FUNDAMENTOS. 2.1. A recorrente remata as suas alegações com as seguintes conclusões: I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral e, consequentemente, absolveu a Ré da instância, nos termos do art. 577.º, alínea a) do CPC. Considerando para tal que a convenção de arbitragem estabelecida na cláusula 41.º do Contrato Quadro (Documento 1 da p.i.) abrange o objecto da lide; não é manifestamente nula, nem se tornou manifestamente ineficaz ou inexequível, sendo oponível à Recorrente. II. Sem conceder quanto às questões referentes à validade da convenção, que não se discutirão nesta sede, procurará a Recorrente demonstrar apenas neste recurso que a (i) convenção de arbitragem não abrange o objecto da lide e, em qualquer caso, (ii) ser-lhe-ia inoponível em função da situação superveniente de insuficiência económica. III. A questão objecto do recurso cinge-se, pois, em saber se a competência material para a presente acção cabe ao Tribunal “a quo” ou é da competência dos tribunais arbitrais, cumprindo, para tanto, apreciar os dois fundamentos enunciados atrás. IV. Começando pelo âmbito da convenção de arbitragem apontada, ao considerar o objecto da lide incluído na cláusula arbitral o tribunal fez uma incorrecta interpretação da mesma, violando o art. 236.º, n.º 1 do CC, e, por consequência, interpretando e aplicando também erradamente os arts. 96.º, alínea b) e 99.º, n.º 1, do CPC, assim como o n.º 1 do art. 5.º da LAV. V. A expressão “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” ínsita na dita cláusula 41.ª reporta-se tão só aos litígios decorrentes directamente do Contrato Quadro, autonomamente considerado, e, quando muito, numa interpretação ampla da convenção arbitral, também aos litígios decorrentes de operações financeiras em que se discutam matérias que integram a disciplina do Contrato Quadro igualmente aplicável a tais operações (maxime as vertidas nas cláusulas 5.ª a 17.ª). VI. O Contrato Quadro tem organização e sistematização próprias, sendo possível vislumbrar no mesmo uma certa segmentação ou divisão, procurando nuns segmentos regular-se os aspectos comuns ao Contrato Quadro e às chamadas operações financeiras (cláusulas 1.ª à 4.ª), noutros, apenas os aspectos específicos das operações financeiras (cláusulas 5.ª à 17.ª), e ainda noutros segmentos, os aspectos específicos do Contrato Quadro (cláusula 18.ª à 41.ª), entre os quais a escolha do foro competente para dirimir os “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” (leia-se o Contrato Quadro). VII. O Contrato Quadro é, por tudo isto, autónomo das operações financeiras que visa enquadrar. Produz, como tal, efeitos directos e imediatos, independentemente da contratação de qualquer operação, e gera direitos accionáveis contenciosamente, se necessário. VIII. Atendendo ao pedido e à causa de pedir formulados nos autos – entre os quais a declaração de invalidade do swap (nos termos do artigo 1245.º do CC ou noutros que o tribunal considere aplicáveis) e a imputação de responsabilidade da Ré (por violação de deveres de informação pré-contratuais), constata-se que a apreciação e decisão destas questões jurídicas, eminentemente de direito privado civil, convoca a aplicação de normas gerais do Código Civil que nada têm a ver com disciplina especial do Contrato Quadro – do qual a Recorrente não se pretende sequer aproveitar – e que são, salvo convenção em contrário, da exclusiva competência dos Tribunais Judiciais, nos termos do art. 64.º do CPC (cfr. citado Ac. TRG de 08/03/2012, proc. 1387/11.5TBBCL-B.G1). IX. O objecto da presente lide – pelo menos na parte em que se joga a invalidade do contrato swap e se discute o aludido direito à indemnização da Autora, nos moldes configurados na acção – não está, xxxxx e inequivocamente, coberto pela convenção de arbitragem assinalada. X. Uma vez que a patente e manifesta inaplicabilidade da convenção de arbitragem é perceptível num juízo perfunctório, o tribunal judicial pode declará-la e, consequentemente, julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral, sem com isso pôr em causa o princípio da competência - competência 5. XI. De resto, havendo incerteza quanto à vontade real das partes na celebração da convenção, sempre a cláusula respectiva deve ser interpretada à luz da teoria da impressão do destinatário (art. 236.º, n.º 1 do CPC), de acordo com a qual chega-se também a resultado idêntico: mesmo para um declaratário normal, na posição da Recorrente, os diferendos relacionados com a validade de operações financeiras futuras ou com a violação de deveres não plasmados no texto do Contrato Quadro estariam fora da convenção. XII. Passemos agora a apreciar a questão da inoponibilidade da convenção em função da situação superveniente de insuficiência económica da Recorrente. XIII. “Mostra-se posicionamento pacífico considerar que a superveniência de uma situação de insuficiência económica que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constituirá causa legítima de incumprimento da convenção” e que “quando uma das partes, sem culpa sua, deixa de ter meios de custear as despesas relativas à arbitragem, não pode ficar impedida de ver satisfeito o seu direito de acesso à justiça para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, pois estar-se-ia a denegar justiça por insuficiência de meios económicos (o que a Lei Fundamental, como vimos, não permite), pelo que a obrigação de recorrer à arbitragem se extingue relativamente a ela – cfr. o Ac. STJ de 18/01/2000, proc. 99A1015, e o Ac. TRL de 02/11/2010, proc. 454/09.0TVLSB.L1-7, sublinhado nosso. XIV. No caso dos autos, já depois de celebrar a convenção de arbitragem e pelos motivos descritos nos arts. 40.º a 52.º da p.i., a Recorrente viu-se a braços com uma degradação da sua situação económica, que não lhe é imputável, e que a impossibilita de custear as despesas de arbitragem. A situação agravou-se de tal forma que, por despacho judicial de 20/03/2005, foi admitida a PER (cfr. Documento 1 junto com este recurso), facto superveniente que a Relação não poderá deixar de ter em linha de conta na decisão que proferir. XV. A admissão ao PER determinou uma alteração ope legis do estatuto jurídico da Recorrente, garantindo- lhe, para além do mais, de forma imediata e directa, a isenção total de custas judiciais no acesso aos tribunais (artigo do 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP), situação de que já tirou proveito nesta apelação mas que, obviamente, não a poderá beneficiar na instância arbitral que, reconhecidamente e sem necessidade de comprovação adicional, será muito mais dispendiosa neste caso. XVI.Os elementos fácticos evidenciados nos autos (designadamente os Documentos 3, 4, 5 e 6 da p.i., e o Documento 1 agora junto) espelham bem a débil realidade económica e financeira da Recorrente e permitem à Relação, por um lado, inferir, ao abrigo da prerrogativa que lhe assiste nos termos do art. 662.