AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES
AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES
VOTO
RELATORIA: Diretor-Geral
TERMO: Voto à Diretoria Colegiada
NÚMERO: 60/2020
OBJETO: Pedido de inclusão de subcláusula em minuta de contrato de concessão da BR-101/SC
ORIGEM: Superintendência de Concessão da Infraestrutura - SUCON
PROCESSO (S): 50500.053367/2020-15
PROPOSIÇÃO PRG: PARECER nº 00275/2020/PF-ANTT/PGF/AGU
ENCAMINHAMENTO: À VOTAÇÃO – DIRETORIA COLEGIADA
1.1. Trata-se de solicitação da CCR S.A. (“CCR”), datada de 03 de junho de 2020, para inclusão de cláusula no contrato da concessão da BR-101/SC que faça constar que o Poder Concedente é responsável pelos riscos relacionados aos “efeitos decorrentes da pandemia do novo coronavírus (COVID-19), objeto do Decreto Legislativo nº 06/2020".
2. DOS FATOS
2.1. A CCR S.A. logrou-se vencedora do Leilão nº 02/2019 ocorrido em 21 de fevereiro de 2020, em São Paulo. Após pedido de dilação de prazo para apresentação de documentos pela empresa, o contrato tinha passado para previsão de assinatura em 25 de junho de 2020, o qual foi novamente adiado em decorrência do presente pleito.
2.2. A empresa afirma que o atraso na apresentação da documentação já se deve às consequências da pandemia. Prossegue afirmando que "esta segue produzindo consequências imprevisíveis nas atividades econômicas".
2.3. Apresenta informação de queda de 43,8% do índice ABCR, na comparação entre abril/2020 e abril/2019, sendo que o fluxo de veículos leves teria diminuído em 51,5% e o de veículos pesados em 20,5%.
2.4. Em seguida, apresenta trecho de decisão do Supremo Tribunal Federal – STF na ADI nº 6.357/DF, em que se reconhece a excepcionalidade e imprevisibilidade da situação atual de pandemia e menciona ainda o Parecer nº 261/2020/CONJUR-MINFRA/CGU/AGU, destacando que a pandemia pode ser classificada como evento de força maior ou caso fortuito, com álea extraordinária.
2.5. Por fim, apresenta informação de que a Artesp, no Contrato de Concessão nº 0409/ARTESP/2020, ligação entre Piracicaba e Panorama, realizou Termo Aditivo e Modificativo nº 01/2020 para incluir cláusula no contrato de concessão e colaciona trecho de documentação da Artesp que aduz que "para reconhecer que a pandemia do novo coronavírus (COVID-19) se configura como caso fortuito e/ou força maior, o que, nos termos da Cláusula 48.1.1., item “iii”, combinada com Cláusula 19.2, item “iii”, ambas do Contrato de Concessão, autorizam as aferições dos efeitos no equilíbrio econômico-financeiro do contrato".
2.6. Assim, a CCR requer a inclusão de item 20.2.3.1 na minuta de contrato de concessão da BR-101/SC, qual seja:
20.2 O Poder Concedente é responsável pelos seguintes riscos relacionados à Concessão: (...)
20.2.3 caso fortuito ou força maior, desde que o fato gerador não seja segurável no Brasil considerado o prazo de um ano anterior à data da ocorrência por, no mínimo, duas seguradoras;
20.2.3.1 os efeitos decorrentes da pandemia do novo coronavírus (COVID-19), objeto do Decreto Legislativo no 06/2020
2.7. Com base no pedido formulado pela CCR mencionado, a Superintendência de Concessão de Infraestrutura - Sucon, por meio do OFÍCIO SEI Nº 11334/2020/SUCON/DIR-ANTT (SEI nº 3533950), de 17 de junho de 2020, solicitou à Comissão de Outorga nº 02/2019, relativa ao leilão da BR-101/SC, que para análise detalhada e atendimento à demanda apresentada, a necessidade de postergação do prazo para manifestação da referida Superintendência e análise jurídica pela PRG. Nesse documento, foi indicada previsão da postergação da data de assinatura do contrato para 09 de julho de 2020.
