual para que tenha chance de se desenvolver, é necessário que seja implantado em um útero ou esteja em estado de congelamento ou criopreservado.
Nesse sentido, conforme Silmara Chinellato (2008), ao acrescentar a palavra embrião no art. 2º, do Código Civil, isso seria negar a qualidade que o nascituro já tem de todas as suas fases de desenvolvimento, inclusive a de pré-implantatório. Portanto, a lei deve diferenciar a capacidade jurídica do nascituro implantado e não implantado, sem negar a condição de nascituro ao embrião. Com isso, nota-se que a falta de regulamentação específica, ocasiona embates bioéticos nas questões jurídicas, o que gera lacunas nos dispositivos aplicáveis.
Ainda, Tartuce (2023) manifesta sobre as três teorias presentes no art. 2º, do Código Civil, sendo a teoria natalista, a teoria da personalidade condicional e a teoria concepcionista. Denota-se que a primeira teoria, já mencionada nesse artigo, aborda que os nascituros não possuem até mesmo os seus direitos fundamentais, como a personalidade, direito à vida, investigação de paternidade, aos alimentos, nome e imagem, além de ser desfavor as novas técnicas de reprodução e direito aos embriões. Tais direitos só são dispostos com o nascimento com vida.
Já a segunda teoria está interligada a tese de que a personalidade civil começa com o nascimento com vida, porém os direitos do nascituro sujeitam-se a condição suspensiva. Isso pois, são eventos futuros e incertos, pelo qual acarreta uma mera expectativa de direitos.
A última teoria é a que o nascituro é pessoa humana, tendo seus direitos resguardados pela lei. Dessa forma, em alinhamento, Xxxxxxxx Xxxxxxxxx (2020) afirma que alguns códigos estrangeiros utilizam a última teoria para ser aplicada em seus países, porém isso produz distinções relevantes sobre a fertilização in vitro, o aborto e o direito de herança. Cabe ressaltar que a última teoria é a que vem sendo defendida e adotada por muitos doutrinadores renomados no ordenamento brasileiro, como Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxx xx Xxxxxxx e entre outros.
Vale salientar o que afirma Xxxxxxx Xxxxxxxxxx:
O nascimento com vida aperfeiçoa o direito que dele dependa, dando-lhe integral eficácia, na qual se inclui sua transmissibilidade. Porém, a posse dos bens herdados ou doados ao nascituro pode ser exercida, por seu representante legal, desde a concepção, legitimando-o a perceber as rendas e os frutos, na qualidade de titular de direito subordinado à condição resolutiva (2008, p. 174).
Posto isso, uma vez que verificado os elementos que dão início à personalidade jurídica, bem como o resguardo de direitos ao nascituro, importa avaliar qual a extensão destes direitos atribuídos, especialmente no que toca o contrato de doação.
2.2 DA DOAÇÃO
Conforme Xxxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxxx (2024) o proprietário de um bem, quando doa algo para alguém, exerce um grau máximo do seu direito sobre a coisa. Outrossim, a doação possui natureza contratual, uma vez que o donatário, aquele que recebe o benefício, em regra, deve aceitar recebê-la, sob pena de não haver o devido consentimento e o contrato tornar-se inexistente. Por tanto, para ser uma doação, deve haver mera liberalidade do doador querer beneficiar ou favorecer o donatário.
No que diz respeito ao conceito da doação, percebe-se que ele se encontra expresso no art. 538, do Código Civil, no qual considera-se a doação o contrato pelo qual um indivíduo utilizando de sua liberalidade, transfere de seus patrimônios bens ou vantagens para o de outra pessoa.
Posto isso, verifica-se que que a doação é um "negócio jurídico firmado entre dois sujeitos (doador e donatário), por força do qual o primeiro transfere bens, móveis ou imóveis para o
patrimônio do segundo, animado pelo simples propósito de beneficência ou liberalidade." (Gagliano, 2024, p. 691).