º do CPC, a concomitante incapacidade de esta suportar as despesas inerentes à via arbitral e, por outro, em consequência, julgar extinta a obrigação de recorrer à arbitragem ou – caso a Relação entenda que não dispõe ainda de elementos suficientes para fixar a matéria de facto caracterizadora da situação económica da Recorrente – anular a decisão recorrida e mandar baixar os autos à 1.ª instância para que aí sejam seleccionados os correspondentes factos, a constarem de base instrutória, e sobre eles produzida prova, tudo nos termos do art. 662.º, n.º 2 do CPC.. XVII. A impossibilidade de custear as despesas relativas à arbitragem acarreta, nos termos do art. 790.º, n.º 1, do CC, uma extinção da obrigação de recorrer à arbitragem, fundada na impossibilidade do seu cumprimento por causa não imputável ao devedor, o que permite julgar, desde logo, improcedente a excepção de preterição de tribunal arbitral, sem que para tal haja necessidade de desaplicar a norma contida no art. 577.º, alínea a) do CPC em função de um juízo de inconstitucionalidade sobre determinada dimensão interpretativa da mesma. XVIII. Inconstitucionalidade que, à cautela, também se suscita já, quando a norma referida seja interpretada no sentido de a excepção de violação de convenção de arbitragem ser oponível à parte que, sem culpa, se encontre em situação superveniente de insuficiência económica que lhe confira o benefício de isenção de custas judiciais previsto no artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP, por de violação do art. 20.º da Constituição (acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva), não devendo, em conformidade, a mesma norma ser aplicada ao caso dos autos e julgando-se assim improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal (cfr. neste sentido o Ac. TC n.º 311/08, de 30/05/2008, no proc. 753/07, já citado). XIX. E não se diga que o princípio constitucional do acesso à justiça não passa por o Estado assegurar que entidades com fins lucrativos e em má situação económica têm a possibilidade de aceder aos tribunais. Embora seja verdade que a Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, afastou a concessão de protecção jurídica às pessoas colectivas com fins lucrativos, o Estado, porém, não deixa de reconhecer uma isenção total de custas judiciais a tais pessoas colectivas, quando estejam em situação de falência ou em processo de recuperação de empresa, por conseguinte, em má situação económica (artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP). XX. Dito isto, à Recorrente restam duas alternativas: ou consegue ver julgados na instância judicial os direitos invocados ou, caso contrário, terá que os deixar cair definitivamente por não ter condições económicas de suportar as despesas da arbitragem, ou seja, verá “ser-lhe denegada justiça por insuficiência de meios económicos”, resultado que a Constituição manifestamente impede (cfr. o Ac. TRL de 02/11/2010, já citado). XXI. Em síntese, é manifesto e patente (na acepção acima mencionada) que a aludida cláusula compromissória é inoponível à Recorrente, por impossibilidade superveniente de esta, sem culpa sua, custear as despesas da arbitragem (art. 790.º do CC). E, em qualquer caso, sempre a oponibilidade da convenção de arbitragem violaria o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva previstos no art. 20º, da CRP.
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FUNDAMENTOS. 2.1O objecto do presente recurso passa, no essencial, pelas seguintes questões, tantas quantas as levantadas no recurso sob apreciação: - Da inaplicabilidade do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 12/95/M, de 14 de Agosto (doravante “RAU”); - Das consequências a retirar da junção da certidão judicial, emitida em 15 de Julho de 2003, relativa a uma inspecção ao local.
1. A Quanto à alegada irregularidade apontada pelo recorrido no que concerne ao cumprimento do disposto noo ao artigo 598º do CPC que, sob a epígrafe “Ónus de alegar e formular conclusões”, determina, nomeadamente, que “versando o recurso sobre matéria de direito” deve o Recorrente indicar a norma jurídica que, no seu entendimento, deveria ter sido aplicada, não se deixará de remeter para o que adiante se disser sobre essas matéria.
2. Sustenta a recorrente remata as nas suas alegações com as seguintes conclusões:
I. O presente de recurso vem interposto da sentença que julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral efracção em causa se destinava inequivocamente a um “fim especial transitório”, consequentemente, absolveu a Ré da instância, nos termos do art. 577.º, que se refere a alínea a) do CPC. Considerando para tal que a convenção da Lei n.º 12/95/M, de arbitragem estabelecida 14 de Agosto (RAU), na cláusula 41.º do Contrato Quadro (Documento 1 da p.i.) abrange o objecto da lide; não é manifestamente nula, nem se tornou manifestamente ineficaz ou inexequível, sendo oponível à Recorrente.
II. Sem conceder quanto às questões referentes à validade da convenção, que não se discutirão nesta sede, procurará a Recorrente demonstrar apenas neste recurso que a (i) convenção de arbitragem não abrange o objecto da lide e, em qualquer caso, (ii) ser-lhe-ia inoponível em função da situação superveniente de insuficiência económica.
III. A questão objecto do recurso cinge-se, pois, em saber se a competência material para a presente acção cabe ao Tribunal “a quo” ou é da competência dos tribunais arbitrais, cumprindo, para tanto, apreciar os dois fundamentos enunciados atrás.
IV. Começando pelo âmbito da convenção de arbitragem apontada, ao considerar o objecto da lide incluído na cláusula arbitral o tribunal fez uma incorrecta interpretação da mesma, violando o art. 236.º, n.º 1 do CC, e, por consequência, interpretando e aplicando também erradamente os arts. 96.º, alínea b) e 99.º, n.º 1, do CPC, assim como o n.º 1 do art. 5.º da LAV.