2.8. A Sucon analisou o pleito por meio da NOTA TÉCNICA SEI Nº 2784/2020/SUCON/DIR (SEI nº 3615767), e propôs minuta de Deliberação (SEI nº3615897). A Procuradoria Federal Junto à ANTT expediu o Parecer n. 00275/2020/PF-ANTT/PGF/AGU (SEI n3º638901), entendendo ser legítima
a minuta de deliberação. A Comissão de Outorga expediu Comunicado Relevante nº 06/2020 (SEI nº 3633735) postergando a publicação do Ato de Outorga para dia 8 de julho de 2020 e a assinatura do Contrato de Concessão para dia 9 de julho de 2020.
Parecer n. 00275/2020/PF-ANTT/PGF/AGU
18. Pelo exposto, entendo legítima a minuta de Deliberação anexa à NOTA TÉCNICA SEI Nº
2784/2020/SUCON/DIR, seja do ponto de vista formal, seja pela adequação de seu conteúdo às disposições constitucionais, legais e contratuais
3.1. A Sucon, por meio do Relatório à Diretoria 424 (SEI nº3645891), apresentou proposta de deliberação para dar direito ao enquadramento das situações não previstas, diretamente decorrentes da COVID-19, como caso de força maior ou caso fortuito, para fins de reequilíbrio econômico-financeiro, o qual deve ser reconhecido, mas analisado em seus efeitos fáticos no momento oportuno da revisão contratual. Apresenta entendimento que inexistem modelos preditórios confiáveis quanto aos efeitos socioeconômicos futuros decorrentes da crise de saúde pública causada pela COVID-19.
3.2. A Superintendência apresenta extensiva análise dos efeitos da pandemia, abordando as razões de fato que levaram a ANTT a adotar diversas medidas emergenciais de alteração e flexibilização de normativos regulatórios para fins de mitigar os efeitos da pandemia no setor de transporte, devidamente embasada na situação pandêmica e na repentina mudança de práticas cotidianas que foram levadas a cabo em decorrência das instruções para o isolamento social provenientes da Organização Mundial da Saúde – OMS.
3.3. A área técnica também informa que a Agência se manifestou recentemente junto ao Tribunal de Contas da União – TCU, por meio da NOTA TÉCNICA SEI Nº 2665/2020/GEREG/SUCON/DIR (SEI nº 3590263), de 15 de junho de 2020, em resposta a expediente de diligência do Tribunal a respeito da desestatização da BR-163/MT/PA e BR-230/PA, informando que “diante da grande imprevisibilidade das consequências econômicas e sociais da atual crise – seja pelas restrições impostas pelo combate à pandemia, seja em razão da mudança de comportamento das pessoas no pós-crise – é prudente aguardar momento de maior certeza acerca de sua extensão e intensidade antes de readequação das premissas e projeções.”
3.4. Asseverou-se, ainda, que não há dados “mais confiáveis para alimentar novas estimativas de tráfego, sobretudo quanto ao arrefecimento da pandemia e a consequente retomada da atividade econômica – o que em si já é um desafio, ante a inexistência de modelos preditórios confiáveis acerca do comportamento da Covid-19”. Resposta no mesmo sentido já havia sido dada também no âmbito do processo de fiscalização da concessão da BR- 153/080/414/TO/GO, por meio da NOTA TÉCNICA SEI Nº 1852/2020/CEOUT/GEREG/SUINF/DIR (SEI nº 3297399), de 29 de abril de 2020.
3.5. Quanto ao leilão da BR-101/SC, ocorrido em 21 de fevereiro de 2020, ressalta-se que já havia dados referentes à notoriedade de casos em outros países, em especial China, que reportou os primeiros casos à OMS em 31 de dezembro de 2019. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS reconhece o vírus como uma emergência de saúde pública de importância internacional e em 03 de fevereiro de 2020 declarou-se no Brasil a Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional, com a publicação da Lei nº 13.979, de 06/02/2020 – Lei da Quarentena. Entretanto, apesar do acompanhamento de casos suspeitos, o primeiro caso oficial reportado em território brasileiro ocorreu somente em 26 de fevereiro de 2020. A declaração de pandemia, pela OMS, ocorreu em 11 de março de 2020.
