Contrato de Cartão de Crédito: Relação entre “Estabelecimento” e Credenciadora
Contrato de Cartão de Crédito: Relação entre “Estabelecimento” e Credenciadora
Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx
Pós-graduando em Direito na Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Mestrando em Direito na UERJ, na linha de pesquisa de Empresa, Trabalho e Propriedade Intelectual. Advogado.
INTRODUÇÃO
A expressão "contrato de cartão de crédito" é usada tanto para de- signar o contrato de emissão, quanto o contrato de credenciamento. Nes- te artigo, a expressão "contrato de credenciamento" será utilizada para designar o contrato celebrado entre a credenciadora e o fornecedor de bens e/ou serviços, denominado de “estabelecimento”, enquanto a ex- pressão "contrato de emissão" designará o contrato celebrado entre a so- ciedade empresária emissora do cartão de crédito e o titular ou portador do cartão de crédito.
Deve ser ressaltado, logo de início, que a expressão “estabeleci- mento” nesses contratos é utilizada de forma atécnica. "Estabelecimento" significa o conjunto de bens materiais e imateriais utilizados para o exer- cício da empresa. Contudo, nos contratos de credenciamento a expressão “estabelecimento” é personificada e passa a se equiparar à própria socie- dade empresária. Por isso, ao longo do texto, a expressão "estabelecimen- to", quando utilizada, não terá o significado técnico.
O objetivo deste trabalho é analisar o contrato de credenciamento. Para tanto, no primeiro capítulo, será realizado um breve estudo histórico sobre os cartões de crédito. No segundo capítulo, será estudado o sistema de cartões de crédito, com ênfase para as partes que compõem o siste- ma. Para então, no terceiro capítulo, poder ser estudada a relação entre
o estabelecimento e a credenciadora. Objetiva-se, até o final deste artigo, esmiuçar a relação entre essas duas partes do sistema de cartões de cré- dito, de forma a identificar as principais cláusulas desse contrato. Como forma de detalhar esses pontos, será utilizado como referência o contrato de credenciamento celebrado com a CIELO, que guarda semelhança com
o da REDECARD, apenas divergindo em algumas denominações e forma de redação. Portanto, o estudo através do contrato da CIELO atingirá o mesmo resultado de um estudo que utilizar o contrato da REDECARD.
O estudo do tema é relevante em razão de o cartão de crédito ter se tornado um importante meio de pagamento, fato que obriga os forne- cedores de bens e serviços a se credenciarem ao sistema de cartões de crédito. Caso contrário, as vendas dos estabelecimentos ficam limitadas àqueles clientes que ainda utilizam cheque ou preferem comprar utilizan- do dinheiro em espécie.
1 - CARTÃO DE CRÉDITO
O cartão de crédito é um documento pessoal e intransferível, de propriedade da emissora de cartões de crédito, do qual o titular é fiel de- positário.1 Dentre as suas funções, o cartão de crédito, conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
[...] enseja ao seu usuário concatenar transações junto a estabelecimentos fornecedores de bens ou serviços, previa- mente credenciados. Secundariamente, permite-lhe realizar saques de dinheiro em caixas automáticos do banco emissor, para pagamento futuro ou lançamento imediato em sua con- ta bancária, conforme se trate de cartão de crédito ou débito. É um instrumento de pagamento e crédito que não se basta e não circula. Não guarda nenhum ponto de contato com os títulos de crédito.2
O cartão de crédito está atrelado a um contrato que lhe confere validade; ele “não implementa direitos nem obrigações, alojando-se no mundo dos efeitos de um complexo contratual”.3
1 XXXXXX XXXXXX, Waldo. Cartão de crédito, cheque e direito do consumidor. São Paulo: Atlas, 2011, p. 7. 2 Ibid., p. 7.
3 Ibid., p. 9.
O uso de cartões de crédito tem crescido a cada ano em razão da segurança que oferece para o consumidor e para o fornecedor, que não precisam ter em suas mãos dinheiro em espécie na hora de efetuar com- pras. Além disso, para o estabelecimento, traz uma outra vantagem con- siderável: não há o risco de inadimplemento, tendo em vista que o paga- mento é efetuado pelo titular do cartão ao emissor, e o emissor do cartão se responsabiliza pelo adimplemento da obrigação perante o estabeleci- mento, independentemente da quitação do titular do cartão. Além disso, diminui o risco de recebimento de cheque falso. Portanto, as operações de crédito se tornam mais seguras com a utilização de cartões de crédito.
Dentre os benefícios da utilização do cartão de crédito, também pode ser ressaltado o fato de o cartão permitir que o consumidor satis- faça a sua necessidade ou vontade de adquirir um bem ou contratar um serviço no momento em que ele deseja. Ademais, o crédito já é aprovado. Logo, não há necessidade de realizar cadastro para efetuar a compra, bas- ta ter o cartão, o que torna mais dinâmico o mercado de crédito.
Por trazer benefícios tanto para os consumidores, quanto para os fornecedores de bens ou serviços, o sistema de cartões de crédito se ex- pandiu nas últimas décadas. De acordo com Xxxxx Xxxxxx Junior:
O crescente número de usuários de cartões dispostos a efe- tuar seus pagamentos por esse meio implementa o creden- ciamento de estabelecimentos comerciais. De outra parte, a ampla gama de estabelecimentos comerciais sensíveis à recepção de cartões de pagamento incentiva a demanda de usuários pelos cartões. É que a importância do cartão au- menta para o seu titular à medida que mais estabelecimen- tos passam a aceitá-lo e mais usuários aderem ao sistema. Para os estabelecimentos fornecedores de produtos e servi- ços, a elevação da quantidade de potenciais usuários acena com a possibilidade de haurir vantagens afiliando-se à rede de credenciados.4
Atualmente, a grande massa de consumidores realiza boa parte de suas compras com cartão, seja de crédito ou de débito. Sendo assim, com o avanço da rede de cartões de crédito e a disponibilização do cartão para
4 Ibid., p. 236.
um grande número de consumidores, os fornecedores de bens e serviços se veem obrigados a se filiar ao sistema de cartões para angariar clientes e aumentar os seus lucros.
1.1 Evolução dos Cartões de Crédito
Os cartões de crédito surgiram originariamente como cartões de fidelização. Eram utilizados em postos de gasolina para facilitar o paga- mento dos clientes: as vendas eram realizadas e posteriormente o cliente efetuava o pagamento das compras efetuadas durante um lapso temporal de uma só vez.
Sobre o surgimento dos cartões de crédito, afirma Xxxx Xxxxxxx:
Em linhas gerais, os estudiosos dos cartões de crédito afir- mam o seu aparecimento e desenvolvimento nos Estados Unidos, onde, já por volta de 1920, as empresas de distri- buição de gasolina Esso e Texaco os forneciam, como car- tões de identificação, aos seus clientes, facilitando a esses o pagamento do consumo, feito em pequenas parcelas, de uma só vez, em uma época posterior, em regra no mês se- guinte ao das vendas.5
Nessa época, alguns hotéis também utilizavam o cartão de crédito da mesma forma. Tratava-se, de fato, de “cartões de identificação de bons pagadores, distribuídos entre os clientes das empresas com a finalidade de prender esses clientes às mesmas, facilitando-lhes um pagamento pos- terior das compras feitas em determinado período.”6
Posteriormente, com a criação do Diner’s Club pelos milionários Xxxxxx XxXxxxxx, Xxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxxxxxxxx, por volta de 1950, surgiram os cartões de crédito da forma como os conhecemos atu- almente. A partir desse momento, houve um avanço na utilização e acei- tação dos cartões.7
5 XXXXXXX, Xxxx. Cartões de crédito: natureza jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 26. 6 Ibid., p. 26.
7 Id. Contratos e obrigações comerciais, ed. rev. e aum. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 459/460.
Inicialmente, “(...) o Diner’s Club se destinava [...] a cobrir despe- sas em hotéis e restaurantes. Mas os seus fundadores [...] viram que tais modalidades de venda e pagamento através de cartões poderiam ser am- pliadas para outros setores que não apenas hotéis e restaurantes.”8 Com a perspicácia desses empresários, logo o sistema se expandiu e passou a abranger os diversos ramos de fornecimento de bens e serviços.
À época da criação do Diner’s a relação jurídica que se formava en- tre as partes envolvidas no sistema de cartões de crédito era triangular, sendo o Diner’s um intermediário entre o consumidor e o fornecedor de bens e serviços. Portanto, havia três partes no sistema de cartões de cré- dito: o titular do cartão, o emissor e o fornecedor de bens ou serviços.
O fornecedor, ao celebrar o contrato com a emissora do cartão de crédito se comprometia a efetuar um pagamento à emissora do cartão, sobre o percentual das vendas que ele realizasse. Em contrapartida, o emissor do cartão lhe anteciparia o valor das vendas e teria sempre como meta ampliar a rede de cartões de crédito.
O titular do cartão, por sua vez, ao celebrar o contrato com a emis- sora do cartão de crédito também ficava obrigado a remunerá-la. O con- trato celebrado era por prazo determinado, sendo que a cada renovação caberia nova remuneração do portador ao emissor.9
Como o emissor se comprometia a efetuar o pagamento das despe- sas efetuadas pelo titular do cartão aos fornecedores de bens e serviços, o emissor assumia o risco de inadimplemento pelo titular do cartão de cré- dito. Portanto, após a venda do bem ou a prestação do serviço, a relação obrigacional se dava entre o emissor/fornecedor e entre o emissor/titular do cartão de crédito.