V. A expressão “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” ínsita na dita cláusula 41.ª reporta-se tão só aos litígios decorrentes directamente do Contrato Quadro, autonomamente considerado, e, quando muito, numa interpretação ampla da convenção arbitral, também aos litígios decorrentes de operações financeiras medida em que se discutam matérias destinava única e exclusivamente a “sala de gás”, cuja finalidade era servir de apoio logístico ao fornecimento de gás ao Restaurante “The xx Court”, razão pela qual os contratos de “arrendamento” e de fornecimento de gás tinham a mesma duração. Não sendo o RAU aplicável aos contratos de arrendamento para fins especiais transitórios, não seria igualmente a acção de despejo o meio próprio para a denúncia desse contrato, pelo que integram errou o tribunal a disciplina quo, ao aplicar esta lei, ao invés das regras gerais da locação previstas nos artigos 1022º ss. do Contrato Quadro igualmente aplicável a tais operações (maxime as vertidas nas cláusulas 5.ª a 17.ª).
VI. O Contrato Quadro tem organização e sistematização próprias, sendo possível vislumbrar no mesmo uma certa segmentação ou divisão, procurando nuns segmentos regular-se os aspectos comuns ao Contrato Quadro e às chamadas operações financeiras (cláusulas 1.ª Código Civil à 4.ª), noutros, apenas os aspectos específicos das operações financeiras (cláusulas 5.ª à 17.ª), e ainda noutros segmentos, os aspectos específicos do Contrato Quadro (cláusula 18.ª à 41.ª), entre os quais a escolha do foro competente para dirimir os “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” (leia-se o Contrato Quadro).
VII. O Contrato Quadro é, por tudo isto, autónomo das operações financeiras que visa enquadrar. Produzdata em vigor, como tal, efeitos directos e imediatos, independentemente da contratação de qualquer operação, e gera direitos accionáveis contenciosamente, se necessário.
VIII. Atendendo ao pedido e à causa de pedir formulados nos autos – entre os quais a declaração de invalidade resulta do swap (nos termos n.º 2 do artigo 1245.º 1º RAU. Antes de mais, não se deixa de constatar que não resulta da douta sentença recorrida que tenha sido o anterior regime do CC ou noutros arrendamento urbano o aplicado, bastando ver as inúmeras referências ao Código Civil vigente, em que o tribunal considere aplicáveis) a mesma se louvou, aliás, dentro da correcta interpretação das normas de aplicação da lei no tempo e a imputação do disposto no artigo 17º do Dec.-Lei prembular nº 39/99/M de responsabilidade da Ré (por violação 3 de deveres de informação pré-contratuais)Agosto. De qualquer modo, constataassinala-se que a apreciação e decisão destas questões jurídicaso contrato inicial em análise se integra no género do contrato de locação, eminentemente de direito privado civil, convoca a aplicação de normas gerais do Código Civil que nada têm a ver com disciplina especial do Contrato Quadro – do qual a Recorrente não se pretende sequer aproveitar – e que são, salvo convenção em contrário, da exclusiva competência dos Tribunais Judiciais, nos termos do art. 64.º do CPC (cfr. citado Ac. TRG de 08/03/2012, proc. 1387/11.5TBBCL-B.G1).
IX. O objecto da presente lide – pelo menos na parte medida em que se joga a invalidade do contrato swap e se discute o aludido direito à indemnização da Autora, nos moldes configurados na acção – não está, xxxxx e inequivocamente, coberto pela convenção de arbitragem assinalada.
X. Uma vez que a patente e manifesta inaplicabilidade da convenção de arbitragem é perceptível num juízo perfunctório, o tribunal judicial pode declará-la e, consequentemente, julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral, sem com isso pôr em causa o princípio da competência - competência 5.
XI. De resto, havendo incerteza quanto à vontade real das partes na celebração da convenção, sempre a cláusula respectiva deve ser interpretada à luz da teoria da impressão do destinatário (art. 236.º, n.º 1 do CPC), de acordo com a qual chega-se também a resultado idêntico: mesmo para um declaratário normal, na posição da Recorrente, os diferendos relacionados com a validade de operações financeiras futuras ou com a violação de deveres não plasmados no texto do Contrato Quadro estariam fora da convenção.
XII. Passemos agora a apreciar a questão da inoponibilidade da convenção em função da situação superveniente de insuficiência económica da Recorrente.
XIII. “Mostra-se posicionamento pacífico considerar que a superveniência de uma situação de insuficiência económica que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constituirá causa legítima de incumprimento da convenção” e que “quando uma das partes, sem culpa suao A., deixa se obrigou a proporcionar à Ré o gozo temporário de ter meios uma coisa, mediante retribuição (artigo 969° do Código Civil), pelo período de custear as despesas relativas à arbitragem8 anos, contrato que se tipifica como arrendamento por versar sobre coisa imóvel (artigo 970° do Código Civil) e, ainda, como arrendamento comercial porquanto se relaciona com o exercício da empresa comercial da Ré (artigo 1045º do Código Civil). Anota-se ainda que, tanto nos termos do Código Civil (CC) em vigor, como do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), anteriormente aplicável, os direitos do senhorio (ora recorrido) têm o mesmo enquadramento e a mesma protecção, lançando mão do mecanismo de acção de despejo para defender o seu direito. E tanto o regime do RAU como o do CC excepcionam a aplicação de certas normas do regime jurídico próprio do arrendamento àqueles que sejam celebrados para fins especiais transitórios (cfr. art. 1029, nº2 do CC e 2º, nº1, a) do RAU. Pretende a recorrida integrar o arrendamento em causa nesta espécie, como sendo um contrato de arrendamento para fim especial transitório. Não lhe assiste qualquer razão. O conceito de "contrato de arrendamento para fim especial transitório" constava já do Código Civil anteriormente em vigor em Portugal (artigo 1083° n.º 2) e do posterior Regime de Arrendamento Urbano, aprovado para substituir aquele (no respectivo artigo 5°). Previa o citado artigo 1083° que o regime geral do arrendamento previsto no Código Civil não era aplicável aos "arrendamentos para habitação, por certos períodos, em praias, termas ou outros lugares de vilegiatura ou para outros fins especiais transitórios" - assim se definindo, de forma expressa, a maior parte dos casos (específicos) em que um contrato de arrendamento era celebrado para "fim especial transitório". Na evolução legislativa subsequente, tanto no RAU de Macau, como no novo CC, a previsão normativa passou a consagrar apenas a previsão, por totalmente abrangente, respeitante a “arrendamentos para fins especiais transitórios”. A interpretação daquele preceito deve respeitar situações particulares e transitórias, tais como sejam os arrendamentos para fins especiais, por curtos períodos ou para finalidades específicas de curta duração, v. g. casas de praia, em termas ou outras formas de descanso ou gozo de férias. A duração, enquanto elemento do contrato, cede perante a transitoriedade que se assume como elemento essencial do conceito, isto é, independentemente do tempo do contrato, releva-se aqui a utilização efectiva do locado pelo arrendatário. Independentemente do prazo do contrato de arrendamento, se o locado só for utilizado durante um mês por ano, pelo inquilino em gozo de férias, está preenchido o conceito de arrendamento para fim especial transitório. Esta interpretação, como refere o Prof. A. Xxxxxx0, extrai-se exactamente da expressão utilizada pelo legislador, já que “a referência genérica da parte final da alínea (outros fins especiais transitórios) revela a verdadeira ratio legis do preceito: a lei recusa a tutela própria da legislação vinculística, nomeadamente o princípio da relocação obrigatória imposta ao senhorio pelo arrendatário, aos arrendamentos destinados a ocupar o imóvel, pelo seu fim, não pode ficar impedida durante o ano inteiro, mas apenas por períodos ou épocas de ver satisfeito curta duração na roda do ano.” Ora, arrendar parte de uma fracção, por oito anos, para servir de sala de gás, em apoio a um restaurante, o que supõe um fornecimento permanente, ainda que tenha cessado o contrato de fornecimento de gás, - havendo sempre que distinguir, ainda que se trate da mesma pessoa, entre senhorio e dono do restaurante -, não pode, de forma alguma, considerar-se que esse contrato tem a natureza especial transitória de que fala o normativo acima referido.