3.6. A Procuradoria Federal Junto à ANTT expediu o Parecer n. 00275/2020/PF- ANTT/PGF/AGU (SEI nº 3638901) justificando:
(...)
8. A questão jurídica que se coloca aqui vai além de declarar a pandemia COVID-19 como evento de força maior, eis que essa declaração já foi feita e assumida por essa Agência em normativos que flexibilizaram o cumprimento de algumas obrigações sobretudo regulatórias, também já decorrendo do Decreto Legislativo n. 06/2020, quando reconhece a ocorrência do estado de calamidade pública, e mais especificamente do entendimento firmado no Parecer n. 261/2020/CONJURMINFRA/CGU/AGU.
9. O que releva para o caso em apreço é, como dito na NOTA TÉCNICA SEI Nº 2784/2020/SUCON/DIR, firmar uma interpretação jurídica (que nesse momento é casuística) sobre:
1. a imprevisibilidade dos efeitos extraordinários da pandemia no momento em que apresentada a proposta econômica pela concessionária, datada de 17 de fevereiro de 2020;
2. a necessidade de avaliar a repercussão desses efeitos extraordinários sobre o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão;
3. o momento em que será avaliada a repercussão desses efeitos extraordinários sobre o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão (qual seja, revisões contratuais); e
4. o parâmetro a ser considerado na análise do equilíbrio econômico-financeiro (que será a avaliação das condições vigentes no momento de apresentação da proposta da licitação).
(...)
15. Se há uma certeza sobre a caracterização da pandemia COVID-19 enquanto um evento de força maior (com incidência ao caso da subcláusula 20.2.3 da minuta de contrato), o mesmo não se dá com a repercussão dos seus efeitos extraordinários sobre o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão. Devem ser objeto de demonstração, aferição e apuração. É nesse sentido que a NOTA TÉCNICA SEI Nº 2784/2020/SUCON/DIR bem cita a seguinte passagem do Parecer n. 261/2020/CONJURMINFRA/CGU/AGU:
Em todo caso, seria necessário avaliar se "a pandemia teve efetivo impacto sobre as receitas ou despesas do concessionário. É possível que, em determinados casos, não tenha ocorrido impacto significativo. Esses elementos deverão ser devidamente examinados para que se possa concluir se um determinado contrato deve ser reequilibrado."
16. E mais: a avaliação do impacto dos efeitos extraordinários da pandemia COVID-19 sobre as receitas ou despesas do concessionário ocorrerá no bojo das revisões contratuais. Registre-se, no ponto, que a revisão ordinária, prevista na subcláusula 17.4 da minuta de contrato, contempla
aplicação de fatores de reequilíbrio, que a revisão quinquenal, prevista na subcláusula 17.5, prevê alterações do Programa de Exploração Rodoviária - PER que também poderiam ser utilizadas para finalidade de recomposição desse equilíbrio, e que a revisão extraordinária tem um escopo bem específico (mas não excludente dos reflexos que poderiam decorrer da pandemia nas demais revisões tarifárias), tal qual previsto na subcláusula 17.6.1 da minuta de contrato:
17.6.1 Nas revisões extraordinárias serão consideradas as repercussões decorrentes, única e exclusivamente, de força maior, caso fortuito, fato da Administração, alteração unilateral urgente do Contrato ou fato do príncipe de que resulte, comprovadamente, alteração dos encargos atribuídos à Concessionária que comprometa ou possa comprometer sua solvência e/ou continuidade da execução/prestação dos serviços previstos neste Contrato. (grifamos)
(...)
3.7. A Sucon apresentou a informação de que a data para se analisar a ocorrência ou não de efeitos da pandemia se daria no dia de apresentação das propostas das licitantes, o que ocorreu no dia 17 de fevereiro de 2020. Em conformidade com arts. 9 e 10 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, em que disciplina-se que o equilíbrio econômico-financeiro seria estabelecido conforme as regras do edital e do contrato e que a tarifa será fixada na data de apresentação de propostas. A Sucon analisou as razões por que a usual cláusula de alocação ao Poder Concedente do risco de caso fortuito ou força maior presente na minuta do contrato não é suficiente.