Sobre os caracteres jurídicos, Xxxx Xxxxxxx (2003) exibe que o contrato de doação são contratos gratuitos (gera benefício ou vantagem apenas para o donatário), unilaterais (uma vez que cria obrigações para uma das partes) e formais (considerando que deve obedecer à forma prescrita em lei). Para Xxxxxx Xxxxxxx (2003) para que um contrato de doação seja considerado válido, basta que exista a intenção de doar. Isso pode ser justificado pelo próprio Código Civil, “Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo”. Dessa maneira, o doador pode fixar um devido prazo para que o donatário declare
anuência, em que se o doador ficar em silêncio traz a presunção relativa, iuris tantum, de aceitação.
Em contraposição, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx (2024) defende quatro elementos fundamentais que caracterizam uma doação, sendo a contratualidade, o ânimo do doador de fazer uma liberalidade, a transferência de bens ou de direitos do patrimônio do doador para o donatário e a aceitação do donatário.
Ademais, alguns outros requisitos especiais são necessários, sendo eles subjetivos, objetivos e formais. No que tange os requisitos subjetivos, isto é a capacidade passiva ou ativa para doar, postula- se que, por exemplo, os absolutamente e relativamente incapazes, em regra, não podem doar, até mesmo pelos seus representantes, tendo em vista a liberalidade em que não se considera os interesses do representado. Alguns outros exemplos, são: os cônjuges (sem devida autorização, com exceção no regime de separação absoluta), cônjuge adúltero ao seu cúmplice, consorte entre si se o regime for de comunhão universal, falido ou insolvente e entre outros requisitos importantes (Diniz, 2024).
Em relação a capacidade passiva, ou seja, de receber a doação, salienta-se que não se tem problema nas doações puras e simples, haja vista a caracterização benéfica desse ato. Conforme, art. 543, CC, “Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura”.
Sobre os requisitos objetivos, verifica-se a necessidade de objetos que estejam in commercio, ou sejam bens móveis, imóveis, corpóreos ou incorpóreos, futuros ou presentes, direitos reais, vantagens patrimoniais. Posto isso, analisa-se que deverão ser observados algumas normas, como o fato de que doação de bens alheios é inadmissível, uma vez que não são objetos do devedor (Diniz, 2023).
O último requisito, sendo ele o formal, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx (2023) verifica o que dispõe o art. 541, do Código Civil, ou seja, a obrigatoriedade de ser de modo escrito, quando for por instrumento de cunho público e particular, com exceção de verbal em casos especiais.
Nesse sentido, Xxxxxxxx Xxxxxxxxx (2020) ressalta que no direito brasileiro as doações são divididas por espécies, sendo a doação pura (doação simples e não subordinada a evento futuro ou incerto), doação condicional (depende para ser eficaz de algum acontecimento futuro e incerto), doação propter nuptias (subespécie da condicional, para um casamento futuro e com certa e determinada pessoa), doação meritória (doação por merecimento), doação remuneratória (doação por gratidão aos préstimos do donatário), doação com cláusula de reversão (doação com condição resolutiva, pelo qual se o donatário morre primeiro que o doador, volta-se o bem ao patrimônio do donatário) e a doação modal (doação submetida a encargo ou modo).
É possível verificar ainda, a respeito da invalidade das doações. De acordo com o entendimento de Xxxxxxxxx (2020), a título de exemplificação, o próprio código expõe hipóteses pelo qual os contratos tornam-se inválidos, como o caso do art. 548, CC, em que se considera nula a doação universal, sem reserva de bens ou renda suficiente para autonomia e subsistência do doador. Outras disposições que versam sobre a nulidade do contrato de doação são a doação inoficiosa (art. 549, CC) e a doação feita pelo cônjuge adúltero ao cúmplice (art. 550. CC).
Por conseguinte, debata-se a respeito da revogação da doação, pelo qual Xxxxxxxxx afirma que, “A revogação da doação tem efeitos retroativos (ex tunc) e só é admitida pela nossa ordem jurídica em duas hipóteses: (a) descumprimento do encargo ou (b) ingratidão do donatário” (2020, p. 759). Salienta-se que isso está alinhado ao que dispõe o art. 555, CC, “A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou por inexecução do encargo”.