1 - CC Anot.3ª ed., II, 528 Assim, não se acolhe a qualificação que a recorrida veio fazer do respectivo contrato, como contrato de arrendamento para fim especial transitório. Acresce que, ao defender a inadmissibilidade da acção de despejo nestas situações, limitando-se a remeter para o regime geral de locação, estatuído no Código Civil (artigo 1022° e seguintes), é verdade que a recorrida não explicitou quais as consequências da aplicação do regime do Código Civil, quais as normas que, em concreto, deveriam ser aplicadas pelo Tribunal a este caso e quais os efeitos jurídicos daí resultantes, isto é, se, em concreto, por causa disso, o despejo não devia ter sido decretado. Muito embora o erro na forma de processo não gere o indeferimento do pedido - cfr. art. 145º do CPC - , não se deixará de dizer que, se era esta conclusão que pretendia retirar dessa argumentação, o certo é o que o não referiu expressamente, pelo que ao omitir esta parte essencial da sua argumentação, a recorrida, faltando ao cumprimento do disposto no artigo 598°, n.° 2 al. c) do Código de Processo Civil, não forneceu os elementos necessários conducentes à conclusão de que foram preteridos actos ou formalidades que abalaram o seu direito de acesso defesa ou do contraditório, ou quais os elementos em concreto que de alguma forma abalaram os fundamentos subjacentes à justiça decisão de despejo e consequente entrega da coisa arrendada, de forma a considerar que o pedido devia ter sido desatendido. É questão, contudo, que se mostra ultrapassada, face à posição que se tomou quanto à qualificação do contrato. Mas não se deixará ainda de dizer que, mesmo que se entendesse que se tratava de um contrato de arrendamento para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidosfins especiais transitórios, pois estar-se-ia a denegar justiça por insuficiência de meios económicos (o não é seguro que a Lei Fundamentaltal contrato se lhe não aplique a acção de despejo, como vimosface ao disposto no nº 3 do artigo 1029º do CC e artigo 929º do CPC.
3. Importa agora analisar a questão que se prende com as consequências que se pretendem retirar da junção da certidão judicial, não permite)emitida em 15 de Julho de 2003, pelo que relativa a obrigação de recorrer à arbitragem se extingue relativamente a ela – uma inspecção ao local (cfr. o Acfls 410 e v.). STJ Pretende a recorrente retirar desse documento e pelo facto de 18/01/2000a Ré não possuir a chave do locado, proc. 99A1015, e o Ac. TRL tendo sido necessário recorrer ao arrombamento da porta de 02/11/2010, proc. 454/09.0TVLSB.L1-7, sublinhado nosso.
XIV. No caso dos autos, já depois de celebrar a convenção de arbitragem e pelos motivos descritos nos arts. 40.º a 52.º da p.i., a Recorrente viu-se a braços com uma degradação da sua situação económicaacesso ao local, que não lhe é imputávelestaria na posse do locado, e que só então passando a impossibilita estar em condições de custear as despesas de arbitragemdele retirar os seus pertences. A situação agravou-se de tal forma Pelo que, por despacho judicial de 20/03/2005não tendo a posse do locado, foi admitida a PER (cfr. Documento 1 junto com este recurso)nem o seu gozo, facto superveniente que a Relação não poderá deixar de ter em linha de conta na decisão que proferir.
XV. A admissão ao PER determinou uma alteração ope legis faltando um elemento essencial do estatuto jurídico da Recorrente, garantindo- lhe, para além do mais, de forma imediata e directa, a isenção total de custas judiciais no acesso aos tribunais (artigo do 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP), situação de que já tirou proveito nesta apelação mas que, obviamentecontrato, não podia haver contrato de arrendamento ou sequer de locação. Xxxxx simplesmente se dirá que o referido documento comprova apenas aquilo que ali se descreve, não estando em causa a poderá beneficiar na instância arbitral que, reconhecidamente e sem necessidade existência de comprovação adicional, será muito mais dispendiosa neste caso. XVI.Os elementos fácticos evidenciados um contrato de arrendamento devidamente comprovado nos autos (designadamente os Documentos 3e como tal, 4, 5 correctamente qualificado e 6 da p.i., e o Documento 1 agora junto) espelham bem tratado na douta sentença recorrida. Não é pelo facto de se ter de arrombar a débil realidade económica e financeira da Recorrente e permitem à Relação, por um lado, inferir, ao abrigo da prerrogativa que lhe assiste nos termos porta do art. 662.º do CPC, a concomitante incapacidade de esta suportar as despesas inerentes à via arbitral locado e, por outro, em consequência, julgar extinta a obrigação de recorrer à arbitragem ou – caso a Relação entenda que não dispõe ainda de elementos suficientes para fixar a matéria de facto caracterizadora da situação económica da Recorrente – anular a decisão recorrida e mandar baixar os autos à 1.ª instância para que aí sejam seleccionados os correspondentes factos, a constarem de base instrutória, e sobre eles produzida prova, tudo nos termos do art. 662.º, n.º 2 do CPC..