Em 1951, o Franklin National Bank lançou um cartão de crédito que se diferenciava em um aspecto do cartão Diner’s: naquele, o titular do car- tão tinha um crédito rotativo aprovado no banco. Sendo assim, o banco cobria as despesas do titular do cartão e à medida que o titular pagava a fatura do cartão o crédito, retornava para a sua conta.10 Contudo, a rela- ção jurídica continuava sendo triangular.
8 XXXXXXX, Xxxx. Op. cit., 1976, p. 27.
9 Ibid., p. 27.
10 Ibid., p. 28.
Em 1956, o Diner’s foi lançado no Brasil, sendo que somente em 1968 surgiu no Brasil o primeiro cartão de crédito propriamente dito, com crédito rotativo, lançado pelo Bradesco, denominado de cartão ELO.11
Na década de 60, ocorreu a intensificação do uso dos cartões de crédito, em razão de dois fatores: “a predominância dos cartões de crédito bancários, inclusive a associação de bancos e empresas não bancárias, e a grande aceitação dos cartões no mundo inteiro.”12 Con- forme Xxxx Xxxxxxx:
Só em 1958 e 1959, com a entrada nos sistemas de car- tões de crédito dos grandes·bancos Mellon e Pittsburgh National, os cartões de crédito bancários começaram a dar bons resultados. Novas técnicas foram utilizadas e aperfeiçoadas e esse fato marca o segundo período dos cartões de crédito bancários. Já então os cartões de crédi- to começam a ser lançados por bancos europeus, notada- mente na Inglaterra e na França.
O terceiro período dos cartões de crédito bancários foi a partir de 1965, quando passaram a ser utilizados mundial- mente, consolidando-se, assim, sua posição.13
Posteriormente, as instituições financeiras passaram a possibilitar
que os clientes sacassem dinheiro com o cartão de crédito.14
Foi em 1974 que surgiu uma rede global de meios de pagamento: “[...] o IBANCO, uma empresa de capital fechado, fez com que o BankA- mericard, que é o primórdio do VISA, se transformasse numa entidade internacional”15.
Nos anos 80, além do fornecedor, emissor e titular do cartão, passaram a existir nessa relação jurídica as credenciadoras, responsá-
11 XXXXXX, Xxxxxxx. "O cartão de crédito no mundo e no Brasil." In: Seminário Sistema Jurídico e Operacional dos Cartões de Crédito, 2005, Búzios. Rio de Janeiro: Tribunal de Justiça – RJ, CEDES, 2005, p. 16.
12 XXXXXXX, Xxxx. Op. cit., 1976, p. 29.
13 Ibid., p. 140/141.
14 Ibid., p. 40.
15 XXXXXX, Xxxxxxx. Op. cit., p. 17.
veis por credenciar os fornecedores de bens e serviços, denominados
de estabelecimentos, no sistema de cartões de crédito.
Foi também nessa época que a marca Visa passou a ser utilizada no Brasil. Inicialmente, pela CREDICARD. No entanto, “[...] em 86, o contrato entre VISA e CREDICARD é [foi] rescindido. Os cartões VISA passam [pas- saram] a ser emitidos por uma série de emissores, e a CREDICARD passa [passou] a emitir exclusivamente a marca MASTERCARD”.16
Em 1991, ocorreu outro marco na história dos cartões de crédito no Brasil. Naquele ano17, os cartões de crédito brasileiros passaram a ter aceitação internacional. Com o passar dos anos, esse meio de pagamento ganhou força na sociedade brasileira. Sendo assim, os fornecedores de bens e serviços se tornaram obrigados a ingressar no sistema de cartões de crédito.
2 - SISTEMA DE CARTÕES DE CRÉDITO
O sistema de cartões de crédito atualmente é formado por cinco partes: as bandeiras, as credenciadoras, as emissoras de cartões de cré- dito, os estabelecimentos credenciados e os titulares ou portadores de cartões de crédito.
As bandeiras são titulares das marcas, por exemplo, Visa, Master Card, American Express. São elas as responsáveis pela organização de todo o sistema de cartões de crédito e é através de parcerias com as ban- deiras que os cartões de crédito emitidos no Brasil podem ser utilizados no exterior. De acordo com Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx, as bandeiras:
[...] são pessoas jurídicas transnacionais que estabelecem as regras gerais de organização e funcionamento do sistema de cartões de pagamento. Nessa direção, exigem que credencia- dores e emissores ofereçam garantias suficientes para fazer frente às obrigações de pagamento decorrentes do contrato de licença de uso da respectiva marca. [...] [Além disso] De- finem as estratégias de utilização dos cartões, dão suporte à
16 Ibid., p. 18.
17 XXXXXX, Xxxxxxx. Op. cit., p. 18.
sua publicidade e uniformizam os procedimentos das institui- ções financeiras locais a quem cedem licença para utilização de sua marca. Como detêm os direitos de uso da marca, es- tabelecem os padrões e as regras para ingresso na sua rede. Auferem receita das tarifas de uso do sistema pelas emisso- ras e credenciadoras.18
As emissoras possuem o contato direto com os titulares de cartões de crédito. Elas emitem os cartões, disponibilizam o crédito, bem como assumem o risco de inadimplência pelos titulares e de fraude no siste- ma, “(...) são instituições financeiras licenciadas para emitir cartões, que concedem crédito aos titulares de cartões de crédito para utilização no Brasil e/ou no exterior, e prestam serviços de administração e utilização dos cartões que emitem”.19
Os fornecedores de bens e serviços se relacionam diretamente com as credenciadoras e com os titulares de cartões de crédito. São eles que celebram o contrato de compra e venda ou prestação de serviços com os titulares. Após o pagamento, o crédito é automaticamente cedido para as emissoras de cartões de crédito.
As credenciadoras se relacionam diretamente com os “estabeleci- mentos”, através do credenciamento desses no sistema de cartões de cré- dito. Elas se responsabilizam pela instalação e manutenção da maquineta utilizada na transação com o cartão de crédito e pelo repasse dos crédi- tos aos fornecedores. Em síntese, o titular do cartão paga a fatura para a emissora do cartão de crédito, a qual, por sua vez, após descontada a taxa devida, repassa o dinheiro para a credenciadora, que repassará para o estabelecimento, também com os devidos descontos. Deve-se lembrar que independentemente da quitação do titular, ocorrerá o repasse pela emissora à credenciadora.
A credenciadora opera com várias bandeiras. Logo, o fornecedor,
ao se credenciar, poderá escolher com quais bandeiras ele irá trabalhar.
Por último, os titulares ou portadores de cartão de crédito. Esses são os que de fato movimentam todo o sistema. Eles realizam o contrato com a emissora de cartão de crédito, que disponibiliza a eles um crédito rotativo, que poderá ser utilizado para compras nos “estabelecimentos” credencia-
18 FAZZIO JUNIOR. Op. cit., p. 16/17.
19 Ibid., p. 17.
dos. Em contrapartida, eles assumem a obrigação de adimplir a fatura na data aprazada, havendo a incidência de multa e juros moratórios, caso não ocorra o pagamento. Além disso, assiste a eles o direito de efetuar o paga- mento de parte da fatura, havendo a incidência de juros remuneratórios entre a diferença paga e o montante devido na respectiva fatura.
Ao tratar das partes que compõem o sistema de cartões de crédito, é importante chamar a atenção para o significado da expressão “admi- nistradora de cartão de crédito”. De acordo com o artigo 2º, § 2º, inciso I, da instrução normativa 341/2003, da Secretaria da Receita Federal, a expressão “administradora de cartão de crédito” pode ser usada em dois significados: em relação aos titulares de cartão de crédito será a emissora dos cartões, enquanto em relação aos fornecedores de bens ou serviços, será a credenciadora.
2.1 Relações entre as Partes Envolvidas no Sistema
As partes que compõem o sistema de cartões de crédito dão ense- jo a três contratos: 1) contrato de emissão, celebrado entre a instituição financeira emissora do cartão de crédito e o titular do cartão; 2) contrato de aquisição de bens ou serviços, este é celebrado entre o estabelecimen- to e o titular do cartão; 3) contrato de credenciamento, realizado entre o estabelecimento e a credenciadora. Esses três contratos se complemen- tam e são necessários para o “funcionamento do sistema de cartões, por- que as obrigações envolvidas observam um [...] iter [...] que passa pelo credenciamento de estabelecimentos [...] emissão do cartão e, enfim, por transações entre os portadores de cartões e os estabelecimentos...”.20 Conforme Waldirio Bulgarelli:
Visto em conjunto, o cartão de crédito é um negócio jurídi- co com várias facetas. Integrado por vários contratos que se desdobram entre os componentes do negócio, unifica-se pela finalidade proposta: permitir que o consumidor adquira de imediato, em determinados estabelecimentos comerciais ou de serviços, os bens e serviços de que necessita.21
20 FAZZIO JUNIOR. Op. cit., p. 14.
21 BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 13. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., p. 479.