Posto isso, segundo o autor, o descumprimento do encargo ocorre somente nas doações modais, em que em alinhamento ao art. 562, CC, caso não tenha sido estipulado prazo, o doador pode notificar o donatário fixando um determinado prazo para o cumprimento. Sobre a ingratidão, ela encontra-se prevista no art. 557, CC,
Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações: I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; II - se cometeu contra ele ofensa física; III - se o injuriou gravemente ou o caluniou; IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava (Brasil, 2002).
O Código Civil, em seu art. 558, considera que a ofensa a parentes próximos do doador também são formas de ingratidão. Outrossim, mencionam que “A revogação por ingratidão assume natureza
jurídica de penalidade, punindo-se o donatário que praticou ato que o tornou desmerecedor da liberalidade” (Tepedino; Konder; Bandeira, 2021, p.359).
Sendo assim, uma vez explicados os principais termos gerais da doação, observa-se como ela é utilizada especificamente quando feita ao nascituro ou embrião.
2.3 DA DOAÇÃO FEITA AO NASCITURO OU EMBRIÃO
Como já observado, sabe-se que os direitos do nascituro são garantidos pelo Código Civil, assim, Gagliano (2024), ressalta que a doutrina concepcionista possui como égide o efetivamente tutelar os direitos do nascituro, o sistema jurídico já declara pessoa, posto que, de acordo com a regularização do direito privado, apenas pessoas são sujeitos de direito, e, por consequência têm personalidade jurídica.
Diante disto, esse reconhecimento esclarece diversos aspectos. O código civil em seu art. 1° estabelece que "toda pessoa é capaz de direitos e obrigações na ordem civil". Sob esta perspectiva, percebe-se que o nascituro, ainda que seja protegido em suas expectativas de direitos, este está sob a proteção, mesmo que esteja em fase de desenvolvimento intrauterino.
Segundo Xxxxxxxx (2024), destarte, para a teoria da personalidade condicional, no decorrer da gestação, o nascituro é protegido pela lei (o curador ou seu representante legal ficaria como responsável pelo cuidado de seus direitos), que lhe assegura direitos personalíssimos e patrimoniais submetendo-os à condição suspensiva, ou seja, com o nascimento com vida.
Conforme mencionado, esta teoria baseia-se que o direito se estende ao nascituro, assegurando- os mesmo antes do nascimento. Tais direitos serão zelados pelo curador ou representante do nascituro, que estará sujeito à suspensão até o nascimento com vida deste. Percebe-se uma significativa evolução na interpretação dos direitos civis, tendo em vista tal reconhecimento de que os direitos começam a ser tutelados desde a concepção.
Ainda, de acordo com o entendimento do autor, "Nada impede, pois, que alguém pretenda fazer uma doação de bens ou valores ao nascituro, não obstante esta estipulação negocial esteja subordinada a uma condição suspensiva (nascimento com vida do donatário).” (Gagliano, 2024, p.761). Percebe- se que é permitido e possível que seja realizada uma doação ao nascituro, desde que, conforme o art. 542 do CC, terá que ser aceita pelo representante legal, ficando este responsável por garantir a doação até o nascimento com vida do donatário.
Destaca-se, segundo Xxxx (2023), apesar de não ser pessoa viva, o nascituro é sujeito de direito e tem potencial de exigir, por seu representante legal, o cumprimento da obrigação do contratante promitente, mesmo que só será capaz adquirir a titularidade plena desse direito quando nascer com vida.
Além disso, conforme Xxxxx Xxxxxx Xxxxx,
Por se tratar de contrato benéfico, o donatário não precisará ter capacidade de fato para aceitar a doação pura e simples, embora se suponha necessário o consentimento de seu representante legal. Mesmo o nascituro (infans conceptus) poderá receber doação, mas a aceitação deverá ser manifestada pelo seu representante legal, ou seja, por aquele a quem incumbe cuidar de seus interesses (CC, art. 542): pai, mãe ou curador. Se nascer morto, embora aceita a liberalidade, esta caducará, por ser o nascituro titular de direito sob condição suspensiva. Se tiver um instante de vida, receberá o benefício, transmitindo-o aos seus sucessores (CC, art. 2º, 2ª parte) (Diniz, 2024. p. 263).