XVII. A impossibilidade de custear as despesas relativas à arbitragem acarreta, nos termos do art. 790.º, n.º 1, do CC, uma extinção da obrigação de recorrer à arbitragem, fundada na impossibilidade do seu cumprimento por causa não imputável ao devedoraparentemente, o locatário não estar a utilizar o local arrendado que permite julgar, desde logo, improcedente a excepção de preterição de tribunal arbitral, sem que para tal haja necessidade de desaplicar a norma contida no art. 577.º, alínea a) se pode concluir pela inexistência do CPC em função de um juízo de inconstitucionalidade sobre determinada dimensão interpretativa da mesma.
XVIII. Inconstitucionalidade que, à cautela, também se suscita já, quando a norma referida seja interpretada no sentido de a excepção de violação de convenção de arbitragem ser oponível à parte que, sem culpa, se encontre em situação superveniente de insuficiência económica que lhe confira o benefício de isenção de custas judiciais previsto no artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP, por de violação do art. 20.º da Constituição (acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva), não devendo, em conformidade, a mesma norma ser aplicada ao caso dos autos e julgando-se assim improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal (cfr. neste sentido o Ac. TC n.º 311/08, de 30/05/2008, no proc. 753/07, já citado).
XIX. E não se diga que o princípio constitucional do acesso à justiça não passa por o Estado assegurar que entidades com fins lucrativos e em má situação económica têm a possibilidade de aceder aos tribunais. Embora seja verdade que a Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, afastou a concessão de protecção jurídica às pessoas colectivas com fins lucrativos, o Estado, porém, não deixa de reconhecer uma isenção total de custas judiciais a tais pessoas colectivas, quando estejam em situação de falência ou em processo de recuperação de empresa, por conseguinte, em má situação económica (artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP).
XX. Dito isto, à Recorrente restam duas alternativas: ou consegue ver julgados na instância judicial os direitos invocados ou, caso contrário, terá que os deixar cair definitivamente por não ter condições económicas de suportar as despesas da arbitragem, ou seja, verá “ser-lhe denegada justiça por insuficiência de meios económicos”, resultado que a Constituição manifestamente impede (cfr. o Ac. TRL de 02/11/2010, já citado).
XXIcontrato. Em síntese, é manifesto e patente (na acepção acima mencionada) que a aludida cláusula compromissória é inoponível à Recorrente, por impossibilidade superveniente de esta, sem culpa sua, custear as despesas da arbitragem (art. 790.º do CC). E, em qualquer todo o caso, sempre ali xxxxxxxx aparelhos seus e sempre podia fazer uso do arrendado, removendo os obstáculos a oponibilidade essa utilização. A posse jurídica e material pertence à Ré, ora recorrente, como ficou provado nos presentes autos, sendo-lhe conferida a posse com a celebração do contrato, sendo que não restituiu o locado ao A., no termo do contrato, como era sua obrigação. A relação jurídica eventualmente existente com terceiros (recorrente e restaurante), tanto quanto se alcança da convenção de arbitragem violaria o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva previstos no artidentificação das partes na acção ordinária n.º CAO-015-0-2, donde a aludida certidão foi extraída, em nada interfere na presente acção, até porque nada foi alegado nesse sentido. 20ºNão merece, da CRP.pois, a sentença recorrida qualquer censura, mostrando-se atempadamente feita a rectificação pretendida que não vem, aliás, posta em crise
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Samples: Contrato De Arrendamento
FUNDAMENTOS. 2.1II.I – Da regularidade do processo O presente Processo Administrativo tramitou conforme as normas contidas na Constituição da República, na Lei n° 8.666/93, Lei Estadual n° 14.184/02 e na Resolução PGJ n° 40/2004, respeitando-se os ritos e regras predeterminados, a legalidade e a impessoalidade inerentes ao feito, bem como a ampla defesa e o contraditório. O ato de instauração do processo é válido, realizado por autoridade competente, apresenta motivo, motivação, finalidade e objeto definido. Em relação à regularidade do processo, a Lei de Licitações confere à Administração a prerrogativa de fiscalizar a execução dos contratos, acompanhando permanentemente a atuação do particular (arts. 58, III e 67, da Lei nº 8.666/93). Tal poder-dever visa a permitir ao administrador adotar providências corretivas ou repressivas, conforme o caso, com a maior presteza possível, resguardando a fiel execução do pactuado e, em última análise, a satisfação do interesse público, tendo em vista o princípio da finalidade dos atos administrativos. A recorrente remata as suas alegações instrução, imprescindível à validade do Processo Administrativo, teve início logo após a Portaria Inaugural. Garantiram-se à Contratada o exercício do contraditório e da ampla defesa, com as seguintes conclusões:
I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente todos os meios e recursos a excepção dilatória de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral e, consequentemente, absolveu a Ré da instânciaeles inerentes, nos termos do art. 577.º, alínea a) do CPC. Considerando para tal que a convenção de arbitragem estabelecida na cláusula 41.º do Contrato Quadro (Documento 1 da p.i.) abrange o objecto da lide; não é manifestamente nula, nem se tornou manifestamente ineficaz ou inexequível, sendo oponível à Recorrente.
II. Sem conceder quanto às questões referentes à validade da convenção, que não se discutirão nesta sede, procurará a Recorrente demonstrar apenas neste recurso que a (i) convenção de arbitragem não abrange o objecto da lide e, em qualquer caso, (ii) ser-lhe-ia inoponível em função da situação superveniente de insuficiência económica.
III. A questão objecto do recurso cinge-se, pois, em saber se a competência material para a presente acção cabe ao Tribunal “a quo” ou é da competência dos tribunais arbitrais, cumprindo, para tanto, apreciar os dois fundamentos enunciados atrás.