Tanto o contrato de credenciamento, quanto o contrato de emissão de cartões de crédito, são contratos de adesão. Conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
As estruturas de ambas são formatadas por elementos pre- estabelecidos pelos estipulantes, cuja especificidade funcio- nal não enseja subsunção exclusiva a nenhum tipo contratual preexistente (são contratos atípicos), mas congregam ele- mentos de diversos contratos autônomos interconectados, produzindo contratos atípicos assentados na sua função so- cioeconômica.22
Portanto, não há uma legislação específica para os cartões de crédi- to. Os contratos celebrados entre as partes integrantes desse sistema são denominados de atípicos. Conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
Produto da prática econômica e da liberdade comercial, o sistema de cartões não se coaduna com a interposição legis- lativa singular e específica, recolhendo subsídios normativos em diversos diplomas que tangenciam com alguns de seus aspectos, mas não com todos. A palavra mais adequada para o enquadramento dos cartões de crédito é complexidade e seu cenário é o da prática comercial no âmbito da formação socioeconômica, sem afinidade exclusiva com qualquer espé- cie contratual. Trata-se, de fato, de um complexo contratu- al interativo, porque composto de diversas submodalidades contratuais envolvendo intermediação financeira.23
Essa complexidade formada por diversos negócios jurídicos cons- tituem o sistema de cartões de crédito. Como não há “uma legislação específica, acende a necessidade de se adotar, combinadamente, um complexo de normas que envolve os direitos do consumidor, a teoria dos contratos, os princípios regentes das obrigações e, enfim, os princípios ge-
22 XXXXXX XXXXXX. Op. cit., p. 14.
23 Id. Cartão de crédito: explicação difícil, mecanismo fácil. Disponível em: < xxxx://xxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx-xx-
-credito-explicacao-dificil-mecanismo-facil/>. Acesso em: 19 mar. 2013.
rais do direito”24, com destaque para a livre iniciativa, a livra concorrência e a função social dos contratos. O fato de não haver uma legislação espe- cífica traz mais bônus do que ônus ao sistema. Nos Estados Unidos, as ten- tativas de regulamentar o complexo sistema de cartões de crédito não ob- tiveram êxito, o mesmo ocorreu com outros “[...] institutos que habitam o mercado, região onde imperam soluções socioeconômicas flexíveis”.25
A manutenção desse sistema ocorre através de tarifas. O titular do cartão paga à emissora a “tarifa do portador”, denominada de anuidade. A credenciadora paga à emissora a “tarifa de intercâmbio”. Esta, ao repas- sar os valores das transações efetuadas pelo titular do cartão para aquela, já efetua o desconto dessa tarifa.
O estabelecimento paga à credenciadora uma taxa denominada de “desconto” ou “comissão”, que incide sobre o valor das transações efetu- adas pelo titular do cartão com o estabelecimento. Portanto, ao efetuar o repasse desses valores para o estabelecimento, a credenciadora efetua o desconto dessa tarifa.26 As bandeiras, por sua vez, recebem das credencia- doras e das emissoras de cartões de crédito uma taxa “pelo uso da marca e por serviços da rede internacional”.27
3 - RELAÇÃO ENTRE “ESTABELECIMENTO” E CREDENCIADORA
O “estabelecimento” ao celebrar o contrato de filiação com a cre- denciadora se compromete a remunerá-la de acordo com um percentual sobre as vendas devidamente pré-fixado no contrato. Além disso, para que o sistema tenha êxito, o “estabelecimento” assume outras obriga- ções, tais como: pedir para o cliente apresentar um documento de iden- tificação, conferir a assinatura do cliente, se o cartão não for de chip, e guardar os comprovantes impressos. Estes podem ser solicitados pela credenciadora para comprovar as transações efetuadas no terminal do estabelecimento.28
24 FAZZIO JUNIOR. Op. cit., p. 10.
25 Ibid., p. 28.
26 Ibid., p. 19/20. 27 Ibid., p. 20.
28 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS. Faq. Disponível em: < http:// xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx0000/xxxXxxxxxxxxxxxxxxx.xxx> Acesso em: 19 mar. 2013.
3.1 Contrato de Credenciamento
O contrato de credenciamento é um contrato de adesão. Trata-se de um contrato “bilateral, oneroso, comutativo, de execução diferida e impessoal, o contrato de credenciamento ou afiliação não conhece rótulo na sistemática contratual jurídico-positiva”.29 É celebrado pelo fornecedor de bens e serviços para o incremento de sua atividade negocial. Logo, não incide sobre essa relação jurídica as regras do Código de Defesa do Consumidor. Esse é o entendimento da Quarta Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, esboçado na Apelação Cível n. 0089734-81.2005.8.19.0001: “Ab initio, a relação jurídica entre as partes litigantes não se configura como de consumo, não se aplicando, pois, nes- ta hipótese, as normas do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.”30 No mesmo sentido, decidiu a Segunda Câmara Cível, do Tribunal
de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, na Apelação Cível n. 0016852-
18.2005.8.19.0003:
A relação jurídica firmada é regida pelo Código Civil, em que são partes a autora, sociedade microempresária atuante no ramo de materiais de construção, e o réu, Consórcio Rede- card, responsável pela administração e pagamento ao esta- belecimento do valor líquido das transações efetuadas atra- vés de cartão.31
No que pese as decisões citadas acima no sentido da não aplicação do Código de Defesa do Consumidor nessas relações, a Primeira Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, na Apelação Cí- vel n. 0041336-89.2008.8.19.0004, se posicionou favoravelmente à apli- cação do Código de Defesa do Consumidor. Conforme se extrai do voto do relator, basta que seja constada a “[...] hipossuficiência técnica, jurídica
29 XXXXXX XXXXXX. Op. cit., p. 234.
30 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0089734-81.2005.8.19.0001. Quarta Câmara Cível. Rel. Des. Xxxxxxx Xxxx Xxxxxxx. Julgado em: 26 set. 2012. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXx- cGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00045ADC7C52CC209A87638B3BAC3F0DBC73B1C4573F0C06 > Acesso em: 19 mar. 2013.
31 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0016852-18.2005.8.19.0003. Segunda Câmara Cível. Rela. Desa. Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 31 ago. 2011. Disponível em: <xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXxxXxxXxx/ faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=0003D04A839D2A4123367CC8693A337C253CA1C4030E235B>Acesso em: 19 mar. 2013.
ou econômica na relação jurídica perante o fornecedor” para que seja caracterizada a relação de consumo. Sendo assim, “comprovada a hipos- suficiência da pessoa jurídica consumidora diante da pessoa jurídica for- necedora, é de se aplicar o CDC na busca do equilíbrio entre as partes.”32 Portanto, como, no caso concreto, estava de um lado a REDECARD e do outro, uma cabeleireira, a Primeira Câmara Cível concluiu pela aplicação do CDC. Logo, há casos específicos em que, pelos motivos expostos, o Có- digo de Defesa do Consumidor poderia vir a ser aplicado na relação entre a credenciadora e o “estabelecimento”. No entanto, trata-se de posiciona- mento minoritário.
A definição de se tratar ou não de relação de consumo é fundamen- tal para uma possível inversão do ônus da prova. Conforme se manifes- tou o Desembargador Xxxxxxx Xxxxxxxxx, na Apelação Cível n. 0173700- 68.2007.8.19.0001, seguindo a corrente majoritária:
[...] a relação jurídica que consubstancia a causa de pedir re- mota da vertente demanda é, assim, regida pelas regras tra- zidas pelo Código Civil de 2002, sendo certo que, quanto a dis- tribuição do ônus probatório atinente às alegações das partes, deve incidir o artigo 333, I e II, do Código de Processo Civil.33
Portanto, reconhecida a não incidência do Código de Defesa do Consumidor nos contratos de credenciamento, aplica-se as normas do Código de Processo Civil para a produção de provas.
Credenciar “[...] um estabelecimento para atuar no sistema (...) sig- nifica introduzi-lo no âmbito do esquema, associá-lo (...) a um mecanismo que (...) estimula os negócios da empresa”.34 O contrato de credenciamen- to se aperfeiçoa quando ocorre uma das seguintes hipóteses:
-fornecimento ou instalação dos equipamentos necessários, pela credenciadora do sistema, no estabelecimento;
32 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0041336-89.2008.8.19.0004. Primeira Câmara Cível. Rel. Des. Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx. Julgado em: 10 mai. 2011. Disponível em: <xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXx- cGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=0003B0FBC4BDED7341986DC86119F897F45231C40301612B>. Acesso em: 19 mar. 2013.
33 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0173700-68.2007.8.19.0001. Décima Primeira Câmara Cível. Desembargador Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 23 ago. 2012. Disponível em: <xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/Xxx- sultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00047694688C99C253370A9124BD1EA03DAAEEC4532 1531F>. Acesso em: 19 mar. 2013.
34 FAZZIO. Op. cit., p. 235.
-habilitação, mediante a conexão da estação ou terminais à rede de captura e transmissão de transações;
-qualquer manifestação inequívoca de concordância do esta- belecimento com os termos e condições postos no contrato, independentemente de discussão sobre sua elaboração.
A partir do credenciamento, o estabelecimento passa a res- ponder pelas taxas e tarifas por transação, além de outros encargos eventualmente incidentes, conforme os serviços des- frutados entre os proporcionados pelo sistema a que aderiu.35
Como se trata de um contrato de adesão, havendo cláusulas ambí- guas ou contraditórias, essas deverão ser interpretadas da forma “mais favorável ao aderente”, nos termos do artigo 423 do Código Civil. Portan- to, em benefício do estabelecimento. Além disso, caso existam cláusulas que “estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”, essas serão reputadas nulas, conforme dispõe o artigo 424 do Código Civil. O intérprete do contrato de credenciamento, assim como de qualquer outro contrato, deve ter sempre em mente que a liberdade de contratar deve ser “exercida em razão e nos limites da fun- ção social do contrato”, nos termos do artigo 421 do Código Civil.