Vale destacar que, conforme o artigo 130 do Código Civil, “Ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo”. O responsável legal ou curador, poderá, portanto, realizar ações para o fim de conservar a doação nos casos que couber as condições mencionadas.
Nesse sentido, a título de exemplificação dos direitos de doação assegurados aos nascituros, à jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DOAÇÃO CUMULADA COM PETIÇÃO DE HERANÇA. APELAÇÃO DAS RÉS (1) DOAÇÃO REALIZADA DE ASCENDENTE A DESCENDENTE. TRANSFERÊNCIA DA INTEGRALIDADE DO PATRIMÔNIO DO DOADOR. VIOLAÇÃO DA LEGÍTIMA.FILHO XXXXXXXXX. DIREITOS RESGUARDADOS. FILHO FRUTO DE POUCOS DIAS APÓS A LAVRATURA DA DOAÇÃO. PECULIARIDADES QUE DENOTAM INTENÇÃO DE PRETERIÇÃO DE UM FILHO, EM DETRIMENTO DE OUTRO, ATRAVÉS DA LIBERALIDADE.DOAÇÃO INOFICIOSA CARACTERIZADA.ANULAÇÃO DA PARTE QUE EXCEDEU À LEGÍTIMA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS.1.176 e 1.721, DO CCB/16. APELAÇÃO DOS AUTORES (2) POSSIBILIDADE DE DOAÇÃO DA PARTE DISPONÍVEL.LIMITAÇÃO A 50% DO PATRIMÔNIO DO PAI. PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DAS CLÁUSULAS DE INCOMUNICABILIDADE E INALIENABILIDADE. CONSEQUÊNCIA DA NULIDADE DA DOAÇÃO. RECURSO DE APELAÇÃO DAS RÉS DESPROVIDO E RECURSO DE APELAÇÃO DOS AUTORES, PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJPR - 12ª Câmara Cível - AC - Araucária - Rel.: DESEMBARGADOR XXXXX XXXXXX XXXXX - Xxxxxxx - X. 31.08.2016) (grifo nosso).
Dessa forma, percebe-se que essa jurisprudência se trata de uma ação cível que possuía como enfoque a declaração de nulidade de uma doação, tendo em vista que houve a doação integral do patrimônio de um pai para um de seus descendentes. Observa-se que alguns pontos relevantes devem
ser analisados, como o caso do nascituro, em que mesmo ainda não tendo nascido, já possui os seus direitos à herança, bem como doação se fosse o caso, apreciando a legítima.
Conforme o entendimento de Diniz (2024), na hipótese de o bebê nascer morto, este não adquire personalidade jurídica material e, consequentemente, não receberá, nem transmitirá a herança de seu pai (...). Sob esta ótica, percebe-se que apenas com o nascimento com vida, a doação se concretizará. Denota-se que não há previsão legal para doações realizadas ao embrião, sendo inviável tal ato.
Gagliano (2024), ainda, destaca que além disso, a regra geral, do modo que se acredita, é na essência de que os contratos necessitam ser celebrados entre pessoas existentes, capazes e legitimadas, somente se admitindo, excepcionalmente e por expressa permissão legal, que se permite figurar no contrato um ente ainda não nascido. Em razão disto, há direitos ressalvados pelo legislador apenas ao nascituro.
Em síntese, a doação é viável ao nascituro, sendo tutelada por um representante até o seu nascimento com vida, ressaltando que não se concretizará se não houver vida, ou seja, ao natimorto não restará direitos patrimoniais. Do mesmo modo, não há previsão de doações à luz do atual ordenamento jurídico para os embriões.