IV. Começando pelo âmbito da convenção de arbitragem apontada, ao considerar o objecto da lide incluído na cláusula arbitral o tribunal fez uma incorrecta interpretação da mesma, violando o art. 236.º, n.º 1 do CC, e, por consequência, interpretando e aplicando também erradamente os arts. 96.º, alínea b) e 99.º, n.º 1inciso LV, do CPCartigo 5º, da Constituição da República. Nesse jaez, respeitou-se o dever de informar a parte daquilo que se lhe imputa e das consequências que podem advir do processo, assim como se observou o n.º 1 do art. 5.º da LAV.
V. A expressão “diferendos que possam surgir entre direito à vista de todas as Partes no âmbito do presente contrato” ínsita na dita cláusula 41.ª reportaprovas e manifestações reunidas nos autos, com oportunizando à parte manifestar-se tão só aos litígios decorrentes directamente do Contrato Quadroe adotar as providências para sua defesa e comprovação de suas alegações, autonomamente considerado, e, quando muito, numa interpretação ampla da convenção arbitral, também aos litígios decorrentes de operações financeiras em produzindo provas que se discutam matérias que integram a disciplina do Contrato Quadro igualmente aplicável a tais operações (maxime as vertidas nas cláusulas 5.ª a 17.ª).
VI. O Contrato Quadro tem organização e sistematização próprias, sendo possível vislumbrar no mesmo uma certa segmentação ou divisão, procurando nuns segmentos regular-se os aspectos comuns ao Contrato Quadro e às chamadas operações financeiras (cláusulas 1.ª à 4.ª), noutros, apenas os aspectos específicos das operações financeiras (cláusulas 5.ª à 17.ª), e ainda noutros segmentos, os aspectos específicos do Contrato Quadro (cláusula 18.ª à 41.ª), entre os quais a escolha do foro competente para dirimir os “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” (leia-se o Contrato Quadro).
VII. O Contrato Quadro é, por tudo isto, autónomo das operações financeiras que visa enquadrar. Produzentendesse pertinentes, como tal, efeitos directos garantia de influência e imediatos, independentemente não surpresa na construção da contratação de qualquer operação, e gera direitos accionáveis contenciosamente, se necessáriodecisão final1.
VIII. Atendendo ao pedido e à causa de pedir formulados nos autos – entre os quais a declaração de invalidade do swap (nos termos do artigo 1245.º do CC ou noutros que o tribunal considere aplicáveis) e a imputação de responsabilidade da Ré (por violação de deveres de informação pré-contratuais), constata-se que a apreciação e decisão destas questões jurídicas, eminentemente de direito privado civil, convoca a aplicação de normas gerais do Código Civil que nada têm a ver com disciplina especial do Contrato Quadro – do qual a Recorrente não se pretende sequer aproveitar – e que são, salvo convenção em contrário, da exclusiva competência dos Tribunais Judiciais, nos termos do art. 64.º do CPC (cfr. citado Ac. TRG de 08/03/2012, proc. 1387/11.5TBBCL-B.G1).
IX. O objecto da presente lide – pelo menos na parte em que se joga a invalidade do contrato swap e se discute o aludido direito à indemnização da Autora, nos moldes configurados na acção – não está, xxxxx e inequivocamente, coberto pela convenção de arbitragem assinalada.
X. Uma vez que a patente e manifesta inaplicabilidade da convenção de arbitragem é perceptível num juízo perfunctório, o tribunal judicial pode declará-la e, consequentemente, julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral, sem com isso pôr em causa o princípio da competência - competência 5.
XI. De resto, havendo incerteza quanto à vontade real das partes na celebração da convenção, sempre a cláusula respectiva deve ser interpretada à luz da teoria da impressão do destinatário (art. 236.º, n.º 1 do CPC), de acordo com a qual chega-se também a resultado idêntico: mesmo para um declaratário normal, na posição da Recorrente, os diferendos relacionados com a validade de operações financeiras futuras ou com a violação de deveres não plasmados no texto do Contrato Quadro estariam fora da convenção.
XII. Passemos agora a apreciar a questão da inoponibilidade da convenção em função da situação superveniente de insuficiência económica da Recorrente.
XIII. “Mostra-se posicionamento pacífico considerar que a superveniência de uma situação de insuficiência económica que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constituirá causa legítima de incumprimento da convenção” e que “quando uma das partes, sem culpa sua, deixa de ter meios de custear as despesas relativas à arbitragem, não pode ficar impedida de ver satisfeito o seu direito de acesso à justiça para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, pois estar-se-ia a denegar justiça por insuficiência de meios económicos (o que a Lei Fundamental, como vimos, não permite), pelo que a obrigação de recorrer à arbitragem se extingue relativamente a ela – cfr. o Ac. STJ de 18/01/2000, proc. 99A1015, e o Ac. TRL de 02/11/2010, proc. 454/09.0TVLSB.L1-7, sublinhado nosso.
XIV. No caso dos autos, já depois de celebrar a convenção de arbitragem e pelos motivos descritos nos arts. 40.º a 52.º da p.i., a Recorrente viu-se a braços com uma degradação da sua situação económica, que não lhe é imputável, e que a impossibilita de custear as despesas de arbitragem. A situação agravou-se de tal forma que, por despacho judicial de 20/03/2005, foi admitida a PER (cfr. Documento 1 junto com este recurso), facto superveniente que a Relação não poderá deixar de ter em linha de conta na decisão que proferir.
XV. A admissão ao PER determinou uma alteração ope legis do estatuto jurídico da Recorrente, garantindo- lhe, para além do mais, de forma imediata e directa, a isenção total de custas judiciais no acesso aos tribunais (artigo do 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP), situação de que já tirou proveito nesta apelação mas que, obviamente, não a poderá beneficiar na instância arbitral que, reconhecidamente e sem necessidade de comprovação adicional, será muito mais dispendiosa neste caso. XVI.Os elementos fácticos evidenciados nos autos (designadamente os Documentos 3, 4, 5 e 6 da p.i., e o Documento 1 agora junto) espelham bem a débil realidade económica e financeira da Recorrente e permitem à Relação, por um lado, inferir, ao abrigo da prerrogativa que lhe assiste nos termos do art. 662.º do CPC, a concomitante incapacidade de esta suportar as despesas inerentes à via arbitral e, por outro, em consequência, julgar extinta a obrigação de recorrer à arbitragem ou – caso a Relação entenda que não dispõe ainda de elementos suficientes para fixar a matéria de facto caracterizadora da situação económica da Recorrente – anular a decisão recorrida e mandar baixar os autos à 1.ª instância para que aí sejam seleccionados os correspondentes factos, a constarem de base instrutória, e sobre eles produzida prova, tudo nos termos do art. 662.º, n.º 2 do CPC..