3.1.1 Domicílio Bancário
O domicílio bancário é o número da conta-corrente indicada pelo estabelecimento para que a credenciadora, após os descontos devidos, efetue o repasse das transações realizadas pelo estabelecimento por meio do cartão de crédito. Conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
Em regra, os contratos contemplam a transferência pelo es- tabelecimento à credenciadora dos poderes para representá-
-lo, como mandatária, exclusivamente para essas operações bancárias junto ao banco depositário. O domicílio bancário pode ser escolhido por bandeira (salvo se houver manuten-
35 FAZZIO. Op. cit., p. 237.
ção de domicílio) e deverá ser sempre indicado pelo esta- belecimento entre as instituições participantes do sistema. Independentemente da existência de filiais e/ou escritórios, somente um domicílio bancário deve ser apontado para efe- tuar o repasse dos créditos ou débitos. O zelo pela regulari- dade do domicílio bancário é ônus do estabelecimento.36
É possível a alteração do domicílio bancário pelo estabelecimento; basta que haja comunicação à credenciadora para que ocorra a alteração. A alteração só não poderá ocorrer se houver a “trava” ou “manutenção de domicílio bancário”.
3.1.1.1 Manutenção de Domicílio Bancário
Em síntese, a “manutenção do domicílio bancário” consiste em atrelar os créditos que o estabelecimento receberia de uma determinada bandeira da credenciadora a uma operação bancária realizada entre o es- tabelecimento e o banco no qual ele mantém o domicílio bancário.
A manutenção de domicílio bancário é realizada pelos Ban- cos, mediante autorização do Estabelecimento, junto à Cre- denciadora, quando o Estabelecimento possui operações de crédito ou algum serviço bancário atrelado aos recebíveis provenientes das vendas realizadas com cartões de crédito e/ ou débito das Bandeiras [...] Neste caso, os créditos das ven- das realizadas com os cartões de referida bandeira irão para o Banco no qual estiver a manutenção de domicílio bancá- rio daquela bandeira, independentemente da Credenciadora pela qual for realizada a transação de captura das vendas.37
Logo, o fato de os recebíveis de uma determinada bandeira servi- rem como garantia de uma operação de crédito do fornecedor de bens ou serviços, não impede que ele celebre contrato com uma outra cre-
36 FAZZIO. Op. cit., p. 244.
37 FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS. SCG – Sistema de Controle de Garantias. Disponível em: < xxxx://xxx. xxxxxxxx.xxx.xx/Xxxxxx0.xxx?xx_xxxxxx000&xx_xxxxxxx00> Acesso em: 19 mar. 2013.
denciadora para utilização da mesma bandeira, tendo em vista que, inde- pendentemente da credenciadora, os créditos dessa bandeira serão de- positados no domicílio bancário onde houver a manutenção de domicílio bancário.38 Portanto, o domicílio bancário não é escolhido de acordo com a credenciadora; ele é escolhido conforme a bandeira.
Caso o estabelecimento não possua manutenção de domicílio ban- cário, ele poderá escolher um domicílio bancário para cada ponto de ven- da. Contudo, se houver manutenção de xxxxxxxxx xxxxxxxx, ele deverá in- dicar o mesmo domicílio bancário. Além disso, caso haja manutenção de domicílio bancário, o estabelecimento deverá indicar o mesmo domicílio bancário para operações de débito e crédito.39
3.1.2 - Taxa de Comissão
Dentre as cláusulas do contrato de credenciamento, está a que pre-
vê a taxa de comissão:
Cláusula 25ª - Em decorrência da afiliação e serviços previstos no CONTRATO, o ESTABELECIMENTO pagará uma COMISSÃO,
da qual uma parte remunerará os serviços prestados pelo EMISSOR do respectivo CARTÃO ou MEIO DE PAGAMENTO e a outra parte remunerará os serviços prestados pela CIELO. Parágrafo Único - O valor da COMISSÃO será abatido au- tomaticamente do valor bruto da TRANSAÇÃO e poderá ser diferente em função do tipo de TRANSAÇÃO, tipo de MEIO DE PAGAMENTO, segmento de atuação do ESTABE- LECIMENTO, e/ou forma de captura de dados, se eletrôni- ca ou manual (maquineta).40
Portanto, a taxa de comissão corresponde ao percentual que incide sobre o valor bruto das transações efetuadas pelo estabelecimento creden- ciado. Parte do valor dessa taxa é retido pela emissora no momento em que o titular do cartão efetua o pagamento da fatura, o restante do valor é
38 Ibid.
39 Ibid.
40 CIELO. Contrato de afiliação ao sistema CIELO. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxxxxxx/ f00422ad4b2f4c02bfeeff3bf788d8a8.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2013
transferido para a credenciadora, que retira a parte que lhe compete e fica responsável por remunerar a bandeira, em razão da utilização da marca.
3.1.3 - Repasse
Conforme afirmado, nos contratos de cartões de crédito, o titular do cartão efetua o pagamento da fatura para a emissora do cartão. Esta fica responsável por efetuar a transferência do valor recebido para a cre- denciadora. Ao receber o valor, antes de efetuar o repasse para a creden- ciadora, a emissora “[...] deduz e retém a parte que lhe cabe da quantia correspondente à comissão.”41
A credenciadora, por sua vez, efetuará o repasse para o estabeleci- mento, após deduzido o percentual que lhe cabe na comissão, através de depósito no domicílio bancário do estabelecimento. Essa é a operação de repasse. Portanto, ela “se concretiza por meio de depósito no domicílio bancário, à vista ou de cada parcela para a transação parcelada”.42
A operação de repasse está prevista na cláusula 18ª do contrato de
credenciamento da CIELO.43
3.1.3.1 - Prazo de Repasse
O prazo para que a credenciadora efetue o repasse dependerá de a venda ter ocorrido à vista ou a prazo. Caso a venda tenha ocorrido à vista, o repasse ocorrerá, em média, 30 dias após a realização da transação efe- tuada com o cartão de crédito. Se a transação foi realizada com cartão de débito, o prazo de repasse é, em média, de dois dias. No entanto, se a venda foi parcelada, o repasse ocorrerá conforme o vencimento das parcelas.44
41 FAZZIO. Op. cit., p. 251.
42 FAZZIO. Op. cit., p. 251.
43 CIELO. Op. cit. Cláusula 18ª - O ESTABELECIMENTO reconhece que a sua adesão ao SISTEMA CIELO implica na contratação da CIELO para administrar a liquidação, e também na contratação do EMISSOR do CARTÃO para que este realize a cobrança do valor da TRANSAÇÃO junto ao PORTADOR, devendo tal valor ser repassado ao ESTABELECI- MENTO no prazo acordado com a CIELO, desde que a TRANSAÇÃO tenha sido realizada de acordo com este CONTRA- TO, e depois de deduzidas a COMISSÃO, taxas e encargos aplicáveis. Parágrafo Primeiro – Quando do recebimento pelo EMISSOR do valor da TRANSAÇÃO em pagamento do valor devido pelo PORTADOR, o EMISSOR poderá deduzir e reter a parte que lhe for aplicável da quantia correspondente à COMISSÃO.
44 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório sobre a indústria de cartões de pagamento. Anexo H. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxx.xxx.xx/xxxx/xxx/Xxxxxxxxx_Xxxxxxx.xxx>. Acesso em: 19 mar. 2013.
3.1.3.2 - Antecipação de Recebíveis
Caso o estabelecimento tenha interesse e a credenciadora concor- de, os créditos a que o estabelecimento faz jus poderão ser antecipados. Essa operação é realizada por cessão, sobre ela incide a taxa de desconto, variável conforme à época da antecipação dos repasses.
Cláusula 29ª - Caso o ESTABELECIMENTO queira negociar seus recebíveis de quaisquer MEIOS DE PAGAMENTO, deverá solici- tar junto à CIELO ou à instituição financeira onde mantém seu DOMICÍLIO BANCÁRIO de cada MEIO DE PAGAMENTO, confor-
me disponibilidade e respectivas condições aplicáveis.45
A antecipação de recebíveis, portanto, também poderá ocorrer por solicitação à instituição financeira onde o estabelecimento mantém o seu domicílio bancário. Caso a operação de antecipação de recebíveis seja rea- lizada perante a credenciadora, ela ocorrerá por meio de cessão de crédito.