A despeito da constatação de que a cláusula tradicional presente nos contratos de concessão de alocação do risco de caso fortuito ou força maior permite o enquadramento dos impactos da pandemia do coronavírus sobre os contratos existentes firmados pela ANTT previamente ao surgimento dessa questão de emergência internacional, paira dúvida sobre o contrato da BR- 101/SC, justamente porque a sua assinatura está prevista para momento em que a pandemia se encontra em plena produção dos seus efeitos. Vejamos também a cláusula contratual.
20.2 O Poder Concedente é responsável pelos seguintes riscos relacionados à Concessão:
(...)
20.2.3 caso fortuito ou força maior, desde que o fato gerador não seja segurável no Brasil considerado o prazo de um ano anterior à data da ocorrência por, no mínimo, duas seguradoras;
Assim, não havendo notícia de seguro que proteja contra os impactos de um evento da natureza de uma pandemia, a controvérsia neste caso residiria sobre o momento em que se considera como referência para se verificar a existência do fato gerador do caso fortuito ou força maior, se na formulação da proposta ou na assinatura do contrato. Nesse sentido, embora a Lei Geral de Concessões fale em condições do edital e do contrato, há que se considerar que, pelo vínculo ao instrumento convocatório, o equilíbrio econômico-financeiro refletivo no contrato se estabelece no momento da apresentação da proposta, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal.
De fato, a agência reguladora deve justamente prover segurança e previsibilidade ao mercado regulado, dirimindo situações com potencial incerteza, as quais possam gerar risco ou comprometer as atividades finalísticas almejadas e, consequentemente, os serviços que devem ser entregues à sociedade e perante uma situação de potencial exceção em relação ao restante do setor, como no caso em tela, faz-se necessário emitir, portanto, posicionamento acerca do tratamento a ser futuramente conferido ao caso, nivelando expectativas e conferindo estabilidade ao comportamento dos agentes privados envolvidos. A diferenciação entre os privados deve ocorrer tão somente de acordo com as especificidades de cada caso, caracterizando postura isonômica e horizontal diante do conjunto de atores do mercado.
Considerando a lógica de formulação de propostas para uma concessão, a qual é de natureza complexa, envolvendo diversos levantamentos de campo, trabalhos de escritório e decisões empresariais estratégicas, e diante do que foi exposto, a Sucon entendeu que não se poderia exigir da concessionária, no momento da realização do leilão, ou, mais precisamente, no momento da apresentação da proposta lacrada da concessionária, 4 (quatro) dias antes, a análise extensiva dos potenciais efeitos de uma futura pandemia no contrato.
Como bem colacionado pela área técnica, um dos elementos que corroboram esse racional é a ausência de percepção do efeito contágio dos efeitos da ameaça derivada do coronavírus sobre a economia nacional, àquele momento adstrito à China. O relatório Focus, produzido pelo Banco Central e considerado o principal termômetro para a perspectiva da economia brasileira, não indicava qualquer desaceleração econômica em 17 de fevereiro de 2020, data da entrega das propostas na B3. A seguir, apresentam-se os relatórios de mercado emitidos nas datas de 19 de dezembro de 2019, 21 de fevereiro de 2020 e 19 de junho de 2020:
Data (situação) | 2020 (em %) | 2021 (em %) | 2022 (em %) | 2023 (em %) |
19/12/2019 (prévia) | 2,30 | 2,50 | 2,50 | - |
21/02/2020 (leilão) | 2,20 | 2,50 | 2,50 | 2,50 |
19/06/2020 (atual) | -6,50 | 3,50 | 2,50 | 2,50 |
Da análise das projeções do Focus, verifica-se – em primeiro plano – que há grande diferenciação entre a situação de 21/02/2020, que caracteriza o leilão, e a situação atual de 19/06/2020. As previsões para 2020 e 2021 alteram-se substancialmente, marcando de forma clara a alternância entre momentos de não percepção e percepção dos impactos derivados do coronavírus. Confirma essa visão o dado de fins de 2019, anterior à primeira notificação relacionada ao novo coronavírus na China, cuja projeção é muito próxima da realizada em fevereiro.