XVII. A impossibilidade de custear as despesas relativas à arbitragem acarreta, nos termos do art. 790.º, n.º 1, do CC, uma extinção da obrigação de recorrer à arbitragem, fundada na impossibilidade do seu cumprimento por causa não imputável ao devedor, o que permite julgar, desde logo, improcedente a excepção de preterição de tribunal arbitral, sem que para tal haja necessidade de desaplicar a norma contida no art. 577.º, alínea a) do CPC em função de um juízo de inconstitucionalidade sobre determinada dimensão interpretativa da mesma.
XVIII. Inconstitucionalidade que, à cautela, também se suscita já, quando a norma referida seja interpretada no sentido de a excepção de violação de convenção de arbitragem ser oponível à parte que, sem culpa, se encontre em situação superveniente de insuficiência económica que lhe confira o benefício de isenção de custas judiciais previsto no artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP, por de violação do art. 20.º da Constituição (acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva), não devendo, em conformidade, a mesma norma ser aplicada ao caso dos autos e julgando-se assim improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal (cfr. neste sentido o Ac. TC n.º 311/08, de 30/05/2008, no proc. 753/07, já citado).
XIX. E não se diga que o princípio constitucional do acesso à justiça não passa por o Estado assegurar que entidades com fins lucrativos e em má situação económica têm a possibilidade de aceder aos tribunais. Embora seja verdade que a Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, afastou a concessão de protecção jurídica às pessoas colectivas com fins lucrativos, o Estado, porém, não deixa de reconhecer uma isenção total de custas judiciais a tais pessoas colectivas, quando estejam em situação de falência ou em processo de recuperação de empresa, por conseguinte, em má situação económica (artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP).
XX. Dito isto, à Recorrente restam duas alternativas: ou consegue ver julgados na instância judicial os direitos invocados ou, caso contrário, terá que os deixar cair definitivamente por não ter condições económicas de suportar as despesas da arbitragem, ou seja, verá “ser-lhe denegada justiça por insuficiência de meios económicos”, resultado que a Constituição manifestamente impede (cfr. o Ac. TRL de 02/11/2010, já citado).
XXI. Em síntese, é manifesto e patente (na acepção acima mencionada) que a aludida cláusula compromissória é inoponível à Recorrente, por impossibilidade superveniente de esta, sem culpa sua, custear as despesas da arbitragem (art. 790.º do CC). E, em qualquer caso, sempre a oponibilidade da convenção de arbitragem violaria o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva previstos no art. 20º, da CRP.
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FUNDAMENTOS. 2.1. A recorrente remata as suas alegações com as seguintes conclusões:
I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral e, consequentemente, absolveu a Ré da instância, nos termos do art. 577.º, alínea a) do CPC. Considerando para tal que a convenção de arbitragem estabelecida na cláusula 41.º do Contrato Quadro (Documento 1 da p.i.) abrange o objecto da lide; não é manifestamente nula, nem se tornou manifestamente ineficaz ou inexequível, sendo oponível à Recorrente.
II. Sem conceder quanto às questões referentes à validade da convenção, que não se discutirão nesta sede, procurará a Recorrente demonstrar apenas neste recurso que a (i) convenção de arbitragem não abrange o objecto da lide e, em qualquer caso, (ii) ser-lhe-ia inoponível em função da situação superveniente de insuficiência económica.
III. A questão objecto do recurso cinge-se, pois, em saber se a competência material para a presente acção cabe ao Tribunal “a quo” ou é da competência dos tribunais arbitrais, cumprindo, para tanto, apreciar os dois fundamentos enunciados atrás.
IV. Começando pelo âmbito da convenção de arbitragem apontada, ao considerar o objecto da lide incluído na cláusula arbitral o tribunal fez uma incorrecta interpretação da mesma, violando o art. 236.º, n.º 1 do CC, e, por consequência, interpretando e aplicando também erradamente os arts. 96.º, alínea b) e 99.º, n.º 1, do CPC, assim como o n.º 1 do art. 5.º da LAV.
V. A expressão “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” ínsita na dita cláusula 41.ª reporta-se tão só aos litígios decorrentes directamente do Contrato Quadro, autonomamente considerado, e, quando muito, numa interpretação ampla da convenção arbitral, também aos litígios decorrentes de operações financeiras em que se discutam matérias que integram a disciplina do Contrato Quadro igualmente aplicável a tais operações (maxime as vertidas nas cláusulas 5.ª a 17.ª).
VI. O Contrato Quadro tem organização e sistematização próprias, sendo possível vislumbrar no mesmo uma certa segmentação ou divisão, procurando nuns segmentos regular-se os aspectos comuns ao Contrato Quadro e às chamadas operações financeiras (cláusulas 1.ª à 4.ª), noutros, apenas os aspectos específicos das operações financeiras (cláusulas 5.ª à 17.ª), e ainda noutros segmentos, os aspectos específicos do Contrato Quadro (cláusula 18.ª à 41.ª), entre os quais a escolha do foro competente para dirimir os “diferendos que possam surgir entre as Partes no âmbito do presente contrato” (leia-se o Contrato Quadro).
VII. O Contrato Quadro é, por tudo isto, autónomo das operações financeiras que visa enquadrar. Produz, como tal, efeitos directos e imediatos, independentemente da contratação de qualquer operação, e gera direitos accionáveis contenciosamente, se necessário.
VIII. Atendendo ao pedido e à causa de pedir formulados nos autos – entre os quais a declaração de invalidade do swap (nos termos do artigo 1245.º do CC ou noutros que o tribunal considere aplicáveis) e a imputação de responsabilidade da Ré (por violação de deveres de informação pré-pré- contratuais), constata-se que a apreciação e decisão destas questões jurídicas, eminentemente de direito privado civil, convoca a aplicação de normas gerais do Código Civil que nada têm a ver com disciplina especial do Contrato Quadro – do qual a Recorrente não se pretende sequer aproveitar – e que são, salvo convenção em contrário, da exclusiva competência dos Tribunais Judiciais, nos termos do art. 64.º do CPC (cfr. citado Ac. TRG de 08/03/2012, proc. 1387/11.5TBBCL-B.G1).