Caso a operação seja realizada perante a instituição financeira onde o estabelecimento mantém domicílio bancário, caberá à credenciadora “(i) realizar a troca de titularidade dos recebíveis, no caso de cessão, ou
(ii) realizar a trava de cada DOMICÍLIO BANCÁRIO do ESTABELECIMENTO,
por prazo ou por valor acordado”.46
3.1.3.3 - Chargeback
Em determinadas situações, pode ocorrer o cancelamento da com- pra feita pelo portador do cartão. Esse cancelamento denomina-se char- geback e “[...] pode acontecer por dois motivos: um deles é o não reco- nhecimento da compra por parte do titular do cartão, e o outro pode se dar pelo fato de a transação não obedecer às regulamentações previstas
45 CIELO. Contrato de afiliação ao sistema CIELO. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxxxxxx/ f00422ad4b2f4c02bfeeff3bf788d8a8.pdf> Acesso em: 17 mar. 2013
46 CIELO. Contrato de afiliação ao sistema CIELO. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx/xxxxxxxxx/ f00422ad4b2f4c02bfeeff3bf788d8a8.pdf> Acesso em: 17 mar. 2013
no Contrato de Credenciamento [...]”47. O chargeback, portanto, poderá “acarretar o cancelamento do repasse ou estorno do crédito, se já efetu- ado, pela credenciadora.”48
Dentre as hipóteses em que pode ocorrer o chargeback, seja por violação do contrato de credenciamento ou alegação pelo titular do car- tão de não reconhecimento da compra, podem ser elencadas:
[...]Comprovante de venda adulterado - o comprovante de venda apresenta rasura ou adulteração não reconhe- cida pelo portador do cartão. [...] Transação via telefone/ Correio/Internet/M-Commerce/T-Commerce - o portador do cartão não reconhece uma compra feita através de um desses meios e a venda não está em conformidade com as re- gras, políticas ou regulamentações estabelecidas para o uso dos cartões nessas modalidades. Transação não reconhecida pelo portador do cartão - A venda é contestada pelo porta- dor do cartão e o documento enviado pelo estabelecimento não comprova a presença do cartão na venda nem a autori- zação do portador para a realização da venda. Crédito não emitido em caso de devolução de mercadoria / Mercadoria não recebida / Serviços não prestados / Mercadoria entre- gue com defeito / Mercadoria diferente da descrita - caso o portador do cartão conteste a transação por um destes motivos e o estabelecimento não apresente prova contrária. Crédito não processado - o portador do cartão fez um acordo de cancelamento total ou parcial da venda junto ao estabe- lecimento [...] Duplicidade de transação - venda processada em duplicidade [...] Não recebimento da documentação que comprova a venda - Os estabelecimentos sempre devem for- necer a documentação que comprova a venda, quando isso for pedido pela Credenciadora, de forma legível até o prazo limite estipulado na carta de solicitação.”49
47 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS. Faq. Disponível em: < http:// xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx0000/xxxXxxxxxxxxxxxxxxx.xxx> Acesso em: 19 mar. 2013.
48 FAZZIO. Op. cit., p. 252.
49 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS. Faq. Disponível em: < http://
xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxx0000/xxxXxxxxxxxxxxxxxxx.xxx> Acesso em: 19 mar. 2013.
A Segunda Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, na Apelação Cível n. 0016852-18.2005.8.19.0003, julgou questão acerca do chargeback. No caso concreto, se discutia o fato de a credencia- dora não ter realizado o repasse das transações efetuadas no mês de ju- lho do ano de 2005 para o estabelecimento. A credenciadora alegou que o estabelecimento aceitou cartões fraudados por não ter tomado “[...] as cautelas necessárias, tais como, conferência de assinatura e verifica- ção dos plásticos”. Além disso, a credenciadora alegou que o valor das transações efetuadas no mês de julho teria sido bem superior ao valor dos demais meses e sustentou que a sua conduta estava fundamentada na cláusula décima sexta do contrato de credenciamento firmado com o estabelecimento, que dispõe: “Estarão sujeitas a cancelamento as transa- ções irregularmente realizadas pelo estabelecimento, de forma conivente ou não, que ocasionem fraudes ou visem à obtenção de vantagens ilícitas e/ou em desacordo com este contrato.”
No entanto, nesse caso concreto, o estabelecimento “[...] apresentou os comprovantes de vendas legíveis à administradora, na forma prevista no contrato [...]”. Dessa forma, a relatora considerou que não havia “[...] jus- tificativa para negar o pagamento das transações que já haviam sido por ela [credenciadora] autorizadas [...] Portanto, competia ao réu demonstrar a ocorrência de fraude na realização das vendas, na forma do art. 333, II, do CPC, o que não foi feito.” A relatora ainda observa que, em razão de a credenciadora, no caso a REDECARD, auferir “[...] lucros com a atividade de- senvolvida [...]”, ela deveria “garantir a segurança operacional da utilização dos cartões e, com isso, deve responder pelos prejuízos advindos.”50
Portanto, a Segunda Câmara Cível, ao analisar a questão concluiu que, na hipótese de cancelamento dos créditos em razão da alegação de cometimento de fraude por parte do estabelecimento, restando as tran- sações devidamente comprovadas pelo estabelecimento, constitui ônus da credenciadora provar a ocorrência da fraude.
Também no que tange à realização de operações supostamente fraudulentas, decidiu a Nona Câmara Cível, em Agravo Interno na Apela- ção Cível nº 0037669-37.2004.8.19.0004:
50 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0016852-18.2005.8.19.0003. Segunda Câmara Cível. Rela. Desa. Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 31 ago. 2011. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXxxXxxXxx/ faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=0003D04A839D2A4123367CC8693A337C253CA1C4030E235B>Acesso em: 19 mar. 2013.
A alegação de que a demandante teria realizado operações comerciais de forma fraudulenta deveria ser cabalmente comprovada pela ré, de modo a embasar sua conduta. Con- tudo, não se extrai suficientemente dos elementos dos autos que a autora de fato tenha compactuado com a utilização de cartões de crédito clonados em seu estabelecimento (...) Destaque-se que o risco da atividade é todo da Redecard, que aufere os lucros do negócio, cabendo-lhe investir em técnicas que assegurem a segurança e diminuam a possibilidade de fraude (...) Assim, se a compra foi autorizada pelo sistema da própria demandada, não lhe cabe transferir o ônus da fraude à parte autora, de modo que é devido o valor pelo negócio objeto da lide [...]51
A Desembargadora Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx, na Apelação Cível n. 0009526-41.2008.8.19.0087, em ação que também tinha como causa de pedir o chargeback, decidiu:
[...] o fato constitutivo do direito autoral está comprovado pelos comprovantes de autorização das transações. Por ou- tro lado, a parte ré insiste em afirmar que a empresa não comprovou a veracidade das transações e, ainda, afirma, que o pagamento não foi repassado para a loja, posto que se tratava de operações fraudulentas, alegando que tomou conhecimento por parte dos operadores de crédito. [...] Por- tanto, incumbia ao recorrido o ônus de comprovar o fato im- peditivo ou extintivo da pretensão ao recebimento do valor, que fora retido sob a alegação de transação realizada me- diante fraude. Em que pese caber ao estabelecimento adotar as devidas precauções para evitar transações fraudulentas, insta salientar que a transação foi aprovada pelo sistema do réu. Portanto, cabia a ele provar que a retenção da quantia
51 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Agravo Interno na Apelação Cível nº 0037669-37.2004.8.19.0004. Nona Câmara Cível. Rel. Des. Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxx. Julgado em: 20 abr. 2011. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/ ConsultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=000377A3445F80329C7E13E9898B4878342E22C40 2635A44 > Acesso em: 19 mar. 2013.
era legítima. Em não provando que tenha havido irregulari- dade na aludida venda, a retenção do respectivo pagamento afigura-se indevida.52
A fundamentação da decisão foi no mesmo sentido da decisão da Desembargadora Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx. Logo, conclui-se que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro tende a admitir o chargeback em caso de fraude apenas se a credenciadora conseguir comprovar que a transação foi inde- vida, se o estabelecimento comprovar a venda ou prestação do serviço.
A Décima Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, na Apelação Cível n. 0008892-19.2007.8.19.0204, decidiu a favor da credenciadora em caso concreto que se discutia a sus- pensão do repasse em razão da ocorrência de fraude. No caso concreto, o titular do cartão não reconheceu a compra. Dessa forma, segundo o relator:
[...] para que pudesse a apelada [estabelecimento] reivindi- car o repasse do valor da venda, deveria ter demonstrado que a compra foi realmente efetuada pelo usuário do cartão, ou ter tomado as precauções de praxe no ato da venda. Não o fazendo, outra conduta não poderia ter a apelante [cre- denciadora], senão agindo como o fez, segundo estipulações contratuais, não efetuando o depósito dos valores reivindi- cados, ante a notificação pelo real proprietário do cartão da ocorrência de fraude [...]53
O relator, no seu voto, ainda afirma que o comerciante é “[...] o responsável pela verificação da legitimidade do portador do cartão e da autenticidade desse.”54
Nesse sentido, o Desembargador Xxxxxxx Xxxxxxxxx na Apelação Cível n. 0173700-68.2007.8.19.0001 decidiu: “[...] de fato, o dever quanto
52 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0009526-41.2008.8.19.0087. Décima Sétima Câmara Cível. Rela. Desa. Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 18 dez 2012. Disponível em: < xxxx://xxx0.xxxx.xxx.xx/ gedcacheweb/default.aspx?UZIP=1&GEDID=0004469A0C369DFAEE72A9F224191C7A08E3C50201415126 > Aces-
so em: 19 mar. 2013.
53 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0008892-19.2007.8.19.0204. Décima Quinta Câmara Cí- vel. Rel. Des. Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx. Julgado em: 21 jun. 2011. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXx- cGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00033A2D5AD08CB46675C9C8D8CF23FADE7420C40306553C> Acesso em: 19 mar. 2013.
54 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0008892-19.2007.8.19.0204. Décima Quinta Câmara Cí- vel. Rel. Des. Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx. Julgado em: 21 jun. 2011. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/XxxxxxxxXx- cGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00033A2D5AD08CB46675C9C8D8CF23FADE7420C40306553C> Acesso em: 19 mar. 2013.