3. METODOLOGIA
A metodologia aplicada para a elaboração desse artigo científico é a qualitativa, no qual visa compreender as teorias e conceitualizações com uma análise crítica do que está sendo estudado. Verifica-se que como fontes de pesquisa, foram realizadas buscas em legislações vigentes, entendimentos doutrinários, estudos aprofundados sobre os direitos do nascituro e jurisprudência aplicáveis, uma vez que pelo tema envolver questões complexas, é fundamental haver diversidade de fontes a fim de interpretar as controvérsias relacionadas ao tema.
Desde o início a pesquisa explorou discutir o modo que esse assunto repercute na vida dos indivíduos, averiguando o aprofundamento jurídico sobre as questões relacionadas as doações feitas aos nascituros e embriões. Observando, ainda, as consequências jurídicas que pode haver com a concretização das doações.
4. ANÁLISES E DISCUSSÕES
Diante ao exposto, considerando toda a pesquisa efetuada, percebe-se que o nascituro e os embriões possuem direitos assegurados. Entretanto, ao analisar sobre os direitos de receber doações, são necessários análises importantes sobre a temática, uma vez que apresentam lacunas jurídicas que devem ser estritamente observadas.
Com a pesquisa, percebe-se que os nascituros possuem direitos as doações, mesmo ainda não tendo nascido. Desse modo, verifica-se que, para que esse direito seja assegurado, deve o responsável do nascituro oferecer tutela até o nascimento do verdadeiro donatário, isso é, o ser que está para nascer. Em contradição, os embriões, principalmente ao embate da fertilização in vitro, ou seja, que se quer ainda estão dentro do ventre materno, não possuem a mesma personalidade para que possa ser aplicados os institutos das doações.
Portanto, o que se discute no presente artigo científico são os pensamentos existentes sobre as preliminares das doações aos nascituros e embriões, considerando que são relatados alguns pontos específicos ligadas as perceptíveis brechas das legislações vigentes, que devem se adequar ao avanço da genética. Sendo assim, prescreve-se que quando se têm mudança voltadas as áreas médicas e científicas, isso demanda novas realidades, inclusive no âmbito jurídico.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo científico buscou esclarecer a possibilidade de doações ao nascituro à luz do Código Civil brasileiro, analisando estas hipóteses enfatizando as consequências legais que cercam o tema. Assim, observa-se que a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção. Em razão disto, é plenamente possível realizar doações ao nascituro, desde que seja tutelado pelo representante legal até o nascimento do donatário.
Ao examinar-se a posição jurídica dos embriões, especialmente no âmbito da medicina ao tratar-se de fertilização in vitro, torna-se evidente a ausência de uma personalidade que seja reconhecida pela legislação vigente, limitando a aplicabilidade de institutos como a doação. A doutrina esclarece que apenas seres como vida intrauterina concretamente desenvolvida poderia ser sujeito de direitos, não se estendendo a ele as mesmas proteções que são realizadas ao nascituro.
Portanto, o Código Civil não reconhece, em nenhuma hipótese, que seja realizada doações à um embrião, uma vez que não há um vínculo jurídico suficiente entre o embrião e os direitos patrimoniais, pois este encontra-se em estágio extracorpóreo, assim como os casos de fertilização in vitro, não podendo, portanto, falar-se em direitos civilistas. Diferentemente, o nascituro se encontra
inserido no estágio de desenvolvimento vital dentro do útero materno, sendo um titular de direitos potenciais, ou seja, é possível que haja a expectativa que este adquira o direito com seu nascimento com vida.
Tal distinção é essencial para o entendimento dos limites jurídicos das doações, em razão de que, em termos doutrinários, o nascituro possui expectativas de direitos patrimoniais tuteladas pela legislação, sendo que, por outro lado, o embrião, como sabe-se, mantido em laboratório, no âmbito da medicina, conhecido como fertilização in vitro, por sua natureza técnica e pelo contexto, não possui essa mesma tutela jurídica quanto a mera expectativa, não podendo ser beneficiário de doações.
REFERÊNCIAS
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