IX. O objecto da presente lide – pelo menos na parte em que se joga a invalidade do contrato swap e se discute o aludido direito à indemnização da Autora, nos moldes configurados na acção – não está, xxxxx e inequivocamente, coberto pela convenção de arbitragem assinalada.
X. Uma vez que a patente e manifesta inaplicabilidade da convenção de arbitragem é perceptível num juízo perfunctório, o tribunal judicial pode declará-la e, consequentemente, julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta por preterição de tribunal arbitral, sem com isso pôr em causa o princípio da competência - competência 5.
XI. De resto, havendo incerteza quanto à vontade real das partes na celebração da convenção, sempre a cláusula respectiva deve ser interpretada à luz da teoria da impressão do destinatário (art. 236.º, n.º 1 do CPC), de acordo com a qual chega-se também a resultado idêntico: mesmo para um declaratário normal, na posição da Recorrente, os diferendos relacionados com a validade de operações financeiras futuras ou com a violação de deveres não plasmados no texto do Contrato Quadro estariam fora da convenção.
XII. Passemos agora a apreciar a questão da inoponibilidade da convenção em função da situação superveniente de insuficiência económica da Recorrente.
XIII. “Mostra-se posicionamento pacífico considerar que a superveniência de uma situação de insuficiência económica que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constituirá causa legítima de incumprimento da convenção” e que “quando uma das partes, sem culpa sua, deixa de ter meios de custear as despesas relativas à arbitragem, não pode ficar impedida de ver satisfeito o seu direito de acesso à justiça para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, pois estar-se-ia a denegar justiça por insuficiência de meios económicos (o que a Lei Fundamental, como vimos, não permite), pelo que a obrigação de recorrer à arbitragem se extingue relativamente a ela – cfr. o Ac. STJ de 18/01/2000, proc. 99A1015, e o Ac. TRL de 02/11/2010, proc. 454/09.0TVLSB.L1-7, sublinhado nosso.
XIV. No caso dos autos, já depois de celebrar a convenção de arbitragem e pelos motivos descritos nos arts. 40.º a 52.º da p.i., a Recorrente viu-se a braços com uma degradação da sua situação económica, que não lhe é imputável, e que a impossibilita de custear as despesas de arbitragem. A situação agravou-se de tal forma que, por despacho judicial de 20/03/2005, foi admitida a PER (cfr. Documento 1 junto com este recurso), facto superveniente que a Relação não poderá deixar de ter em linha de conta na decisão que proferir.
XV. A admissão ao PER determinou uma alteração ope legis do estatuto jurídico da Recorrente, garantindo- garantindo-lhe, para além do mais, de forma imediata e directa, a isenção total de custas judiciais no acesso aos tribunais (artigo do 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP), situação de que já tirou proveito nesta apelação mas que, obviamente, não a poderá beneficiar na instância arbitral que, reconhecidamente e sem necessidade de comprovação adicional, será muito mais dispendiosa neste caso. XVI.Os elementos fácticos evidenciados nos autos (designadamente os Documentos 3, 4, 5 e 6 da p.i., e o Documento 1 agora junto) espelham bem a débil realidade económica e financeira da Recorrente e permitem à Relação, por um lado, inferir, ao abrigo da prerrogativa que lhe assiste nos termos do art. 662.º do CPC, a concomitante incapacidade de esta suportar as despesas inerentes à via arbitral e, por outro, em consequência, julgar extinta a obrigação de recorrer à arbitragem ou – caso a Relação entenda que não dispõe ainda de elementos suficientes para fixar a matéria de facto caracterizadora da situação económica da Recorrente – anular a decisão recorrida e mandar baixar os autos à 1.ª instância para que aí sejam seleccionados os correspondentes factos, a constarem de base instrutória, e sobre eles produzida prova, tudo nos termos do art. 662.º, n.º 2 do CPC..
XVII. A impossibilidade de custear as despesas relativas à arbitragem acarreta, nos termos do art. 790.º, n.º 1, do CC, uma extinção da obrigação de recorrer à arbitragem, fundada na impossibilidade do seu cumprimento por causa não imputável ao devedor, o que permite julgar, desde logo, improcedente a excepção de preterição de tribunal arbitral, sem que para tal haja necessidade de desaplicar a norma contida no art. 577.º, alínea a) do CPC em função de um juízo de inconstitucionalidade sobre determinada dimensão interpretativa da mesma.
XVIII. Inconstitucionalidade que, à cautela, também se suscita já, quando a norma referida seja interpretada no sentido de a excepção de violação de convenção de arbitragem ser oponível à parte que, sem culpa, se encontre em situação superveniente de insuficiência económica que lhe confira o benefício de isenção de custas judiciais previsto no artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP, por de violação do art. 20.º da Constituição (acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva), não devendo, em conformidade, a mesma norma ser aplicada ao caso dos autos e julgando-se assim improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal (cfr. neste sentido o Ac. TC n.º 311/08, de 30/05/2008, no proc. 753/07, já citado).
XIX. E não se diga que o princípio constitucional do acesso à justiça não passa por o Estado assegurar que entidades com fins lucrativos e em má situação económica têm a possibilidade de aceder aos tribunais. Embora seja verdade que a Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, afastou a concessão de protecção jurídica às pessoas colectivas com fins lucrativos, o Estado, porém, não deixa de reconhecer uma isenção total de custas judiciais a tais pessoas colectivas, quando estejam em situação de falência ou em processo de recuperação de empresa, por conseguinte, em má situação económica (artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do RCP).
XX. Dito isto, à Recorrente restam duas alternativas: ou consegue ver julgados na instância judicial os direitos invocados ou, caso contrário, terá que os deixar cair definitivamente por não ter condições económicas de suportar as despesas da arbitragem, ou seja, verá “ser-lhe denegada justiça por insuficiência de meios económicos”, resultado que a Constituição manifestamente impede (cfr. o Ac. TRL de 02/11/2010, já citado).
XXI. Em síntese, é manifesto e patente (na acepção acima mencionada) que a aludida cláusula compromissória é inoponível à Recorrente, por impossibilidade superveniente de esta, sem culpa sua, custear as despesas da arbitragem (art. 790.º do CC). E, em qualquer caso, sempre a oponibilidade da convenção de arbitragem violaria o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva previstos no art. 20º, da CRP.
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