à verificação da identificação do usuário do cartão de crédito deve recair sobre a sociedade empresária [estabelecimento], associada à apelante, conforme previsão contratual [...]”. No entanto, conforme observou o Desembargador “[...] em momento algum comprovou a recorrente [cre- denciadora] o alegado pedido de estorno do valor por parte do titular do cartão de crédito[...]”55. E concluiu:
[...] a mera alegação da ocorrência de fraude no uso do men- cionado cartão e de pedido de estorno do valor por seu titular, tudo desacompanhado de qualquer prova, não tem o condão de embasar a recusa do pagamento atinente à operação de venda [...] comprovada pela demandante [...]56
Portanto, a fundamentação da decisão citada acima corrobora com a percepção do autor acerca do entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sobre a possibilidade de chargeback na hipótese de ocor- rência de fraude.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais também já se manifestou sobre o tema. No caso concreto, as partes celebraram contrato verbal para “[...] que a apelada [estabelecimento] disponibilize [disponibilizasse] seus produtos para venda pela internet com uso de cartões de crédito de diversas “bandeiras”. Contudo, em razão de ter recebido reclamações de titulares de cartões de crédito, alegando que não haviam realizado as compras, a credenciadora se absteve de efetuar o repasse dos respectivos valores das compras. No entanto, o estabelecimento comprovou que a credenciadora “[...] afirma que presta um serviço seguro, disponibilizan- do, inclusive, instrumento de prevenção à fraude, o chamado Serviço de Verificação de Dados Cadastrais (AVS), que aumenta a segurança de seu serviço[...]”. Ademais, a credenciadora não alegou
55 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0173700-68.2007.8.19.0001. Décima Primeira Câmara Cível. Desembargador Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 23 ago. 2012. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/Xxx- sultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00047694688C99C253370A9124BD1EA03DAAEEC4532 1531F>. Acesso em: 19 mar. 2013.
56 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0173700-68.2007.8.19.0001. Décima Primeira Câmara Cível. Desembargador Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Julgado em: 23 ago. 2012. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/Xxx- sultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=00047694688C99C253370A9124BD1EA03DAAEEC4532 1531F>. Acesso em: 19 mar. 2013.
[...] qualquer cautela que poderia a apelada ter tomado para evitar a fraude além da utilização de programas como o AVS. Desta maneira, correto o sentenciante ao imputar à ré [cre- denciadora] a responsabilidade pelas fraudes ocorridas, sen- do indevida a retenção realizada por esta dos valores corres- pondentes às vendas fraudadas.57
Portanto, o chargeback no caso concreto foi considerado indevido.
Sendo assim, no que pese haver a possibilidade de chargeback, na linha de entendimento majoritário do tribunais e amparado em Waldo Fa- zzio Junior, compete à credenciadora comprovar a legalidade da medida.58
3.1.4 - Fiscalização
Nos contratos de credenciamento, há expressa previsão de que a credenciadora poderá fiscalizar o estabelecimento. A fiscalização tem o objetivo de:
-conferir a regularidade das condutas praticadas na aceita- ção dos cartões;
-inspecionar os terminais ou estações;
-vistoriar a adequação da sinalização promocional;
-examinar a regularidade das transações; e
-verificar a guarda dos materiais e dados documentais sobre transações e portadores.59
Essa cláusula é necessária em razão da necessidade de o estabeleci- mento prestar o serviço de forma adequada perante o consumidor. Dessa forma, todo o sistema de cartões de crédito é beneficiado. Caso contrário, os titulares de cartões de crédito perderiam a credibilidade no sistema.
57 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 1.0024.10.229995-5/007. Décima Câmara Cível. Rel. Des. Gutemberg da Mota e Xxxxx. Julgado em: 18 set. 2012. Disponível em: < xxxx://xxx0.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/ xxxxxxxxXxxxxxXXXXxxxxxxXxxxxxx.xx?numeroRegistro=1&totalLinhas=1&linhasPorPagina=10&numeroUnico=1. 0024.10.229995-5%2F007&pesquisaNumeroCNJ=Pesquisar >. Acesso em: 19 mar. 2013.
58 FAZZIO. Op. cit., p. 252.
59 FAZZIO. Op. cit., p. 241.
3.1.5 - Tarifas Devidas pelo Estabelecimento à Credenciadora
Além das taxas sobre as quais já foram feitas alusões até agora, como a taxa de comissão e a taxa de depósito, ainda existem outras. No contrato de credenciamento com a CIELO, tomado como referência para este artigo, na cláusula vigésima sexta, há a previsão de diversas dessas taxas.60 Dentre essas, devem ser destacadas a taxa de afiliação ao sistema, devida pelo es- tabelecimento pela simples afiliação ao sistema e a taxa de aluguel do ter- minal. Aquela é devida anualmente, enquanto esta é devida mensalmente.
Mesmo diante de tantas taxas, em razão de a sociedade brasileira ter aumentado o consumo por meio de cartão de crédito, ainda traz be- nefícios ao estabelecimento a filiação ao sistema de cartões de crédito.
3.1.6 - Obrigatoriedade de Cobrar o Mesmo Valor das Vendas com Di- nheiro
Nos contratos de credenciamento, há a previsão de que os esta- belecimentos deverão cobrar nas transações realizadas com cartões de crédito o mesmo valor cobrado para as vendas à vista. Conforme se de- preende da cláusula 9ª do contrato de credenciamento com a CIELO: “O ESTABELECIMENTO deverá praticar nas TRANSAÇÕES com MEIOS DE PA-
60 CIELO. Op. cit. Cláusula 26ª O ESTABELECIMENTO será responsável também pelo pagamento dos seguintes encar- gos, conforme os valores em vigor quando do fato gerador e conforme venham a ser exigidos pela CIELO:
(i) Taxa de Cadastro: taxa devida pela análise cadastral e elaboração de ficha de cadastro do ESTABELECIMENTO e/ ou alteração e/ou atualização das informações cadastrais existentes;
(ii) Taxa de Afiliação / Anuidade: taxa devida pela adesão do ESTABELECIMENTO ao SISTEMA CIELO; pela inclusão de outro ESTABELECIMENTO dependente prevista na Cláusula 6ª, e pelas respectivas renovações anuais;
(iii) Taxa por Inatividade: taxa devida pelo decurso de cada 3 (três) meses sem que o ESTABELECIMENTO efetue qualquer TRANSAÇÃO;
(iv) Taxa de Emissão e Envio de Extrato em Papel: taxa pela emissão e envio do EXTRATO EM PAPEL;
(v) Taxa de Emissão de Documento em Segunda Via: taxa por pedido de emissão, em segunda via, de extratos, rela- tórios, borderôs, entre outros documentos;
(vi) Taxa de Conectividade: taxa devida pelo ESTABELECIMENTO pela conexão de cada TERMINAL ou equipamento
próprio ou de terceiros autorizados na rede do SISTEMA CIELO;
(vii) Aluguel de TERMINAL: remuneração mensal devida pelo ESTABELECIMENTO pela locação do TERMINAL confor- me as condições do Capítulo VII;
(viii) Taxa de Liquidação: taxa devida pela liquidação dos valores das TRANSAÇÕES no DOMICÍLIO BANCÁRIO do
ESTABELECIMENTO.
Esta taxa incide sobre cada liquidação, seja de crédito ou de débito de valores, realizada no DOMICÍLIO BANCÁRIO
do ESTABELECIMENTO; e
(ix) Taxas operacionais: taxas devidas à CIELO por controle anormal ou extraordinário de TRANSAÇÕES efetuadas pelo ESTABELECIMENTO ou de créditos de repasse a ele devidos, incluindo, mas não se limitando, a ajustes realiza- dos no cadastro ou AGENDA FINANCEIRA do ESTABELECIMENTO em decorrência de procedimentos ou determina- ções administrativos e/ou judiciais, tais como, cumprimento de ofícios, bloqueios, penhoras, arrestos etc. Esta taxa poderá ser cobrada do ESTABELECIMENTO pela CIELO, mensalmente ou por evento, a critério desta.
GAMENTO o mesmo preço que praticar nas vendas “à vista”, ou seja, sem acréscimo de juros, encargos, taxas ou restrições de qualquer natureza.”61 O fundamento dessa proibição “[...] vem da regra da Bandeira in- ternacional, por que, em nenhum país do mundo, a Bandeira permite que haja diferenciação de preços entre o cartão de crédito, o cheque ou o dinheiro. Essa regra é mundial.” 62 Portanto, ao aceitar trabalhar com uma bandeira internacional os estabelecimentos devem observar essas regras. Logo, não pode haver diferenciação de preços.63Se as credencia- doras receberem uma denúncia de que o estabelecimento está cobrando preço diferente para pagamento com cartão ou pagamento em dinheiro, primeiro o estabelecimento recebe uma advertência e, na hipótese de
reincidência, o estabelecimento é descredenciado.64
Enquanto o fundamento da proibição de cobrança de preços dife- renciados está na utilização de bandeiras internacionais, a discussão acer- ca da possibilidade de cobrar preços distintos reside na natureza jurídica do pagamento. Conforme Xxxxxxx Xxxxxx Junior:
[..] o prazo de graça concedido ao consumidor, que jamais ul- trapassa trinta dias, para que ele possa saldar o débito contra- ído, é inerente ao contrato de cartão de crédito, não o trans- formando por isso, em pagamento a prazo. Mais do que ser fruto de dispositivo contratual, a proibição da cobrança de preços diferenciados por parte do fornecedor direto, pertence à natureza do contrato coligado de cartão de crédito, não o transformando por isso, em pagamento a prazo. Mais do que ser fruto de dispositivo contratual, a proibição da cobrança de preços diferenciados por parte do fornecedor direto pertence à natureza do contrato coligado de cartão de crédito.65
Ademais, a cobrança de preço diferenciado implica, na verdade, na transferência do custo da taxa de comissão para o titular do cartão. Por-
61 CIELO. Op. cit.
62 XXXXX, Xxxx. "Estrutura jurídica e operacional do cartão de crédito". In: Seminário Sistema Jurídico e Operacional dos Cartões de Crédito, 2005, Búzios. Rio de Janeiro: Tribunal de Justiça – RJ, CEDES, 2005, p. 31.