Retomando a análise conjuntural daquele momento, nota-se que o coronavírus (Covid19) era tratado como uma epidemia de abrangência regional, tal como outras epidemias recentes, a exemplo de outras doenças de trato respiratório como a SARS (2002) e a MERS (2012), cujos ambientes de contaminação se mantiveram restritos à Ásia e ao Oriente Médio. O primeiro caso de coronavírus no Brasil somente viria a ser confirmado no dia 26/02/2020, 9 dias após a entrega das propostas relativas ao leilão da BR-101/SC, e mesmo que tivesse ocorrido antes, dificilmente poderia se falar em previsibilidade dos seus impactos sobre a economia nacional e, por conseguinte, sobre a demanda da rodovia.
Das evidências que ora podem ser levantadas, é possível depreender que nem bem o ambiente de incertezas que se estabeleceria em algumas semanas já pudesse ser percebido no momento do leilão. Grandes incertezas impactam muito adversamente as decisões de investimentos. No caso da concessão da BR-101/SC, as exigências de capital social mínimo presentes no edital eram bastante elevadas, da ordem de R$ 400 milhões, e o edital continha um dispositivo de exigência de capital
próprio adicional proporcional ao otimismo da licitante no leilão, que, para o caso da proposta vencedora, implicou em quase R$ 1 bilhão de comprometimento de capital próprio no projeto. Soma-se a isso o fato de nenhum interessado ter pleiteado a suspensão do leilão pela justificativa de incertezas crescentes.
Todos estes indícios apontam para o fato de que tanto o mercado em geral como o setor de concessões rodoviárias em particular operava num contexto de certa normalidade, sem precificar as incertezas da pandemia em suas transações. Diante de tal entendimento, passa-se a analisar se os eventuais efeitos da pandemia sobre a concessão configuram risco alocado contratualmente ao Poder Concedente e se cabe a possibilidade, ou não, da inclusão da cláusula contratual requerida pela empresa.
3.8. Quanto ao julgamento da ADI nº 6.357/DF, a decisão do STF foi em bojo de Medida Cautelar com a finalidade de flexibilização temporária de ditames legais, especificamente, aos arts. 14, 16, 17 e 24 Lei de Responsabilidade Fiscal e ao art. 114, caput, in fine, e § 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias/2020 para, “durante a emergência em Saúde Pública de importância nacional e o estado de calamidade pública decorrente de COVID-19, afastar a exigência de demonstração de adequação e compensação orçamentárias em relação à criação/expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do contexto de calamidade gerado pela disseminação de COVID-19.”
3.9. Resta claro que a decisão do STF foi tomada em caráter emergencial, com base em análise à luz de princípios constitucionais e ressaltou a temporariedade e a proporcionalidade da medida, bem como a finalidade maior "de proteção à vida, à saúde e a subsistência de todos os brasileiros, com medidas sócio econômicas protetivas aos empregados e empregadores estão em absoluta consonância com o princípio da razoabilidade, pois, observadas as necessárias justiça e adequação entre o pedido e o interesse público."
3.10. Ou seja, apesar do STF reconhecer a extraordinariedade da situação da pandemia, deve ser ressaltado que a análise se refere à flexibilização legal para situações circunscritas aos limites de atuação do Estado. Não houve reconhecimento de responsabilização estatal derivada da pandemia. No mesmo sentido, é importante notar que a medida foi liminar, com base nos princípios do fumus boni iuris e periculum in mora pela eminente paralisação da atuação estatal no enfrentamento da doença, reconhecendo-se o tratamento de situação temporária e com alinhada proporcionalidade da decisão às necessidades sociais e econômicas, bem como ao interesse público premente.
3.11. No entanto, mesmo na ausência de precedente jurisprudencial perfeitamente compatível com o caso em análise, o Parecer nº 261/2020/CONJUR- MINFRA/CGU/AGU estabeleceu de maneira bastante consistente a aplicabilidade do entendimento de caso fortuito ou força maior aos efeitos da pandemia do novo coronavírus em contratos de concessão, desde que a alocação de riscos do contrato não disponha de maneira diversa sobre os efeitos deste evento:
72. O que importa, ao menos no âmbito desta consulta em tese, é reconhecer que o elemento causador do distúrbio econômico, ainda que indiretamente, consistiu claramente num evento da natureza (mutação e rápida disseminação de um vírus com taxa de letalidade relativamente alta), sendo que esse evento ou pelo menos os seus efeitos não poderiam ter sido previstos ou antecipados pelos concessionários quando da apresentação de suas propostas nos respectivos leilões e tampouco poderiam ter sido por eles evitados. Por conseguinte, parece-me muito claro que a pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2) é evento que caracteriza “álea extraordinária”, capaz de justificar a aplicação da teoria da imprevisão.