63 Ibid., p. 31.
64 Ibid., p. 31
65 XXXXXX XX, Xxxxxxx. "Cobrança de preço diferenciado com cartão de crédito". In: Seminário Sistema Jurídico e Operacional dos Cartões de Crédito, 2005, Búzios. Rio de Janeiro: Tribunal de Justiça – RJ, CEDES, 2005, p. 109.
tanto, transfere-se para o titular do cartão o ônus de uma relação jurídica da qual ele não faz parte. Por isso, a prática usual de conceder 5% ou 3% de desconto para os clientes que efetuam o pagamento em dinheiro cons- titui violação ao contrato de credenciamento e pode levar ao descreden- ciamento do estabelecimento.
Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx, por sua vez, defende que a compra efetuada com cartão de crédito não poderia ser considerada pagamento à vista “[...] dado que o vendedor ou prestador só receberá o valor pertinente, da administradora do cartão, no mínimo, 30 dias após a transação [...]”.66 No que pese haver a regra da bandeira internacional, na proposta
de projeto de lei 213/2007, há previsão de regra de que não será vedada a fixação de preço diverso para pagamento à vista ou com cartão de crédito, desde que o consumidor seja devidamente informado.
3.1.7 - Adstrição ao Pedido de Integração
O estabelecimento, ao se credenciar no sistema de cartões de cré- dito, deve detalhar a atividade que exerce. Feito isso, ele só poderá utilizar o sistema de cartões de crédito se a transação estiver relacionada com o detalhamento da atividade apresentado no momento da celebração do contrato de credenciamento.
3.1.8 - Possibilidade de Modificação das Cláusulas Contratuais
As cláusulas do contrato de credenciamento poderão ser modifi- cadas no curso do cumprimento do contrato, em razão da evolução do sistema de cartões de crédito. Por exemplo, uma nova tecnologia pode surgir e, em razão do custo para ela ser implementada, a credenciadora pode necessitar de uma contrapartida dos estabelecimentos.
Mesmo sendo comum ocorrer modificações no contrato de creden- ciamento, “a credenciadora precisa cientificar previamente o estabeleci- mento sobre alterações que direta ou obliquamente esbarrem nos de- veres principais do contrato.”67 Em síntese, deve ser observada a boa-fé objetiva e as obrigações secundárias decorrentes desse princípio.
66 XXXXXX XX, Xxxxx. "Preço e pagamento com cartão de crédito". Disponível em: <xxxx://xxxxx.xxx.xx/xxxxx-x-
-pagamento-com-cartao-de-credito/>. Acesso em: 19 mar. 2013.
67 XXXXXX XX. Op. cit., p. 242.
3.1.9 - Confidencialidade
Vigora no contrato de credenciamento o dever de sigilo dos dados que o estabelecimento ou credenciadora venham a ter acesso, como, por exemplo, dados pessoais dos titulares dos cartões de crédito e transações por eles realizadas. Conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
Salvo para as finalidades estipuladas no contrato, tanto o es- tabelecimento, como a credenciadora mantêm em confiden- cialidade informações e dados acessados ou conhecidos sobre transações, titulares de cartão e condições comerciais de con- trato. Eventual violação desse dever acarreta outro, o de inde- nizar. Por isso, as credenciadoras fazem inserir nos respectivos contratos de afiliação de estabelecimentos cláusula pela qual o estabelecimento se obriga a observar as regras, os padrões de segurança de dados, informações e especificações, prévia e periodicamente estipulados e considerados adequados, tanto pela credenciadora, quanto pela bandeira.68
Essa previsão consta expressamente no contrato de credenciamen- to da CIELO:
Cláusula 31ª - Cada uma das partes se obriga, sob pena de in- denização por perdas e danos e aplicação de multa, a manter em absoluto sigilo e confidencialidade, usando somente para os fins deste CONTRATO, todas as informações, dados ou espe- cificações a que tiver acesso ou que porventura venha a conhe- cer ou ter ciência sobre as TRANSAÇÕES, PORTADORES, dados de CARTÕES e MEIOS DE PAGAMENTO e condições comerciais deste CONTRATO, sem prejuízo das obrigações de revelação ou dos reportes exigidos em lei ou por ordem judicial [...]69
Portanto, a cláusula se aplica tanto para a credenciadora, quanto para o estabelecimento e obriga aquele que a violou a indenizar a parte prejudicada a título de perdas e danos.
68 XXXXXX XX. Op. cit., p. 246.
69 CIELO. Op. cit.
3.1.10 - Possibilidade de Resilição/Rescisão do Contrato
O contrato de credenciamento pode ser rescindido ou resilido. A resilição se diferencia da rescisão. Na resilição, há a manifestação de von- tade de uma ou ambas as partes no sentido da extinção do contrato. A resilição é possível nos contratos celebrados por prazo indeterminado, como o contrato de credenciamento. Conforme Xxxxx Xxxxxx Junior:
O contrato poderá ser resilido, integral ou parcialmente, com relação a um respectivo estabelecimento e determinado tipo de transação ou cartão, por qualquer parte, a qualquer tem- po, mediante aviso prévio por escrito à outra parte com pelo menos 30 (trinta) dias de antecedência, responsabilizando-se as partes pelas transações já realizadas.70
A possibilidade de resilição é prevista expressamente nos contratos
de credenciamento.
Cláusula 34ª – [...] O presente CONTRATO poderá ser resilido, integral ou parcialmente, sem ônus ou multa, com relação a um respectivo ESTABELECIMENTO e determinado tipo de TRANSAÇÃO, produto, MEIO DE PAGAMENTO ou CARTÃO, por
qualquer parte, a qualquer tempo, mediante aviso prévio por escrito à outra parte com pelo menos 30 (trinta) dias de ante- cedência, responsabilizando-se as partes, nos termos e con- dições do presente, pelas TRANSAÇÕES já realizadas e pelas obrigações com caráter perene ou cujos prazos se estendam além do término da vigência deste CONTRATO. Parágrafo Se- gundo – Em caso de resilição, caberá à CIELO efetuar os re- passes porventura devidos ao ESTABELECIMENTO, no prazo contratual, ficando plenamente quitada das suas obrigações decorrentes deste CONTRATO, e caberá ao ESTABELECIMEN- TO pagar ou restituir de imediato à CIELO as quantias eventu- almente a ela devidas, na forma deste CONTRATO, sem preju- ízo das perdas e danos aplicáveis.71
70 XXXXXX XX. Op. cit., p. 247.
71 CIELO. Op. cit.
Portanto, caso haja a resilição, a credenciadora deve efetuar o repasse dos créditos porventura existentes para o estabelecimento, en- quanto este deverá pagar à credenciadora possíveis débitos existentes no momento da resilição do contrato.
Os contratos de credenciamento também podem ser rescindidos. Neste artigo, não cuidaremos da utilização técnica desse termo, em razão de não ser o objeto do artigo. Pela leitura do contrato de credenciamento, a rescisão ocorrerá por causa superveniente à celebração do contrato. É comum haver previsão nesses contratos de que a recuperação judicial ou extrajudicial possibilita a rescisão:
Cláusula 35ª - A adesão do ESTABELECIMENTO a este CON- TRATO será rescindida de pleno direito, independentemente de notificação, interpelação judicial ou extrajudicial, na hi- pótese de falência, recuperação judicial ou extrajudicial ou insolvência de qualquer das partes, decretada ou requerida.72
Deve-se observar que essa cláusula é abusiva, tendo em vista que “o princípio norteador do instituto da recuperação judicial tem o obje- tivo de viabilizar a superação da crise econômico-financeira da empre- sa recuperanda”73. Sendo assim, rescindir o contrato de credenciamento pode inviabilizar a própria recuperação da sociedade empresária.
Sobre o objetivo da recuperação, a Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu:
É notório que o artigo 47 da Lei 11.101/2005 exprime o princípio basilar da recuperação judicial de empresas em colapso econômico. Tal princípio busca a manutenção de empregos, o estímulo à atividade empresarial e o cresci- mento econômico. Assim, ainda que o artigo 49, § 3º, de- termine que o arrendador não ficará sujeito aos efeitos da recuperação, importante observar o intuito do instituto em questão, que é de recuperar a empresa. Deste modo, enten-
72 CIELO. Op. cit.
73 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 10148090661825004. Rela. Desa. Xxxxx Xxxxxxx. Julgado em: 30 jun. 2010. Disponível em: < xxxx://xxx0.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxxxXxxxxxXXXXxxxxxxX- xxxxxx.xx?numeroRegistro=1&totalLinhas=1&linhasPorPagina=10&numeroUnico=1.0148.09.066182-5%2F004&p esquisaNumeroCNJ=Pesquisar > Acesso em: 19 mar. 2013.
do acertada a decisão hostilizada, eis que tratando de bem essencial à atividade da empresa recuperanda, a reintegra- ção, ainda que após o prazo de 180 dias, não poderá ser efe- tivada, sob pena de inviabilizar a recuperação da empresa. (grifo do autor)74
Portanto, pelo mesmo raciocínio da decisão citada, essa cláusula
deve ser considerada inválida.