3.12. Como a minuta do contrato estabelece que os eventos de caso fortuito e força maior configuram risco alocado ao Poder Concedente, desde que não seguráveis, como já mencionado,a Sucon entende como desnecessária a inclusão da subcláusula proposta pela CCR. Parece que o propósito da inserção pleiteada está mais relacionado à necessidade de segurança do investidor sobre entendimentos futuros da agência na caracterização de eventuais desequilíbrios.
3.13. Ainda que se reconheça como merecedora de tratamento particular a preocupação do investidor diante de expressivas incertezas no momento da assinatura do contrato, a proposta apresentada não parece ser a melhor alternativa regulatória, por ser incomum qualquer alteração na minuta de contrato submetida ao procedimento licitatório. Tal alteração poderia inaugurar precedente perverso para futuras alterações em outros contratos, colocando em questão o objeto licitado. Não se deve olvidar tampouco que, futuramente, uma inclusão de disposição contratual poderia dar margem a discussões, inclusive judiciais, a respeito do nexo de causalidade em consequências contratuais que poderiam ser, ou não, decorrentes do novo coronavírus.
3.14. Parece corroborar este argumento o fato de a Artesp ter optado por firmar termo aditivo modificativo na mesma data de assinatura do contrato de concessão do "Eixo SP" da Ligação Rodoviária entre Piracicaba e Panorama, dando tratamento adequado às particularidades do contrato de concessão por meio deste aditivo. Ainda que possa ser formalmente superior à opção proposta pela CCR, a opção da agência reguladora estadual não parece tampouco ser a melhor alternativa.
3.15. Da mesma forma que na proposta de inclusão de subcláusula, estaria criado precedente para que as demais concessionárias de infraestrutura rodoviária federal demandassem aditamentos equivalentes em seus contratos, por alegada segurança jurídica. Faltam, assim, critérios objetivos que possam dar parâmetro aos efeitos ensejadores de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato que sejam, de fato, consequência causal da pandemia.
3.16. A opção regulatória para este caso deve ter o condão de tratar de forma particular a concessão da BR 101/SC apenas na medida em que se diferencia dos demais contratos regulados pela ANTT, aproximando-a deles para a dispensa de regulação horizontal e isonômica. Assim, o que se pretende é permitir que, comprovados eventuais desequilíbrios contratuais decorrentes da pandemia que prejudiquem a concessionária, ela se enquadre nas regras gerais que permitam a comprovação dos desequilíbrios e o respectivo pleito de reequilíbrio.
3.17. Sobre este tema, a Sucon ressalta que em citação sobre o Acórdão nº 1.431/2017- Plenário (TC 034.272/2016-0), disposta no Parecer 261/2020/CONJUR-MINFRA/CGU/AGU mencionado pela CCR, consta que a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão em decorrência de variação cambial extraordinária somente caberia em caso de "análise que demonstre, inequivocamente, os seus pressupostos, de acordo com a teoria da imprevisão, juntamente com análise global dos custos da avença, incluindo todos os insumos relevantes e não somente aqueles sobre os quais tenha havido a incidência da elevação da moeda estrangeira, de forma que reste comprovado que as alterações nos custos estejam acarretando o retardamento ou a inexecução do ajustado na avença".
3.18. Ou seja, a comprovação de efeitos de situação imprevisível que seja eventualmente alocada como risco estatal, deve ser comprovada cabalmente e com análise detalhada acerca de quais seriam os efeitos de fato derivados da álea extraordinária, ou quais seriam decorrentes da álea ordinária contratual, alocada ao concessionário. Destaca-se que, como também disposto no Parecer da AGU, "o risco deve ser alocado à parte mais capaz de administrá-lo" e, por isso, "deve-se então avaliar em cada caso qual a distribuição de riscos mais eficiente e adequada à política pública que se pretende implementar.". E, nesse sentido, aponta que "a pandemia do novo coronavírus poderia ser caracterizada como “força maior” ou “caso fortuito”.”