No entanto, há outras hipóteses em que há previsão de rescisão do contrato de credenciamento. Trata-se de hipóteses que estão atreladas, em síntese, ao descumprimento do contrato ou à impossibilidade de cum- primento, como, por exemplo, se o estabelecimento ficar impossibilitado de manter um domicílio bancário.75
Nessas hipóteses ocorrerá a rescisão sem prejuízo do pagamento da multa no valor equivalente à soma do valor das transações realizadas nos últimos três meses. Além disso, a credenciadora poderá rescindir o
74 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 10148090661825004. Rela. Desa. Xxxxx Xxxxxxx. Julgado em: 30 jun. 2010. Disponível em: < xxxx://xxx0.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/xxxxxxxxXxxxxxXXXXxxxxxxX- xxxxxx.xx?numeroRegistro=1&totalLinhas=1&linhasPorPagina=10&numeroUnico=1.0148.09.066182-5%2F004&p esquisaNumeroCNJ=Pesquisar > Acesso em: 19 mar. 2013.
75 CIELO. Op. cit. Cláusula 36ª - Também motiva a rescisão de pleno direito, e sem prejuízo da multa não compen- satória no valor equivalente à somatória das TRANSAÇÕES efetivadas nos últimos 3 (três) meses e do ressarcimen- to das perdas e danos eventualmente acarretados, o não cumprimento pelo ESTABELECIMENTO de qualquer das cláusulas ou obrigações dispostas em qualquer dos documentos que compõem o CONTRATO, ou ainda se ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: a) se o ESTABELECIMENTO sugerir ao PORTADOR que substitua o pagamento com CARTÃO por outro meio de pagamento; b) se o ESTABELECIMENTO, sem autorização da CIELO, (i) ceder ou transferir para terceiros, emprestar-lhes ou entregar-lhes os equipamentos ou materiais que receber em virtude deste CON- TRATO, (ii) utilizar equipamentos ou materiais de terceiros sem autorização da CIELO, ou ainda, (iii) ceder a terceiros, mesmo parcialmente, os direitos e/ou obrigações decorrentes deste CONTRATO. As vedações aqui previstas são válidas e aplicáveis para filiais e empresas do mesmo grupo econômico do ESTABELECIMENTO; c) se o ESTABELE- CIMENTO ficar impedido de abrir ou manter conta-corrente de depósitos em estabelecimentos bancários ou caso fique, por qualquer período de tempo e por qualquer motivo, sem DOMICÍLIO BANCÁRIO para receber seus créditos de CARTÕES; d) se o ESTABELECIMENTO não pagar quaisquer taxas, comissões ou quaisquer outros encargos contra- tados ou se recusar a fazê-lo; e) se o ESTABELECIMENTO aceitar MEIOS DE PAGAMENTO em negócio ou segmento diverso do cadastrado no SISTEMA CIELO sem comunicação e aprovação da CIELO quanto à manutenção da afiliação do ESTABELECIMENTO; f) se o ESTABELECIMENTO praticar ou tentar praticar quaisquer atos que tenham por obje- tivo, direto ou indireto, realizar TRANSAÇÕES consideradas ilegítimas, fraudulentas ou que infrinjam o CONTRATO ou que pretendam burlar ou descumprir o CONTRATO, quaisquer regras ou requisitos operacionais ou de segurança da CIELO ou da BANDEIRA, ou qualquer lei ou regulamento municipal, estadual ou federal; g) se qualquer das infor- mações escritas ou verbais dadas pelo ESTABELECIMENTO, incluindo, mas não se limitando àquelas constantes do Formulário de Afiliação ao SISTEMA CIELO, bem como representação legal e dados cadastrais do ESTABELECIMENTO, não corresponderem com a verdade ou não forem atualizadas pelo ESTABELECIMENTO em, no máximo 30 (trinta) dias, em caso de alteração; h) não cumprir a legislação e regulamentação aplicável ao ESTABELECIMENTO, bem como as regras estabelecidas pela CIELO e/ou pelas BANDEIRAS. Parágrafo Primeiro - Nos casos previstos nesta Cláusula, a CIELO não estará obrigada a cumprir o prazo de 30 (trinta) dias podendo efetivar a rescisão no momento de sua ciência da ocorrência de quaisquer das hipóteses acima. Parágrafo Segundo - Em caso de suspeita de fraude ou qualquer outra atividade ilícita, a CIELO poderá, no momento efetivo da rescisão, reter eventuais repasses a serem realizados ao ESTABELECIMENTO pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias contados da data da rescisão, até conclusão de auditoria sobre os eventos.
contrato no momento da ciência do fato, sem precisar observar o prazo de 30 dias. Caso haja suspeita de fraude, a credenciadora poderá reter possíveis créditos pelo prazo de 120 dias.
O Desembargador Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxx, relator do Agravo In- terno na Apelação Cível nº 0037669-37.2004.8.19.0004, ao julgar lide em que envolvia a rescisão do contrato de credenciamento, dispôs:
Por fim, quanto ao pedido de manutenção do contrato, rescin- dido pela parte ré, merece ser acolhido. Não obstante estarmos diante de relação jurídica de direito privado, regulado pelo ma- croprincípio da autonomia da vontade, devemos prestigiar no caso também os princípios da pacta sunt servanda e da boa-fé objetiva. Ora, o contrato firmado entre as partes (fl. 21) tem prazo indeterminado e não estamos diante de hipótese de resi- lição (desfazimento por simples manifestação de vontade). Ao contrário, a extinção do contrato teve fundamento na cláusula vigésima quarta do instrumento de fl. 21, que previu especifi- camente as hipóteses de resolução, dentre elas a ocorrência de fraude, motivo apontado no caso dos autos. Mas a ocorrência de fraude não restou minimamente comprovada, como reco- nhecido tanto pela sentença, quanto pela decisão monocrática ora agravada, de modo que não subsistiria, portanto, o motivo para rescisão do contrato.76
Portanto, para que haja a rescisão em razão da verificação de algu- ma das hipóteses elencadas no contrato, deve haver a comprovação dos fatos. Devendo ter em mente, que, apesar de o contrato poder ser resilido a qualquer tempo, a rescisão não pode ser confundida com a resilição.
Ao se interpretar o contrato diante do caso concreto e para dar efi- cácia às cláusulas de rescisão e resilição previstas no contrato, o intérprete deve se ater, conforme observou o desembargador relator em seu voto:
76 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Agravo Interno na Apelação Cível nº 0037669-37.2004.8.19.0004. Nona Câmara Cível. Rel. Des. Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxx. Julgado em: 20 abr. 2011. Disponível em: < xxxx://xxx00.xxxx.xxx.xx/ ConsultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=000377A3445F80329C7E13E9898B4878342E22C40 2635A44> Acesso em: 19 mar. 2013.
[...] às disposições dos artigos 421 e 422 do Código Civil, que condicionam o exercício da liberdade de contratar aos limites da função social do contrato e instituem a boa-fé objetiva como uma regra de conduta, a ser observada por todos os contratantes, tanto na conclusão do contrato como na sua execução. A boa-fé objetiva é regra que desde o advento do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil de 2002 permeia todos os contratos, exigindo dos contratantes um comportamento probo e honesto a ser observado durante toda a existência da relação contratual, não apenas no mo- mento de sua execução, mas também nas fases pré e pós-
-contratual.77
Portanto, por maior que seja a liberdade de contratar das partes e por mais detalhado que seja o contrato de credenciamento, a boa-fé objetiva continuará sendo a base e o limite dos contratos.
CONCLUSÃO
O sistema de cartões de crédito evoluiu consideravelmente ao lon- go dos anos. Atualmente, entre as três partes tradicionais que compu- nham o sistema, figura também a credenciadora, que credencia os esta- belecimentos de bens e serviços no sistema, e as bandeiras.
O contrato de credenciamento de cartão de crédito apresenta inú- meras regras que obrigam o estabelecimento. Não cabe ao estabelecimen- to discutir essas regras, ele deve aderir ou não ao contrato. Isso faz com que o estabelecimento fique sujeito a cláusulas que lhe são desfavoráveis e, muitas vezes, abusivas, como, por exemplo, a cláusula que previr a rescisão do contrato na hipótese de recuperação judicial ou extrajudicial.
Em razão da conduta abusiva das credenciadoras, os tribunais, ao julgarem os casos que envolvem o contrato de credenciamento, são cau- telosos, justamente por se tratar de um contrato de xxxxxx, bem como em razão do fato de estar credenciado ao sistema de cartões de crédito
77 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Agravo Interno na Apelação Cível nº 0037669-37.2004.8.19.0004. Nona Câmara Cível. Rel. Des. Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxx. Julgado em: 20 abr. 2011. Disponível em: <xxxx> Acesso em: 19 mar. 2013.
ter se tornado imprescindível para os estabelecimentos. Sendo assim, as partes são postas novamente em equilíbrio perante o Judiciário, com ful- cro na aplicação do princípio da boa-fé objetiva.
No que pese essa constatação negativa advinda do contrato de cre- denciamento de cartões de crédito, deve-se considerar que o complexo sistema de cartões de crédito é capaz de aumentar significativamente a clientela do estabelecimento. Além disso, ele ganhou grandes propor- ções no Brasil e se tornou um importante mecanismo de fomento ao consumo.❖
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