3.19. Todavia, ressalta a AGU que o reconhecimento é feito em abstrato e que isso não implicaria diretamente em reequilíbrio de contratos de concessão. Em todo caso, seria necessário avaliar se "a pandemia teve efetivo impacto sobre as receitas ou despesas do concessionário. É possível que, em determinados casos, não tenha ocorrido impacto significativo. Esses elementos deverão ser devidamente examinados para que se possa concluir se um determinado contrato deve ser reequilibrado."
3.20. Desta feita, a sugestão de inclusão de subcláusula na minuta de contrato referente à concessão da BR-101/SC estaria ampliando os efeitos possíveis em decorrência do parecer da AGU. A despeito de reconhecer o caso fortuito ou força maior com o advento da pandemia, não foi estabelecido um dever de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da concessionária, tendo em vista que é possível a ocorrência de impactos diminutos, não ensejadores de recomposição, ou mesmo não se verificar um efetivo impacto direto da pandemia.
3.21. Não se deve olvidar que, futuramente, uma inclusão de disposição contratual poderia dar margem a discussões, inclusive judiciais, a respeito do nexo de causalidade em consequências contratuais que poderiam ser, ou não, decorrentes do novo coronavírus. Da mesma forma, estaria criado precedente para que as demais concessionárias de infraestrutura rodoviária federal demandassem aditamentos equivalentes em seus contratos, por alegada segurança jurídica. Faltam, assim, critérios objetivos que possam dar parâmetro aos efeitos ensejadores de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato que sejam, de fato, consequência causal da pandemia.
3.22. Conforme disposto anteriormente na contextualização, não obstante a assinatura do contrato não ter ocorrido ainda, a entrega da proposta lacrada da concessionária ocorreu 4 (quatro) dias antes da realização do leilão em comento. Antes da primeira morte causada pela Covid-19 em território brasileiro e, ainda, antes da declaração da OMS de pandemia em função da doença, portanto.
3.23. Reconhece-se à concessionária, dessa forma, a aplicabilidade das medidas de flexibilização adotadas pela ANTT e demais entes de governo, bem como alinhamento ao supracitado parecer 261/2020 da AGU, que classifica a situação como evento de força maior ou caso fortuito, e cujos desdobramentos deverão ser verificados caso a caso.
3.24. Assim, em atenção a proposta apresentada e justificada pela Superintendência de Concessão da Infraestrutura e PARECER nº 00275/2020/PF-ANTT/PGF/AGU, esta Diretoria está de acordo, com o indeferimento do pedido da CCR S.A.
4.1. Considerando o exposto, proponho ao Colegiado desta Casa que aprove a minuta de Deliberação (SEI nº3648219), para indeferir o pedido da CCR S.A. de alteração do contrato de concessão objeto do Edital de Concessão nº 2/2019 e declarar que a pandemia decorrente do novo coronavírus (Covid-19) configura força maior, ficando reconhecido que em 17 de fevereiro de 2020, data da entrega das propostas para a licitação regida pelo Edital de Concessão nº 2/2019, os eventuais efeitos extraordinários da pandemia decorrente do Covid-19 eram imprevisíveis, e que a ocorrência de eventuais efeitos extraordinários da pandemia decorrente do Covid-19 e sua repercussão sobre o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão objeto da Deliberação, ora apreciada, serão apuradas nas revisões contratuais, considerando como parâmetro as condições vigentes no momento de apresentação da proposta da licitação.
Brasília, 25 de junho de 2020.
XXXXXXX XXXXXX XXXXX
Diretor-Geral em exercício
Documento assinado eletronicamente por XXXXXXX XXXXXX XXXXX, Diretor Geral em Exercício, em 01/07/2020, às 13:15, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no
art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.
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Referência: Processo nº 50500.053367/2020-15 SEI nº 3683417
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